Autores

Tomazzoli, E. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA) ; Pellegrin, J.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA) ; Nazareth, E.R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA) ; Martins, C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA) ; Souza, K.I.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA) ; Marins, P.C.O. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA) ; Prestes, L.D. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA) ; Minski, G.L. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA) ; Segundo, E. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA) ; Lalane, H.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA)

Resumo

O presente trabalho propõe a descrever aspectos fisiográficos da planície costeira da praia da Pinheira, município de Palhoça, SC. A partir de um mapeamento geológico-geomorfológico superficial na escala 1:10.000. Para atingir os objetivos sintetizaram-se as atividades em quatro etapas: fotointerpretação preliminar, trabalho de campo, análise laboratorial e fotointerpretação final. Durante o trabalho de campo, foram visitadas 108 pontos, com coletas de sedimentos e rochas, tendo sido avaliadas diferentes características geológicas tais como: estrutura, textura, cor, mineralogia, dentre outras informações pertinentes. No mapeamento geológico foram identificadas 15 unidades geológicas de três sistemas distintos: cristalino, deposicional transicional costeiro e continental.

Palavras chaves

Mapeamento geológico; Geomorfologia costeira; Holoceno

Introdução

As planícies costeiras consistem uma unidade geomorfológica formada por diferentes tipos de depósitos, em geral do período Quaternário, associadas em sistemas deposicionais de acordo, principalmente, com seu ambiente de sedimentação e idade, ao longo da faixa litorânea. A área de estudo situada no município de Palhoça, entre a Praia do Sonho até a praia da Guarda do Embaú (Figura 1), caracteriza-se por apresentar uma planície costeira composta por diversos depósitos Quaternários, de variada composição e morfologia, além de rochas do embasamento que constitui o domínio das serras do Leste Catarinense. A gênese destes depósitos esta diretamente relacionada aos processos transgressivo-regressivos do nível relativo médio do mar ocorridos desde o Pleistoceno superior ate os dias atuais, aos processos intempéricos atuantes sobre o embasamento durante todo o Quaternário, além dos processos antrópicos decorridos durante o Holoceno (LIVI & HORN FILHO, 2010). Conforme SANTA CATARINA (2010) a zona costeira de Santa Catarina, constitui-se de duas grandes unidades geológicas presentes: o embasamento e as bacias sedimentares marginais Santos e Pelotas, de natureza tectônica de margem continental passiva, situada no oceano Atlântico Sul, desde o inicio da deriva continental, relacionada à fragmentação da Gonduana, que separou a América do Sul do continente africano. A unidade geomorfológica da planície costeira da região corresponde a uma estreita faixa localizada a oeste do oceano Atlântico sul constituído de praias arenosas, sistemas de dunas construídos por processos marinhos e eólicos, sistemas fluviais, lagunares e paludiais, sendo unidades bastante diversificadas e desempenham um papel considerável na morfologia costeira e litorânea, responsável igualmente por grandes feições, como ocorre na área de estudo. A planície costeira de Santa Catarina possui elevada importância socioambiental, tanto pela quantidade de recursos naturais que a mesma possui quanto pelo efetivo populacional que utiliza esses recursos. Essas características justificam a necessidade de conhecimento dessa unidade, dos seus ecossistemas e da base física que a sustenta, com destaque para suas características geológicas e geomorfológicas (HORN FILHO, N.O. et al, 2014). Através da interpretação de fotografias aéreas, ortofotos, curvas de nível fornecidas pela Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável (SDS) e dados coletados a campo, foram reconhecidos as litologias e os depósitos da área de estudo. Na área de estudo, ocorrem dois domínios geológicos principais: o de rochas do embasamento cristalino, com granitos de idade neoproterozóica, cortados por diques de composição básico-intermediária, de idade cretácea e os depósitos da planície costeira, da era Cenozóica. Os depósitos da planície costeira são característicos de dois sistemas deposicionais: sistema continental e costeiro, ambos datados do Quaternário. O sistema continental está associado às encostas das terras altas, englobando os depósitos fluviais da área de estudo. O sistema costeiro compreende depósitos eólicos, lagunares e marinhos, de idade pleistocênica e holocênica, formados a partir de trangressões e regressões marinhas. Nesse contexto, foi realizado um mapeamento geológico e geomorfológico da Pinheira, que originou um mapa na escala 1:10.000, compondo informações da planície costeira e rochas do embasamento da região, acompanhado de um breve texto explicativo com os principais aspectos geológicos e geomorfológicos da área. O resultado deste trabalho foi parte conclusiva da disciplina Técnicas de Mapeamento Geológico – Geomorfológico oferecido pelo Programa de Pós- graduação em Geografia, pela Universidade Federal de Santa Catarina, durante o primeiro semestre de 2017.

