Autores
- KETHELEN ALVES DE MORAISUFPA- UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁEmail: kethelenmoarais11@gmail.com
- MARCOS COSTA CASTROUFPA- UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁEmail: marcos.cst022@gmail.com
- LIVÂNIA NORBERTA DE OLIVEIRAUFPA- UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁEmail: livania.norberta@ufpa.br
Resumo
Este estudo tem como objetivo analisar os processos envolvidos nas modificações
da paisagem e no fluxo hídrico do Tabuleiro do Embaubal. A região é alvo de
intensas ações antrópicas nas últimas décadas, que provocam modificações na
dinâmica natural, reestruturando e redefinindo a paisagem como um todo.
Utilizou-se como método o georreferenciamento da área num recorte temporal de
seis períodos entre 1973 a 2022 além da visita de campo. Verificou-se que em
1973, 61% de toda área do Tabuleiro era ocupada por formações florestais, e
cerca de 38% correspondia ao corpo hídrico, enquanto nas próximas décadas com as
intensificações das atividades humanas impactou diretamente na estrutura física
da área, o que provocou alterações na drenagem hídrica, bem como, o aumento na
degradação do solo. É de extrema importância compreender as dinâmicas da região,
e como ela se adapta aos processos ao qual foi inserida assim como sua
capacidade de manutenção a partir dos diversos fatores que alteraram.
Palavras chaves
Tabuleiro do Embaubal; Alteração; Paisagem; Amazônia; Rio Xingu
Introdução
As modificações da paisagem são perceptíveis em todo o espaço geográfico nas
últimas décadas, sendo as atividades antrópicas as principais causadoras dessas
alterações que na maioria das vezes acontecem através do trabalho, ocorrendo de
acordo com que os seres humanos se relacionam. Dessa forma, identificar essas
alterações, suas causas e seus efeitos são fundamentais para fins de gestão
ambiental e manutenção dos ecossistemas envolvidos.
Para Tricart (1977) uma paisagem não se restringe apenas ao meio físico e aos
recursos de exploração natural, mas nas diversas formas de ocupação
socioespacial organizadas pelo homem. Para Raffestin (2009, p. 15) “a paisagem é
um produto da territorialidade que resulta de um conjunto de relações
mediatizadas, produto expresso por meio de diversas linguagens, em certa
escala”. Nesse contexto, Sauer (2004) relata que o dinamismo das sociedades
atuais, a fluidez e intensidade de suas atividades (exploração desenfreada dos
recursos naturais, novos usos do solo, instalação de grandes infraestruturas,
dentre outras variáveis) são indutoras de transformações das paisagens.
O Tabuleiro do Embaubal é constituído por várias ilhas, que compõe um Refúgio de
Vida Selvagem, oficialmente estabelecido no ano de 2016, como área de grande
relevância para preservação da fauna e flora., um dos maiores bancos de desova
de quelônios, como a Tartaruga da Amazonia (Podocnemis expansa) (Paula, 2017), o
Tracajá (Podocnemis unifilis) e o Pitiú (Podocnemis sextuberculata). (LIMA,
2007). É também considerado um patrimônio histórico biológico do rio Xingu, por
ser área de refúgio de aves migratórias como o marreco (Spatula querquedula), o
mergulhão (Phalacrocorax Brasilianus) e muitas outras espécies da fauna
amazônica, os sedimentos têm importância nas questões hidrodinâmicas, ecológicas
e biogeoquímicas (SILVA, 2019).
No Tabuleiro do Embaubal a paisagem geomorfológica fluvial vem sendo
significativamente alterada pela diminuição dos sedimentos transportados pelo
rio, que garantem a formação de barras arenosas necessárias para a manutenção do
geosistema.
Santos (2019) relata que essas áreas de proteção têm contribuído fortemente para
controlar o avanço do desmatamento. Nesse contexto, essa pesquisa buscou
sistematizar as mudanças ocorridas na reserva antes e depois da mesma ser
considerada uma área de conservação, bem como, antes e depois da implantação da
Usina Hidrelétrica de Belo Monte, localizada a montante do Tabuleiro do
Embaubal, na busca de tornar perceptível a alteração das atividades nas últimas
décadas e discutir os impactos dessas ações para a dinâmica da paisagem nesse
recorte geográfico.
