• 14° SINAGEO – Simpósio Nacional de Geomorfologia
  • Corumbá / MS
  • 24 a 30 de Agosto de 2023

FRAGILIDADE AMBIENTAL E DISTRIBUIÇÃO DOS PROCESSOS EROSIVOS NA UNIDADE DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS DO RIO DO PEIXE (UGRHI 21) - SP

Autores

  • GLEICE SANTANA PEREIRAFCT - UNESPEmail: gleice.santana@unesp.br

Resumo

O artigo apresenta uma análise acerca da Fragilidade Ambiental e do comportamento/distribuição dos focos erosivos na UGRHI 21 - São Paulo. Com base na metodologia proposta por Ross (1990, 1994), a aferição da fragilidade se dá através de um produto cartográfico de síntese resultante da sobreposição ponderada das variáveis de relevo, tipos de solo, clima, usos da terra e cobertura vegetal. No que tange aos resultados, 65% da bacia hidrográfica é classificada com "Alta" fragilidade aos processos erosivos pluviais e através do estudo individual de cada uma das variáveis correlacionadas a localização e distribuição das erosões é possível indicar que elas são mais frequentes na unidade morfoescultural do “Planalto Centro Ocidental”, em solos do tipo “Argissolos” e associados a “Pastagens” e menos em áreas localizadas nas planícies do baixo curso do Rio do Peixe, na presença de “Latossolos” e em culturas de “Cana-de-açúcar”.

Palavras chaves

Geomorfologia; Geoprocessamento; Álgebra de mapas; Fragilidade; Erosão acelerada

Introdução

A remoção da cobertura natural do solo, sua compactação por maquinários agrícolas e impermeabilização em áreas urbanas, têm alterado e intensificado os processos de escoamento superficial, erosão e assoreamento dos corpos hídricos, constituindo o debate em torno de sistemas adequados de gestão integrada das águas como primordial (TUNDISI, 2006; PIROLI, 2016). O entendimento aprofundado a respeito dos processos que envolvem as dinâmicas erosivas (partindo do momento em que as gotas da chuva incidem sobre o solo) se torna essencial para que se constituam metodologias que possam intervir ou mesmo reverter o cenário de degradação dos solos e do ambiente, partindo do pressuposto de que o conhecimento aprofundado das ocorrências e seus processos permitem pôr em prática ações que operem sobre o manejo do solo de maneira eficaz e objetiva. O relevo e os demais componentes da natureza devem ser analisados sob as potencialidades dos recursos naturais diante das novas necessidades que vêm sendo criadas pelas sociedades humanas e as fragilidades dos ambientes naturais em função das interferências que as tecnologias, cada vez mais desenvolvidas, permitem. A modelagem vem sendo muito utilizada como ferramenta de análise nos diferentes campos da Geografia Física, e representa, em geral, um conjunto de instrumentos úteis na busca de previsões de comportamentos, seja de cenários futuros ou pretéritos, nas mais variadas escalas espaciais e temporais. Segundo Pereira (2021, p. 40) a modelagem se constitui em: “[...] uma importante ferramenta para diagnósticos e prognósticos ambientais e consequentemente, pode oferecer subsídios à tomada de decisões relacionadas ao uso e manejo adequado dos solos e à preservação dos recursos hídricos, uma vez que permite a identificação de áreas mais e menos suscetíveis”. Dentre os diversos métodos de classificação dos terrenos que utilizam uma abordagem integrada ou sistêmica, apoiada no conceito de paisagem, destacam-se, no Brasil, dois sistemas de mapeamento integrado que adotam as unidades de relevo como informação principal: Mapas de Fragilidade Ambiental (ROSS, 1994) e Mapas de Vulnerabilidade à Erosão (CREPANI et al., 2001). Segundo Florenzano (2008), “ambos os sistemas vêm sendo utilizados na elaboração de zoneamentos ambientais, mais especificamente no Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE), como definido institucionalmente” (p. 122). Neste trabalho, foi aplicada a metodologia de Fragilidade Ambiental, proposta por Ross (1990, 1994) e que foi baseada nos princípios da Ecodinâmica de Tricart (1977), onde são avaliadas as relações entre as componentes do meio físico e antrópico (como o relevo, solo, pluviometria cobertura vegetal e uso da terra). Os estudos integrados de um determinado território pressupõem o entendimento da dinâmica de funcionamento do ambiente natural com ou sem as intervenções humanas, dessa forma, a metodologia compreende a elaboração da Fragilidade Potencial (que seria a suscetibilidade natural do ambiente face aos processos erosivos) e da Fragilidade Emergente/Ambiental (a suscetibilidade natural associada aos graus de proteção que os diferentes tipos de uso e cobertura vegetal exercem). Para tal, o estudo foi realizado utilizando como objeto de estudo a Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Rio do Peixe - UGRHI 21 (Política Estadual de Recursos Hídricos – Lei 7663/91) do Estado de São Paulo, que corresponde, quase que integralmente, à bacia hidrográfica do Rio do Peixe.

