Autores
- WILLIAN TOSHIAKI MIZUMURAUNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIAEmail: wtmizumura@hotmail.com
- ALAN SILVEIRAUNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIAEmail: alan.silveira@ufu.br
- JULIANA ABREU CROSARA PETRONZIOUNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIAEmail: julianapetronzio@ufu.br
- SAMUEL LACERDA DE ANDRADEUNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIAEmail: samuelgeopro@gmail.com
Resumo
Imagens adquiridas a partir de Aeronaves Remotamente Pilotadas (ARP) tornaram-se
instrumentos relevantes nos estudos geomorfológicos de voçorocas. Na região de
Monte Carmelo (MG) são observadas quantidades significativas de voçorocas,
principalmente em área de rochas e regolitos vinculadas ao Complexo Monte
Carmelo. O trabalho teve o objetivo de caracterizar a morfometria da voçoroca do
Mombuca, localizada na periferia da área urbana de Monte Carmelo. A partir das
imagens coletadas e tratadas a partir da ARP DJI Mavic Pro foram elaborados os
mapeamentos de Hipsometria e Declividade, gerados por meio do Modelo Digital de
Terreno (MDT). Os resultados permitiram o reconhecimento de 3 setores para a
área onde se instala o voçorocamento estudado: topo e alta vertente convexizada;
vertente erodida e planície fluvial. Dada a sua proximidade com a área
urbanizada, a voçoroca tem forte influência antrópica, com registro de depósito
tecnogênicos em seu interior, e usos destinados agropecuária.
Palavras chaves
Drone ; Erosão hídrica; Solos frágeis; Complexo Monte Carmelo; Planalto Dissecado do Paranaíba
Introdução
Solos frágeis apresentam elevado risco de degradação, como ocorre nos locais
com deslizamento de encostas, compactação e erosão hídrica e eólica
(ALBUQUERQUE, 2015). De acordo com Guerra (2011), a erosão é um processo de
remoção de material pelas águas das chuvas, ocorrendo com grande frequência no
Brasil devido a sua condição climática tropical.
As voçorocas são erosões hídricas lineares que ilustram a intensidade dos
processos pluviais, gerando estruturas de grande tamanho, largura e profundidade
(GUERRA, 2010). Tradicionalmente a análise e monitoramento de voçorocas são
feitos por meio de estacas que permitem acompanhar o processo de evolução
(GUERRA, 1996). Há pouco tempo também passaram a ser investigadas a partir do
uso de imagens adquiridas por Aeronaves Remotamente Pilotadas (ARP),
popularmente conhecidas como drones.
Figueiredo e Figueiredo (2018) apresentaram circular técnica com etapas e
procedimentos para a realização de voo com ARP e aquisição de imagens obtidas
pela fotogrametria digital. Julian e Nunes (2020) demonstraram a aplicação de
ARP e do geoprocessamento para o cálculo de perdas de solos em voçoroca. O
artigo de Moura et al. (2021) destaca o processamento digital das
aerofotografias adquiridas por ARP, bem como a produção de MDS, MDT, ortomosaico
e as curvas de níveis do terreno.
Com isso, as imagens adquiridas a partir de ARP tornaram-se recentemente
instrumentos relevantes nos estudos geomorfológicos para a análise e
monitoramento de formas erosivas lineares, com destaque às voçorocas. Estas
feições erosivas são provocadas pela perda de sedimentos devido a ação das águas
das chuvas, que propiciam o aprofundamento e a ampliação dos canais por erosão
regressiva (remontante), atingindo, por vezes, o lençol freático. Acabam
resultando em um processo de degradação nas zonas rurais e urbanas, promovendo a
diminuição de áreas destinadas à agropecuária, o desabamento de casas em cidades
e perdas significativas de solos.
O trabalho de Barbosa et al. (2018) registrou em mapeamento geomorfológico na
região de Monte Carmelo (MG) a presença de formas denudativas como sulcos
erosivos, ravinamentos e voçorocamentos, sobretudo em áreas do Complexo Monte
Carmelo, constituído por rochas neoproterozoicas, com destaque aos granitos com
intercalações de anfibolitos (CODEMIG, 2017).
Assim, o trabalho delimitou como área de estudo a voçoroca do Mombuca, que fica
localizada em área rural nas imediações do sítio urbano de Monte Carmelo (Figura
1), à aproximadamente 2,5 Km da malha urbana, com área de 0,6 Km².