Destaca-se a importância de trabalhos como esse, na perspectiva temporal em
forma de linguagem cartográfica sendo ela um instrumento de análise que
contribui grandemente para compreensão dos impactos dessas mudanças e dessas
ações realizadas atreladas à interesses econômicos que também estão envolvidos
Material e métodos
Buscou-se fazer uma análise temporal de uso e cobertura do solo, para assim
compreender como a dinâmica da paisagem no Tabuleiro do Embaubal vêm sendo
modificada e os motivos que levaram a essas alterações. Pata tanto, fez-se
levantamento bibliográfico sobre a temática em periódicos e bibliografia que
tratam e discutem a temática e no recorte geográfico em pesquisa
Utilizou-se do geoprocessamento na construção e análise dos mapas para a
análise e discussão da transformação da paisagem no Tabuleiro do Embaubal. Sobre
essa importância, Harley diz: “[...]os mapas são um meio de imaginar, articular
e estruturar o mundo dos homens. Aceitando-se tais premissas, torna-se mais
fácil compreender a que ponto eles se prestam às manipulações da parte dos
poderosos na sociedade” (HARLEY, 2009, p. 2).
Para fazer a análise temporal da alteração da paisagem optou-se pela
periodização de mapas para os anos de 1973, 1984, 1993, 2003, 2013, 2022, os
quais foram dispostos em mosaico. Esses anos foram escolhidos estrategicamente
para frisar alguns acontecimentos que tiveram influência direta com as
transformações ocorridas, assim como a qualidade das imagens nesses períodos
para melhor interpretação e classificação da área.
Os mapas foram produzidos no software Q-gis onde foram coletadas imagens do
Landsat; coleção 1 para o ano de 1973, coleção 5 para 1984, 1993 e 2003 e
coleção 8 para 2013 e 2022. Para a composição de bandas da coleção Landsat
utilizou-se as cores naturais simuladas; bandas 5, 4, 3 para os anos de 1973,
1984, 1993 e 2003 e bandas 6, 5, 4 para os anos de 2013 e 2022. A imagem
coletada de 1973 foi coletada no INPE (http://www.dgi.inpe.br), e dos demais
anos foram coletadas do Earth Explore (https://earthexplorer.usgs.gov/), como se
pode observar na tabela 1.
Tabela 1: Coleções Landsat
Coleção Landsat Fonte Período das imagens
Landsat 1 INPE 24/08/1973
Landsat 5 USGS EarthExplorer 26/08/1984
Landsat 5 USGS EarthExplorer 04/09/1993
Landsat 5 USGS EarthExplorer 19/11/2003
Landsat 8 USGS EarthExplorer 27/09/2013
Landsat 8 USGS EarthExplorer 16/06/2022
Fonte: Autores, 2023
As imagens foram transformadas de vetor para raster com a finalidade de tornar
possível a classificação das classes e em seguida foram feitos os cálculos
percentuais de cada uma delas. Para os cálculos percentuais, foi utilizada a
classificação realizada pelo software Q-gis, por meio da ferramenta “Calculate
Geometry” para exportar a camada recém-criada em formato Excel. Na planilha o
cálculo foi realizado pela seguinte equação:
Área/ Total= %
Realizou-se visita de campo em outubro de 2022, em função de um trabalho de
campo na área, quando foi possível fazer o registro fotográfico, coletar relatos
de moradores e identificar in loco das alterações apresentadas no
georreferenciamento
Resultado e discussão
O Tabuleiro do Embaubal, corresponde um arquipélago, localiza-se no baixo curso
do rio Xingu, no município de Senador José Porfírio-PA (Figura 1). o rio Xingu,
em seu médio e baixo curso, passou a ser alvo de interesses relacionados ao seu
potencial hidroelétrico, baseado principalmente no benefício econômico oriundo
da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.
Figura 1- Localização Tabuleiro do Embaubal- PA
(Fonte: Autores, 2023)
A região Amazônica, constantemente é alvo do grande capital, como fonte de
exploração. Gonçalves (2015) discute a visão que os grandes dominantes têm sobre
essa região, considerada como uma Natureza Imaginária, e para além disso, nós
Amazônidas, principalmente, precisamos fazer com que esse tipo de imagem caia
por terra na busca de construir uma imagem da região e não sobre a região.
Diante disso o atual trabalho busca tratar da especificidade do Tabuleiro do
Embaubal, que mostra claramente como os interesses do capital modifica
diretamente o seu meio.
