• 14° SINAGEO – Simpósio Nacional de Geomorfologia
  • Corumbá / MS
  • 24 a 30 de Agosto de 2023

Análise das mudanças na dinâmica da paisagem a partir das planícies de inundação da Bacia Hidrográfica do Rio São João através do Google Earth Engine

Autores

  • BEATRIZ COSTA DE JESUSFACULDADE DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES - UERJEmail: biabixxd.costa@gmail.com
  • BEATRIZ MOURÃO LOPESFACULDADE DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES - UERJEmail: beatrizmourao1998@gmail.com
  • MONIQUI DOS SANTOS MATTOSFACULDADE DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES - UERJEmail: santosmoniqui544@gmail.com
  • PHILLIPE CARDOSO VALENTEFACULDADE DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES - UERJEmail: phillipevalente@gmail.com

Resumo

Dentro de uma perspectiva geossistêmica, o estudo da paisagem se torna fundamental em áreas que apresentam grande dinamismo, pois permite compreender os processos e eventos decorrentes da inter-relação entre os elementos e componentes da paisagem. A Bacia Hidrográfica do Rio São João (BHRSJ) está inserida em uma dessas áreas dinâmicas, pois apresenta uma variedade de ambientes e ecossistemas, incluindo áreas úmidas (Wetlands) que são consideradas sistemas permanentes ou temporariamente saturados. O objetivo deste trabalho é analisar as mudanças de estado da paisagem na BHRSJ ao longo das estações de cheia e estiagem entre os anos de 2019 a 2021, a fim de compreender as transformações ocorridas na paisagem, utilizando imagens Landsat 8 (OLI) e a plataforma do Google Earth Engine (GEE).

Palavras chaves

Paisagem; BHRSJ; Landsat-8 ; Áreas úmidas ; GEE

Introdução

As wetlands/áreas úmidas são sistemas que podem estar permanentemente ou temporariamente saturados e são altamente dinâmicos e importantes do ponto de vista ambiental, conforme descrito por Gomes (2017). Essas áreas estão presentes em cerca de 6% de todo o território mundial e são encontradas em diversas partes da Terra, muitas vezes fragmentadas, como destacado por Moore (2008). Dentro desse grupo, destacam-se as planícies de inundação, que, segundo Borges e Ferreira (2019), são unidades geomorfológicas que se formam a partir da deposição de sedimentos pela água. Essas planícies são encontradas em áreas com baixo gradiente topográfico, geralmente em vales de rios, onde a deposição e retenção de materiais transportados pela água é favorecida pela suavidade dos declives. A Bacia Hidrográfica do Rio São João (BHRSJ), localizada no Estado do Rio de Janeiro,inserindo-se em oito municípios (2160 km²), integralmente no de Silva Jardim, e parcialmente nos municípios de Casimiro de Abreu, Araruama, Cabo Frio, Rio das Ostras, Rio Bonito, São Pedro da Aldeia e Cachoeira de Macacu.Essa paisagem tem sido transformada ao longo dos anos devido às suas características físicas e diferentes usos, um exemplo é a retificação do Rio São João e a construção da barragem de Juturnaíba com o intuito do abastecimento de água para a Região dos Lagos que ao rebaixar o nível do lençol freático, gera extensões de baixadas propensas para atividades agropecuárias, além disso, essas intervenções destravam uma série de impactos, como sedimentação fluvial à montante da barragem e erosão à jusante e o incremento da descarga de sedimentos fluviais na foz do Rio São João. Além da construção de valas e canais artificiais, está diretamente conexa com a perda da mata fluvial e a perda de áreas alagadas nas planícies fluviais da bacia. (BIDEGAIN e MICHAEL,2007). Para entender essas mudanças, é necessário observar sua periodicidade. As mudanças dinâmicas da paisagem podem ser representadas pela periodicidade e reversibilidade, ocasionadas pelos processos que ocorrem no interior das paisagens e em partes da autorregulação. Avaliar os estados da paisagem é uma tarefa relevante para estudos geossistêmicos, especialmente em áreas onde as mudanças ocorrem com frequência e profundidade. (RODRIGUEZ et al,2004) Para este trabalho, foram escolhidos os estados de média duração, que se referem aos estados estacionários com um período de aproximadamente três meses. Esses estados se dividem em períodos quentes, frios, secos e úmidos, manifestando-se de forma rigorosa e cíclica. No Brasil, os períodos secos ocorrem nos meses de inverno e primavera, enquanto os úmidos ocorrem nos meses de outono e verão. Segundo Florenzano (2011), os usos dessas geotecnologias têm sido muito empregados pela sua facilidade de aquisição de imagens e as plataformas que disponibilizam o seu acesso gratuito. Câmara et al. (2001), expõe que o geoprocessamento pode ser definido como um conjunto de tecnologias que são direcionadas à coleta e tratamento de informações espaciais por conta de um objetivo específico. A utilização de imagens de satélite tem facilitado cada vez mais estudos de impactos ambientais, pois conseguem atender a demanda com grandes volumes de dados, como também a análise de áreas de grande extensão (PRINA & MONGUILHOTT, 2011) A plataforma do Google Earth Engine (GEE), agrega algumas dessas facilidades ao ter a capacidade para armazenar e processar muitos conjuntos de dados em nuvem - de maneira rápida e simples. Conta com diversas coleções de imagens de satélite para uso gratuito para pesquisas, além de outros conjuntos de dados vetoriais baseados em Sistemas de Informação Geográfica (SIG). (Mutanga e Kumar, 2019; Zhao et al, 2021). Dito isso, o trabalho tem o objetivo de analisar as mudanças ocorridas nos períodos de cheia e estiagem na planície de inundação da Bacia Hidrográfica do Rio São João, nos anos de 2019 a 2021, através do Google Earth Engine.

