Autores
- ERICK DA SILVA AMORIMUNIVERSIDADE DE PERNAMBUCOEmail: erick.dsilvaamorim@gmail.com
- SIDNEY WALISSON SANTOS DA SILVAUNIVERSIDADE DE PERNAMBUCOEmail: sidneycontacton@gmail.com
- KLEBER CARVALHO LIMAUNIVERSIDADE DE PERNAMBUCOEmail: kleber.carvalho@upe.br
- DANIEL DANTAS MOREIRA GOMESUNIVERSIDADE DE PERNAMBUCOEmail: daniel.gomes@upe.br
Resumo
A erosão da superfície terrestre é um fenômeno natural, cujas principais causas
podem estar relacionadas tanto com as características fisiográficas do ambiente,
quanto às intervenções antrópicas que nele ocorrem, portanto, está sujeita a
processos que são desencadeados pelas formas de uso e ocupação que o homem
estabelece. Entre as principais atividades antrópicas estão os cortes de
estradas e as práticas agrícolas, logo, o objetivo deste trabalho é analisar
processos geomorfológicos e a ação antropogênica sobre o relevo, com foco nos
processos erosivos em áreas de agricultura irrigada no município de Tacaratu,
semiárido pernambucano. Foi percebido, na área de estudo, a predominância de
erosão laminar em detrimento aos cortes de estradas, portanto, o fenômeno
erosivo na área está interligado à dinâmica da erosão diferencial, devido a
distinção litológica, entretanto, as formas de uso da terra proporcionam a
aceleração dos processos erosivos.
Palavras chaves
erosão laminar; atividades antrópicas; processos geomorfológicos; erosão diferencial; bacia sedimentar
Introdução
A erosão da superfície terrestre é um fenômeno natural, cujas principais causas,
como afirmam Daniel e Vieira (2015) podem estar relacionadas tanto com as
características fisiográficas do ambiente, bem como às intervenções antrópicas
que nele ocorrem. Para uma análise que vise compreender a ocorrência dos
processos erosivos em um determinado espaço se faz necessário abordar as
características físicas do ambiente de forma sistêmica, pois cada elemento
mantém relações de interdependência entre si, bem como as características desses
elementos irão determinar a dinâmica natural que rege aquele ambiente em busca
de manter seu equilíbrio dinâmico.
Todavia, é importante remeter ao fato de que, em nossa atual realidade, os
ambientes naturais sofreram ou sofrem modificações pelas ações antrópicas,
portanto, estão sujeitos à processos que são desencadeados pelas formas de uso e
ocupação que o homem estabelece, dessa forma, para além de uma análise dos
elementos físicos que compõem a área de estudo, é de extrema importância
compreender como o homem age dentro do sistema, causando problemas para o meio
que reverberam na própria organização social, pois ambos mantém, também,
relações de interdependência.
A degradação ambiental, conforme Sánchez (2013) é a perda da qualidade
ambiental, onde o agente causador é o ser humano. Diante disso, a intervenção
antrópica pode causar no sistema ambiental, a aceleração e intensificação dos
processos erosivos, permitindo o avanço da ações morfodinâmicas sobre a
superfície da Terra, desestabilizando a homeostase do sistema, possibilitando
mudanças aparentes em sua paisagem.
Entre as principais atividades antrópicas que contribuem demasiadamente com os
processos erosivos estão os cortes de estradas e as práticas agrícolas, e para
isso “[...]o homem tem buscado meios consonantes com seu nível tecnológico, para
transformar cada vez mais as terras em espaços produtivos, o que nem sempre o
tem levado a considerar seu potencial e suas limitações de uso” (MAFRA, 2006, p.
304). Daí o papel fundamental do uso da terra para fins agrícolas apresentar
diversos riscos para o ambiente e ser um grande causador de degradação em
diversas áreas do Brasil.
