• 14° SINAGEO – Simpósio Nacional de Geomorfologia
  • Corumbá / MS
  • 24 a 30 de Agosto de 2023

AÇÃO ANTROPOGÊNICA SOBRE O RELEVO: ANÁLISE GEOMORFOLÓGICA DE CASOS EROSIVOS EM BACIA SEDIMENTAR NO SEMIÁRIDO PERNAMBUCANO

Autores

  • ERICK DA SILVA AMORIMUNIVERSIDADE DE PERNAMBUCOEmail: erick.dsilvaamorim@gmail.com
  • SIDNEY WALISSON SANTOS DA SILVAUNIVERSIDADE DE PERNAMBUCOEmail: sidneycontacton@gmail.com
  • KLEBER CARVALHO LIMAUNIVERSIDADE DE PERNAMBUCOEmail: kleber.carvalho@upe.br
  • DANIEL DANTAS MOREIRA GOMESUNIVERSIDADE DE PERNAMBUCOEmail: daniel.gomes@upe.br

Resumo

A erosão da superfície terrestre é um fenômeno natural, cujas principais causas podem estar relacionadas tanto com as características fisiográficas do ambiente, quanto às intervenções antrópicas que nele ocorrem, portanto, está sujeita a processos que são desencadeados pelas formas de uso e ocupação que o homem estabelece. Entre as principais atividades antrópicas estão os cortes de estradas e as práticas agrícolas, logo, o objetivo deste trabalho é analisar processos geomorfológicos e a ação antropogênica sobre o relevo, com foco nos processos erosivos em áreas de agricultura irrigada no município de Tacaratu, semiárido pernambucano. Foi percebido, na área de estudo, a predominância de erosão laminar em detrimento aos cortes de estradas, portanto, o fenômeno erosivo na área está interligado à dinâmica da erosão diferencial, devido a distinção litológica, entretanto, as formas de uso da terra proporcionam a aceleração dos processos erosivos.

Palavras chaves

erosão laminar; atividades antrópicas; processos geomorfológicos; erosão diferencial; bacia sedimentar

Introdução

A erosão da superfície terrestre é um fenômeno natural, cujas principais causas, como afirmam Daniel e Vieira (2015) podem estar relacionadas tanto com as características fisiográficas do ambiente, bem como às intervenções antrópicas que nele ocorrem. Para uma análise que vise compreender a ocorrência dos processos erosivos em um determinado espaço se faz necessário abordar as características físicas do ambiente de forma sistêmica, pois cada elemento mantém relações de interdependência entre si, bem como as características desses elementos irão determinar a dinâmica natural que rege aquele ambiente em busca de manter seu equilíbrio dinâmico. Todavia, é importante remeter ao fato de que, em nossa atual realidade, os ambientes naturais sofreram ou sofrem modificações pelas ações antrópicas, portanto, estão sujeitos à processos que são desencadeados pelas formas de uso e ocupação que o homem estabelece, dessa forma, para além de uma análise dos elementos físicos que compõem a área de estudo, é de extrema importância compreender como o homem age dentro do sistema, causando problemas para o meio que reverberam na própria organização social, pois ambos mantém, também, relações de interdependência. A degradação ambiental, conforme Sánchez (2013) é a perda da qualidade ambiental, onde o agente causador é o ser humano. Diante disso, a intervenção antrópica pode causar no sistema ambiental, a aceleração e intensificação dos processos erosivos, permitindo o avanço da ações morfodinâmicas sobre a superfície da Terra, desestabilizando a homeostase do sistema, possibilitando mudanças aparentes em sua paisagem. Entre as principais atividades antrópicas que contribuem demasiadamente com os processos erosivos estão os cortes de estradas e as práticas agrícolas, e para isso “[...]o homem tem buscado meios consonantes com seu nível tecnológico, para transformar cada vez mais as terras em espaços produtivos, o que nem sempre o tem levado a considerar seu potencial e suas limitações de uso” (MAFRA, 2006, p. 304). Daí o papel fundamental do uso da terra para fins agrícolas apresentar diversos riscos para o ambiente e ser um grande causador de degradação em diversas áreas do Brasil. O semiárido pernambucano é uma área extremamente suscetível aos processos erosivos, pois este possui características fisiográficas que favorecem à erosão, vegetação limitada às condições climáticas, grandes áreas de solo exposto, chuvas fortemente concentradas em curtos períodos de tempo, bem como formas de uso da terra que favorecem a aceleração dos processos erosivos. Sendo necessário analisar esse território de forma aplicada “o controle da erosão tem passado por um aprimoramento a partir da utilização de ferramentas em Sistemas de Informações Geográficas (SIG) e outras Geotecnologias, inclusive em áreas de difícil acesso” (LISTO e XAVIER, 2017). Baseado nisso, o objetivo deste trabalho é analisar processos geomorfológicos e a ação antropogênica sobre o relevo, com foco nos processos erosivos em áreas de agricultura irrigada no município de Tacaratu, semiárido pernambucano. Sendo assim, sua importância está atrelada às questões fundamentais na análise dos processos que atuam na área de estudo, podendo garantir formas de compreender esses processos e desenvolver métodos de conter ou prevenir seu desenvolvimento.

