Autores
- SANDRA MARA ALVES DA SILVA NEVESUNEMATEmail: ssneves@unemat.br
- JESÃ PEREIRA KREITLOWUNEMATEmail: kreitlow.jesa@unemat
- EDINEIA APARECIDA DOS SANTOS GALVANINUNESP/OURINHOSEmail: edineia.galvanin@unesp.br
- MARIA CÂNDIDA MOITINHO NUNESUFPELEmail: nunes.candida@gmail.com
Resumo
O objetivo deste estudo é identificar por meio de geotecnologias, a
susceptibilidade à erosão hídrica e os conflitos de uso da terra na Bacia
Hidrográfica Nascentes do Rio Cabaçal, em Mato Grosso. Foram gerados, no
software ArcGIS, mapa de susceptibilidade à erosão dos solos, mapa de potencial
atual à erosão e mapa de uso atual da terra. Para definição dos conflitos de uso
da terra foram analisados os dados dos mapas de suscetibilidade à erosão e de
capacidade de uso da terra. Os resultados demostram a predominância de solos
arenosos e de áreas extremamente susceptíveis à erosão, bem como usos da terra
em desconformidade com a capacidade do solo, podendo acarretar desequilíbrio na
dinâmica da paisagem e o comprometimento da qualidade das águas. Concluiu-se que
na bacia faz-se necessário ações de planejamento para o adequado uso e ocupação
da terra, visto a necessidade da conservação dos solos.
Palavras chaves
Geotecnologias; proteção ambiental; solos; Bacia do Alto Paraguai; Mato Grosso
Introdução
A delimitação do espaço geográfico em bacia hidrográfica tem sido utilizada na
execução de análises territorial e ecológica, considerando-a como uma unidade
básica de planejamento. Freitas e Kerr (1996, p. 44) discorreram que a bacia
hidrográfica “compreende uma área de formação natural, drenada por um curso de
água e seus afluentes, a montante de uma seção transversal considerada, para
onde converge a água da bacia”. Assim sendo, as nascentes ou olhos d’água são
manifestações superficiais de lençóis freáticos que originam os corpos hídricos
(VALENTE e GOMES, 2005).
A Bacia Hidrográfica Nascentes do Rio Cabaçal é uma das 5 sub-bacias da Bacia
hidrográfica do Rio Cabaçal (BHRC), a qual é uma das subunidades da Bacia do
Alto Paraguai (BAP), onde está situada a maior planície alagável de água doce do
mundo – O Pantanal, sendo essencialmente amparada economicamente pelas
atividades de pecuária e monoculturas, apresentando propriedades
fitofisionômicas heterogêneas, cujas formações florestais são características
dos biomas Cerrado, Amazônia e Pantanal, bem como de suas áreas de transição,
explicadas em função das variações ambientais, especialmente os atributos do
solo (LOREZON et al., 2021).
A avaliação do estado de Conservação da Água realizada por Lorezon et al. (2021)
para as cinco subunidades hidrográficas da BHRC mostrou que, tanto no período
chuvoso quanto no seco, o pior estado foi o da Nascentes do rio Cabaçal, os
quais explicam que, pelo fato das Áreas de Preservação Permanente (APPs)
encontrarem-se em desacordo com o preconizado no Código Florestal brasileiro
(BRASIL, 2012), argumentando que tal situação é preocupante uma vez que nesta
sub-bacia encontram-se situadas as nascentes do rio Cabaçal, um dos principais
tributários do Rio Paraguai, que juntos colaboram para o pulso de inundação na
planície alagável pantaneira, considerando que a água que inunda a planície
alagável não advém somente das precipitações in situ e do rio Paraguai, mas
também das áreas das nascentes de suas sub-bacias, situadas em região de
planalto (LORENZON et al., 2015) .
Ribeiro et al. (2013), Freitas et al. (2015) e Carvalho et al. (2017), ao
desenvolverem suas pesquisas na Bacia Hidrográfica do Rio Jauru e na Microregião
do Jauru, os autores verificaram que o “predomínio de solos frágeis à erosão, em
concomitância aos desmatamentos generalizados, principalmente em áreas das
matas-galerias e cabeceiras de drenagens, com predomínio de pastoreios
intensivos nas áreas de pastagem”, contribuíram para a degradação por erosão
hídrica de grande magnitude, como as voçorocas, responsáveis pela perda de solo,
contribuindo para a diminuição de nutrientes assim como o assoreamento dos rios
da BHRC.
A elaboração em Sistema de Informação Geográfica (SIG) da representação
cartográfica de capacidade de uso e de uso atual da terra, associado ao uso de
outras geotecnologias, constitui uma das etapas do processo de identificação de
problemas de manejo e conservação do solo, procedentes do uso seu inadequado
(FREITAS et al., 2015), e “serve como parâmetro de indicação para atividades
propícias à conservação das terras e dos recursos hídricos, na busca da maior
eficiência na adequação do uso e manejo do solo, em relação às recomendações
pertinentes a cada classe, prevenindo assim os processos erosivos” (RODRIGUES et
al., 2001).
