Autores
- BEATRIZ MOURÃO LOPESUERJEmail: beatrizmourao1998@gmail.com
- WELLINGHTON MARINS COUTINHO FIRMINOUERJEmail: wellinghtoncoutinho@gmail.com
- PHILLIPE VALENTE CARDOSOUERJEmail: valentephc@gmail.com
- VINICIUS DA SILVA SEABRAUERJEmail: vinigeobr@yahoo.com.br
Resumo
O mapeamento dos domínios geomorfológicos da Bacia Hidrográfica da Baía de
Sepetiba é uma proposta fundamental para compreender, planejar e gerenciar a
paisagem. O presente artigo tem como objetivo aplicar a metodologia do IPT (1981)
adaptada por Seabra (2012) onde se utiliza os valores de declividade e amplitude
para mapear as unidades geomorfológicas. Essas varáveis morfométricas de relevo
foram obtidas através do processamento do Modelo Digital de Elevação SRTM,
fornecidos pela Embrapa. Os resultados da pesquisa identificaram a predominância
de unidades de relevo montanhoso, com relevante presença também de morros e
planícies
Palavras chaves
Mapeamento Geomorfológico; MDE SRTM; Variáveis Morfométricas do Relevo; Bacia Hidrográfica da Baía de Sepetiba; Unidades de Relevo
Introdução
De acordo com Christofoletti (1994), o conhecimento geomorfológico desempenha um
papel fundamental no diagnóstico das condições ambientais, ajudando a direcionar
a alocação e o assentamento das atividades humanas no espaço. Nesse sentido,
caracterizadas por serem uma unidade geomorfológica, as bacias hidrográficas são
limitadas por divisores de água, em que a água da chuva é drenada para um curso
principal, convergindo para apenas uma saída.
A adoção das bacias como categoria de análise é fundamental para gerir a
paisagem, uma vez que integra uma visão conjunta do comportamento das condições
naturais e antrópicas que ocorrem sob a bacia. Para Machado et al. (2017) é
importante fazer um estudo detalhado dessa unidade para que se proceda a
utilização e um manejo mais adequado de seus recursos. Essa abordagem promove
uma visão integrada e sistêmica do ambiente, como destacado por Botelho e Silva
(2004).
Augusto et. al. (2016) aponta que as bacias hidrográficas apresentam uma enorme
quantidade de variáveis, seus estudos necessitam de metodologias e ferramentas
que possibilitem a realização desse fim. Hoje em dia, a disseminação de dados
digitais e o uso de aplicativos de Sistemas de Informações Geográficas
possibilitam a utilização de técnicas automáticas para delimitação de bacias
hidrográficas de forma prática e com baixo custo.
Dado o exposto, o presente estudo tem como objetivo fazer uma análise grau de
dissecação do relevo para da Bacia Hidrográfica da Baía de Sepetiba, tendo como
base o Modelo Digital de Elevação SRTM, disponibilizado pela Embrapa, utilizando
a metodologia do Mapeamento Geomorfológico de São Paulo (IPT) adaptada por
Seabra (2012) para o mapeamento da bacia hidrográfica do rio São João.
A escolha da área compreendida deve-se a participação dos autores deste artigo
no projeto interdisciplinar e interinstitucional do Observatório Socioambiental
da Baía de Sepetiba, onde o grupo de pesquisa de Dinâmicas Ambientais e
Geoprocessamento tornou-se responsável pelo mapeamento da paisagem.
A bacia hidrográfica Baía de Sepetiba está localizada no litoral sul do Estado
do Rio de Janeiro (Figura 1) e apresenta limites bem definidos. A região norte e
nordeste é caracterizada por áreas montanhosas e escarpadas, enquanto a porção
sudoeste é conhecida pela Serra do Mar. Já próximo ao litoral, a prevalência é
de relevo plano ou suavemente colinoso. Além disso, com uma área total de
2.293km², a BHBS está inserida em um contexto de Mata Atlântica.
A Bacia Hidrográfica da Baía de Sepetiba tem grande importância econômica,
social e ambiental. De acordo com Junior et al. (2018), uma área que antes era
ocupada pelos povos originários, incluindo os sambaquis, sofreu mudanças na
paisagem desde a chegada dos europeus. Friedman (2011) relata que a produção
econômica na Baía de Sepetiba começou com a instalação da Fazenda de Santa Cruz
pelos jesuítas no século XVI. Já nessa época, segundo Junior et al. (2018), eram
visíveis as intervenções humanas na bacia, como a criação de um desvio no Rio
Guandu para transportar as freguesias de Marapicu, Jacutinga e Campo Grande.
É importante ressaltar que atualmente a Bacia Hidrográfica da Baía de Sepetiba
faz parte do circuito do minério de ferro e, portanto, é objeto de investimentos
e demandas de países europeus e asiáticos, principalmente a China, que buscam
explorar esse recurso. Nesse contexto de desenvolvimento, há a presença de rios,
manguezais, mar, pescadores, marisqueiras, caiçaras e outras comunidades locais,
como destaca Junior (2018).
