Autores

Silva, F.J.L.T. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ) ; Rocha, D.F. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE) ; Aquino, C.M.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ)

Resumo

A procura por novas perspectivas voltadas ao estudo científico da natureza configura-se como uma necessidade constante. Nesse prisma, conceitos como Geodiversidade e Geoconservação passaram a circular nas publicações acadêmicas, sobretudo a partir da década de 1990. Nesse sentido, o Patrimônio Geomorfológico destaca-se como uma vertente particular de valorização da Geodiversidade. Assim sendo, buscou-se com esse artigo analisar o estado da arte relativo ao tema Patrimônio Geomorfológico no âmbito do Simpósio Nacional de Geomorfologia – SINAGEO, compreendendo as edições de 2006, 2008, 2010, 2012, 2014 e 2016. A pesquisa pautou-se em revisão bibliográfica, com foco nos Anais do evento apontado acima. Contraposta aos temas clássicos da Geomorfologia, a produção sobre Patrimônio Geomorfológico ainda se mostra incipiente no cerne do SINAGEO. As pesquisas direcionadas à avaliação do Patrimônio Geomorfológico abarcam diferentes metodologias, critérios e estratégias de Geoconservação.

Palavras chaves

Geodiversidade; Patrimônio Geomorfológico; Geoconservação

Introdução

No contexto da pesquisa acadêmica, os conceitos de Geodiversidade, Patrimônio Geomorfológico e Geoconservação ainda se caracterizam pelo seu caráter hodierno (BRILHA, 2005; GRAY, 2004; PEREIRA, 2006). Em linhas gerais, a Geodiversidade agrega o conjunto de recursos geológico geomorfológicos, seus fenômenos e processos ativos, incluindo suas relações, propriedades e sistemas que dão origem às paisagens. Esta concepção demonstra a importância que o tema possui no cenário dos estudos ambientais, posto a Geodiversidade ser considerada o substrato para a sustentação da Biodiversidade (GRAY, 2004; BRILHA, 2005). Conforme apontam Gray (2004) e Pereira (2006), a Geodiversidade comporta um conjunto de valores que fundamentam a sua avaliação, a saber: intrínseco, cultural, estético, econômico, ecológico, funcional, científico e educativo. Nessa perspectiva, Gray (2004) se refere à Geodiversidade como sendo a ligação entre sociedade, paisagem e cultura. Na acepção de Pereira (2006), o Patrimônio Geomorfológico traduz-se pelo conjunto de locais de interesse geomorfológico que adquirirem valor a partir da percepção humana, podendo ser denominado ainda como geopatrimônio, sítio geomorfológico, geossítio de caráter geomorfológico ou mesmo geomorfossítio. Relativamente às metodologias de avaliação do Patrimônio Geomorfológico, Pereira (2006) apresentou modelo específico, proposto para ser aplicado a áreas de quaisquer dimensões. Tal metodologia subdivide-se em duas etapas básicas: (i) inventariação e (ii) quantificação. A inventariação comporta quatro etapas: (i) identificação dos potenciais locais de interesse geomorfológico; (ii) avaliação qualitativa; (iii) seleção dos locais de interesse geomorfológico; (iv) caracterização dos locais de interesse geomorfológico. Por sua vez, a quantificação é realizada a partir da avaliação numérica e seriação dos locais de interesse geomorfológico. Pereira (2006) destaca que a utilização deste método implica o conhecimento geomorfológico prévio da área estudada de modo a contemplar as etapas mencionadas. Na perspectiva de melhor enquadrar a avaliação dos locais de interesse geomorfológico, Pereira (2006) ainda elencou critérios para a seleção destes, considerando os seguintes valores: (i) científico; (ii) ecológico; (iii) cultural; (iv) estético e (v) econômico. Já o conceito de Geoconservação atrela-se às estratégias e iniciativas de conservação da Geodiversidade, incluído aí o Patrimônio Geomorfológico (PEREIRA, 2006). O termo Geoconservação abarca as atividades relacionadas à proteção do patrimônio natural, desde os inventários e levantamentos básicos às tarefas de gestão. Uma das ações prioritárias para a geoconservação é a valorização e divulgação dos sítios com valor patrimonial (BRILHA, 2005). No intuito de subsidiar as atividades voltadas à Geoconservação, Brilha (2005) destacou algumas estratégias necessárias para a conservação do patrimônio natural. Tais estratégias de Geoconservação obedecem às seguintes etapas: inventariação, quantificação, classificação, conservação, valorização, divulgação e monitoramento. Frente ao exposto, observa-se o estreito vínculo entre Geodiversidade, Patrimônio Geomorfológico e Geoconservação. Nesse contexto, o presente artigo objetivou analisar o estado da arte das pesquisas sobre Patrimônio Geomorfológico no âmbito do SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOMORFOLOGIA, considerando as edições de 2006, 2008, 2010, 2012, 2014 e 2016. A elaboração do presente estado da arte comportou as seguintes etapas: (i) balanço quantitativo das pesquisas com enfoque no tema proposto; (ii) metodologias e etapas de avaliação dos geomorfossítios; (iii) critérios de seleção dos geomorfossítios; (iv) estratégias de Geoconservação dos geomorfossítios e (v) distribuição do conhecimento em território nacional.

