Autores
- LARA FILGUEIRAUNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIROEmail: laraf.oliveira1@gmail.com
- ARMANDO FROTA FILHOUNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIROEmail: armandofrota.filho@gmail.com
- ANTONIO J. T. GUERRAUNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIROEmail: antoniotguerra@gmail.com
Resumo
Este artigo discorre sobre a importância da inserção de novos recursos adaptados
para o ensino da Geografia Física aos anos finais do Ensino Fundamental. Deste
modo, os objetivos são: identificar formas alternativas de ensino sobre solos
para o Ensino Básico, elaborar recursos para o aprimoramento do ensino sobre os
solos e por fim sensibilizar os alunos para as questões socioambientais que
estão relacionadas ao uso dos solos. Para tal, a metodologia baseia-se em uma
Oficina de Solos com dinâmicas realizadas com materiais recicláveis de fácil
acesso que podem ser confeccionados em sala de aula pelo professor em conjunto
com os alunos. O resultado consiste da análise que buscou enfatizar a relação
entre a temática abordada e as competências e habilidades da BNCC. Além disso,
evidenciou-se que a adaptação de metodologias que conversem com o cotidiano dos
estudantes e contextualizem as discussões abordadas na escola pode auxiliar no
processo de ensino-aprendizagem.
Palavras chaves
OFICINA; AMBIENTE; EDUCAÇÃO; EROSÃO; ENSI
Introdução
O Ensino da Geografia Física na Educação Básica está calcado a um modelo de
aprendizagem voltado para uma vertente conteudista, baseia-se em livros
didáticos contendo imagens e textos com informações na maioria das vezes
generalizadas, já que são compostos por conceitos condensados dentro de
um só material, o que pode causar estranheza e dificultar a assimilação dos
estudantes. A tendência é que esses materiais disponibilizados aos educadores
para o ensino da Geografia deem ênfase às vertentes sociais e políticas,
deste modo, acabam deixando um espaço reduzido para conteúdo como o ensino do
relevo e dos solos.
Autores como Louzada e Frota Filho (2017) chamam atenção para a falta de
contextualização dos conteúdos oferecidos nestes materiais, que
dificulta com que os discentes tenham aprofundamento real com a conteúdo, pois
trazem conceitos que não fazem relação entre a temática abordada e a realidade
local, como por exemplo, os conceitos de paisagem, urbanização, riscos
socioambientais e também conceitos como a erosão, degradação dos solos e a
evolução do relevo. Neste contexto, Mello (2000) ressalta que “(...)
É importante reconhecer que a aprendizagem pode ser mais ou menos estruturada,
mas não pode ser descontextualizada e compartimentalizada em disciplinas
estanques”. Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (2019) apontam que cerca de 40% dos professores da Educação
Básica possuem formações acadêmicas diferentes daquelas que lecionam, ou seja, é
comum encontrar casos de pedagogos ou ainda professores de Ciências e História
ministrando aulas de Geografia para suprir a alta demanda das escolas.
Outro fator alarmante é a transição na estrutura de ensino na
Educação Básica, principalmente entre o Fundamental I e II, já que dentro deste
primeiro ciclo (da 1º até a 5º série) a disciplina está condicionada dentro de
um eixo temático que compartilha de diversos assuntos variados (FREIRE 2016) e
só depois ganha núcleo próprio. Por isso, os estudantes não têm contato com um
professor específico da Geografia, o dito especialista. Além de nesse período,
este componente ser ministrado de forma um tanto superficial, ainda que o
professor (pedagogo) tenha tido fundamentos de Geografia e/ou metodologia do
ensino de Geografia. Essa transição repentina pode dificultar o processo de
aprendizagem fazendo com que temas importantes como as questões ambientais, se
tornem desinteressantes para a maioria dos discentes durante sua jornada
escolar. Por fim, estes conteúdos são abordados no viés de recursos a serem
explorados, ou seja, na perspectiva utilitarista.
A importância de se estudar a Geografia e os solos na Educação Básica surge da
urgência em se formar cidadãos conscientes e engajados nas questões ambientais
do planeta, da relação do ser humano com a natureza e da responsabilidade social
a nível local e global. Por isso, é crucial que os indivíduos sejam ensinados
desde a tenra idade a conhecer as funções dos solos, a importância que possuem
para a sociedade e também maneiras de preservação. Isso pode ser feito através
da adaptação de metodologias de ensino e inserção de novos recursos para
aprendizagem efetiva e significativa, em conjunto com materiais didáticos
disponibilizados pela escola, para que o entendimento do conteúdo seja de melhor
compreensão e agradável de acordo com a faixa etária e interesses desses
estudantes.
