• 14° SINAGEO – Simpósio Nacional de Geomorfologia
  • Corumbá / MS
  • 24 a 30 de Agosto de 2023

O AVANÇO DO PERÍMETRO URBANO SOB AS PLANÍCIES DE INUNDAÇÃO DO BAIXO CURSO DO RIO PREGUIÇAS, BARREIRINHAS - MA.

Autores

  • KARINNE CRISTHINA DINIZ BRITOUNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIASEmail: karinne.brito@discente.ufg.br
  • LEONARDO AZEVEDO SERRAUNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃOEmail: leonardo.as@discente.ufma.br
  • MAXIMILIANO BAYERUNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIASEmail: maxbayer@ufg.br

Resumo

Esse estudo trata da multitemporalidade de uso e ocupação nas planícies de inundação da bacia hidrográfica do Rio Preguiças, localizado na região leste do estado do Maranhão, dentro deste contexto, destaca-se a faixa sub-litorânea onde se encontra o município de Barreirinhas, considerado um dos portais de entrada para a visitação turística dos Lençóis Maranhenses, com isso, torna-se polo atrativo para projetos construtivos. É inegável que a dinamização expressiva do crescimento urbano por meio da melhoria das vias de acesso e da ampla divulgação em áreas ambientalmente sensíveis traz consigo custos elevados de manutenção da infraestrutura local. Os resultados obtidos, no recorte temporal dos anos 2000, 2010 e 2021, indicaram a crescente ocupação na área estudada, observou-se simultaneamente a oscilação de uso e ocupação das áreas verdes e dos cursos hídricos em quilômetros quadrados, fatores determinantes para o equilíbrio ambiental.

Palavras chaves

Barreirinhas; Urbanização; Planícies de inundação; Turismo; Geomorfologia fluvial

Introdução

A geomorfologia fluvial é o ramo da geomorfologia que estuda as formas de relevo associadas aos rios e seus processos de formação e evolução. Essa área de estudo é fundamental para compreender a dinâmica dos sistemas fluviais e suas interações com o meio ambiente. Através da análise da morfologia fluvial, é possível compreender como os rios moldam o relevo, transportam sedimentos e nutrientes, afetam a biodiversidade e influenciam no clima local. O estado do Maranhão é rico em recursos hídricos, com doze bacias hidrográficas e dois sistemas hidrográficos estaduais, destaca-se entre eles a rede hidrográfica do Rio Preguiças, situado no município de Barreirinhas, na costa leste do estado do Maranhão. A carga sedimentar transportada pelo rio tem grande influência na formação das praias e dunas dos famosos Lençóis Maranhenses, um importante destino turístico do estado. De fato, o Rio Preguiças é considerado um dos pontos de visitação mais valorizados do estado (SEMA, 2016). A hidrodinâmica presente no baixo curso do rio desempenha um papel importante na formação do estuário, responsável pela remoção, distribuição e deposição dos sedimentos. Esses processos têm impacto significativo na modelagem das praias e dunas dos Lençóis Maranhenses (FEITOSA, 2015). Geomorfologicamente, apresenta relevo suavemente plano devido à presença de depósitos dunares e cordões arenosos marinhos formados a partir do deslocamento de depósitos arenosos na faixa sub-litorânea dos Lençóis Maranhenses. A vegetação apresenta aspecto de transição entre cerrado, mangues e restingas característicos das regiões litorâneas sob clima tropical úmido. Quanto ao arcabouço geológico, a região é composta de sedimentos do Terciário-Quaternário de origem marinha, eólica e flúvio-marinha. A porção mais superficial da sequência sedimentar, formada por depósitos mais recentes, tem alta influência na geomorfologia da região de estudo (GASTÃO, 2010). Além disso, o rio Preguiças também é fundamental para a vida dos moradores locais, que utilizam suas águas para atividades como pesca e agricultura. Ele também é uma importante fonte de água para consumo humano e animal. O Rio Preguiças é um patrimônio natural e cultural da região, com uma rica fauna e flora e diversas comunidades tradicionais que vivem às suas margens. Sendo assim, sua preservação é essencial para garantir o equilíbrio ambiental e a qualidade de vida das pessoas que dependem dele. Essas características fazem do Rio Preguiças um importante objeto de estudo para entender os processos de formação e dinâmica de rios meandrantes em planícies aluviais e fluviomarinhas, além de sua importância para a comunidade local e para o turismo na região. Contudo, nos últimos 20 anos, a região vem crescendo de forma desordenada, com a construção de inúmeros hotéis e pousadas, além da expansão de loteamentos e condomínios sobretudo à beira do rio Preguiças e seus afluentes. Essa forma de crescimento urbano e a dinamização expressiva com a melhoria das vias de acesso e ampla divulgação numa área ambientalmente sensível, tem resultado em custos elevados de manutenção da infraestrutura local, além de trazer prejuízos irreparáveis ao meio ambiente, em especial, aos cursos d’água. Portanto, os objetivos principais do presente trabalho é (i) comparar os resultados da análise para avaliar as mudanças na ocupação urbana na planície de inundação entre os anos 2000, 2010 e 2021, (ii) identificar possíveis fatores que contribuíram para essas mudanças e (iii) gerar um mapa para melhor compreensão dos resultados.