Material e métodos

No modelo proposto por Ross (1994) a análise empírica da fragilidade é realizada a partir da sobreposição ponderada de produtos cartográficos temáticos pré existentes, atribuindo pesos para cada uma das suas respectivas classes. Para a variável relevo, utilizou-se os Padrões de Formas Semelhantes (3º táxon) e os índices de dissecação do relevo como parâmetro morfométrico. Essas informações foram obtidas no Mapa Geomorfológico do estado de São Paulo, em escala 1:500.000 elaborado por Ross e Moroz (1997) e foram atribuídos níveis hierárquicos de fragilidade para cada categoria identificada na área de estudo. Os níveis de fragilidade atribuídos às categorias morfométricas do relevo foram estabelecidos de acordo com os padrões de formas semelhantes de relevo e índices de dissecação do relevo, da seguinte forma: Muito baixo (1) - Dc11 /Dt 11; Baixo (2) - Dc12, 22/Dt 12; Médio (3) - Dc 13, 23/Dt 13; Alto (4) - Dc 14, 24, 34; e, Muito alto (inundação) - Atf / Apf; onde as formas agradacionais são representadas pela letra maiúscula A (agradacional/ acumulação) e as formas denudacionais recebem a letra maiúscula D (denudacional/ dissecação). O nível “Muito alto (inundação)” é classificado no programa como “Restrito” por serem áreas de planícies de inundação e embora apresentem fragilidade baixa em relação aos processos erosivos, são áreas onde a ocupação deve considerar aspectos legais (APPs), a instabilidade dos terrenos e a ocorrência de inundações. Para a variável solo foi empregado o Mapa Pedológico do estado de São Paulo, em escala 1:250.000 de Rossi (2017). Os níveis atribuídos para as classes de solo são: Baixo (2) - Latossolos; Alto (4) - Argissolos; Muito alto (5) - Neossolos; e Muito alto (inundação) - Planossolos e Gleissolos. Em relação ao uso da terra, é indispensável considerar o grau de proteção que cada tipo de cobertura oferece aos solos, face aos processos erosivos ocasionados pela ação das águas pluviais. Os níveis que foram atribuídos para cada classe de uso da terra, conforme sugerido por Ross (1994) são: Muito baixo (1) - Cobertura arbórea; Médio (3) - Cana, Área urbana; Alto (4) - Pastagem; Muito alto (5) - Solo exposto; e, Muito alto (inundação) - Área úmida, corpos d’água. Para a pluviometria, uma distribuição regular ao longo do ano e com volumes anuais não superiores a 1000 mm/ano é considerada pela metodologia como "Muito baixo (1)" e até 2000 mm/ano é classificado como "Baixo (2)" (ROSS, 1994). Segundo os dados do “Relatório de situação dos Recursos Hídricos das Bacias do Rios Aguapeí e Peixe” (CBH-AP, 1997), a precipitação média anual é de 1.250 mm; dessa forma, como as chuvas na UGRHI se apresentam em um volume baixo, foi feita a opção de não incluir esse material nas sobreposições para conseguir avaliar com mais destaque o papel do relevo, solo e uso da terra. Após a organização dos mapas temáticos, realizou-se a sobreposição ponderada entre o relevo e o solo, obtendo assim o Mapa de Fragilidade Potencial; ao correlacionar este último com o uso da terra, foi elaborado o Mapa de Fragilidade Emergente (Ambiental). Num segundo momento, os focos de processos erosivos (disponibilizados pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas no ano de 2012) foram sobrepostos ao mapa síntese a fim de verificar se os locais com as maiores e menores densidades erosivas corresponderiam aos níveis de fragilidade atribuídos; já que segundo a teoria, nos níveis mais altos haveria uma maior densidade (erosão/km) quando comparados aos outros. Por fim, foi realizada uma análise individual de cada uma das variáveis utilizadas nas sobreposições para identificar quais seriam os condicionantes e o que diferenciaria as áreas com maior e menor densidade erosiva.