Material e métodos

Para a realização do presente trabalho foram executadas as seguintes etapas metodológicas: Inicialmente foi realizado o levantamento bibliográfico e inventário dos mapeamentos e do material cartográfico existente, para auxiliar no reconhecimento das unidades geológicas e geomorfológicas da área a serem mapeadas. Após a obtenção dos dados, foi construído um mapa-base através do software de mapeamento AutoCAD Map 3D, contendo as curvas de nível, rios, estradas, trilhas e limite da linha de costa. A linha de costa, os rios e as vias de acesso foram digitalizadas a partir da interpretação das ortofotos da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável (SDS) de Santa Catarina. Ainda foram incorporadas ao mapa-base, as curvas de nível, também disponibilizadas pela SDS. Através das fotografias aéreas de 1957, das ortofotos da SDS e do Modelo Digital de Terreno, foi realizada uma interpretação geológica/geomorfológica preliminar. O mapa-base e a interpretação preliminar possibilitaram o planejamento dos trabalhos de campo. Segundo momento do trabalho consistiu em saída de campo. Em campo foram feitos pontos de observação que tiveram suas coordenadas geográficas registradas através do receptor GPS. Em cada ponto foi realizada a caracterização dos afloramentos rochosos e dos sedimentos da planície quaternária. Amostras das rochas foram coletadas e etiquetadas. Foram descritos e medidos com o auxílio de bússola geológica, a orientação dos diques e direções e mergulhos dos afloramentos. Todos os dados foram registrados em caderneta de campo e posteriormente digitalizados. Em cada ponto, realizou-se o registro fotográfico e foram amostrados um total de 108 pontos, divididos em 4 idas à campo e dois grupos participantes. Posteriormente em gabinete, os pontos coletados foram plotados sobre o mapa- base e as ortofotos. Para cada ponto foi dada uma cor correspondente à sua classificação geológica/geomorfológica, facilitando, assim, a delimitação das unidades mapeadas. Tendo como subsidio os trabalhos de campo, os pontos plotados, a interpretação prévia da área, as ortofotos, o Modelo Digital de Terreno (MDT) e as curvas de nível, iniciou-se o mapeamento das unidades geológicas/geomorfológicas. Para a confecção do mapa o ambiente de produção foi concentrado em plataforma do software AutoCad Map 3D, utilizado através de licença educacional, que permitiu a vetorização dos contatos litológicos, dos diques e das estruturas geomorfológicas. Foram realizadas análises laboratoriais das amostras de mão coletadas, tais como: descrição mineralógica, petrográfica e textural das rochas. A confecção de lâminas delgadas permitiu a visualização dos minerais no microscópico óptico. Todas as imagens orbitais, fotografias aéreas e mosaicos, foram retificados e georreferenciados para o Datum SAD 69, de forma a manter a compatibilidade com o Mapa Geológico da Ilha de Santa Catarina (TOMAZOLLI e PELERIN, 2015).