Material e métodos

MATERIAIS E MÉTODOS Área de estudo A área de estudo compreende o baixo curso da Bacia Hidrográfica do Rio Preguiças, em uma região de várzea. Os limites da área de estudo foram delineados por meio de mapas hidrológicos e topográficos, além de imagens de satélite. Coleta e Preparação de Dados Os dados de uso e cobertura do solo foram obtidos do projeto MapBiomas coleção 7, que possui dados a partir de 1984 a 2021 para o Brasil. Especificamente, para esse estudo, foram obtidos os dados para os anos de 2000, 2010 e 2021. Os dados do MapBiomas têm uma resolução espacial de 30 metros e são derivados de imagens de satélite Landsat. Os dados foram baixados no formato GeoTIFF e importados para o QGIS para processamento posterior. O sistema de referência de coordenadas foi ajustado para a projeção apropriada para a área de estudo (UTM Zona 23S). 2.3 Processamento de dados No QGIS, foram tomadas as seguintes etapas para processar os dados: 1. Camadas raster de clipe: As camadas de raster para 2000, 2010 e 2020 foram cortadas na extensão da área de estudo usando a ferramenta "Clip Raster by Mask Layer". Foi feito para focar a análise no baixo curso da Bacia do Rio Preguiças. 2. Reclassificação: As camadas raster foram reclassificadas em oito categorias: Corpo d’água, duna e areal, vegetação rasteira, formação florestal (densa), apicum, mangue, agropecuária e área urbana. A categoria urbana incluiu usos residenciais, comerciais e industriais da terra, enquanto a categoria não urbana incluiu todos os outros usos da terra, como agricultura, florestas e corpos d'água. Para tanto, foi utilizada a ferramenta "Reclassificar por Tabela", além, de converter o arquivo raster para polígonos para obtenção do cálculo de área dos usos. 3. Cálculo da área: A área total para cada ano (2000, 2010 e 2021) foi calculada em quilômetros quadrados (km²) utilizando o software QGIS. Isso envolveu a importação da camada vetorial do polígono, a abertura de sua tabela de atributos e a criação de um novo campo "Área". Utilizando a Calculadora de Campos, aplicamos a função "$area", dividido por um fator de conversão de 1000000, para calcular a área em km². Os valores calculados foram salvos no novo campo e a tabela de atributos. Esta metodologia permitiu a análise adicional das áreas dos polígonos dentro do contexto da pesquisa. 2.4 Análise a. Análise de crescimento urbano: O crescimento urbano entre os anos de 2000, 2010 e 2021 foi calculado comparando-se a área urbana total de cada ano. A taxa de crescimento urbano também foi calculada dividindo-se a variação da área urbana pela área urbana inicial e o número de anos entre os períodos de tempo. b. Distribuição espacial do crescimento urbano: A distribuição espacial do crescimento urbano foi analisada pela sobreposição das áreas urbanas para cada ano no QGIS. Isso foi feito para identificar visualmente as áreas de rápida expansão urbana e potencial invasão da planície de inundação. c. Análise de várzea: As áreas de várzea foram identificadas por meio de dados hidrológicos e topográficos disponíveis. A interseção entre as áreas urbanas e a várzea foi calculada utilizando-se a ferramenta "Intersecção" no QGIS. Isso permitiu a avaliação do percentual de crescimento urbano ocorrido dentro da várzea.