Material e métodos

Caracterização da área de estudo A área escolhida para análise está localizada no município de Tacaratu, estado de Pernambuco, Brasil (figura 1). Trata-se de uma sub-bacia hidrográfica da bacia do Rio São Francisco, com extensão territorial de 33,762 km², entre as coordenadas 8º87’S/8º96’S e 38º15’W/38º20’W. Possui altimetria entre 572 e 316m, está assentada sobre litologia sedimentar, constituída por antigas formações que datam do período Jurássico, conforme mostram Neves e Temóteo (2000). Seu relevo está dentro dos domínios da Província Borborema, inserido na grande Depressão Sertaneja, segundo Neves e Temóteo (2000) apresenta superfície de pediplanos com inselbergs, algumas serras e chapadas. Trata-se de uma área com superfície aplainada com pouca variação altimétrica. O clima da área é classificado como Bsh semiárido quente, segundo a classificação de Koppen, com média de temperatura anual de 26ºC, média pluviométrica anual de 620,10 mm, entretanto as chuvas não são bem distribuídas durante o ano, mas sim se apresentam em períodos específicos e de forma concentrada, sobretudo na estação do verão, onde na maior parte do ano predomina a estiagem. Sobre uma litologia sedimentar, solos poucos desenvolvidos, relevo aplainado e clima quente e seco desenvolve-se uma vegetação de caatinga, do tipo hiperxerófila, com predominância de vegetação de porte herbáceo e arbustivo. Essa vegetação se mantém ao longo do ano sem desenvolver folhagem, uma forma de manter a água retida em seu interior, somente desenvolvendo folhagem no período chuvoso. A drenagem da sub-bacia possui cursos d’água intermitentes, ou seja, sua carga hídrica se mantém apenas no período chuvoso, seus afluentes são do tipo intermitente, porém é muito comum nessas áreas a presença de canais efêmeros, que possuem água em seu curso somente em episódios de intensidade pluviométrica, secando assim que cessam as chuvas. O padrão da drenagem é o dendrítico, com predominância de canais meandrantes e alguns setores anastomasados. Aquisição e processamento dos dados Os dados foram obtidos a partir de plataformas de instituições que dispõem de dados georreferenciados, e podem ser manipulados e processados em ambiente SIG (Sistema de Informações Geográficas). Os SIG representam uma potente ferramenta de apoio à decisão, através da integração de dados para análise, provenientes de diferentes fontes [...] e da modelagem de diversos processos que ocorrem no mundo real (FARINA, 2006). O aplicativo de SIG aqui utilizado foi o QGIS versão 3.24.1, plataforma gratuita de uso livre, com acesso liberado a qualquer usuário. Os dados matriciais (MDE, MDT, Ortoimagem) foram disponibilizados pelo governo do Estado de Pernambuco, a partir do PE3D, projeto que visa o recobrimento aerofotogramétrico e perfilamento a laser de todo o território pernambucano (pe3d.pe). Esse projeto disponibiliza os dados em altíssima resolução especial de 50 cm, com escala de 1:1.000. Com base no MDT foi processado o mapa hipsométrico, responsável pela representação topográfica do relevo. A drenagem foi ajustada manualmente à escala de detalhe (1:5.000) com uso do relevo sombreado (gerado a partir do MDE) e da ortoimagem, sendo possível delimitar canais de 1ª a 3ª ordem. Os dados referentes às unidades geológicas foram obtidos pelo site do Serviço Geológico do Brasil (geosgb.cprm.gov.br) em escala de 1:100.000, contidos na carta Airi, folha SC.24-X-A-V, arquivo vetorial. Os dados sobre solo foram obtidos no site da Embrapa (geoinfo.cnps.embrapa.br) em escala de 1:100.000, arquivo vetorial, onde foi utilizado uma simbologia com as cores e ordem contidas no documento mais atual do SIBCS. Foi feita uma visita à área de estudo e coletadas imagens via VANT (Veículo Aéreo Não Tripulado), a partir de um Drone encarregado de registrar aerofotografias do setor à jusante da sub-bacia, que foram analisadas e relacionadas aos dados matriciais, com intuito de garantir melhor qualidade nos resultados finais.