Deste modo, este artigo tem como foco o uso de recursos e ferramentas para
aprimorar o ensino da relação relevo-solo na Educação Básica, calcado na:
Geografia Escolar e Geografia Física e sua interrelação, a fim de caracterizar
em sala de aula aspectos pouco explorados sobre solos e seus processos. Trazendo
como finalidade da oficina sensibilizar os alunos para as questões
socioambientais (do aspecto natural e social) que estão relacionadas ao uso do
solo e que são de extrema importância para a manutenção ambiental.
Material e métodos
Para a elaboração da Oficina foi realizado levantamento bibliográfico a partir
de revistas, periódicos, anais de eventos, teses e livros com enfoque na
pesquisa sobre o ensino da Geografia Física e Ambiente para estudantes do Ensino
Básico, buscando entender quais as principais dificuldades relatadas pelos
docentes no processo de ensino-aprendizagem da Geografia e também sondando quais
seriam as metodologias mais utilizadas em sala de aula para a aplicação do eixo
ambiental da matéria.
No que concerne às atividades, foram escolhidas temáticas relacionadas às
habilidades e objetos do conhecimento da Base Nacional Comum Curricular (BNCC,
2018) abrangendo aspectos fundamentais da relação solo-relevo, a fim de
relacionar o conteúdo de sala de aula com a vida além dos muros da escola. Outro
ponto relevante, foi o desenvolvimento de atividades que fossem de fácil
elaboração pelo professor, haja vista que podem ser feitas com materiais de
descarte como garrafas pet e caixas de papelão, possibilitando aos docentes
adaptarem sua realização com materiais de sua preferência.
Ressalta-se que antes do uso dos recursos propostos nesta oficina é de extrema
importância garantir que a temática possua relevância para os discentes, para
isso, deve ser explicada da maneira mais simples e lúdica possível, buscando
sempre aproximar o conteúdo ao contexto vivido pelos estudantes no cotidiano.
Como forma de contextualização antes das dinâmicas, indica-se dialogar sobre
algumas características do solo, como: porosidade, composição, textura e entre
outras temáticas, de forma adaptada para a faixa etária dos estudantes, como
proposto por Jorge (2021) e Frota Filho (2022).
Dito isto, seguem as metodologias das dinâmicas propostas na Oficina:
Porosidade dos solos
Tem por objetivo demonstrar aos discentes a porosidade dos diferentes tipos de
solo, além de estabelecer uma relação entre a capacidade de absorção de cada
amostra e a velocidade em que ocorre a infiltração de água, visto que os solos
arenosos possuem poros maiores a água é absorvida e se infiltra com mais
facilidade, este fator também atrasa a formação do escoamento superficial, o que
faz com que o solo fique menos suscetível à erosão (GUERRA, et al. 2017). É
aconselhável que o professor separe e distribua amostras de solos para que os
alunos percebam a diferença tátil de cada solo sem a interferência da água. Em
seguida, a dinâmica baseia-se em criar dois funis com garrafas pet, colocando
separadamente os solos dentro dos funis, por fim adicionar água ao mesmo tempo
nos dois sistemas e observar o escoamento da água.
Composição dos Solos
O principal objetivo é relacionar a cor dos solos e seus componentes. O docente
deve instruir a classe para a realização de uma mistura envolvendo solo, água e
cola. Essa mistura forma uma tinta artesanal, que possui cor diferente a
depender do solo utilizado. É indicado que o professor esclareça acerca do
significado de algumas colorações: tinta com cor avermelhada indica que o solo é
rico em óxidos de ferro; tons de marrom podem indicar a presença de materiais
orgânicos. Deste modo, utilizam-se práticas de contextualização para trazer
referências próximas à realidade dos estudantes. Essas tintas poderão ser
utilizadas para a confecção de trabalhos escolares diversos.
Terrário
Tem como objetivo estabelecer o começo de processos geomorfológicos em pequena
escala em função da água e demonstrar a importância da vegetação nos processos
de erosão e escoamento superficial, de forma que se aproximem da realidade dos
alunos, o que facilita a aprendizagem (FREIRE, 1989). O terrário é produzido a
partir de garrafas pet, amostras de solo e sementes de feijão. É indicado que se
faça três terrários com quantidades de sementes variadas para comparação, além
disso, a tarefa de irrigação diária dos terrários facilita o entendimento dos
estudantes e permite uma aproximação mais significativa dos discentes no
processo de ensino-aprendizagem.
Resultado e discussão
1. Práticas pedagógicas do ensino de Geografia relacionadas às Competências e
Habilidades da BNCC
A BNCC é um documento regulamentado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN), que determina as habilidades e competências básicas
necessárias para a formação dos estudantes do Ensino Básico no Brasil,
abrangendo desde a Educação Infantil até os Anos finais do Ensino Fundamental
(da 6° à 9° série) e o Ensino Médio.