Dentro da BHBS, existem importantes Unidades de Conservação em sua extensão como
o Parque Estadual do Cunhambebe, a Área de Proteção Ambiental de Mangaratiba,
Reserva Biológica Estadual de Guaratiba e a Área de Proteção Ambiental do Rio
Guandu. Estas unidades são essenciais diante das pressões ambientais, visto que
são uma forma de
Material e métodos
Tradicionalmente as bacias hidrográficas eram delimitadas através de mapas
topográficos de papel. Porém, com a disponibilização gratuita de dados espaciais
e com avanço das técnicas de geoprocessamento ficou muito mais fácil e prático
automatizar a delimitação das bacias. Os Modelos Digitais de Elevação (MDE)
representam um dado imprescindível para obtenção de informações que estão
presentes na superfície terrestre, através do processamento do MDE torna-se
possível extrair valores de declividade, amplitude e mapear as redes de
drenagem. Algumas aplicações para a delimitação de bacias hidrográficas através
da modelagem espacial foram identificadas por Lindsay et al. (2008),
especialmente a ferramenta Watershed Delineation.
Essa ferramenta está disponível para ser utilizada no ArcGis e possui diversas
aplicabilidades, permitindo rastrear a direção, a acumulação de fluxo de água
dentro da bacia, bem como delimitar a sua forma e os canais fluviais utilizando
o Modelo Digital de Elevação (MDE). Nesse sentido, para o projeto foram
catalogados os Modelos Digitais de Elevação SRTM (MDE-SRTM) da área de estudo,
disponibilizados pelo projeto Brasil em Relevo da Embrapa.
Os Modelos Digitais de Elevação da Embrapa foram adquiridos pelo SRTM (Shuttle
Radar Topography Mission) da NASA e passaram por correções e padronizações para
eliminar falhas e distorções. Como resultado, os dados disponíveis possuem
valores altimétricos precisos e detalhes compatíveis com uma resolução espacial
de 30 metros no solo. Esses dados podem ser acessados gratuitamente no site da
Embrapa Monitoramento por Satélite.
No software ArcGIS 10.8, foram adicionadas as folhas SF-23-Z-C e SF-23-Z-A com
escala compatível de 1/250.000 (IBGE) para criar um mosaico da área de
interesse. Em seguida, foi utilizado o plugin "Watershed Delineation" para
delimitar uma bacia hidrográfica. Com os resultados obtidos, foi realizado um
recorte do Modelo Digital de Elevação correspondente à área de estudo.
Em seguida, foi criada uma coluna numérica para criar um código para cada
polígono das microbacias geradas pelo Watershed Deliniation. Os códigos foram
gerados a partir da ferramenta "Raster Calculator" utilizando a expressão
"FID+1". Feito isso, as microbacias foram convertidas de vetores (shape) para
matriz (raster), a fim de extrair para cada uma delas o nível de base, isto é, o
menor valor de altitude para cada bacia. Ao fazer a conversão, todos os pixels
pertencentes a uma mesma bacia vão receber o valor do "COD" (coluna de códigos).
No valor da célula foi utilizado o valor de 30 m de acordo com a célula do SRTM.
Mais adiante utilizamos a ferramenta "Combine" que permite o cruzamento entre as
camadas de informação que estão em formato raster, sendo elas o MDE e raster de
bacias. Neste processo podemos encontrar o menor valor de altitude de cada
bacia, que será então considerado o nível de base da mesma. A partir de álgebra
de mapa, podemos calcular a diferença entre a altitude de cada ponto e o seu
nível de base, encontrando então a amplitude de cada ponto.
Posteriormente utilizamos a ferramenta “Slope” para gerar a declividade em
percentual. Os mapas de amplitude e declividade foram então sobrepostos, e a
partir de edições de tabelas e vetorial, foram geradas as classes finais do mapa
geomorfológico.
Tabela 1: Classes de Sistemas de Relevo adaptada para Bacia Hidrográfica da Baía
de Sepetiba
Sistemas de Relevo Declividade Amplitude do Relevo
Plano ou Suavemente Ondulado 0 a 3% Inferior a 40m
Relevo Colinoso Entre 3 e 15% Inferior a 40 m
Morrotes Acima de 15% Entre 40 e 100m
Morros com Vertentes Suavizadas Entre 3 e 15% Entre 100 e 300m
Morros Acima de 15% Entre 100 e 300m
Montanhoso ou Escarpado Acima de 15% Acima de 300m
Fonte: DAGEOP
Os resultados do cruzamento dos mapas temáticos de declividade e de amplitude
deram origem ao mapeamento geomorfológico da BHBS e foram apresentados no
subcapítulo seguinte.