O semiárido pernambucano é uma área extremamente suscetível aos processos
erosivos, pois este possui características fisiográficas que favorecem à erosão,
vegetação limitada às condições climáticas, grandes áreas de solo exposto,
chuvas fortemente concentradas em curtos períodos de tempo, bem como formas de
uso da terra que favorecem a aceleração dos processos erosivos. Sendo necessário
analisar esse território de forma aplicada “o controle da erosão tem passado por
um aprimoramento a partir da utilização de ferramentas em Sistemas de
Informações Geográficas (SIG) e outras Geotecnologias, inclusive em áreas de
difícil acesso” (LISTO e XAVIER, 2017).
Baseado nisso, o objetivo deste trabalho é analisar processos geomorfológicos e
a ação antropogênica sobre o relevo, com foco nos processos erosivos em áreas de
agricultura irrigada no município de Tacaratu, semiárido pernambucano. Sendo
assim, sua importância está atrelada às questões fundamentais na análise dos
processos que atuam na área de estudo, podendo garantir formas de compreender
esses processos e desenvolver métodos de conter ou prevenir seu desenvolvimento.
Material e métodos
Caracterização da área de estudo
A área escolhida para análise está localizada no município de Tacaratu, estado
de Pernambuco, Brasil (figura 1). Trata-se de uma sub-bacia hidrográfica da
bacia do Rio São Francisco, com extensão territorial de 33,762 km², entre as
coordenadas 8º87’S/8º96’S e 38º15’W/38º20’W. Possui altimetria entre 572 e 316m,
está assentada sobre litologia sedimentar, constituída por antigas formações que
datam do período Jurássico, conforme mostram Neves e Temóteo (2000). Seu relevo
está dentro dos domínios da Província Borborema, inserido na grande Depressão
Sertaneja, segundo Neves e Temóteo (2000) apresenta superfície de pediplanos com
inselbergs, algumas serras e chapadas. Trata-se de uma área com superfície
aplainada com pouca variação altimétrica.
O clima da área é classificado como Bsh semiárido quente, segundo a
classificação de Koppen, com média de temperatura anual de 26ºC, média
pluviométrica anual de 620,10 mm, entretanto as chuvas não são bem distribuídas
durante o ano, mas sim se apresentam em períodos específicos e de forma
concentrada, sobretudo na estação do verão, onde na maior parte do ano predomina
a estiagem. Sobre uma litologia sedimentar, solos poucos desenvolvidos, relevo
aplainado e clima quente e seco desenvolve-se uma vegetação de caatinga, do tipo
hiperxerófila, com predominância de vegetação de porte herbáceo e arbustivo.
Essa vegetação se mantém ao longo do ano sem desenvolver folhagem, uma forma de
manter a água retida em seu interior, somente desenvolvendo folhagem no período
chuvoso.
A drenagem da sub-bacia possui cursos d’água intermitentes, ou seja, sua carga
hídrica se mantém apenas no período chuvoso, seus afluentes são do tipo
intermitente, porém é muito comum nessas áreas a presença de canais efêmeros,
que possuem água em seu curso somente em episódios de intensidade pluviométrica,
secando assim que cessam as chuvas. O padrão da drenagem é o dendrítico, com
predominância de canais meandrantes e alguns setores anastomasados.
Aquisição e processamento dos dados
Os dados foram obtidos a partir de plataformas de instituições que dispõem de
dados georreferenciados, e podem ser manipulados e processados em ambiente SIG
(Sistema de Informações Geográficas). Os SIG representam uma potente ferramenta
de apoio à decisão, através da integração de dados para análise, provenientes de
diferentes fontes [...] e da modelagem de diversos processos que ocorrem no
mundo real (FARINA, 2006). O aplicativo de SIG aqui utilizado foi o QGIS versão
3.24.1, plataforma gratuita de uso livre, com acesso liberado a qualquer
usuário.
Os dados matriciais (MDE, MDT, Ortoimagem) foram disponibilizados pelo governo
do Estado de Pernambuco, a partir do PE3D, projeto que visa o recobrimento
aerofotogramétrico e perfilamento a laser de todo o território pernambucano
(pe3d.pe). Esse projeto disponibiliza os dados em altíssima resolução especial
de 50 cm, com escala de 1:1.000.