A estrutura da BNCC compartimentaliza os componentes curriculares em 4 tópicos
principais, sendo eles unidades temáticas, objetos do conhecimento, habilidades
e competências. O documento serve como ferramenta de orientação para os docentes
no planejamento das aulas e temáticas a serem abordadas no ensino básico, porém
não garante a efetividade do processo de ensino-aprendizagem no contexto
escolar, já que o professor possui a necessidade de utilizar outras metodologias
de fixação do conteúdo, e de desenvolvimento de habilidades e competências em
sala de aula.
Segundo Azambuja (2019) as unidades temáticas podem ser entendidas como um
conjunto de conteúdos estruturantes, isto é, representam a necessidade de um
foco temático que complementa o raciocínio geográfico. O autor também chama
atenção para o foco principal do componente curricular de Geografia na BNCC no
sexto ano, revelando que “(...) indica o estudo relacionado ao reconhecimento e
identidade dos lugares, dos elementos físico-naturais e das alterações
socioculturais ocorridas nesse meio, decorrentes da ocupação humana”.
A partir desta análise realizada no documento proposto pela BNCC (2018), é
possível afirmar que muitas vezes os conteúdos do componente curricular da
Geografia são expostos seguindo um viés de intervenção humana, ou seja, tendem a
considerar de maneira superficial os aspectos e processos físico-naturais
presentes no ambiente, deixando em segundo plano debates importantes que
precisam ser trazidos para o contexto educacional, como a erosão dos solos, a
capacidade de retenção de água que influi diretamente, por exemplo, em fenômenos
que estão presentes no cotidiano destes estudantes e da sociedade em geral, como
os movimentos gravitacionais de massa, enchentes e alagamentos recentes (GUERRA
et al, 2009).
Estes fatores dificultam ainda mais a intervenção dos educadores no ensino da
Geografia, já que demandam um posicionamento crítico acerca do foco do
componente curricular, sendo necessário adaptar práticas pedagógicas que cumpram
o papel de trazer certo contexto entre a disciplina a ser ministrada e os
conhecimentos prévios dos estudantes, sempre com a preocupação de tornar a
educação significativa, efetiva e que use corretamente os conceitos geográficos.
A educação efetiva é o principal ponto de partida para garantir o sucesso do
processo de ensino-aprendizagem. Segundo Ausubel (1978) a aprendizagem baseada
nas vivências pessoais é o caminho para fugir do sistema de aprendizagem
mecânica, que é o acúmulo de informações sem qualquer relação e transitar para
uma aprendizagem significativa, na qual os conteúdos prévios ancoram os novos
conhecimentos, para este último, Ausubel propõe o termo subsunçor, que são
estruturas de conhecimento prévio do indivíduo que favorecem novas
aprendizagens. É preciso então, identificar quais seriam os subsunçores destes
estudantes, ou seja, quais seriam as condições para este aluno aprender, e a
partir disso criar estratégias e ferramentas de ensino adaptadas dentro desse
contexto.
A principal problemática enfrentada na aprendizagem significativa é justamente a
interdisciplinaridade encontrada na vida fora da sala de aula, disto isto, para
integrar uma nova informação é preciso entender antes quais são os conteúdos
mínimos para a compreensão de um outro conteúdo, demonstrando mais uma vez a
importância da contextualização. Deste modo, é possível que se construa uma
educação aprendida ao invés de uma educação decorada, já que decorar não é
apreender, apreender é quando o sujeito consegue desenvolver raciocínio
geográfico sobre certo tema e perceber correlações no mundo.
Deste modo, o quadro 1 elenca as principais unidades temáticas, objetos do
conhecimento, habilidades e competências relacionadas ao ensino da Geografia.
Foi desenvolvido com o principal objetivo de contextualizar as ferramentas
pedagógicas de apoio propostas neste artigo, além de auxiliar no desenvolvimento
de planos de aulas com a temática ambiental, relacionando aspectos naturais e
sociais, dando ênfase aos principais conceitos que podem ser abordados dentro do
currículo do sexto ano do Ensino Fundamental, no componente curricular da
Geografia Física.