Resultado e discussão

Segundo estudo da CETEC (2008), a UGRHI apresenta uma alta criticidade em relação aos processos erosivos visto que das 78 sub bacias do rio do Peixe, 62 possuem alto potencial à degradação por erosão (79,49%), 10 têm médio potencial (12,82%) e 6 (7,69%) baixo potencial. Neste trabalho, para avaliar a UGRHI, foi elaborado um produto síntese que expressam os diferentes graus de fragilidade do ambiente (expresso na Figura 1). Figura 1 - Mapa de Fragilidade (Emergente) Ambiental. Fonte: Pereira, 2021. É possível identificar que o nível mais expressivo é o “Alto” e de acordo com Pereira (2021, p. 96) “a Unidade de Gerenciamento dos Recursos Hídricos do Rio do Peixe apresenta as fragilidades: “Baixo” (3%), “Médio” (27%), “Alto” (65%) e “Muito alto” (2%) face aos processos erosivos, além das áreas de planície de inundação”, ou seja, o nível “Muito baixo” não representa nem 1% do total enquanto 65% têm uma alta suscetibilidade. Conceitualmente, dos processos erosivos pluviais, é importante distinguir os processos por escoamento laminar dos processos lineares que envolvem a movimentação de grandes massas de solo e sedimentos, conhecidos como sulcos, ravinas e voçorocas (estas últimas são o foco do trabalho); em 2010/2011 foi desenvolvido no Estado de São Paulo o “Cadastramento de pontos de erosão e inundação no Estado de São Paulo”, resultado de uma demanda do Departamento de Águas e Energia Elétrica – DAEE, que possibilitou o aprofundamento do conhecimento a respeito dos processos erosivos no território paulista e na bacia do Rio do Peixe, foram identificados 6902 focos erosivos, sendo 172 erosões urbanas (76 ravinas e 89 voçorocas) e 6730 rurais (1461 ravinas e 5364 voçorocas) - indicadas na Figura 2. Figura 2 - Localização dos focos erosivos no Mapa de Fragilidade (Emergente) Ambiental. Fonte: Elaborado pela autora. Ao analisar a localização dos focos erosivos nota-se que não há uma distribuição homogênea em toda a UGRHI já que algumas das áreas apresentam uma menor densidade ou mesmo “vazios”. Quando se compara essas áreas com menor quantidade de processos erosivos com o “Mapa de Fragilidade Ambiental”, é possível ver que a maior parte do nível de fragilidade “Médio” está visível, sendo assim, é possível dizer que os níveis mais baixos de fragilidade concentram o menor percentual de processos erosivos; apenas 2,5% do total de erosões estão localizados no nível “Baixo”, 11% no “Médio”, 83% no “Alto” e 2,5% no “Muito alto”. A Figura 3 apresenta localização dos processos erosivos, as variáveis utilizadas na elaboração do Mapa de Fragilidade e os Pontos 1 e 2 (que apresentam uma menor ocorrência de focos erosivos). Figura 3 – (a) Processos erosivos; (b) Mapa Geomorfológico; (c) Esboço Pedológico; e, (d) Mapa de Uso. Fonte: Elaborado pela autora. As formas de relevo apresentam relações diretas com o desencadeamento dos processos erosivos; em relação a geomorfologia, predomina o Planalto Ocidental que apresentam “formas de dissecação média a alta, com vales entalhados