Autores
- ROMARIO TRENTINUFSMEmail: romario.trentin@gmail.com
Resumo
As formas e elementos do relevo representam o arranjo espacial de superfícies
homogêneas resultantes da ação de forças tectônicas que provocam soerguimentos e
rebaixamentos, e agentes da superfície terrestre que atuam em materiais
rochosos, decompondo-os e desagregando-os ao longo do tempo. Nesse trabalho
apresenta-se a relação dos elementos de relevo com os compartimentos
geomorfológicos do estado apresentado pelo RADAM/IBGE. Os elementos de relevo
são definidos conforme proposta de Jasiewicz & Stepinski (2013), que analisa a
similaridade textural do MDE. As regiões geomorfológicas foram obtidas junto ao
Portal de Mapas do IBGE no formato vetorial e, através de manipulações em SIG
foram organizados os cruzamentos entre ambas as camadas e extraídas a s
informações apresentadas. A proposta de identificação dos elementos do relevo,
denominados geomorphons, se mostrou uma técnica bastante eficiente permitindo
importante relação com os compartimentos geomorfológicos.
Palavras chaves
Mapeamento; Compartimentos; Geomorphons; Rio Grande do Sul; R
Introdução
As formas e elementos do relevo representam o arranjo espacial de superfícies
homogêneas resultantes da ação de forças tectônicas que provocam soerguimentos e
rebaixamentos, e agentes da superfície terrestre que atuam em materiais
rochosos, decompondo-os e desagregando-os ao longo do tempo. Para o estudo do
relevo utilizam-se diferentes parâmetros morfométricos. Alguns dos primeiros
estudos que analisaram e classificaram o relevo, a partir de parâmetros
morfométricos, foram desenvolvidos por Troeh (1965) e Huggett (1975). Troeh
(1965) apresentou a classificação de quatro principais tipos de vertentes: as
coletoras de água, com plano de curvatura convergente e as distribuidoras de
água, com plano de curvatura divergente. Sob o aspecto do perfil de curvatura,
as vertentes convexas são as que facilitam o desenvolvimento do rastejamento e
as côncavas as que favorecem a lavagem pela água das chuvas. Huggett (1975)
estabeleceu a combinação de formas de vertentes relacionando a curvatura vista
em perfil e em plano, propondo nove padrões de vertentes. Nessas os fluxos da
água e sua distribuição promovem diferenças na atuação dos processos
superficiais.
Os tipos de relevo também podem ser definidos como agrupamentos de associações
de formas de relevo e padrões de relevo (DIKAU et al.,1995). O método de Wood
(1996, apud SENA-SOUZA et al., 2015) considera uma combinação específica de
pares de curvatura longitudinal/transversal e mínima/máxima dependendo da
inclinação da região a ser classificado e identifica elementos do relevo como:
plano, canal, crista, concavidade, pico e fosso.
Atualmente, o geoprocessamento e SIG permite representar a superfície
topográfica através de modelos digitais (MDE), bem como o cálculo automatizado
de uma série de variáveis relacionadas (MUÑOZ, 2009). Schmidt e Hewitt (2004)
desenvolveram um procedimento onde obtém diferentes ETs (Elementos do Terreno)
utilizando como critério a posição da paisagem, dividindo-a em áreas planas e em
áreas dissecadas a partir da curvatura tangencial, vertical, mínima e máxima.
Dragut e Blaschke (2006) optaram por segmentar os objetos dos Modelos de
Elevação relativamente homogêneos em vários níveis geomorfológicos utilizando
curvatura de plano e curvatura vertical.
No Brasil, a identificação automatizada de elementos de relevo foi desenvolvida
para o estado do Paraná e a região da Serra do Mar Paranaense (SILVEIRA,
SILVEIRA, 2015 e 2016). Silveira et al. (2017) e Trentin & Robaina (2018)
aplicaram o Índice de Posição Topográfica para classificar elementos do relevo.
Jasiewicz & Stepinski (2013) estabeleceram uma classificação de elementos do
relevo usando ferramentas de visão computacional ao invés de ferramentas da
geometria diferencial.
Dessa forma, mapas de elementos de relevo podem ser trabalhados como algoritmos.