Material e métodos

A pesquisa pautou-se em revisão bibliográfica atinente aos conceitos de Geodiversidade, Patrimônio Geomorfológico e Geoconservação. Nessa etapa de revisão, utilizaram-se livros, artigos de periódicos, dissertações e teses. O estado da arte acerca do tema Patrimônio Geomorfológico foi elaborado a partir da análise da produção acadêmica disponibilizada nos anais do Simpósio Nacional de Geomorfologia – SINAGEO, contemplando as edições de 2006, 2008, 2010, 2012, 2014 e 2016. Para a tabulação dos dados e confecção do mapa de espacialização da produção acadêmica, fez-se uso dos seguintes programas: Microsoft Office Excel 15.0 e ArcGIS 10.5.1.

Resultado e discussão

Apresenta-se a seguir um breve resgate das últimas seis edições do respectivo evento no que se refere aos temas centrais e eixos temáticos estruturadores de cada edição. Posteriormente, exibe-se o balanço da produção acadêmica sobre o tema Patrimônio Geomorfológico ao longo das edições assinaladas anteriormente. O tema do 6º SINAGEO (2006 – Goiânia/GO) foi “GEOMORFOLOGIA DAS REGIÕES TROPICAIS E SUBTROPICAIS: PROCESSOS, MÉTODOS E TÉCNICAS”. A edição divulgou 307 contribuições científicas. As discussões do 7º SINAGEO (2008 – Belo Horizonte/MG) foram regidas pelo tema “DINÂMICA E DIVERSIDADE DE PAISAGENS”. A edição publicou 457 artigos. O tema do 8º SINAGEO (2010 – Recife/PE) foi “SENSITIVIDADE DE PAISAGENS: A GEOMORFOLOGIA NO CONTEXTO DAS MUDANÇAS AMBIENTAIS GLOBAIS”. Esta edição publicou em seus anais 300 artigos. Por sua vez, o 9º SINAGEO (2012 – Rio de Janeiro/RJ) teve por lema “GEOMORFOLOGIA E EVENTOS CATASTRÓFICOS: PASSADO, PRESENTE E FUTURO”. A referida edição divulgou 543 contribuições. Os debates do 10º SINAGEO (2014 – Manaus/AM) foram norteados pela temática “GEOMORFOLOGIA, AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE”. A edição publicou um total de 420 artigos. Por fim, o 11º SINAGEO (2016 – Maringá/PR) estruturou-se em torno do tema “GEOMORFOLOGIA: COMPARTIMENTAÇÃO DE PAISAGENS, PROCESSOS E DINÂMICA”. Esta edição divulgou 429 contribuições. Ao longo destas últimas seis edições do SINAGEO foram publicadas mais de 2.400 pesquisas, cobrindo diversos enfoques temáticos da Geomorfologia brasileira. Mapeamento Geomorfológico, Geomorfologia Fluvial, Dinâmica de Encostas e Análise de Bacias Hidrográficas despontam como os temas mais recorrentes e de fato já consolidados no bojo do referido simpósio (SILVA; RIBEIRO; AQUINO, 2016). Nesse ponto, interessa refletir sobre a “movimentação” do SINAGEO naquilo que tange à abertura do evento aos temas da Geodiversidade e Geoconservação. Em termos de estruturação dos eixos temáticos, a edição de 2008, realizada em Belo Horizonte, “inaugurou” a concessão de um subeixo temático específico para os temas em tela, o mesmo encontrando-se diluído no eixo 7 “Geomorfologia Aplicada” (subeixo 7.7: “Levantamento e avaliação integrada de recursos naturais/Geodiversidade”). A edição subsequente, realizada em 2010 na cidade de Recife, também destacou um eixo temático às investigações dos adeptos da Geodiversidade e Geoconservação, no cerne do qual podem ser rastreadas pesquisas com este enfoque (eixo 6: “Geomorfologia e conservação do patrimônio natural”). As edições de 2012 (Rio de Janeiro) e 2014 (Manaus) desviaram-se da tendência dos encontros antecedentes, não destinando eixos temáticos específicos para os temas supramencionados. A despeito disso, as pesquisas com esse direcionamento continuaram abastecendo a produção acadêmica do evento. Para a edição de 2016 (Maringá), a comissão organizadora do evento reservou o eixo “Geodiversidade e Patrimônio Geomorfológico” aos interessados na temática. Pela primeira vez na história do SINAGEO, nomeava-se um eixo temático com esta rubrica. Feita esta