Autores
Dias, L. (UNICAMP) ; Cândido, A.O. ()
Resumo
Este trabalho discute as principais intervenções e alterações nos canais fluviais provocadas pela ocupação da Bacia Hidrográfica do Rio das Pedras localizada da Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro. O processo de urbanização dessa área foi marcado por uma dinâmica de alteração dos rios, o que provocou intensas transformações, tanto nos canais fluviais quanto na planície de inundação. Para a elaboração deste trabalho levou-se em consideração o histórico de obras e as técnicas utilizadas, como também as implicações geomorfológicas, hidrológicas e biológicas apresentadas nos canais fluviais após execução das obras. Como resultado dessas transformações, verificou-se que as margens dos rios foram intensamente ocupadas nos últimos anos, reduzindo a capacidade de transporte do canal. Destaca-se que as onerosas obras de canalização, não resolveram o problema das enchentes e inundações. Pelo contrário, acabaram descaracterizando os rios e possibilitando a ocupação irregular das margens.
Palavras chaves
canais fluviais; urbanização; alterações geomorfológicas
Introdução
Durante o processo de urbanização, as intervenções realizadas no meio físico são objetivadas, principalmente, em minimizar os efeitos de eventos naturais de grande magnitude, tais como enchentes, enxurradas, deslocamento de massa dentre outros. Botelho (2011) destaca que na busca de novos espaços de ocupação e, principalmente, na solução do problema de enchentes, a ação humana alterou profundamente os rios, tornando-os “urbanos”. A exemplo disso, as obras de canalização são responsáveis por causar significativas perturbações na qualidade ambiental dos rios. As atividades como a retificação, impermeabilização do leito do rio, retirada da mata ciliar, mudança na morfologia do canal fluvial, modificação da dinâmica sedimentar e do nível lençol freático ocasionam negativas consequências ambientais. A canalização é a intervenção que envolve todas as obras de engenharia praticadas no canal fluvial com a finalidade de controle de enchentes, melhoria de drenagem, manutenção da navegação, redução da erosão das margens ou desvio para construção de estradas (KELLER, 1976; BROOKES, 1985). As principais intervenções se destacam por diferentes processos de canalização, que consistem no alargamento e aprofundamento da calha fluvial, na retificação do canal, na construção de canais artificiais e diques, na proteção das margens e na remoção de obstruções no canal (CUNHA, 2012). O processo de urbanização da baixada de Jacarepaguá e Barra da Tijuca na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro foi marcado por essa dinâmica de alteração dos rios, o que provocou intensas transformações, tanto nos canais fluviais quanto na planície de inundação. As obras de drenagem, barramentos e a canalização foram as principais atividades executadas ao longo do processo de ocupação da área, alterando as condições naturais e canais fluviais e potencializando os eventos de enchentes e inundações. A partir dessa problemática, este trabalho tem por objetivo a análise das alterações geomorfológicas nos canais fluviais provocadas pela urbanização na Bacia Hidrográfica do Rio das Pedras, compreendida entre os bairros de Jacarepaguá, Itanhangá, Anil e Barra da Tijuca, na Zona Oeste da Cidade do Rio de Janeiro (vide imagem 01), afim de identificar as mudanças dos processos geomorfológicos associados as alterações humanas.