Nesse contexto, fez-se uma análise temporal do Tabuleiro do Embaubal (Figura 2)
para observar como as dinâmicas físicas foram alteradas com o passar do tempo de
acordo com ações específicas implantadas na região, principalmente as
antrópicas. Verificou-se que no ano de 1973 a região possuía uma paisagem quase
inalterada, uma das características principais da atual reserva, com vegetações
pioneiras arbustivas e herbáceas de influência fluvial que representava 61% da
área. Entretanto, em 1984, verifica-se uma escomunal diferença, isso porque em
1982 houve um incêndio que tomou proporções avassaladoras na área. Essa queimada
comprometeu boa parte da vegetação nativa, que representava 35% da área. Há
relatos que nessa época se iniciou a criação de búfalos no Tabuleiro do
Embaubal, atividade essa, causadora de alterações na dinâmica dessa paisagem em
função da produção de pastagem e pisoteio no solo, provocando erosões.
Figura 2- Uso e Cobertura do Solo Tabuleiro do Embaubal- PA
(Fonte: Autores, 2023)
Na década de 1990, observa-se maior alteração da paisagem no Tabuleiro do
Embaubal, destaca-se a redução da vegetação e o aumento do solo exposto e solo
compactado, devido também a ampliação da criação de búfalos. Meirelles (2000)
enfatiza que esses animais possuem uma ótima adaptação em campos inundáveis. A
bubalinocultura torna-se mais viável em áreas como esta, devido sua alta
facilidade de reprodução, e por não exigir tantos cuidados como os bovinos.
Porém os búfalos possuem o hábito de escavar o solo para a formação de poças de
lama, o que provocou a criação de canais artificiais, que pode ter acelerado o
processo de drenagem no arquipélogo, como se observa no período de 1993 na
porção nordeste e Sudeste do Tabuleiro do Embaubal. Paula (2017) diz que a
pastagem natural nas áreas de várzea herbácea do arquipélago são permanente e ou
temporariamente designadas à criaçãobde rebanhos de bovinos e bubalinos que
acaba por retardar a pedogênese, consequentemente, a ocupação por espécies
vegetais arbóreas.
No ano de 2003, observa-se a Noroeste do Tabuleiro do Embaubal alterações no
movimento dos barramentos arenosos, área utilizada pelo quelônios para desova.
Nota-se ainda, a alteração da vegetação para o tipo secundária, em detrimento
das intervenções ocorridas anteriormente.
Destaca-se que em 2009, na bacia hidrográfica do rio Xingu teve a implantação de
um grande projeto, que mudaria toda a dinâmica fluvial do rio em seu baixo curso
e consequentemente no Tabuleiro do Embaubal, que foi a instalação da Usina
Hidrelétrica de Belo Monte. De acordo com a Norte Energia trata-se da maior
usina hidrelétrica brasileira e a quarta maior do mundo, com capacidade de
11.233,1 MW e quantidade média de geração de energia de 4.571 MW.
A implantação da UHE Belo Monte trouxe diversas alterações para o Tabuleiro do
Embaubal, conforme se observa na imagem coletada de 2013 (Figura 2)
principalmente na dinâmica do fluxo fluvial em detrimento do barramento do rio
XIngu. Nesse aspecto, realata Paula (2017) ao observar o fluxo do rio Xingu a
partir da estação fluvial Belo Monte e Porto de Moz nos anos de 2015 e 2016,
constatou mudanças diárias dos níveis da água no Tabuleiro do Embaubal, por
influência e pelas mudanças diárias das cotas do rio Amazonas, que sofre ações
dos avanços e retrocessos frequentes do oceano Atlântico, onde a flutuação do
nível do rio Xingu é mais suave no Tabuleiro do Embaubal, do que em outras áreas
ou regiões que o rio abrange. Em consequência dessa dinâmica fluvial, observa-se
também alteração no movimento dos barramento arenoso nesse período na sua porção
Noroeste.
Para o ano de 2022, na figura 2, verifica-se o surgimento de novos canais
fluviais, bem como de um grande lago na porção Noroeste e Sudeste por do
Tabuleiro do Embaubal, em consequência da presença de bubalinos e da alteração
da cobertura vegetal.
Na tabela 2 é possível observar que a vegetação ocupava boa parte da área do
Tabuleiro do Embaubal, em 1973, embora sofrendo diversas intervenções a área
apresenta-se em processo de recuperação, sobretudo após a implantação da REVIS,
todavia em níveis insuficientes do encontrado em 1973. Destaca-se que o solo
compactado a partir de 2003 demonstrou em maior porcentagem em comparação ao
solo exposto, em detrimento da expansão da criação de búfalos.