e com densidade de drenagem média a alta, apresentando um nível de fragilidade potencial médio/alto a erosão” (ALMEIDA FILHO & HELLMEISTER JUNIOR, 2018, p. 03). No geral 79% das erosões estão localizadas no “Planalto Centro Ocidental” e 21% no “Planalto Residual de Marilía”. No ponto 1, por estar localizado no baixo curso da UGRHI em que encontra a planície fluvial entende-se o porquê dos processos erosivos se encontrem mais escassos (correspondendo a menos de 1%) já que, geralmente, nessas áreas os processos de sedimentação/deposição superam os de erosão e ao favorecer a infiltração da água da chuva e a formação do solo faz com que sejam terrenos estáveis com relação à erosão. Em relação a geomorfologia, predomina o “Planalto Ocidental” que apresenta “formas de dissecação média a alta, com vales entalhados e com densidade de drenagem média a alta, apresentando um nível de fragilidade potencial médio/alto a erosão” (ALMEIDA FILHO & HELLMEISTER JUNIOR, 2018, p. 03). Quanto à pedologia, os “Argissolos” ocupam 78% da UGRHI enquanto os “Latossolos” são apenas 16% (PEREIRA, 2021, p. 68). Sabe-se que solos do tipo “Argissolos” são mais suscetíveis à erosão que o do tipo “Latossolos”, pois o primeiro ocorre principalmente em topografias mais movimentadas que o segundo e, além disso, apresentam um horizonte B textural, com maior concentração de argila, que representa uma “barreira” para a infiltração das águas, favorecendo o escoamento superficial e acelerando os processos erosivos. Ao analisar a Figura 3, é possível identificar que nas áreas onde a ocorrência dos processos erosivos é menor há a presença, mesmo que pequena, de latossolos, o que poderia contribuir para o entendimento dos "vazios". Em relação ao uso e ocupação, predomina a “Pastagem” (63%) que é uma vulnerável aos processos erosivos, já que a vegetação é mais rala e menos densa do que a cultura da “Cana-de-açúcar” (18%) que aparece nos Pontos 1 e 2. Porém, é importante olhar para esse resultado com cuidado já que Sparovek e Schnug (2001) estimaram perdas de solo de 31 t.ha-1.ano-1 por erosão hídrica nos canaviais paulistas; neste sentido, vale pontuar que este estudo é apenas uma amostra, onde a predominância da “Pastagem” faz com que culturas com vegetação/folhagem mais desenvolvida e outras formas de manejo possam oferecer um maior grau de proteção ao solo.

Figura 1 - Mapa de Fragilidade (Emergente) Ambiental.



Figura 2 - Localização dos focos erosivos no Mapa de Fragilidade (Emer



Figura 3 - a, b, c, d



Considerações Finais

Em linhas gerais, observa-se que a erosão hídrica está entre os graves problemas que afetam a Bacia do Peixe e a metodologia da Fragilidade Ambiental pode se constituir em um importante subsídio à tomada de decisões relacionadas ao uso e manejo adequado dos solos e à preservação dos recursos hídricos já que possibilita a identificação de áreas mais e menos susceptíveis aos processos erosivos lineares.

Agradecimentos



Referências

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