Regionalmente, a área se localiza nos Planaltos Dissecados do Alto Paranaíba
(RODRIGUES et al., 2023), posicionados na Faixa de Dobramentos Brasília
(CODEMIG, 2017), com solos marcados por Latossolos, Cambissolos e Neossolos
(MOTTA et al., 2004) e tipo climático Tropical Semi-Úmido (NOVAIS, 2011).
(FIGURA 1)
Os Trabalhos de campo realizados na área de estudo permitiram evidenciar
intensos processos erosivos lineares associados à fragilidade da cobertura
superficial, marcada por solos e saprolitos suscetíveis à dinâmica físico-
hídrica, em condições atuais de clima tropical. Considerando que o levantamento
de imagens aéreas com ARP possibilita a obtenção de imagens de detalhe e boa
qualidade em um curto período de tempo, com aplicações para a análise e o
monitoramento de voçorocas, o trabalho propôs a aquisição e tratamento de
imagens ARP em voçoroca localizada na periferia da cidade de Monte Carmelo, que
se constitui em área ambientalmente degradada.
O objetivo consiste, portanto, em caracterizar do ponto de vista morfométrico a
voçoroca do Mombuca, com a elaboração dos mapas de Hipsometria e Declividade
gerados a partir de imagens aéreas com ARP.
Material e métodos
O desenvolvimento deste trabalho foi realizado em três etapas:
Etapa Pré-Campo:
Nesta etapa foi realizado o levantamento bibliográfico de metodologias de
mapeamentos morfométricos organizados a partir de imagens aéreas com ARP. Também
foi investigado do ponto de vista conceitual o processo de formação de
voçorocas.
A área alvo, no caso a voçoroca do Mombuca foi delimitada através do uso do
Google Earth. Por meio do aplicativo DroneDeploy e com a utilização do KML,
gerado no Google Earth foi planejado os três planos de voo com os mesmos
parâmetros de altitude, nível de sobreposição frontal e lateral das fotos, e o
ângulo da câmera, para a tomada de fotos de toda a voçoroca e seu entorno, sendo
utilizado as seguintes configurações: altitude em relação ao solo de 100 metros;
sobreposição das fotos de 75% para a sobreposição frontal e 65% para a
sobreposição lateral. O ângulo de câmera utilizado para o levantamento foi de
90º em relação ao equipamento, posição que deixa a câmera completamente voltada
ao solo.
Etapa de Campo:
Nesta etapa foi realizada a tomada de fotos com o drone, ARP DJI Mavic Pro,
fazendo uso das configurações descritas acima. As fotos foram tiradas de modo
automático pelo aplicativo DroneDeploy, gerando um total de 785 fotos, as quais
foram coletadas no dia 19 de outubro de 2022, às 11h. As condições de tempo eram
favoráveis, com boa incidência de luz solar e pequena nebulosidade.
Etapa Pós-Campo:
Esta etapa foi dividida em dois momentos. O primeiro conferiu ao tratamento e ao
processamento das imagens fotografadas com o ARP por meio de software
específicos para a realização deste tipo de processamento, as quais foram
sobrepostas e integradas em uma nova imagem, compondo o ortomosaico e o Modelo
Digital do Terreno (MDT) que filtra os objetos presentes no terreno,
apresentando somente as cotas da superfície por meio de classes (FIGUEIREDO;
FIGUEIREDO, 2018). O segundo momento envolveu a geração dos produtos
cartográficos morfométricos derivados do MDT, que filtra os objetos presentes no
terreno, apresentando somente as cotas da superfície por meio de classes,
gerando assim: a base cartográfica, na escala 1:7.000 e equidistância entre as
curvas de nível de 1m; o mapa Hipsométrico, com classes altimétricas variando em
cinco metros (MOURA et al., 2021), e; o mapa de Declividade, com a inclinação do
terreno expresso em porcentagem. Todos esses produtos foram gerados no software
livre QGis.
Resultado e discussão
Conforme mencionado foram gerados para a voçoroca do Mombuca os mapeamentos de
Hipsometria (Figura 2), MDT (Figura 2) e Declividade (Figura 3), a partir da
aquisição e tratamento das imagens adquiridas com a ARP.
(FIGURA 2)
(FIGURA 3)
Observa-se que a voçoroca do Mombuca é constituída por duas frentes erosivas,
posicionadas em vertente que se dirige a um canal fluvial, afluente do Córrego
Mombuca, com fluxo de S para N, o qual deságua à jusantes, no rio Perdizes.
Essas duas frentes erosivas apresentam canais fluviais e pluviais conectados a
planície do canal fluvial afluente do Córrego Mombuca. A partir dos mapeamentos
organizados e dos trabalhos de campo foram reconhecidos três setores para a área
de voçorocamento, a saber: topo e alta vertente convexizada; vertente erodida
(voçorocamento) e planície fluvial.