Com base no MDT foi processado o mapa hipsométrico, responsável pela
representação topográfica do relevo. A drenagem foi ajustada manualmente à
escala de detalhe (1:5.000) com uso do relevo sombreado (gerado a partir do MDE)
e da ortoimagem, sendo possível delimitar canais de 1ª a 3ª ordem. Os dados
referentes às unidades geológicas foram obtidos pelo site do Serviço Geológico
do Brasil (geosgb.cprm.gov.br) em escala de 1:100.000, contidos na carta Airi,
folha SC.24-X-A-V, arquivo vetorial. Os dados sobre solo foram obtidos no site
da Embrapa (geoinfo.cnps.embrapa.br) em escala de 1:100.000, arquivo vetorial,
onde foi utilizado uma simbologia com as cores e ordem contidas no documento
mais atual do SIBCS.
Foi feita uma visita à área de estudo e coletadas imagens via VANT (Veículo
Aéreo Não Tripulado), a partir de um Drone encarregado de registrar
aerofotografias do setor à jusante da sub-bacia, que foram analisadas e
relacionadas aos dados matriciais, com intuito de garantir melhor qualidade nos
resultados finais.
Resultado e discussão
Relação entre os elementos físicos e os processos erosivos
A sub-bacia está inserida na Bacia Sedimentar do Jatobá, trata-se de uma área
com grandes extensões de predominância em erosão laminar, com densidade de
incisões superficiais, sulcos e ravinas, espalhadas pelo terreno de forma
difusa, característica de relevos aplainados, onde a energia cinética não é
suficiente para aprofundar maiores incisões, somado a uma baixa velocidade de
escoamento. Portanto, a litologia sedimentar possui alta capacidade de
infiltração hídrica, o que dificulta o desenvolvimento de maiores incisões,
porém, as condições climáticas da área propiciam o desenvolvimento de solos
rasos (figura 2A), devido as características de semiárido, com altas
temperaturas e baixos índices pluviométricos, predominando o intemperismo físico
e vegetação com baixa densidade.
Conforme a carta geológica Airi, em escala de 1:100.000 da CPRM, a área é
constituída pela Formação Sergi, que apresenta em sua constituição arenitos por
vezes feldspáticos médios a grossos com níveis conglomeráticos, estratificações
cruzadas acanaladas, cruzadas tabulares, plano-paralelas e conglomerados
oligomíticos, a Formação Aliança, composta por argilitos/siltitos e folhelhos
amarronzados e marrom avermelhados intercalados com calcarenitos laminados e
fragmentados de peixes fossilizados, por um último, os Depósitos colúvio-
eluviais, constituídos por areia média a grossa, as vezes conglomerática de
coloração cinza esbranquiçada. Dentre essas unidades observa-se que é nas
formações Sergi e Aliança onde encontram-se os maiores números de feições
erosivas (figura 2B).
Diante disso, a erosão diferencial atua na área, devido as distintas
características litológicas, que resultam em diferentes níveis de resistência ao
desgaste, visível na formação Aliança, setor mais dissecado da sub-bacia, que
apresenta uma estrutura mais frágil aos processos erosivos, pois as argilas e
siltes são os sedimentos com granulometria menores que os grãos de areia,
portanto, se tornam mais coesos e agrupados, formando menos poros em sua
estrutura, o que propicia capacidade de infiltração mais lenta, e em episódios
de alta intensidade pluviométrica acaba havendo maior saturação hídrica e
escoamento superficial.