contextualização acerca de como o SINAGEO vem se organizando nas últimas edições em torno das temáticas Geodiversidade e Geoconservação, urge que se analise a produção do simpósio relativamente ao tema do Patrimônio Geomorfológico. Nessa perspectiva, o Gráfico 1 apresenta o primeiro elemento da nossa proposta de estado da arte acerca do Patrimônio Geomorfológico, em que se buscou assinalar, inicialmente, o comportamento quantitativo das investigações no decorrer da última década. No balanço efetivado, foram identificadas 40 pesquisas com focalização no tema em destaque.Observa-se no Gráfico 1 uma produção acadêmica pouco expressiva sobre Patrimônio Geomorfológico no âmbito do SINAGEO, sobretudo quando contraposta às temáticas “clássicas” do evento. Nesse sentido, a real dimensão do caráter de “novidade” que o tema ainda encerra no contexto deste simpósio pode ser mais bem enquadrada ao se sublinhar novamente que as últimas seis edições do SINAGEO contabilizaram em torno de 2.400 contribuições científicas. Concernente aos elementos metodológicos das pesquisas com enfoque no Patrimônio Geomorfológico, o Quadro 1 destaca os quatro itens principais identificados no decorrer da análise destes estudos – conforme adaptação das proposições de Brilha (2005) e Pereira (2006). Verifica-se que todas as pesquisas consideram a etapa de inventariação como básica para a avaliação dos geomorfossítios. Entre os critérios adotados nesta etapa, sobressaem-se os valores científico e turístico. No contexto deste último, cita-se o significativo volume de pesquisas (28 no total) que sublinham a importância do geoturismo como alternativa para a conservação da Geodiversidade em sua vertente geomorfológica, proporcionando meios de inserção das comunidades locais. Em relação à quantificação dos geomorfossítios, apenas 9 (22%) das 40 pesquisas se comprometeram a realizar esta etapa. As metodologias aplicadas nestes estudos contemplam propostas fruto de experiências realizadas na Europa (BRILHA, 2005; PEREIRA, 2006; PRALONG, 2005) e no Brasil (LIMA, 2008). Destaca-se o reduzido interesse dos pesquisadores em oferecer estratégias concretas de geoconservação dos geomorfossítios. Somente 16 (40%) das 40 pesquisas desenvolveram propostas nesse sentido – todas direcionadas à valorização e divulgação dos geomorfossítios. A Figura 1 espacializa a produção acadêmica sobre Patrimônio Geomorfológico em território nacional, considerando a produção por estados e regiões. O critério utilizado considerou o vínculo institucional do primeiro autor informado no artigo à data de publicação da pesquisa nos anais das respectivas edições analisadas. A análise da Figura 1 atesta a concentração de estudos nos centros de ensino e pesquisa da Região Sudeste, com 16 artigos no total (40%). A Região Nordeste se destaca como a segunda mais produtiva, somando 12 contribuições (30%). A Região Sul detém 8 contribuições (20%). A Região Centro-Oeste totaliza 3 artigos (8%). Por fim, a Região Norte apresentou a produção menos significativa, com apenas 1 contribuição (3%). Ao se considerar a produção acadêmica por estados federados, Rio de Janeiro e Minas Gerais despontam com 7 contribuições cada, somando juntos 35% da produção do SINAGEO (2006-2016). No contexto da Região Nordeste, os estados mais producentes são Ceará e Pernambuco (3 artigos cada) e Bahia e Piauí (2 artigos cada). Na Região Sul, destacam-se Paraná e Rio Grande do Sul, ambos com 3 contribuições. No Centro-Oeste, apenas o estado de Goiás figurou no balanço realizado, com 3 pesquisas. Por último, Roraima totalizou 1 estudo sobre Patrimônio Geomorfológico, configurando-se como o único estado da Região Norte a divulgar uma pesquisa sobre essa temática no âmbito das últimas seis edições do SINAGEO.










