Autores
- HUDSON DAMASIO ALVESUNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINSEmail: hudsondamasio18.hda@gmail.com
- FERNANDO DE MORAISUNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINSEmail: morais@mail.uft.edu.br
Resumo
Entre as muitas possibilidades oferecidas pelas geotecnologias, o uso de índices
morfométricos apresenta-se como ferramenta importante para a estudo das
paisagens. Assim, este trabalho teve como objetivo a compartimentação
topográfica do astroblema da Serra da Cangalha e seu entorno por meio de
técnicas geomorfométricas. A Cratera de impacto está localizada no município de
Campos Lindos, nordeste do estado do Tocantins. Calculou-se o Índice de Posição
Topográfica a partir do MDE Copernicus no QGIS 3.28.4. O cálculo do IPT indicou
sete classes morfológicas, sendo: Fundos de Vales; Vales; Vertentes Rebaixadas;
Áreas Planas; Vertentes Intermediárias; Vertentes Elevadas; e Cristas. Áreas
planas apresentam-se na Chapada da Cangalha e à jusante do Rio Manoel Alves
Grande, margem direita. Enquanto que formas de vale e vertentes rebaixadas
concentram-se em relevos rugosos próximos ao anel exterior da cratera. Percebeu-
se coerência para com as classes morfológicas da área em estudo.
Palavras chaves
Campos Lindos - TO; Astroblema; Compartimentação Topográfica; Serra da Cangalha; Cratera de Impacto
Introdução
A ciência geomorfológica tem as geotecnologias como uma grande aliada para
compreensão das dinâmicas e formas do relevo, assim como para o ordenamento das
paisagens e planejamento ambiental. O uso destas ferramentas geomorfométricas
contribui sistematicamente para a compreensão das paisagens e, consequentemente,
para conservação e/ou preservação do ambiente.
A partir da década de 1980, com disseminação das geotecnologias para uso civil e
aplicações aos estudos ambientais, as técnicas de aquisição, armazenamento e
análise destes dados apresentaram significativas melhorias. De modo que, de 1990
em diante, as abordagens de quantificação e parametrização da superfície
ostentaram sólidas bases teórico-metodológicas; abordagem em escalas diversas;
integração dos trabalhos de campo com os dados digitais; novos sensores remotos
e o desenvolvimento de softwares (SILVA, OKA-FIORI, SILVEIRA, 2017).
Entre estas técnicas destacam-se o Índice de Dissecação do Relevo (ROSS, 1992),
Índice de Posição Topográfica (WEISS, 2000) e, mais recentemente, o Índice de
Concentração de Rugosidade do Relevo (SAMPAIO e AUGUSTIN, 2008;2014). A
digitalização de dados, bem como os avanços recentes têm contribuído para maior
nível de detalhamento de estudos. Neste sentido, o Modelo Digital de Elevação
Copernicus da Agencia Europeia Espacial apresenta-se como alternativa
interessante, tendo em vista a sua qualidade de resolução espacial (30 m).
O Índice de Posição Topográfica proposto por Weiss (2001) admite como objetivo
aliar técnicas de geoprocessamento com estudos de geomorfologia. Deste modo, o
IPT considera raios de busca a partir de células centrais. As janelas de buscas
têm como finalidade calcular a diferença de elevação entre a célula central e a
média de valores das células adjacentes.
O objetivo deste trabalho é aplicar o Índice de Posição Topográfica para análise
das formas de relevo da Cratera de Impacto da Serra da Cangalha e o seu entorno.
A área de estudo situa-se na porção nordeste do Tocantins, e conta com 4.785,95
km² de extensão (Figura 1).
Material e métodos
Para calcular o IPT da área de estudo utilizou-se o MDE Copernicus, com 30
metros de resolução. Todos os procedimentos desta pesquisa foram realizados no
QGIS 2.28.4. O trabalho está dividido em etapas: a) revisão teórica e aquisição
do MDE; 2) pré-processamento da camada raster; c) cálculo do IPT e discretização
dos dados; d) correlação dos aspectos físicos e análise das formas de relevo.