Resultado e discussão

Relação entre os elementos físicos e os processos erosivos A sub-bacia está inserida na Bacia Sedimentar do Jatobá, trata-se de uma área com grandes extensões de predominância em erosão laminar, com densidade de incisões superficiais, sulcos e ravinas, espalhadas pelo terreno de forma difusa, característica de relevos aplainados, onde a energia cinética não é suficiente para aprofundar maiores incisões, somado a uma baixa velocidade de escoamento. Portanto, a litologia sedimentar possui alta capacidade de infiltração hídrica, o que dificulta o desenvolvimento de maiores incisões, porém, as condições climáticas da área propiciam o desenvolvimento de solos rasos (figura 2A), devido as características de semiárido, com altas temperaturas e baixos índices pluviométricos, predominando o intemperismo físico e vegetação com baixa densidade. Conforme a carta geológica Airi, em escala de 1:100.000 da CPRM, a área é constituída pela Formação Sergi, que apresenta em sua constituição arenitos por vezes feldspáticos médios a grossos com níveis conglomeráticos, estratificações cruzadas acanaladas, cruzadas tabulares, plano-paralelas e conglomerados oligomíticos, a Formação Aliança, composta por argilitos/siltitos e folhelhos amarronzados e marrom avermelhados intercalados com calcarenitos laminados e fragmentados de peixes fossilizados, por um último, os Depósitos colúvio- eluviais, constituídos por areia média a grossa, as vezes conglomerática de coloração cinza esbranquiçada. Dentre essas unidades observa-se que é nas formações Sergi e Aliança onde encontram-se os maiores números de feições erosivas (figura 2B). Diante disso, a erosão diferencial atua na área, devido as distintas características litológicas, que resultam em diferentes níveis de resistência ao desgaste, visível na formação Aliança, setor mais dissecado da sub-bacia, que apresenta uma estrutura mais frágil aos processos erosivos, pois as argilas e siltes são os sedimentos com granulometria menores que os grãos de areia, portanto, se tornam mais coesos e agrupados, formando menos poros em sua estrutura, o que propicia capacidade de infiltração mais lenta, e em episódios de alta intensidade pluviométrica acaba havendo maior saturação hídrica e escoamento superficial. Bastos, Maia e Cordeiro (2019) complementam ao dizer que o grau de coesão da rocha vai depender do tipo de cimentação que ela apresenta, portanto, o cimento carbonático (presente no calcário) é mais solúvel que o cimento silicoso (presente nos arenitos), o que torna a rocha dessa formação mais suscetível ao desgaste. A figura 2B mostra que as áreas mais afetadas pela erosão dentro da sub-bacia se encontram dentro da formação Aliança, são áreas com pedologia de predominância de Neossolo Quartzarênico, que segundo Lepsch (2006) são solos pouco desenvolvidos, com presença de horizonte A pouco espesso sobre o embasamento rochoso, são muito arenosos e possui pouca capacidade de armazenar água e nutrientes para as plantas, o que determina a vegetação de caatinga esparsa e de porte predominante arbustivo hiperxerófilo, deixando várias áreas de solo em exposição, que em períodos de chuvas torrenciais, fenômeno característico da região, contribui com o escoamento superficial e transporte de material, porém essa vegetação, mesmo limitada, mantém uma relação de proteção do solo contra as chuvas, e nota-se que grande parte da área de estudo, onde a vegetação nativa se mantém, não apresenta feições erosivas, sobretudo na área dos Depósitos colúvio-eluviais. Uso antrópico e suas interferências O homem aparece como um importante agente erosivo, pois atua no sistema desencadeando e acelerando processos erosivos. Com base nisso, a partir do padrão observado na área de estudo analisada, é possível observar a presença de cultivos agrícolas no baixo curso da bacia hidrográfica, seguindo a classificação proposta por Lima et al (2022), são cultivos de pequeno porte, caracterizados pela baixa retenção dos avanços dos processos erosivos. Ressaltando que esse perímetro agrícola se localiza próximo ao divisor de águas da bacia, onde juntamente com a presença de cultivos de porte herbáceo, é notório a presença de pontos de escoamento difuso espacializados pelo perímetro, caso se sobrepondo sobre a infiltração da área, pode favorecer o início do runoff, conforme apontam Lima et al (2022). Foi observado uma forte relação entre o início das erosões e as estradas, com grande parte das incisões surgindo a partir dos cortes de estradas não pavimentadas, observa-se que no baixo/médio curso, grande presença das feições erosivas, que se iniciam a partir das proximidades das estradas não pavimentadas (figura 3), se constituem como um elemento antrópico que pode influenciar na distribuição das feições erosivas no solo da bacia, podendo chegar a níveis de moderados à severos. Para melhor análise da distribuição são considerados os fatores fisiográficos da área, fatores como declividade, e as classes de materiais ali dispostos, que impactam diretamente na espacialização da erosão na bacia (MOHAAMMADKHAN e AHMADI, 2011).