Considerações Finais

O presente estado da arte constituiu-se em uma tentativa preliminar de: (i) quantificar as pesquisas sobre Patrimônio Geomorfológico no âmbito do SINAGEO, considerando as edições realizadas entre 2006 e 2016; (ii) identificar as metodologias e etapas empregadas na avaliação dos geomorfossítios; (iii) identificar os critérios de seleção dos geomorfossítios; (iv) reconhecer as estratégias de Geoconservação dos geomorfossítios e (v) espacializar a produção acadêmica no contexto do território brasileiro referente ao tema em discussão. Verificou-se que as pesquisas em torno da temática do Patrimônio Geomorfológico ainda são incipientes no âmago do SINAGEO. As mesmas comportam diferentes métodos e critérios de inventariação e quantificação dos locais de interesse geomorfológico. No que concerne às estratégias de Geoconservação, as pesquisas enfatizaram a valorização e divulgação dos geomorfossítios. A distribuição geográfica do conhecimento produzido sobre Patrimônio Geomorfológico se concentrou nas regiões Sudeste, Nordeste e Sul, somando 90% da produção acadêmica nacional. Dentro da proposta lançada e dos resultados alcançados, espera-se contribuir para um melhor esclarecimento da importância do tema Patrimônio Geomorfológico no atual contexto da pesquisa geográfico- geomorfológica nacional.

Agradecimentos

Agradecemos ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Piauí por proporcionar ambiente acadêmico propício para o desenvolvimento de nossas pesquisas.

Referências

BRILHA, J. B. R. Patrimônio geológico e geoconservação: a conservação da natureza na sua vertente geológica. Braga: Palimage Editores, 2005.
GRAY, M. Geodiversity: valuing and conserving abiotic nature. Chichester: John Wiley & Sons, 2004.
LIMA, F. F. Proposta metodológica para a inventariação do patrimônio geológico brasileiro. 2008. 103 f. Dissertação (Mestrado em Patrimônio Geológico e Geoconservação). Escola de Ciências. Universidade do Minho. Portugal, 2008.
PEREIRA, A. R. Patrimônio geomorfológico no litoral sudoeste de Portugal. Finnisterra, n. 30, p. 7-25, 1995.
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PRALONG, Jean-Pierre. A method for assessing tourist potential and use of geomorphological sites. Géomorphosites : définition, évaluation et cartographie, v. 11, n. 3, p. 189-196, 2005.
SILVA, F. J. L. T.; RIBEIRO, K. V.; AQUINO, C. M. S. Panorama da produção geomorfológica no âmbito do Simpósio Nacional de Geomorfologia - SINAGEO (2006, 2010, 2012 e 2014). In: XI SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOMORFOLOGIA, 2016, Maringá. SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOMORFOLOGIA, 11., Maringá, PR, 2016. Anais... Maringá, PR, 2016.
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