2. Proposta de oficina adaptada para o ensino de solos aos anos finais
A proposta da oficina de solos surge a partir do momento em que se percebe a
importância de pensar em novas metodologias adaptadas para os diferentes ciclos
de aprendizagem. É relevante que pensemos em diferentes maneiras de desenvolver
métodos estratégicos de ensino que engajem os alunos nas questões ambientais ao
mesmo tempo que estabeleçam uma conexão significativa (AUSUBEL 1978), obtendo
assim caráter efetivo no cotidiano destes estudantes, ou seja, possibilitando
que a ciência geográfica seja percebida e contextualizada nos ambientes de
vivência dos alunos. Segundo Souza e Alencar (2019), o conteúdo aplicado de
forma prática permite que o aluno se torne capaz de compreender e analisar o
espaço geográfico, além disso
inserir a vivência do aluno ao ensino de geografia (inserção que poderá ser
interdisciplinar, o que é interessante para a correlação de conteúdos e
conhecimentos dos alunos) propicia um estímulo ao conhecimento e uma maior
interação entre as trocas dos alunos com os professores, estreitando essa
relação. (SOUZA e ALENCAR, 2019 p. 4502)
Pensando nisso, a metodologia proposta neste artigo foi ancorada em três
principais atividades a serem realizadas em sala de aula, com materiais de fácil
acesso e que podem ser adaptados conforme a realidade de cada escola e
professor.
O principal objetivo destas atividades é demonstrar na prática conceitos
importantes do eixo temático da Geografia Física, tornando as temáticas mais
lúdicas e palpáveis, o que auxilia no processo de absorção do conteúdo além de
aproximar os estudantes da prática científica. A princípio, é possível
relacionar as três dinâmicas com diversas temáticas relevantes sobre os solos e
suas funções, como a erosão, escoamento superficial, a importância da cobertura
vegetal, composição dos solos, capacidade de retenção de água relacionada à
porosidade, diferentes tipos de solos e localizações no espaço, entre outros.
Ademais, o ideal é que o professor realize a confecção dos materiais que serão
utilizados durante as aulas, em conjunto com os estudantes. Desta maneira é
possível que os alunos se engajem na confecção e manutenção das atividades, como
por exemplo a confecção dos funis de garrafa pet, das tintas de solo e a
manutenção do terrário, realizando um revezamento para administrar a rega de
água diária nos sistemas. A produção das atividades em sala de aula tem o papel
de aproximar os estudantes e professor de forma agradável e descontraída, assim
permitindo que estejam mais abertos e interessados no momento em que se fizer
necessário receber as informações técnicas que precisam ser passadas em uma aula
expositiva sobre solos.
Além de se sentirem pertencentes no contexto escolar, as oficinas (imagem 1 e 2)
permitem um olhar mais crítico e apurado para os fenômenos naturais que estão
presentes no cotidiano. A dinâmica do terrário, por exemplo, além de
proporcionar o acompanhamento do crescimento da vegetação, também permite
movimentações que demonstrem como ocorrem fenômenos como os deslizamentos de
terra, sendo possível também simular cenários de inundação por saturação do
solo. Assim como a confecção de tintas e a dinâmica da porosidade permitem que
os estudantes tenham um contato mais visual e simplificado sobre os componentes
do solo e a sua granulometria
Quadro 1. Organização: Autora, 2022. Fonte: Base Nacional Comum Curricular, 2018.
Confecção das dinâmicas de Porosidade e Composição dos Solos. Organização: Autora, 2023.
Confecção da dinâmica do Terrário. Organização: Autora, 2023.
Considerações Finais
É relevante enfatizar a importância da contextualização e da educação
significativa e efetiva no processo de ensino-aprendizagem, tanto para garantir
que o conhecimento tenha uma aplicabilidade real no cotidiano dos estudantes,
quanto para certificar que a escola está formando sujeitos conscientes,
engajados
e sensíveis às questões socioambientais que envolvem o uso dos solos. Além
disso,
as dinâmicas propostas na Oficina de Solos podem exercer a função de
conectar/aproximar a relação dos professores e alunos, já que são realizadas a
partir de um viés colaborativo e lúdico, no qual as aulas sejam agradáveis e
também estimulem o protagonismo e participação dos estudantes nas atividades
desenvolvidas em sala de aula.
A Oficina é um recurso pedagógico adaptado para o ensino de Geografia Física
que,
aplicada em conjunto com outros materiais (como os livros didáticos), tem
potencial para mudar a percepção e forma como os estudantes entendem as questões
relacionadas aos solos, já que permite uma visão mais aprofundada e palpável das
pautas socioambientais abordadas na escola e na ciência Geográfica. Além de que,
pode estimular o desenvolvimento de um olhar crítico para as situações que
ocorrem
no dia a dia fora das paredes da sala de aula. Por fim, é importante ressaltar
que
a Oficina não substitui os recursos antigos utilizados em sala, mas sim surge
como
mais um recurso no processo de ensino-aprendizagem que beneficia tanto o corpo
docente quanto discente.
Agradecimentos
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