Material e métodos
Durante o processo de urbanização, as intervenções realizadas no meio físico são objetivadas, principalmente, em minimizar os efeitos de eventos naturais de grande magnitude, tais como enchentes, enxurradas, deslocamento de massa dentre outros. Botelho (2011) destaca que na busca de novos espaços de ocupação e, principalmente, na solução do problema de enchentes, a ação humana alterou profundamente os rios, tornando-os “urbanos”. A exemplo disso, as obras de canalização são responsáveis por causar significativas perturbações na qualidade ambiental dos rios. As atividades como a retificação, impermeabilização do leito do rio, retirada da mata ciliar, mudança na morfologia do canal fluvial, modificação da dinâmica sedimentar e do nível lençol freático ocasionam negativas consequências ambientais. A canalização é a intervenção que envolve todas as obras de engenharia praticadas no canal fluvial com a finalidade de controle de enchentes, melhoria de drenagem, manutenção da navegação, redução da erosão das margens ou desvio para construção de estradas (KELLER, 1976; BROOKES, 1985). As principais intervenções se destacam por diferentes processos de canalização, que consistem no alargamento e aprofundamento da calha fluvial, na retificação do canal, na construção de canais artificiais e diques, na proteção das margens e na remoção de obstruções no canal (CUNHA, 2012). O processo de urbanização da baixada de Jacarepaguá e Barra da Tijuca na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro foi marcado por essa dinâmica de alteração dos rios, o que provocou intensas transformações, tanto nos canais fluviais quanto na planície de inundação. As obras de drenagem, barramentos e a canalização foram as principais atividades executadas ao longo do processo de ocupação da área, alterando as condições naturais e canais fluviais e potencializando os eventos de enchentes e inundações. A partir dessa problemática, este trabalho tem por objetivo a análise das alterações geomorfológicas nos canais fluviais provocadas pela urbanização na Bacia Hidrográfica do Rio das Pedras, compreendida entre os bairros de Jacarepaguá, Itanhangá, Anil e Barra da Tijuca, na Zona Oeste da Cidade do Rio de Janeiro (vide imagem 01), afim de identificar as mudanças dos processos geomorfológicos associados as alterações humanas.
Resultado e discussão
É importante destacar que a implantação de infraestruturas no baixo
curso da bacia era a prerrogativa para a instalação de grandes projetos
imobiliários na área. Desta forma, foi necessário drenar toda planície a fim
de possibilitar a ocupação. O que ocorreu de fato foi a criação de diversos
canais de drenagem e construção de estradas e caminhos.
Em 1985, a urbanização da área se limitava a favela de Rio das Pedras,
compreendida entre a Avenida Engenheiro Souza Filho e Estrada de Jacarepaguá,
e alguns condomínios de classe média no alto curso da bacia. Através da
análise do projeto executado pela Secretaria de Obras e Serviços da Prefeitura
do Rio de Janeiro, pode-se destacar a dificuldade encontrada pelos técnicos na
execução das obras em virtude das limitações do terreno, como as áreas planas
ou com desnível topográfico nulo.
Durante a década de 1990 várias favelas do Rio de Janeiro receberam
obras de melhorias de infraestrutura e habitacional através do Programa
Favela-Bairro. Em Rio das Pedras, além das obras na estrutura viária e de
habitação, foram realizadas também intervenções na drenagem e canalização do
rio Das Pedras e rio Retiro. Estes investimentos aconteceram, principalmente,
por conta das enchentes ocorridas em fevereiro de 1996, que causaram grandes
estragos na bacia.
Antes dessas intervenções os canais fluviais foram retificados na
década de 1970, mas ainda possuíam o leito com revestimento natural.
Entretanto, foi durante essas obras que os rios Retiro e Das Pedras sofreram
significativas mudanças em seu leito, incluindo desde a mudança para padrão
mais retilíneo, alterações do perfil das seções transversais, até a inclusão
de revestimento artificial no leito.
Implicações das ações humanas nos canais fluviais.
As obras de canalização em perfis revertidos de concreto acabam, na
maioria dos casos, gerando a alteração da secção transversal, mudança no
perfil morfométrico do canal, impermeabilização do leito, alteração da
dinâmica de erosão e deposição de sedimentos, além do ajustamento do nível de
base local. Desta forma, os efeitos da canalização sobre os ambientes fluviais
(em especial o alargamento e aprofundamento da calha, assim como a retificação
do canal) englobam as mudanças hidrológicas, geomorfológicas e bióticas
analisadas no trecho canalização, a jusante da canalização e na planície de
inundação (CUNHA, 1991, 1992 e 1995). Essas modificações estão expostas no
Quadro 01, no qual são sintetizadas as alterações provocadas pela canalização
nos processos geomorfológicos, hidrológicos e no meio biótico.