Material e métodos

A metodologia empregada consistiu na execução das etapas por meio da plataforma de computação em nuvem Google Earth Engine (GEE) e a primeira etapa da metodologia consistiu na escolha dos meses de cheia e estiagem utilizando o script do CHIRPS (Climate Hazards Group InfraRed Precipitation with Station Data). Esse script engloba imagens de satélite de resolução de 0,05° e utiliza dados de estações locais para gerar séries temporais de precipitação em grade, permitindo estudar e monitorar as secas sazonais. Esse conjunto de dados de precipitação global abrange mais de 30 anos e foi utilizado para selecionar os meses de cheia e estiagem. (DEVELOPERS GOOGLE, c2022a) Desta forma, optou-se pela escolha dos meses de abril e julho de 2019,fevereiro e julho de 2020, janeiro e setembro de 2021. As imagens utilizadas, pertencem a coleção de satélite Landsat 8 (OLI), lançado em 2013, possui 11 bandas , 100m de resolução espacial, resolução radiométrica de 12 bits e a resolução temporal de aproximadamente 16 dias. Em seguida, houve a construção de um novo script para a imagem de cheia e posteriormente adaptada com alguns parâmetros diferentes para a imagem de estiagem, como também uma função para retirada de bordas e um filtro de nuvens em 20%, para a diminuição de ruídos. Em seguida a escolha da coleção de imagens, que foi a USGS Landsat 8 Collection 1 Tier 1 and Real-Time data top-of- atmosphere(TOA) Reflectance , que tem a capacidade de calcular constantes necessárias aos sensores de toda família Landsat e com isso fornecer uma base de comparação padronizada dos dados em uma única cena ou até mesmo entre imagens de diferentes sensores e datas. (CHANDER et al, 2009) Para uma melhor visualização das áreas úmidas, foi utilizada a operação ‘rgbToHsv’, que faz a conversão das bandas red (vermelho), green (verde) e blue (azul) para o modelo HSV, criado no ano de 1974 por Alvy Ray Smith. É um sistema de cores formado pelas componentes hue (matiz) que verifica o tipo de cor, saturation (saturação) onde quanto menor for o valor, mais tons de cinza aparecem na imagem e value (valor) que define o brilho dessa cor. (HISOUR, c2022) A partir da operação acima, gerou-se uma banda nomeada de ‘hue’, que serviu de base para a próxima operação, que seria o de intervalo da água (cheia =0,4 a 0,93 / estiagem = 0,1 a 0,93) para uma melhor visualização das planícies de inundação. Por fim, foi feita uma última operação, o Normalized Difference Water Index (NDWI), um índice que consegue destacar as características da água. Ao final, todos os dados foram exportados pelo Google Drive e em seguida compilados para análises de cunho quantitativo pelo ArcGIS 10.8. Após algumas análises iniciais, houve a transformação do arquivo raster ‘imagemagua’ em arquivo polígono e em seguida, foi feita uma conversão da camada raster para um arquivo shapefile - utilizando a opção de “ArcToolbox - conversion tools - from raster - raster to polygon” e a troca do seu Sistema de coordenadas geográfica (World Geodetic System 84) para projetada (South America Albers Equal Area Conic). Outra ferramenta utilizada foi o dissolver, que tem como objetivo de unir os limites com base nos valores de atributos comuns entre si, ou seja, contribui com a mesclagem dos limites vizinhos se esses tiverem os mesmos atributos. A nova camada convertida, ainda contava com as diversas informações individuais sobre cada polígono, por isso, houve a necessidade de dissolver todas as classes dentro da tabela de atributos, pelo caminho “geoprocessing - dissolve”, gerando uma tabela mais organizada e simplificada. Por fim, todas essas ações possibilitaram com que o cálculo de cada classe em Km² e a sua porcentagem, fossem elaborados.