O escopo desta pesquisa é verificar, por meio de geotecnologias, a
susceptibilidade à erosão hídrica e os conflitos de uso da terra na Bacia
Hidrográfica Nascentes do Rio Cabaçal, Mato Grosso-Brasil.
Material e métodos
A extensão de 855,93 km2 da Bacia Hidrográfica Nascentes do Rio
Cabaçal (BHNRC) encontra-se assim distribuída nas municipalidades mato-
grossenses: 210,69 km2 (24,62%) em Araputanga e 645,24 km2
(75,38%) em Reserva do Cabaçal (Figura 1).
De acordo com estudos de Tarifa (2011), na área da bacia ocorrem os seguintes
tipos-unidades climáticas: IIIC3 - Clima Tropical Continental Úmido e Seco das
Chapadas, Planaltos e Depressões. C - Mesotérmico Quente e Úmido da Fachada
Meridional dos Parecis em 774,43 km2 (90,48%), com temperatura
variando de 24,4 °C a 22,9 °C; IIIA1a-Clima Tropical Continental Úmido e Seco
das Chapadas, Planaltos e Depressões. A - Mesotérmico dos Topos de Cimeira dos
Chapadões em 77,71 km2 (9,08%), com temperatura variando de 22,9 °C a
22,4 °C; e IIIC4a- Clima Tropical Continental Úmido e Seco das Chapadas,
Planaltos e Depressões. C - Mesotérmico Quente e Úmido da Fachada Meridional dos
Parecis em 3,77 km2 (0,44%), com temperatura variando de 24,5 °C a
22,9 °C.
Procedimentos metodológicos
Os arquivos vetoriais dos mapeamentos de interesse foram recortados pela máscara
da área de estudo, compatibilizados e organizados no Banco de Dados Geográficos
do ArcGis (ESRI, 2018).
O mapa de erodibilidade foi gerado pela inserção no mapa de solos (MATO GROSSO,
2007), cuja nomenclatura foi atualizada conforme proposto por Santos et al.
(2018, p. 339), com o de classes de erodibilidade, de acordo com Salomão (2010,
p. 239) e Carvalho (2008, p. 220).
A associação do mapa de erodibilidade, elaborado com base nos índices de
erodibilidade das unidades pedológicas da bacia, com o do fator topográfico (LS)
resultou no mapa de susceptibilidade à erosão hídrica. As definições das classes
de susceptibilidade à erosão, com base no percentual de declive, acompanharam os
critérios do IPT (1990, p. 25): I) Extremamente suscetível; II) Muito
suscetível; III) Moderadamente suscetível; IV) Pouco suscetível e V) Pouco a não
suscetível.
O mapa do fator topográfico (LS) corresponde ao mapa de isodeclividades da
metodologia proposta por Salomão (2010, p. 240) e foi gerado por meio das cenas
do Modelo Digital de Elevação (MDE) provenientes do banco de dados
geomorfométricos TOPODATA (VALERIANO, 2005, p. 3599). Foram gerados os mapas
clinográfico (declividade) e de direção de fluxo (vertentes). Mapas esses que
foram reclassificados e combinados de modo a gerar o mapa de rampas homogêneas,
de onde foram extraídos os valores de declividade média de rampa e de altura de
rampa conforme a metodologia de Fornelos e Neves (2007, p. 29).
Para a elaboração do mapa do potencial atual à erosão hídrica foi feita a
compatibilização do mapa de susceptibilidade à erosão hídrica com o mapa de uso
atual da terra. Para a classificação do potencial atual à erosão foi adotada a
proposta de Salomão (2010, p. 242-243).
O mapa dos conflitos no uso da terra foi elaborado por meio da combinação dos
mapas de potencial atual à erosão hídrica (SALOMÃO, 2010, p. 243) e da
capacidade de uso da terra (LEPSCH, 2015, p. 50). Foi adotada a metodologia de
Hermuche et al. (2009, p. 118) para classificação do conflito e da relação entre
susceptibilidade à erosão hídrica e a capacidade de uso da terra.
A validação dos mapeamentos foi realizada via trabalho de campo, com registro
das observações em formulário digital (tablet), fotografias e as coordenadas via
GPS.
Resultado e discussão
Predomina na Bacia Hidrográfica Nascentes do Rio Cabaçal o grau de erodibilidade
muito alto, relativo aos Neossolos Quartzarênicos e Neossolos Litólicos, cujo
índice de erodibilidade varia de 10,0 a 8,1, estando presentes em 638,12
km2 (74,55%). A erodibilidade média, que possui índice de
erodibilidade variando de 6,0 a 4,1 totalizando 217,81 km2 (25,45%),
relacionada aos Luvissolos e Argissolos Vermelho-Amarelo (Figura 1 A). Nesta
situação, foi identificada a resistência de ambos os solos aos agentes erosivos,
quando submetidos as mesmas condições de manejo, contribuindo para a avaliação
da susceptibilidade à erosão laminar dos solos (GUERRA e BOTELHO, 1996), bem
como, evidencia a necessidade de planejamento adequado de uso das terras,
resultando em ações voltadas ao disciplinamento e manejo do solo e das
atividades agropecuárias na área de pesquisa. Pois, como asseveram Neves et al.