Dentre estas modificações, a substituição do leito original por material
revestido por concreto é uma das medidas mais adotadas em obras de canais
fluviais em áreas urbanas. Exemplo disso pode-se observar o material que foi
utilizado para revestir o canal do rio Das Pedras durante as obras de
canalização de 1996. Através da obra, o leito natural foi substituído por
camada de aterro, pedra de argamassa no revestimento lateral e o fundo
preenchido com colchão de argamassa. São nessas intervenções que os canais
perdem todas as fisionomias de um corpo fluvial natural. A rugosidade e
diferentes níveis altimétricos do leito são resumidos a um fundo liso, plano e
impermeável.
Essas alterações causam também significativas mudanças no comportamento
hidrológico. A diminuição do sombreamento decorrente da retirada da vegetação
ripária e o novo revestimento do canal, geralmente de concreto, podem
influenciar no aumento de temperatura da água. Segundo dados recentes indicam
que a urbanização intensiva pode aumentar a temperatura do curso d’água em até
5º a 10 º C durante pancadas de chuva (ARAÚJO; 2014). O canal concretado
contribui para a anulação das taxas de infiltração e recarga de aquífero, em
virtude da perda de contato com o lençol freático.
Entre os impactos negativos imediatos provocados pelas altas concentrações de
sedimentos estão o aumento da turbidez, a redução na penetração da luz solar e
a diminuição da vegetação aquática submersa, a respiração deficiente dos
peixes e invertebrados aquáticos, a redução da fertilidade e a deterioração
dos recursos pesqueiros comerciais e de lazer (ARAÚJO, 2014).
Podem-se destacar diversos efeitos no meio biótico causados pela implantação
de canais com estruturas de concreto. Estas alterações já começam no início da
obra, por meio da retirada da cobertura vegetal que reveste o canal e a
remoção da mata ripária. Estas ações impactam na diminuição da oferta de
nutrientes provenientes da vegetação marginal, e na consequente redução de
alimentos disponíveis para a ictiofauna.
Após a conclusão das obras, o canal revertido de concreto passa a
aquecer mais e influencia diretamente na temperatura da água, o que favorece o
aumento da produção biológica e de plantas aquáticas invasoras, e na
consequente diminuição do oxigênio dissolvido. As alterações na profundidade e
largura do canal afetam diretamente na diminuição da diversidade do estrato
biológico, este processo é decorrente da diminuição da profundidade do canal,
perda de espaços de refúgio, alimentação e reprodução de peixes e
invertebrados aquáticos. O aumento da carga térmica pode limitar a
sobrevivência de organismos aquáticos que se são extremamente sensíveis aos
ajustes de temperatura (ARAÚJO, 2014).
Na figura 02 é possível analisar as principais diferenças entre canais
naturais e canais revestidos de concreto, observa-se a mudança brusca das
condições do canal entre as duas figuras. Ainda hoje, as técnicas aplicadas
pela engenharia não consideram estes impactos após as obras, e são pouco os
projetos que minimizem os impactos na dinâmica hidrológica, geomorfológica e
biológica.
Na bacia do rio Das Pedras não foi diferente, todas as intervenções e
implicações nos canais fluviais são aparentes. A última grande obra no sistema
de drenagem e nos canais da bacia do rio Das Pedras aconteceu entre os anos de
2010 a 2012. Esses investimentos faziam parte do pacote de obras de
infraestrutura para a preparação da cidade do Rio de Janeiro para a Copa do
Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.. O primeiro projeto consistiu na
dragagem dos rios da bacia, além da canalização do rio Retiro. Estas obras
faziam parte do Programa Recuperação Ambiental Bacia de Jacarepaguá, que tinha
por objetivo a Macrodragagem da Bacia e a despoluição do complexo Lagunar da
Barra da Tijuca e Jacarepaguá. O valor total da obra só neste trecho foi
estimado em mais de 26 milhões de reais. Mesmo com esse montante aplicado, a
degradação ambiental na bacia do rio das Pedras foi pouco alterada.