Bastos, Maia e Cordeiro (2019) complementam ao dizer que o grau de coesão da
rocha vai depender do tipo de cimentação que ela apresenta, portanto, o cimento
carbonático (presente no calcário) é mais solúvel que o cimento silicoso
(presente nos arenitos), o que torna a rocha dessa formação mais suscetível ao
desgaste. A figura 2B mostra que as áreas mais afetadas pela erosão dentro da
sub-bacia se encontram dentro da formação Aliança, são áreas com pedologia de
predominância de Neossolo Quartzarênico, que segundo Lepsch (2006) são solos
pouco desenvolvidos, com presença de horizonte A pouco espesso sobre o
embasamento rochoso, são muito arenosos e possui pouca capacidade de armazenar
água e nutrientes para as plantas, o que determina a vegetação de caatinga
esparsa e de porte predominante arbustivo hiperxerófilo, deixando várias áreas
de solo em exposição, que em períodos de chuvas torrenciais, fenômeno
característico da região, contribui com o escoamento superficial e transporte de
material, porém essa vegetação, mesmo limitada, mantém uma relação de proteção
do solo contra as chuvas, e nota-se que grande parte da área de estudo, onde a
vegetação nativa se mantém, não apresenta feições erosivas, sobretudo na área
dos Depósitos colúvio-eluviais.
Uso antrópico e suas interferências
O homem aparece como um importante agente erosivo, pois atua no sistema
desencadeando e acelerando processos erosivos. Com base nisso, a partir do
padrão observado na área de estudo analisada, é possível observar a presença de
cultivos agrícolas no baixo curso da bacia hidrográfica, seguindo a
classificação proposta por Lima et al (2022), são cultivos de pequeno porte,
caracterizados pela baixa retenção dos avanços dos processos erosivos.
Ressaltando que esse perímetro agrícola se localiza próximo ao divisor de águas
da bacia, onde juntamente com a presença de cultivos de porte herbáceo, é
notório a presença de pontos de escoamento difuso espacializados pelo perímetro,
caso se sobrepondo sobre a infiltração da área, pode favorecer o início do
runoff, conforme apontam Lima et al (2022).
Foi observado uma forte relação entre o início das erosões e as estradas, com
grande parte das incisões surgindo a partir dos cortes de estradas não
pavimentadas, observa-se que no baixo/médio curso, grande presença das feições
erosivas, que se iniciam a partir das proximidades das estradas não pavimentadas
(figura 3), se constituem como um elemento antrópico que pode influenciar na
distribuição das feições erosivas no solo da bacia, podendo chegar a níveis de
moderados à severos. Para melhor análise da distribuição são considerados os
fatores fisiográficos da área, fatores como declividade, e as classes de
materiais ali dispostos, que impactam diretamente na espacialização da erosão na
bacia (MOHAAMMADKHAN e AHMADI, 2011).
figura 1. localização da área de estudo.
Figura 2. A) pedologia; B) litologia; C) hipsometria.
Figura 3. nota-se a predominância em solo descoberto, com cortes de estradas não-pavimentadas, sobre atuação da erosão laminar.
Considerações Finais
A erosão é um processo natural da natureza, porém o homem consegue intensificar
esse fenômeno de forma a causar sérios problemas no sistema. Na área da Formação
Sergi, mesmo havendo ocupação antrópica, com presença de agrovilas e diversos
recortes destinados à agricultura, com exposição de solo, percebe-se que as áreas
com maior incidência de processos erosivos mais intensos localizam-se na Formação
Aliança, devido suas características fisiográficas.
Portanto, o fenômeno erosivo na área está interligado à dinâmica da erosão
diferencial, devido a distinção litológica, entretanto, as formas de uso da terra
proporcionam a aceleração dos processos erosivos, visto que nas áreas destinadas à
agricultura e estradas não pavimentadas é onde se iniciam grande parte das
incisões, o que somado às características do ambiente acaba por agravar ainda mais
a erosão.
Diante disto, se faz necessário o desenvolvimento de trabalhos como esse aqui
produzido, que serve como grande embasamento para ascender as produções e
informações acerca da região do semiárido nordestino, e desse modo conseguir
desenvolver formas de solucionar diversos problemas que assolam a região.
Agradecimentos
Referências
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