O setor de topo e alta vertente convexizada (Figura 3 imagem 1) apresenta classe
hipsométrica dominante superior à 840 metros, refletidas também no MDT em cor
cinza, que atinge 850 metros. A declividade predominante no topo está entre as
classes 0-2 e 2-5%, ao passo que na alta vertente a classe principal se acentua
para 5-12%. Encontram neste setor perfis de solos relativamente espessos e com
textura média, utilizados pela agricultura de grãos e agropecuária. Destaca-se
também a presença significativa de blocos de granito compondo afloramento do
Complexo Monte Carmelo no topo.
O setor onde se instala a feição erosiva propriamente dita (vertente erosiva)
posiciona-se em segmentos da alta e baixa vertente, e, dominantemente na média
vertente (Figura 3 imagem 2). O setor é marcado pela presença de dois canais
fluviais que recebem canais pluviais que partem do rebordo erosivo do
voçorocamento. Comportam-se como as duas frentes principais erosivas. Neste
setor as classes hipsométricas variam principalmente entre as cotas 815 a 840, o
que demonstra um desnível altimétrico da feição erosiva em 25 metros. Em relação
ao topo, as classes de declividade se acentuam consideravelmente neste setor
(12-30, 30-45 e maior que 45%).
Destaca-se que entre os dois canais principais do voçorocamento foi encontrado
um terceiro canal, porém, hoje, não conectado a nenhum dos canais principais. Em
campo, observou-se que este terceiro canal foi preenchido (entulhado) por
depósitos tecnogênicos (Figura 3, imagem 3, destaque a seta vermelha), o que
refletiu nos valores registrados pelos 3 mapeamentos aprestados (Figuras 2 e 3).
Na área preenchida por esses depósitos as classes de hipsometria e MDT se
elevam, ao passo que a de declividade reduz, contrariando a lógica de entalhe da
rede de drenagem no voçorocamento. Em campo, também se observou que este canal
entulhado se conectava anteriormente ao canal superior da imagem do
voçorocamento. Ainda, complementa-se que este setor tem uso destinado à pecuária
bovina.
O setor planície fluvial na área do voçorocamento posiciona-se às margens do
canal fluvial de orientação S-N que deságua no Córrego Mombuca (Figura 3 imagem
4). É nesta planície que os dois canais principais do voçorocamento deságuam
suas águas e sedimentos oriundos da erosão remontante. No setor são encontradas
as classes hipsométricas de 805-810, 810-815 e 815-820 metros. As declividades
apresentam-se bem reduzidas, com classes inferiores a 2% e de 2-5, e de 5-12 no
contato da planície com a baixa vertente. Destaca-se que em campo foram
observados solos hidromórficos e presença de buritis, o que caracteriza o local
como uma vereda.
Mapa de Localização da área de estudo
Mapas Hipsométrico e Modelo Digital do Terreno, da área de estudo
Mapa de declividade da área de estudo, com quatro imagens em 3D dos setores.
Considerações Finais
Diante das técnicas tradicionais, as quais se baseiam no posicionamento de
estacas, para monitorar o processo erosivo que culmina na formação e evolução da
voçoroca, agrega-se o uso de novas tecnologias para facilitar de coleta de dados.
Dentre elas, tem-se a utilização das imagens derivadas dos ARP, os quais
contribuem com maior precisão através do processamento das imagens obtidas pelo
equipamento.
Neste trabalho foram apresentados os primeiros resultados derivados da aquisição e
tratamento de imagens ARP, associados aos mapas de Hipsometria, MDT e Declividade.
Suas análises em conjunto com trabalhos de campo permitiram o reconhecimento de 3
setores na área do voçorocamento estudado. Os resultados também permitiram o
reconhecimento de duas frentes principais de erosão da voçoroca, marcadas por dois
canais fluviais que se conectam à planície de afluente do Córrego Mombuca. Além
disso, ficaram registrados nos documentos cartográficos morfométricos produzidos a
interferência antropogênica no modelado, que inseriu depósitos tecnogênicos em um
canal da voçoroca.
Dessa maneira, para atividades futuras, vê-se a necessidade de realizar novos
levantamentos de imagens e, por fim, compará-los entre os vários cenários que
serão registrados.
Agradecimentos
Os autores agradecem o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) pela concessão da bolsa referente ao processo PIBIC/CNPq/UFU nº
06/2022.
Referências
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