A aquisição do MDE deu-se por meio do “OpenTopography DEM Downloader”, plugin do
QGIS. A etapa de pré-processamento caracteriza-se pelo preenchimento das
depressões espúrias do MDE. Deste modo, empregou-se a ferramenta “r.fill”, a
camada raster resultante corresponde ao MDE preenchido. Este procedimento foi
adotado para evitar erros e ruídos em conformidade com Sampaio e Augustin
(2014).
O índice calcula a diferença de elevação média dos topos e vales, considerando-
se os valores altimétricos de um ponto central (z) em relação à média dos
valores adjacentes (ž) (Equação 1). Dessa forma, o raio de busca é pré-
estabelecido em função do objetivo e escala de cada pesquisa (Silveira e
Silveira, 2017).
IPT= z – ž (1)
Para aferir as posições topográficas da área de estudo, o raio estabelecido
corresponde aos oito pixels vizinhos de cada ponto central. A janela de busca
foi aplicada por meio da ferramenta “Topographic Position Index (TPI)” do QGIS.
A camada raster gerada pela ferramenta TPI foi discretizada e agrupada em sete
classes de formas de relevo, como proposto por Weiss (2001).
Conforme Jenness, Brost e Beier (2013) assinalam, os valores negativos indicam
regiões rebaixadas, como vales e depressões. Valores próximos ou iguais a 0
correspondem às planícies, e ou regiões com baixo gradiente altimétrico (áreas
planas), enquanto valores positivos discriminam locais mais elevados que sua
vizinhança, as cristas e escarpas.
O fatiamento da camada raster foi realizado em “Propriedades da Camada –
Simbologia”. Isto feito, os intervalos para cada forma de relevo estão
distribuídos da seguinte maneira: > -1,04 corresponde aos Fundos de vales; Vales
estão compreendidos de -1,04 a -0,35; as Vertentes Rebaixadas associam-se aos
valores de -0,35 a -0,11; Áreas Planas estão dispostas entre -0,11 a 0,06;
Vertentes Intermediárias apresentam valores de 0,06 a 0,29; Vertentes Elevadas
compreendem os valores de 0,29 a 0,96; e Cristas >0,96.
Para auxiliar na identificação das classes morfológicas foram utilizadas
informações geológicas, e mapas de declividade e hipsometria e extraídos a
partir do MDE em consonância com Horn (1981).
Resultado e discussão
A área de estudo se estende por 4.785,95 km2, compreendendo porções dos estados
do Tocantins e Maranhão, mais especificamente dos municípios de Campos Lindos
(TO), Goiatins (TO), Carolina (MA) e Riachão (MA) (Figura 1). Importante
destacar que o astroblema encontra-se no inteiramente no município de Campos
Lindos – TO. O contexto geológico associa-se aos Domínios das Bacias
Sedimentares Paleo-mesozóicas e Meso-cenozóicas. Os sedimentos da Bacia
Sedimentar do Parnaíba foram depositados do Siluriano ao Triássico, e pertencem
aos grupos Serra Grande, Canindé e Balsas. A área em apreço abriga as formações
Longá, Poti, Piauí, Pedra de Fogo, Coberturas detrito-laterítica pedogênica e
Depósitos aluvionares holocênicos (VASCONCELOS, 2012; IBGE, 2021).
O cálculo do Índice de Posição Topográfica indicou sete classes morfológicas de
relevo, a saber: Fundos de vales; Vales; Vertentes Rebaixadas; Áreas Planas;
Vertentes Intermediárias; Vertentes Elevadas; Cristas (Figura 2).
Formas de relevo associadas aos fundos de vales assentam-se em grande parte
sobre depósitos aluvionares presentes na cabeceira do alto curso do Rio Manoel
Alves Grande, assim como em arenitos com forte entalhamento de vales esculpidos
na Formação Piauí. Estas morfologias foram discriminadas nos Vãos da Bacia do
Parnaíba, porções localizadas na região leste da área em estudo. Nestas regiões
verifica-se a presença de florestas de galerias, dispostas sobre Gleissolos
Háplicos e Neossolos Litólico, com sobre relevos suaves ondulados da Formação
Piauí.
No entorno da cratera de impacto, em função da densidade de drenagens,
constatou-se morfologias que indicam a presença de vales e vertentes rebaixadas.