Resultado e discussão

RESULTADOS E DISCUSSÃO O Rio Preguiças é o principal rio do município de Barreirinhas, sendo um importante meio de ligação às comunidades próximas à sua foz, além de ser navegável durante todo o ano. No entanto, tanto processos antrópicos, como a supressão das matas ciliares e aterros, quanto processos naturais, como os soterramentos das dunas móveis, dificultam a navegabilidade, especialmente no período de baixa mar, onde surgem diversos bancos de areia. Além disso, o avanço da zona urbana às margens do rio na região próxima ao município também tem um impacto negativo significativo no rio e seus afluentes, principalmente devido aos processos antrópicos. De acordo com os moradores mais antigos, o nome de Barreirinhas remonta às paredes de barro (argila) que se encontram às margens do Rio Preguiças, às vezes acompanhadas por dunas de areia. Esse termo já era utilizado na região desde o final do século XVII, muito antes da criação do município. Na década de 70, Barreirinhas passou por seu primeiro surto de mudanças sociais impulsionado pela descoberta do potencial petrolífero e de gás na região de Barreirinhas. Esse crescimento acelerado resultou na criação de novos bairros, como Canequinho, Cebola e Aeroporto. Já na década de 1990, a cidade experimentou um segundo surto de crescimento impulsionado pela ampla divulgação das belezas naturais da região, como o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, Caburé, Atins e Mandacaru. Com isso, muitos empreendimentos turísticos, de diferentes portes, surgiram na cidade e Barreirinhas rapidamente se tornou um polo turístico de renome internacional. Apesar dos benefícios trazidos pelo crescimento acelerado do turismo, a cidade também enfrentou novos desafios que se somaram aos anteriores. O processo de expansão urbana em direção às áreas de planície inundável ao longo do rio por conta de suas características, geram impactos significativos no meio ambiente, uma vez que geralmente envolve a utilização de técnicas de aterramento para projetos de construção. É importante destacar que as feições geomorfológicas fluviais do baixo curso do rio Preguiças são únicas e singulares e fazem parte dos ambientes físicos da paisagem. A ocupação dessas áreas com projetos de construção pode levar a danos irreparáveis nesses ambientes, afetando a fauna e a flora locais e contribuindo para a degradação do rio e seus afluentes. Nos últimos anos, a ocupação urbana sobre planícies de inundação tem sido uma questão preocupante em muitas partes do mundo, devido aos impactos ambientais e socioeconômicos associados a essa prática. Conforme a figura 02, nota-se em dados analíticos a comparação evolutiva da ocupação urbana na planície de inundação estudada entre os anos 2000, 2010 e 2021. Em 2000, a ocupação urbana sobre a planície de inundação era relativamente baixa, com apenas algumas poucas construções e atividades econômicas ao longo das margens do rio, ocupando cerca de 8,7 mil km² da área de estudo. A maior parte da planície de inundação ainda era composta por vegetação rasteira e formação florestal, e a população local dependia principalmente da pesca e da agricultura para sua subsistência. Em 2010, havia aumentado significativamente, com o surgimento de novos assentamentos e o desenvolvimento de atividades econômicas intensivas, ocupando cerca de 11,98 mil km² da área estudada. As áreas florestais foram ocupadas por áreas urbanas, ao passo de suas atividades, como comércio e serviços, e a paisagem natural foi drasticamente alterada. A construção de infraestrutura, como pontes e estradas, também contribuiu para a ocupação urbana. Em 2021, a expansão urbana na região das planícies de inundação se intensificou ainda mais, com a construção de novos empreendimentos turísticos e residenciais. A grande procura por imóveis e a valorização imobiliária impulsionaram o crescimento da ocupação urbana, que se estende cada vez mais em direção às áreas de planície aluvial, atingindo cerca de 14,09 mil km² da área estudada. Alguns fatores externos foram analisados para corroborarem com os resultados obtidos, nota-se a que entre os anos de 2000 a 2010 houveram quedas drásticas nas classes dos corpos hídricos, nas formações florestais, em áreas de apicuns, e levemente nas áreas de mangues. Nos anos de 2010 a 2021, nota-se um aumento em classes como corpos d´agua, em formação florestal, e na agropecuária, porém, houve uma intensa diminuição em áreas de duna e areias, na vegetação rasteira e na áreas de mangues. Por tanto, as ocupações urbanas em torno do rio são impulsionadas pelo atrativo turístico de um dos pontos mais valorizados do Estado. Com o boom das construções, percebe-se um crescimento significativo de hotéis, pousadas, casas de veraneio e resorts nas regiões das planícies de inundação. Essa ocupação intensiva do espaço físico resulta na diminuição do espaço temporal dessa feição geomorfológica e na supressão da mata ciliar, o que proporciona a erodibilidade das margens fluviais. É importante ressaltar que a melhoria das vias de acesso contribuiu para o aumento das edificações e, consequentemente, para a pressão sobre o ambiente natural da região. A ocupação de zonas urbanas em áreas de planície de inundação é uma das principais formas de impacto ambiental na Bacia do Rio Preguiças. Essas áreas são extremamente vulneráveis a inundações, o que pode resultar em prejuízos materiais e humanos significativos. A urbanização nessas áreas altera as características do solo, diminui a permeabilidade e aumenta a impermeabilização, reduzindo a capacidade do solo de absorver água. Além disso, a construção de edifícios e vias de acesso pode causar o assoreamento do rio, o que pode afetar a qualidade da água e alterar a dinâmica fluvial. 3.1. Feição antrópica: a influência da zona urbana no rio Preguiças De acordo com o IBGE (2011), a população estimada em Barreirinhas é de aproximadamente 63.891 mil habitantes, grande parte da área urbana da cidade se estabeleceu às margens do rio Preguiças, atraindo empreendimentos imobiliários. No entanto, o crescimento urbano ao longo do rio vem causando graves impactos ambientais. Comparando com o censo de 2000, quando a população do município era de cerca de 39.669 mil habitantes, o censo de 2010 apontou um aumento para 54.930 mil habitantes com densidade demográfica de 17,65 hab/km², o que representa um acréscimo de 15.231 mil habitantes em dez anos, tanto em áreas urbanas quanto rurais. Esse crescimento populacional e urbano na região das planícies de inundação tem intensificado os impactos ambientais negativos, como a supressão da mata ciliar e a diminuição do espaço temporal das feições geomorfológicas fluviais, poluição e contaminação dos rios, além de aumentar a vulnerabilidade da população local a eventos climáticos extremos. Considerando esse contexto, é importante destacar a carga de impactos gerados a montante do rio, que são carreados para jusante em seus afluentes. De acordo com dados do IBGE (2010), apenas 15,7% dos domicílios da região possuem esgotamento sanitário adequado, o que evidencia uma carência em infraestrutura e gera preocupações quanto ao volume e destinação resultante desse esgotamento. É importante ressaltar que os impactos hidrofísicos e as dinâmicas no sistema fluvial causados pela ação humana podem ser diretos ou indiretos (STEVAUX e LATRUBESSE; 2017). Além dos impactos indiretos gerados pelas atividades relacionadas à ocupação e uso do solo, no baixo curso do rio Preguiças é possível identificar um trecho de canalização criado pelo homem com o objetivo de encurtar a navegabilidade em um meandro do rio (Figura 03). Essa ação humana tem influência direta na regularização do fluxo e na remobilização de sedimentos.