Outra grande intervenção que aconteceu em 2012 foram as obras de
drenagem e instalação de esgotamento sanitário realizadas pela Companhia
Estadual de Habitação do Rio de Janeiro (CEHAB-RJ) nas localidades de Areal e
Areinha, baixo curso da bacia. Foi possível analisar através do projeto
executivo obtido na Fundação Rio Águas a dificuldade encontrada pelos técnicos
para a instalação da rede, visto que o solo não oferecia estabilidade, o que
poderia danificar as tubulações.
O que se tem observado na bacia analisada é que as obras de
canalização são insuficientes para solucionar os problemas de enchentes e que,
de certa forma, acabam por intensificar os problemas de degradação fluvial.
Citando caso análogo, são os canais que não passam por manutenção e limpeza
periódica, o que favorece o acúmulo de sedimentos e lixo no leito,
comprometendo sua capacidade de escoamento. Além do material sedimentado, a
grande quantidade de matéria orgânica facilita o crescimento de plantas
invasoras, gerando um ambiente totalmente diferente do que se observara antes
da canalização. Na figura 03 são observados esses dois cenários: em janeiro de
2012 ocorreu o preenchimento do canal por sedimentos e muitas plantas
invasoras. Já em março de 2016, mesmo após uma dragagem, o canal está
completamente tomado por lixo flutuante.
Mapa de Localização da Bacia Hidrográfica do Rio das Pedras.
Alterações nos canais fluviais em áreas urbanas e implicações geomorfológicas, hidrológicas e bióticas na Bacia do rio das Pedras.
Condições hidrológicas, biofísicas de canais fluviais naturais. Elaboração: Autores
Canal do rio Das Pedras preenchido por plantas aquáticas (2012) e por resíduos sólidos (2016) Fonte: Autores
Considerações Finais
A partir dos resultados alcançados, conclui-se que o processo de urbanização alterou as características originais dos rios e a consequente dinâmica dos canais fluviais, pois para que ocupação acontecesse foi necessário o desvio e canalização dos rios, criação de canais de drenagem, supressão das margens e ocupação da planície de inundação através de aterros. As ações humanas foram responsáveis pela mudança dos padrões fluviais, bem como a alteração do revestimento para estruturas de concreto, acarretando implicações geomorfológicas, hidrológicas e biológicas nos canais. Além disso, as margens dos rios foram intensamente ocupadas durante os últimos anos, fato percebível através da análise temporal da ocupação nas margens do rio das Pedras. As onerosas obras de drenagem urbana, principalmente, intervenções estruturais como a canalização, não resolveram o problema das enchentes e inundações. Pelo contrário, acabaram descaracterizando os rios e possibilitando a ocupação das margens. Faz-se necessário também uma mudança de paradigma com relação aos canais fluviais em áreas urbanas, no qual o rio não pode ser mais visto apenas como condutor de rejeitos, esgotos e lixo. A qualidade de vida nas cidades depende diretamente da capacidade de ocupar o espaço urbano através do entendimento das suas potencialidades e limitações. Os rios no meio urbano podem se tornar áreas de atração de atividades de lazer, turismo e educação ambiental.
Agradecimentos
Referências
BOTELHO, R. G. M. Bacias Hidrográficas Urbanas. In: Geomorfologia Urbana, Guerra. A. J. T. (Org.). – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011.
BROOKES, A. River Channelization: Traditional Engineering Methods, Physical Consequences and Alternative Practices. Progress in Physical Geography, 9, 1:325-326, 1985a.
CUNHA, S. B. Geomorfologia fluvial. In Geomorfologia: uma atualização de bases e conceitos.
________.Impactos das obras de engenharia sobre o ambiente biofísico da Bacia do rio São João (Rio de Janeiro/Brasil). Rio de Janeiro: Edição do autor, 1995. 415p.
________. Bacias hidrográficas. IN: Cunha, S.B. da. e Guerra, A. J. T. (orgs.). Geomorfologia do Brasil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. p. 229-276.
________. Canais fluviais e a questão ambiental. In: CUNHA, S. B.; GUERRA, A. J. T. A questão ambiental: diferentes abordagens. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. P. 219-237.
________. Rios desnaturalizados. In: Ordenamento Territorial Ambiental. Barbosa, J.L. & Limonad, E. Niterói: Editora da UFF, 2012.