(2015): “A identificação dos locais de maior erodibilidade e potencial erosivo
pode auxiliar na tomada de decisão sobre o uso da terra e o sistema de manejo a
ser adotado, visando à conservação dos recursos naturais e da biodiversidade
(...)”.
Na extensão da bacia predominam áreas extremamente susceptíveis à erosão hídrica
(73,74% da área), demonstrando que essa unidade hidrográfica é vulnerável à
degradação dos solos por erosão (Figura 1 B), devido à presença de solos
arenosos, como por exemplo o Neossolos Quartzarênicos, e relevo ondulado,
carecendo de planejamento para preservação de suas nascentes.
Figura 2. A) Erodibilidade e B) Susceptibilidade a erosão hídrica e Potencial à
erosão hídrica do solo na Bacia Hidrográfica Nascentes do Rio Cabaçal, Mato
Grosso, Brasil.
Segundo Bertol e Almeida (2000), os Neossolos Quartzarênicos apresentam baixa
resistência à erosão hídrica decorrente dos altos teores de areia e baixos
teores de argila e matéria orgânica, resultando em fraca agregação. Não menos
relevante, é a classe muito susceptível (17,55%), que ocorre na porção sul da
bacia, situada no município de Araputanga, cujo potencial à erosão hídrica do
solo é alto, demandando que o manejo seja feito de forma adequada, através da
adoção de práticas conservacionistas, a fim de se estabelecer a resiliência das
atividades agropecuárias em consonância com a conservação ambiental (LUZ et al.,
2017).
A classe de médio potencial à erosão hídrica do solo é a de maior ocorrência na
bacia (70,92%) (Figura 1 C), não constituindo em impedimento para que usos da
terra sejam desenvolvidos, desde que adotadas práticas de manejo
conservacionistas para evitar o aumento dos problemas com erosão, a exemplo da
aplicação de adubação de manutenção das pastagens e implementação de áreas de
integração lavoura, pastagem e floresta, auxiliando na melhoria da qualidade do
solo (CARVALHO et al., 2017).
Na BHNRC a maioria das terras é imprópria para cultivos agrícolas (anual ou
permanente), pastagem ou reflorestamento (74,55%), sendo mais adequadas para
abrigo e proteção da fauna e flora silvestre, como ambiente para recreação,
turismo ou para fins de armazenamento de água em açudes e Áreas de Preservação
Permanente – APP (Figura 2 A). Pereira e Tôsto (2012) sugerem que essas terras
“devem ser readequadas dentro da sua capacidade de suporte, a fim de evitar a
degradação ambiental e, ao mesmo tempo, manter os serviços ecossistêmicos
ofertados”. Há 19,37% das terras que são adaptadas para pastagens ou
reflorestamento, devido a problemas complexos de conservação, e o restante se
referem às terras cultiváveis, porém apresentando problemas relativos à
conservação/manutenção (6,08%).
Figura 2: A) Capacidade de uso da terra e B) Conflitos de uso da terra na Bacia
Hidrográfica Nascentes do Rio Cabaçal, Mato Grosso, Brasil.
Em 838,10 km2 (97,92%) da Bacia Hidrográfica das Nascentes do Rio Cabaçal os
conflitos de uso da terra são médios, pois essas terras não foram utilizadas
conforme a sua capacidade e em 17,83 km2 (2,08%) são baixos (Figura 2 B). Diante
da predominância de solos arenosos, de áreas extremamente susceptíveis à erosão
e usos da terra em desconformidade com a capacidade de uso da terra o equilíbrio
dinâmico da paisagem da bacia encontra-se em risco, pois os processos erosivos
podem afetar a estabilidade do solo e a qualidade das águas.
A) Erodibilidade e B) Susceptibilidade a erosão hídrica e Potencial à erosão hídrica do solo na Bacia Hidrográfica Nascentes do Rio Cabaçal, MT
A) Capacidade de uso da terra e B) Conflitos de uso da terra na Bacia Hidrográfica Nascentes do Rio Cabaçal, Mato Grosso, Brasil.
Considerações Finais
Na Bacia Hidrográfica Nascentes do Rio Cabaçal a intensificação dos usos
agrícolas, em discordância com a capacidade de uso da terra, associados a solos
naturalmente frágeis, favorecem o surgimento e agravamento de áreas degradadas por
erosão, que podem comprometer a estabilidade do solo, a disponibilidade de água e
a manutenção da qualidade dos corpos hídricos. Esse cenário ambiental é
preocupante e demanda ações de planejamento para o adequado uso e ocupação da
terra, visto a necessidade da conservação dos solos.
Agradecimentos
A Capes pela concessão da bolsa de doutorado. Informações derivadas do projeto
aprovado no edital MCT/CNPq/FNDCT/FAPs/MEC/CAPES/PRO-CENTRO-OESTE Nº 031/2010.
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