Nestas configurações constatou-se o predomínio de savana arborizada sem floresta
de galeria, além da presença de pastos destinados à pecuária. Soma-se a isto a
presença de solos litólicos com aspecto rugoso das formações Piauí e Pedra de
Fogo. À jusante do alto curso do Rio Manoel Alves Grande, classes relacionadas
aos fundos de vale e vertentes rebaixadas estão assentadas sobre depósitos
permianos e carboníferos da Formação Piauí. Esta porção caracteriza-se por
arenitos cinza-esbranquiçados com granulação fina a média (ADEPELUMI, FLEXOR e
FONTES, 2005).
O ITP indica morfologia de fundos de vale, vale e vertentes rebaixadas sobre a
Formação Pedra de Fogo próximo à nascente do curso hídrico principal e na região
nordeste da área estudada. Em ambos contextos, o relevo tem aspecto rugoso e
presença de Neossolos Litólicos dispostos sobre relevos forte ondulado e
montanhosos.
Áreas planas encontram-se em regiões com presença de coberturas detrítico-
lateríticas dispostas sobre Latossolos Amarelos e Neossolo Quatzarênico em cotas
altimétricas de 300 a 500 m. Em função desta configuração, estas áreas têm sido
destinadas à agricultura mecanizada, principalmente na Chapada da Cangalha,
região que apresenta declividades <3%. Essa chapada é recoberta por coberturas
detríticas, e apresenta, quase que em sua totalidade, solos com poucos macro e
micronutrientes e são muito bem drenados (IBGE, 2021).
Vertentes intermediárias e elevadas apresentam-se no astroblema e em suas
imediações, bem como em áreas à jusante do curso hídrico principal, e nas
rebordas de chapadas próximas a área de estudo na margem direita do alto curso
do Rio Manoel Alves Grande. Nestas áreas encontram-se relevos rugosos e muito
dissecados com pouca ou nenhuma alteração da paisagem natural.
Próximo ao anel soerguido do astroblema, sobre a Formação Longá, o IPT indica
morfologias correspondentes às cristas. Nesta secção, têm-se a maior cota
altimétrica da área de estudo (578 m). Estas morfologias apresentam-se na porção
do astroblema descrita como núcleo central soerguido com 3 km de diâmetro
composto pelos depósitos mais antigos da área em estudo, datam do Devoniano
(KENKMANN et al., 2011).
O cálculo do IPT com auxílio das informações de declividade, hipsometria e de
geologia indicam compartimentos dissecados no entorno do astroblema e nas
periferias das chapadas. Nestas áreas, o relevo é rugoso com presença de
vertentes rebaixadas, vales e fundos de vales, indicando áreas com elevado
gradiente altimétrico. As áreas planas concentram-se sobre coberturas detrito-
lateríticas da Chapada da Cangalha, porções à jusante da margem direita do alto
curso do Rio Manoel Alves Grande.
Mapa de localização da área de estudo
Mapa de Índice de Posição Topográfica
Considerações Finais
O uso de parâmetros morfométricos para análise das formas de relevo contribuem
significativamente para a compartimentação topográfica das paisagens. O índice de
Posição Topográfica mostra-se eficiente para discriminar classes morfológicas em
muitos contextos, como sugere a literatura. No caso da área em estudo, calculou-se
sete classes morfológicas que condizem com dados do aspecto físico e com dados de
outros índices morfométricos.
Visualmente, o mapa do IPT distingue com clareza morfologias relacionadas à fundos
de vale, vales e áreas planas dispostas na Chapada da Cangalha. Compartimentos
associados aos Vãos da Bacia do Parnaíba e o Astroblema da Serra da Cangalha foram
discriminados de modo coerente. Contudo, faz-se necessário trabalhos de campo para
validar informações de maior nível de detalhamento, sobretudo as associadas às
vertentes na área em estudo.
O IPT apresenta praticidade e potencialidades que, quando combinadas com outros
índices, trabalhos de campos e caracterização geológica/geomorfológica, permitem
aos pesquisadores boa compreensão das paisagens.
Agradecimentos
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior pela concessão de
bolsa de mestrado ao primeiro autor.
Referências
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