Através dos algoritmos médios pode-se, através de técnicas computacionais, auto
classificar e mapear elementos das formas de relevo. Os elementos de formas de
relevo podem ser expressos por um número de diferentes geomorphons. Os autores
demonstram como gerar um mapa com 10 mais comuns elementos de relevo (planas
(flat), pico (peak), crista (ridge), ressaltos (shoulder), crista secundária
(spur), encosta (slope), escavado (hollow), base de encosta (footslope), vales
(valley), e fosso (pit).
Nesse trabalho apresenta-se uma discussão sobre a determinação automatizada de
elementos de relevo através da metodologia dos geomorphons e sua relação com a
compartimentação geomorfológica do estado apresentado pelo RADAM.
Material e métodos
O Modelo Digital de Elevação nos estudos desenvolvidos foi obtido a partir das
imagens originadas da missão Shuttle Radar Topography Mission (SRTM),
disponibilizado pelo United States Geological Survey (USGS), com resolução
espacial de 3 arc-second (~90 metros).
A metodologia aplicada é baseada na proposta de Jasiewicz & Stepinski (2013),
que analisa a similaridade textural do MDE, que apresentará variação para mais
ou para menos de níveis de cinza entre células vizinhas, considerando um nível
específico. Se maior “1”, se menor “-1” se igual “0”. Isso é transferido para
valores de elevação do terreno de maior, menor ou igual (Figura 1).
Figura 1. Principais Geomorphons reconhecidos na análise do relevo. Modificado
de Jasiewicz & Stepinski (2013)
Conforme os autores (JASIEWICZ & STEPINSKI, 2013), para caracterizar a
superfície do relevo não basta a diferença de altura, mas a distância e o ângulo
de direção dos pontos vizinhos em relação a célula central (ângulos Zenith e
nadir). Para esse cálculo, perfis são traçados para as principais direções a
partir da célula central “lookup distance” “L” extraídos do Modelo Digital de
Elevação.
Um ângulo de elevação é um ângulo entre o plano horizontal e a linha que liga a
célula central com o ponto no perfil. Em uma elevação com ângulo negativo o
ponto no perfil é mais baixo que o central. Para cada perfil é calculado o
ângulo de elevação “DSL”, com “D” e “L” demonstrando a dependência da direção
(D) e da distância (L).
O ângulo Zenith do perfil é definido por “DϕL=90° – DβL”, onde “DβL” é o ângulo
máximo de elevação “DSL”. O ângulo nadir do perfil é definido como “DψL= 90°
−DδL”, onde “DδL” é o ângulo mínimo de elevação “DSL”. Assim, o ângulo Zenith é
um ângulo entre o Zenith e a “line-of-sight”, e o ângulo nadir é um ângulo entre
o nadir e uma hipotética “line-of-sight” que resulta da reflexão do perfil da
elevação em relação ao plano horizontal. Ambos são positivos e definidos entre
0º a 180º.
Para a realização do processamento do MDE e geração dos geomorphons, utilizou-se
a aplicação r.geomorphons, disponível no QGIS incorporada em aplicações do SAGA
conforme proposta de Jasiewicz & Stepinski (2013). Tal aplicação também
encontra-se disponível no ArcGISPro versão 3.1.
A aplicação exige um conjunto de dados raster e dois valores escalares, livres,
como parâmetros. O arquivo de entrada para a varredura é uma MDE. Os dois
parâmetros livres são lookup “L” (distância em metros ou célula unidades) e
threshold t (nivelamento em graus). Para os parâmetros livres aplicou-se valor
de “L” igual a 20 pixels (1800 metros) e graus “t” igual a 2º.
As escalas espaciais dessas paisagens variadas são identificáveis na figura 1,
com padrões diferentes de cores que representam elementos do relevo. Após o
processamento dos MDEs são definindo as 10 classes de elementos do relevo
definidos como geomorphons.
As regiões geomorfológicas foram obtidas junto ao Portal de Mapas do IBGE no
formato vetorial e, através de manipulações em SIG foram organizadas os
cruzamentos entre ambas as camadas e extraídas a s informações apresentadas.