Resultado e discussão
A classe de montanhoso ou escarpado apareceu como dominante na bacia com 38,43%
da área total. A mesma esta concentrada na parte norte e oeste da bacia onde se
encontra a Serra do Mar. A altitude média dessa área compreendida é de 600 m,
com valor mais alto representado por 1.772 m. A segunda classe predominante
consiste nos relevos planos ou suavemente colinosos que representam 26,35% na
parte mais central da bacia. Nessa classe a altitude média é de 15 m e o ponto
mais alto é 95 m. A terceira classe preponderante representa o relevo colinoso
com 18,14% com altitudes médias de 43 m com ponto mais alto de 169 m. As classes
de morros, morros com vertentes suavizadas e morrotes representam uma área menos
expressiva, que juntas somam 13,08%. As altitudes médias nos morros estão em
torno de 172 m com ponto mais alto de 716 m. A classe de morros com vertentes
suavizadas aparece com 0,87% da área total e sua altitude média é de 208m a
elevação mais alta nessa tipologia é de 701 m. Os morrotes representam 1,22% da
área total da bacia, as altitudes médias estão em 83 m enquanto o ponto mais
alto está em 187 m. Abaixo está a quantificação das tipologias de relevo (tabela
2).
Tabela 2: Quantificação das Tipologias de Relevo
Tipologia Área (km²) Área (%)
Montanhoso ou Escarpado 881,17 38,43%
Morros 252,03 10,99%
Morros com Vertentes Suaves 20,06 0,87%
Morrotes 28,03 1,22%
Relevo Colinoso 415,97 18,14%
Relevo Plano ou Suavemente Colinoso 604,14 26,35%
Área Total 2.293 100
Para a confecção do mapeamento geomorfológico foi feito o cruzamento das
variáveis morfométricas de amplitude e declividade da BHBS, geradas nas etapas
anteriores. Como resultado temos o mapa final a seguir (Figura 2).
Por fim, foi realizado alguns levantamentos em campo utilizando o aplicativo GPS
Essentials e Remotely-Piloted Aircraft (RPA). Com o GPS Essentials foi obtido os
pontos de visita e suas respectivas altitudes estando compatível com a realidade
observada. A partir do RPA foram feitas algumas fotografias aéreas como mostra a
Figura 3 estando o local representado no mapa pelo número “1”.
Localização da Bacia Hidrográfica da Baía de Sepetiba
Mapeamento Geomorfológico da Bacia Hidrográfica da Baía de Sepetiba
Ponto de Extração de Areia
Considerações Finais
A partir dos resultados obtidos nesta pesquisa, torna-se evidente o potencial do
geoprocessamento para a realização de estudos ambientais, especialmente quando se
trata da caracterização espacial do relevo. A utilização do MDE(SRTM)
disponibilizado gratuitamente pelo Embrapa foi fundamental e atendeu os objetivos
pretendidos, como por exemplo a obtenção da amplitude e declividade até a
elaboração do mapa geomorfológico. A representação gerada está de acordo com a
realidade da área de estudo. Por fim, a metodologia adaptada por Seabra (2018)
apresentou ótimas respostas e estão compatíveis com as observações feitas em
lócus.
Agradecimentos
Cabe registrar nesse subcapítulo os agradecimentos ao Fundo Brasileiro para a
Biodiversidade (FUNBIO), a Profa. Dra. Cátia Antônia da Silva do Observatório
Socioambiental da Baía de Sepetiba e ao DAGEOP.
Referências
AUGUSTO, Rafael Cardão et al. Mapeamento de uso e cobertura da terra e cálculo de superfície real da bacia hidrográfica do rio caribu- RJ. Estudos Geográficos, Rio Claro, p. 43-56, 2016. Disponível em: https://www.periodicos.rc.biblioteca.unesp.br/index.php/estgeo/article/view/11454/8086. Acesso em: 17 jan. 2023.
BOTELHO, R. G. M.; DA SILVA, A. S. Bacia hidrográfica e qualidade ambiental. In: VITTE, A. C.; GUERRA, A. J. T. Reflexões sobre a geografia física no Brasil. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.
CHRISTOFOLETTI, Antônio. Aplicabilidade do Conhecimento Geomorfológico nos Projetos de Planejamento. In: Geomorfologia: Uma atualização de bases e conceitos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. 415-441. 1994
FRIDMAN, F. De chão religioso à terra privada. O caso da fazenda de Santa Cruz. In: ACSELRAD, Henri. Planejamento e território: ensaios sobre desigualdade. Rio de Janeiro: Ed. Lamparina,2011.
INPE. AMBDATA. Declividade ou Gradiente. Brasil: INPE, 21-. Disponível em: http://www.dpi.inpe.br/Ambdata/declividade_gradiente.php. Acesso em: 19 jul. 2022.
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Lindsay, John et al. Mapping outlet points used for watershed delineation onto DEM-derived stream networks. Water Resources Research. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/248809134_Mapping_outlet_points_used_for_watershed_delineation_onto_DEM-derived_stream_networks. Acesso em: 25/04/2023.
MIRANDA, E. E. de; (Coord.). Brasil em Relevo. Campinas: Embrapa Monitoramento por Satélite, 2005. Disponível em: <http://www.relevobr.cnpm.embrapa.br>. Acesso em: 3 jul. 2022.
SEABRA, Vinicius da Silva. Uso de modelos digitais de elevação para mapeamento de variáveis morfométricas do relevo na bacia hidrográfica do rio São João. Rev. Tamoios, São Gonçalo (RJ), n. 1, p. 68-79, 2012.