Tabela 2: Porcentagens das classes na Unidade de Conservação Tabuleiro do
Embaubal
Classes 1973 1984 1993 2003 2013 2022
Corpo Hídrico 38,65% 41,48% 38,11% 39,47% 37,95% 39,02%
Vegetação 61,35% 36,19% 31,81% 47,28% 45,61 45,02%
Solo Exposto 22,33% 17,72% 1,10% 1,90% 3,36%
Solo Compactado 12% 13% 15% 12%
Fonte: Autores, 2023
De acordo com Paula (2017), estima-se que há pelo menos três tipos diferentes de
cobertura vegetal predominantes, sendo elas: Formação Pioneiras Arbustivas,
Formação Herbácea, ambas com influência fluvial, e Florestas Ombrófilas Densa
Aluvial (Figura 3).
Figura 3: Cobertura vegetal no Tabuleiro do Embaubal
Fonte: Autores, 2023
Percebe-se que mesmo com diversos fatores agindo diretamente na alteração da
dinâmica dessa paisagem, ela ainda possui capacidade de recuperação. Nesse
contexto, o Tabuleiro oficializado como reserva tem um papel fundamental na
proteção desses animais (BRASIL. IBGE).
Localização Tabuleiro do Embaubal- PA
Uso e Cobertura do Solo Tabuleiro do Embaubal- PA
Cobertura vegetal no Tabuleiro do Embaubal
Considerações Finais
Verifica-se que a área do Tabuleiro do Embaubal sofreu diversas modificações na
paisagem fluvial e terrestre nas últimas décadas, influenciando nos aspectos
bióticos e abióticos. Constata-se alterações na dinâmica fluvial, com o surgimento
de nos cursos d’água, além da formação de uma lagoa a partir da presença de
búfalos, que pode ser considerados um dos agentes preponderantes dessas
alterações, tendo em vista não serem animais nativos da região, tornando uma das
principais atividades econômicas.
Observou-se a partir da análise dos anos de 1973 a 2022 que as alterações da
paisagem ocorreram tanto pelos fatores naturais do meio físico, assim como, das
ações antrópicas, como a implantação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, fator
fundamental na mudança da dinâmica fluvial e consequentemente da paisagem
A área do Tabuleiro do Embaubal é uma área bastante úmida, o que favorece sua
recuperação mesmo com a influência dos diversos fatores agindo sobre ela. Embora
com a implantação da REVIS, ainda é frequente as denúncias de pesca e caça ilegal
na região. Nesse aspecto, ressalta-se a importância da fiscalização e valorização
da vida de animais e vegetação que estão entrando em extinção.
Agradecimentos
Os autores agradecem a bolsa de iniciação científica – PIBIC financiada pela CAPES
Referências
TRICART, J. Ecodinâmica. Rio de Janeiro: IBGE, Diretoria Técnica, SUPREN, 1977
RAFFESTIN, Claude. A Produção das Estruturas Territoriais e sua Representação. In: SAQUET, Marcos Aurelio; SPOSITO, Eliseu Savério (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p.17-36
PAULA, Eder Mileno Silva de. Paisagem Fluvial Amazônica: Geoecologia do Tabuleiro do Embaubal-Baixo Rio Xingu. 2017.
LIMA, Jackson Pantoja. ASPECTOS DA ECOLOGIA REPRODUTIVA DE PODOCNEMIS EXPANSA, PODOCNEMIS SEXTUBERCULATA E PODOCNEMIS UNIFILIS (TESTUDINES, PODOCNEMIDIDAE) NA RESERVA BIOLOGICA DO ABUFARI, AMAZONAS, BRASIL. 2007. 74 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Biologia, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2007.
SILVA, Ariane Maria Marques da. ANÁLISE INTEGRADA DA MORFOLOGIA E SEDIMENTOLOGIA DO BAIXO CURSO DO RIO XINGU. 2019. 56 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Geologia, Universidade Federal do Pará Instituto de Geociências Programa de Pós-Graduação em Geologia e Geoquímica, Belém, 2019.
DOS SANTOS, Flávio Augusto Altieri; DA ROCHA, Edson José Paulino; DOS SANTOS, Josiane Sarmento. Dinâmica da paisagem e seus impactos ambientais na Amazônia. In: REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA FÍSICA, n. 05, 2019, p. 1794-1815.
GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Amazônia, amazônias. Editora Contexto, 2015.
Meirelles, P. D. L., & Mochiutti, S. In: WORKSHOP ECOLAB, n. 5, 2000, Macapá: IEPA, p. 57-61.
ENERGIA, norte. UHE Belo Monte, a maior usina hidrelétrica 100% brasileira. Norte Energia. Disponível em: < https://www.norteenergiasa.com.br/pt-br/uhe-belo-monte/a-usina >. Acesso em: 19 abr. 2023.
BRASIL. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (comp.). Cidades. 2017. Disponível em:< https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pa/senador-jose-porfirio/historico >. Acesso em: 11 nov. 2022.