Resultado e discussão
O estado do Rio Grande do Sul é compartimentado em seis Regiões Geomorfológicas,
conforme IBGE/RADAM (1986), sendo elas: Planalto das Missões (1); Planalto das
Araucárias (2); Planalto da Campanha (3); Depressão Central (4), Planalto Sul
Riograndense (5) e Planície Costeira (6). A figura 2 apresenta a distribuição
espacial dos elementos de relevo sob as Regiões Geomorfológicas do estado. A
figura 3 mostra as porcentagens de áreas ocupadas por esses elementos nos
diferentes compartimentos geomorfolóficos
No Norte do estado, onde ocorre os divisores entre as duas mais importantes
bacias do estado a do Uruguai e a do Guaíba. Os elementos se caracterizam por
encostas com bases amplas, topos estreitos e alongados que se associam a
ressaltos e cristas laterais. A drenagem estão relacionadas aos elementos de
vales, que ocorrem relativamente largos e elementos que marcam rebaixamentos na
meia encosta. Constituem grande parte do que é definido como compartimento do
Planalto das Missões (IBGE,1986). Esse compartimento apresenta uma transição
gradual para o segundo compartimento localizado a Nordeste, o Planalto da
Araucárias (IBGE, 1986). Neste compartimento, os elementos predominantes são
semelhantes ao anterior, formado por amplas encostas com topos estreitos e
alongados, mas maiores ocorrências de elementos de picos no topo da encosta e
elementos de rebaixamentos e cavidades na meia-encosta, caracterizando um
relevo, relativamente, mais movimentado.
Figura 2 – Distribuição espacial dos elementos de relevo (geomorphons) nos
compartimentos geomorfológicos do estado do Rio Grande do Sul
A passagem do compartimento 1 (Planalto das Missões) e o compartimento 3
(Planalto da Campanha) está marcado pelo aumento das formas planas associadas a
elevações isoladas caracterizadas por encostas com bases amplas e, por vezes,
ressaltos entre o meio e o topo da encosta. O compartimento 3, que ocorre no
oeste do estado, é caracterizado pelo predomínio das áreas planas.
Figura 3 – Porcentagem dos elementos de relevo (geomorphons) nos compartimentos
geomorfológicos do estado do Rio Grande do Sul
A passagem dos compartimentos do Planalto para o compartimento 4, da Depressão
Central Gaúcha (RADAM/IBGE, 1986), é brusco formando um relevo com elementos de
encostas com bases amplas e o topo com elevações alongadas, abundantes extensões
secundárias e ressaltos. O compartimento 4 é representado por elementos do tipo
plano e elevações isoladas caracterizadas por encostas com bases amplas.
O Planalto Sul Riograndense pode ser dividido em 3 unidades. A unidade mais a
oeste é formada por elementos definidos por encostas com bases amplas e no topo
ocorrência de ressaltos associados a elementos planos e elevações isoladas.
Constituem o Cinturão Vila Nova, composto por granitos e gnaisses associados a
metavulcânicas e metassedimentares. A unidade mais central com relevo
movimentado predomina os elementos de cristas e vales alinhados e encostas
curtas formando o Cinturão Tijucas, constituído de rochas metamórficas como
quartzitos e xistos. A unidade mais a leste, também no Planalto Sul Riograndense
na porção leste é formado por elementos de amplas encostas com topos estreitos e
alongados em substrato de granito-gnáissico do Cinturão Dom Feliciano. O
compartimento 6 está representado por elementos planos e se associam a Planície
Costeira do RADAM (IBGE, 1986).
Figura 1. Principais Geomorphons reconhecidos na análise do relevo. Modificado de Jasiewicz & Stepinski (2013)
Figura 2 – Distribuição espacial dos elementos de relevo (geomorphons) nos compartimentos geomorfológicos do estado do Rio Grande do Sul
Figura 3 – Porcentagem dos elementos de relevo (geomorphons) nos compartimentos geomorfológicos do estado do Rio Grande do Sul
Considerações Finais
A compartimentação do relevo, tem como objetivo estabelecer características quanto
a configuração e modelado deste, a fim de subsidiar a compreensão de fatores
atuantes na modelagem destes relevos.
O desenvolvimento cada vez maior de geotecnologias associadas a análise ambiental
proporciona a incorporação de procedimentos e técnicas que auxiliem na análise do
relevo, através de modelagens e interpretações de modelos digitais de elevação que
auxiliam na compreensão da compartimentação do relevo.
A proposta de identificação dos elementos do relevo, denominados geomorphons, se
mostrou uma técnica bastante eficiente na delimitação de diferentes compartimentos
de landforms no estado do Rio Grande do Sul, com distintas e peculiares
características que correspondem a unidades reconhecidas geomorfologicamente.