Figura 01:

Localização da área de estudo, situada no baixo curso da Bacia Hidrográfica do Rio Preguiças

Figura 02:

Comparativo cronológico dos anos 2000, 2010 e 2021. Fonte: Mapbiomas, 2021.

Figura 03:

Canal antrópico aberto para encurtar a distância. Fontes: DSG, 1980 e Google Earth Pro, 2016.

Considerações Finais

Os resultados obtidos nesse estudo indicam o avanço da zona urbana em sentindo as planícies de inundação, ao modo que, observou-se a crescente dinâmica quantitativa entre o recorte temporal de 2000 a 2021, em ambientes sensíveis expostos a processos irreparáveis, espera-se que essa abordagem contribua para a elaboração de políticas públicas e para o desenvolvimento da geomorfologia fluvial regional e de preservação ao turismo sustentável, durante a pesquisa, identificou-se uma lacuna significativa em estudos relacionados à geomorfologia fluvial do município de Barreirinhas, com poucos trabalhos disponíveis sobre o tema. Os impactos causados por esses processos de aterramento, influencia de forma direta e indireta na vida da comunidade regional, estão correlacionados a remobilização de sedimentos, na diminuição da vegetação, na supressão da mata ciliar, no fluxo dos cursos hídricos sub e superficiais, são ações que afetam todo um conjunto de ecossistemas. Esses impactos de natureza danosa causam custos elevados ao Rio Preguiças e seus afluentes. Portanto, uma gestão adequada da bacia hidrográfica do Rio Preguiças é fundamental para a conservação dos recursos hídricos e da biodiversidade da região. A adoção de políticas de gestão integrada, envolvendo diferentes setores da sociedade, pode contribuir para a redução dos impactos da ocupação urbana em áreas de planície de inundação e para a proteção dos ecossistemas fluviais, a implementação de planos de manejo de bacias hidrográficas e a adoção de medidas de controle de erosão e assoreamento são algumas das ações que podem ser implementadas para minimizar os impactos da ocupação urbana nessas áreas.

Agradecimentos



Referências

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