Mapa de localização

figura 1. localização da área de estudo.

Mapa geomorfológico.

Figura 2. A) pedologia; B) litologia; C) hipsometria.

Setor sul da sub-bacia.

Figura 3. nota-se a predominância em solo descoberto, com cortes de estradas não-pavimentadas, sobre atuação da erosão laminar.

Considerações Finais

A erosão é um processo natural da natureza, porém o homem consegue intensificar esse fenômeno de forma a causar sérios problemas no sistema. Na área da Formação Sergi, mesmo havendo ocupação antrópica, com presença de agrovilas e diversos recortes destinados à agricultura, com exposição de solo, percebe-se que as áreas com maior incidência de processos erosivos mais intensos localizam-se na Formação Aliança, devido suas características fisiográficas. Portanto, o fenômeno erosivo na área está interligado à dinâmica da erosão diferencial, devido a distinção litológica, entretanto, as formas de uso da terra proporcionam a aceleração dos processos erosivos, visto que nas áreas destinadas à agricultura e estradas não pavimentadas é onde se iniciam grande parte das incisões, o que somado às características do ambiente acaba por agravar ainda mais a erosão. Diante disto, se faz necessário o desenvolvimento de trabalhos como esse aqui produzido, que serve como grande embasamento para ascender as produções e informações acerca da região do semiárido nordestino, e desse modo conseguir desenvolver formas de solucionar diversos problemas que assolam a região.

Agradecimentos



Referências

BASTOS, F. H.; MAIA, R. P.; CORDEIRO, A. M. N. Geomorfologia. 1ª Ed. Fortaleza: EdUECE, 2015.
DANIEL, E.; VIEIRA, B.C. A evolução das feições erosivas da Bacia do Córrego Espraiado, São Pedro (SP). Boletim Goiano de Geografia, vol. 35, n. 2, p. 339–358, 2015. DOI: 10.5216/bgg.v35i2.37435
FARINA, F. C. Abordagem sobre as técnicas de geoprocessamento aplicadas ao planejamento e gestão urbana. Cadernos EBAPE.BR, v. 4, n. 4, p. 1-13, 2006.
LEPSCH, I. F. 19 lições de pedologia. São Paulo: Oficina de Textos, 2011.
LIMA, M. R. M.; SILVA, S. W. S.; RAMOS, R. P. S.; LIMA, K. C. Morfoconservação dos terrenos em perímetros irrigados no submédio São Francisco: Estudo de caso em Icó-Mandantes (Pernambuco). In: IV Simpósio da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, 4., Belo Horizonte – MG, 2022. Anais... Belo Horizonte: CBHSF, 2020.
LISTO, F. L. R.; XAVIER, J. P. S. Carta de suscetibilidade a erosão do município de Aliança – PE a partir de análise multicritério. Clio Arqueológica, v.32, n. 3, p.180-200, 2017. DOI: 10.20891/clio.V32N3p180-200.
MAFRA, N. M. C. Processos erosivos e preservação de áreas de risco de erosão por voçorocas. In: GUERRA, Antonio José Teixeira. SILVA, Antonio Soares da. BOTELHO, Rosangela Garrido Machado (organizadores). Erosão e conservação dos solos: conceitos, temas e aplicações. 3ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. p.301-321.
MOHAMMADKHAN, S.; AHMADI, H. Relationship between soil erosion, slope, parente material and distance to road (Case study: Latian Watershed, Iran). Arabian Journal of Geoscience, v.4, p.331-338, 2011. DOI: 10.1007/s12517-010-0197-z.
NEVES, J. A. C. L.; TEMÓTEO, J. W. C. Base municipal de informações das águas subterrâneas – município de Tacaratu. Recife: CPRM, 2000.
SÁNCHEZ, L.E. Avaliação de impacto ambiental: conceitos e métodos. 2ª Ed. São Paulo: Oficina de Textos, 2013.

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