As Áreas planas com encostas de bases amplas, é o predominante no estado, tendo
como elementos de geomorphons predominantes às áreas planas (flat), seguidos das
bases das encostas (footslope). A segundo maior área de landforms do estado é a
combinação das Encostas com bases Amplas, representa o agrupamento de geomorphons
predominantemente associados às encostas (slope) e vales(valley).
Agradecimentos
Os autores agradecem ao CNPq, pelo auxílio às pesquisas
Referências
DIKAU, R.; BRABB, E. E.; MARK, R. K.; PIKE, R. J. Morphometric landform analysis of New Mexico. Zeitschrift fur Geomorphologie Supplementband. 101: 109-126, 1995.
DRAGUT, L.; BLASCHKE, T. Automated Classifi cation of Landform Elements Using Object-Based Image Analysis. Geomorphology, vol. 81, 2006, pag. 330-344.
IBGE; Projeto Radambrasil. Folha SH. 22 Porto Alegre e parte das folhas SH. 21 Uruguaiana e SI. 22 Lagoa Mirim : geologia, geomorfologia, pedologia, vegetação, uso potencial da terra / Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica [v. 33]. Rio de Janeiro, 1986. 791p.
IWAHASHI, J.; PIKE, R. J. Automated Classifications of Topography from DEMs by an Unsupervised Nested-means Algorithm and a Three-part Geometric Signature. Geomorphology, 2007. vol. 86. Pag. 409–440.
JASIEWICZ, J. AND STEPINSKI, T.F. Geomorphons—A Pattern Recognition Approach to Classification and Mapping of Landforms. Geomorphology, 2013 182, 147-156.
JULESZ, B. A Brief Outline of the Texton Theory of Human Vision. Trends in Neuroscience, 1984, vol. 7, pag. 41–45.
JULESZ, B. Textons, the Elements of Texture Perception, and Their Interactions. Nature, 1981, vol. 290. Pag. 91-97.
LIAO, W. H. Region Description Using Extended Local Ternary Patterns. 20th International Conference on Pattern Recognition, 2010. pag. 1003–1006
MUÑOZ, V. A. Análise Geomorfométrica de Dados SRTM Aplicada ao Estudo das Relações Solo-Relevo. Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos, 2009. 112p. Dissertação (Mestrado em Sensoriamento Remoto).
SCHMIDT, J.; HEWITT, A. Fuzzy Land Element Cclassifi cation from DTMs Based on Geometry and Terrain Position. Geoderma, 2004, vol. 121. Pag. 243–256
SENA-SOUZA; J; NEVES, G.; VASCONCELOS, V.; MARTINS, E.; JUNIOR, A. Mapeamento das Formas de Terreno por meio de Assinatura Geomorfométrica como Subsídio para a Descrição da Paisagem da Bacia Hidrográfi ca do Alto Rio Preto. Anais XVII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto - SBSR, João Pessoa-PB, Brasil,25 a 29 de abril de 2015, INPE, pag. 1617-1624
SILVEIRA, C. T. .; SILVEIRA, RI. M. P.. Classificação das formas do estado do estado do Paraná com uso do Índice de Posição Topográfica. Revista Ra'e Ga ¿ Espaço Geográfico em Análise, v. 41, p. 98-130, 2017.
SILVEIRA, RI. M. P.; SILVEIRA, C. T. . Análise Digital do Relevo Aplicada ao Mapeamento de Formas de Relevo na Serra do Mar Paranaense. In: XI SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOMORFOLOGIA (SINAGEO), 2016, Maringá. Anais do XI SINAGEO, 2016.
SILVEIRA, RI. M. P.; SILVEIRA, C. T. . Automated hierarchical classification of landforms in the state of Paraná supported by digital terrain modeling. Revista Brasileira de Geografia Física, v. 8, p. 1509-1523, 2015.
TRENTIN, R.; ROBAINA, L. E. DE S. Study of the landforms of the Ibicuí river basin with use of Topographic Position Index. Revista Brasileira De Geomorfologia, 2018. 19(2).
TROEH, F. R. Landform Equations Fitted to Contour Maps. American Journal Science, 1965, v. 263, pag. 616-627
WEISS, A. Topographic Position and Landforms Analysis. Poster presentation, ESRI User Conference, San Diego, CA, 2001.
WOOD, J. The geomorphological characterisation of digital elevation models. Leicester, UK, 1996. 185p. PhD Thesis - University of Leicester. Disponível em: http://www.soi.city.ac.uk/~jwo/phd.