Resultado e discussão

Foram geradas 2 imagens por ano, totalizando 6 imagens, ou seja, 3 imagens de cheia e 3 imagens de estiagem, importante salientar que todas as imagens tiveram algum tipo de ruído, ocasionado por “buracos” de nuvens e pequenas confusões com sombras, região de extração de areia da bacia, pastagens desnudas e nas infraestruturas urbanas, mais especificamente no centro do município de Casimiro de Abreu e na orla de Cabo Frio. Desta forma, houve necessidade de cruzar os dados da banda Hue com o NDWI, para melhor análise dos resultados. Nos mapas de estiagem, se obtiveram os seguintes dados: no ano de 2019, a imagem do mês de julho, apresentou 32,2 km² (1,49%) de área úmida, já em julho de 2020, cerca de 65,9 km² (3,05%) e por fim setembro de 2021, contando com 101,64 km² (4,70%). As duas últimas imagens se encontram muito acima da primeira, isso ocorre por conta das confusões geradas pelo Google Earth Engine. (Figura 1) Na bacia, nas imagens de estiagem é possível observar uma grande parte de pastagens desnudas, isso está diretamente ligado a falta de chuvas, como também das características físicas próprias do solo, como a geomorfologia e a pedologia, as plantações em larga escala contribuíram para a perda de algumas propriedades que eram essenciais para a infiltração de água no solo, além de serem alvo de abandono desde os anos 80, com a desvalorização da agricultura e a sua conversão para pastagem para o gado leiteiro e de corte. De acordo com Simões (2021), isso ocorreu porque a maioria dos produtores migrou para as grandes cidades e os que permaneceram trocaram suas plantações de cítricos pela pecuária extensiva. Essa foi a resposta encontrada para contornar a economia local e expandiu-se ao longo dos anos. Essas áreas de pastagem contribuíram significativamente para a compactação do solo, um fator que, combinado com a perda de propriedades do solo, levou ao aumento das áreas alagadiças. Já nas imagens de cheia, foram quantificados no ano de 2019, na imagem de abril cerca de 63 km² (2,92%), quase o dobro encontrado em julho de 2019, no ano de 2020, no mês de fevereiro um total de 57,5km² (2,66%), um pouco abaixo de julho de 2020 e janeiro de 2021, com 104,2 km² (4,82%). (Figura 2) As áreas úmidas em sua maioria estão localizadas próximas do canal retilíneo do rio São João e alguns de seus afluentes, e estão intimamente relacionadas com as obras realizadas na década de 60. Isso ocorre devido à baixa retenção de água e à alta velocidade dos fluxos nos canais, o que provoca uma acentuada erosão nas margens fluviais. Esse fenômeno é resultado da possível restauração do equilíbrio dinâmico dos rios, que ocorria quando suas margens seguiam uma curva natural. (PIMENTA et al., 2021) Como também têm sido objeto de conflitos entre a represa de Juturnaíba, os proprietários rurais, os assentados e acampados. O ICMBio (2008) explica que, embora ocorram fortes chuvas no médio curso do rio São João, as áreas úmidas alagam ainda mais devido à barragem da represa, causando prejuízos aos agricultores localizados a montante da represa. Esses agricultores disputam a abertura das comportas da barragem para permitir que a água acumulada siga pelo baixo curso. No entanto, a abertura das comportas pode afetar negativamente os moradores do assentamento Sebastião Lan I e do acampamento Sebastião Lan II, que residem no local. (ICMBio, 2008)

Figura 1

Mapa comparativo das estiagens

Figura 2

Mapa comparativo das cheias

Considerações Finais

A partir do mapeamento das áreas úmidas das planícies de inundação da BHRSJ, foi possível justificar de que forma o uso das geotecnologias se torna plausível. Foi através da construção do script que contou com a inserção de operações vistas até então como necessárias para chegar ao produto final. Além disso, a mudança sazonal na área de estudo se torna muito evidente ainda nas primeiras operações utilizadas no script, a banda hue demonstrada na metodologia, foi de grande ajuda na identificação das áreas úmidas. Como também o uso de índices como o NDWI, que tiveram uma grande participação na análise mais aprofundada na classe água. Infelizmente com a confusão do Google Earth Engine através dos parâmetros utilizados, se faz necessário o uso de outras operações para melhor identificação mais detalhada das áreas de inundação em estudos próximos. Importante salientar que mesmo havendo meses com uma maior precipitação, os mesmos apresentaram problemas como grandes “buracos” nas imagens e até mesmo uma péssima qualidade, desta forma, foi necessário buscar outros meses que tivessem próximos do objetivo do trabalho. Em suma, a partir da análise dos mapas de cheia e estiagem, se tornou viável identificar os principais focos das áreas alagadas, como também observar quais ações possibilitaram o fator da mudança que vem ocorrendo desde tempos passados. Por fim, o trabalho foi capaz de fornecer um banco de dados, que pode servir de base para trabalhos futuros.

Agradecimentos

Agradecimentos a instituição CAPES, que possibilitou que essa pesquisa conseguisse ser efetuada e ao grupo de Pesquisa Dinâmicas Ambientais e Geoprocessamento, da Faculdade de Formação de Professores (UERJ).

Referências

BIDEGAIN, P. MICHAEL, C. Bacias Hidrográficas dos rios São João e das Ostras - Águas, terras e conservação ambiental. Consórcio Intermunicipal para Gestão das Bacias Hidrográficas da Região dos Lagos, Rio São João e Zona Costeira - CILSJ. 2007. Disponível em: <http://www.lagossaojoao.org.br/>. Acesso em: 10 mar. 2023
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