Resultado e discussão

Através da interpretação de fotografias aéreas, ortofotos da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável (SDS) e dados coletados a campo, foram reconhecidos as litologias e os depósitos da área de estudo. Foram identificados 15 unidades geológicas-geomorfológicas de idades Cenozoicas, Mesozoicas e Proterozoicas, predominando, o Sistema transicional do período Quaternário (Figura 2). Os maciços rochosos são constituídos, predominantemente por Granito Ilha, que corresponde ao Granito grosseiro Ilha, originalmente definido por Scheibe & Teixeira (1970). O Granito Ilha integra a Suíte Intrusiva Pedras Grandes (ZANINI et al., 1997) que por sua vez, engloba também o Granito Serra do Tabuleiro e outros granitóides alcalinos de natureza pós-tectônica. O Granito Ilha possui coloração rosada ou cinzaclaro, com textura equigranular, mais raramente pórfira, grossa ou média, hipidiomórfica (TOMAZZOLI e PELLERIN, 2015). O Granito Ilha é resultante da superposição de inúmeros eventos geotectônicos ocorridos na região no período Ediacarano, sendo considerada a unidade geológica mais antiga da área de estudo. Faz contato geológico direto com as rochas intrusivas básicas e intermediárias cretáceas do Enxame Florianópolis, contato este representado por lineamentos estruturais com fraturamento e aflorantes através de corpos tabulares verticalizados. O granito apresenta-se cortado por esses diques, que se dispõem, de um modo geral segundo a direção nordeste. Os litotipos presentes são diabásios e andesitos. Os diques de diabásio na sua borda apresentam-se muito finos, sendo classificados então como basalto; em alguns casos, no centro desses diques as rochas podem apresenta granulação grossa, podendo ser classificados como gabro. Estão orientados, em sua maioria, seguindo as direções N20E, N30E, N40W (mais rara) e N50E. Embora, na área de estudos, a maioria dos diques seja do tipo simples, ocorrem também diques múltiplos e diques compostos. Diques compostos resultam da interação de dois magmas constrastantes (normalmente ácidos- intermediários e básicos), interagindo no estágio líquido dentro do próprio dique, resultando em bordas básicas e centro ácido ou intermediário, muitas vezes contendo enclaves máficos-magmáticos que comprovam essa interação de líquidos (DIDIER & BARBAIN, 1991). Já os diques múltiplos são resultado de uma ou múltiplas intrusões de diques dentro de outros já consolidados, todos geralmente de mesma composição (Jerran e Petford, 2014), resultando num dique mais jovem posicionado no centro com as bordas constituídas pelo dique mais antigo que foi intrudido. No maciço da Pinheira, ao sul, ocorre dique composto com bordas de basalto fino e centro de andesito mais grosso, contendo enclaves máfico-magmáticos de basalto afanítico (Fig. 3a).No maciço da Ponta do Papagaio, a norte, ocorre outro dique composto, contendo bordas de basalto fino e centro de andesito pórfiro, com aglomerados de fenocristais de plagioclásio e augita (Fig. 3 b) que, especula-se que possam tratar-se de xenocristais ou xenólitos de gabro, com recrisitalização por metamorfismo termal. Ao sul, esse dique faz contato com outro, de grabro, não registrado no mapa geológico devido ao fato de sua geometria não estar ainda bem compreendida. Nesse caso, trata-se também de um dique múltiplo, intrudido no gabro previamente consolidado; os xenólitos e fenocristais poderiam ser provenientes do gabro. Em alguns setores com na Ponta das Andorinhas no maciço da Pinheira, os diques de diabásio promovem refusões da rocha encaixante granítica, como já foi registrado na Ilha de Santa Catarina (Tomazzoli e Pellerin, 2015). Nesse local, as refusões graníticas acabaram interagindo com o diabásio, ora no estágio líquido ora no estágio sólido, promovendo a formação de brechas, com framentos angulosos e arredondados de basalto e diabásio, envoltos por granito (Fig 3 c).Nas áreas onde ocorrem os diques de diabásio ou andesito, o relevo apresenta-se deprimido em relação às rochas encaixantes mais resistentes. Os depósitos eólicos geralmente formam campos de dunas. De acordo com Livi e Horn Filho (2010), o depósito eólico do Holoceno aflora tanto na margem leste da Ilha de Santa Catarina, quanto no continente, visto que é resultado do retrabalhamento de sedimentos marinho praiais pela ação do vento. Do ponto de vista geomorfológico, o depósito eólico do Holoceno apresenta-se sob forma de dunas, tanto móveis como fixas (vegetadas), tendo a ação dos ventos como seu principal agente formador. No entanto, nas praias da Pinheira e do Sonho encontra-se apenas dunas fixas, vegetadas ou semi- vegetadas, que pode ser classificadas como dunas transgressivas e dunas frontais. Outro sistema aflorante é o deposicional litorâneo, sendo o resultado de uma série de eventos transgressivos e regressivos ocorridos durante o Holoceno. Consiste de depósitos formados principalmente por sedimentos arenosos que constituem os depósitos marinhos e lagunares, composto de sedimentos finos que são originados em ambientes úmidos. Destes episódios originaram-se os depósitos lagunar, flúvio-lagunar, fluvial, lagunar praial, marinho praial, eólico e paludial (LIVI & HORN FILHO, 2010). Em campo foi observado que os depósitos lagunares em sua maioria estão restritos entre os cordões de areias. Do ponto de vista geomorfológico, o depósito lagunar do Holoceno apresentou em forma de terraço lagunar com áreas de cotas altimétricas de até 5m, composição areno-lamosa, caracterizando um depósito mal selecionado, com coloração escura, que varia de tons de marrons a cinza, típico de ambiente redutor. O Depósito flúvio-lagunar localizado na área de estudo, encontra-se sob forma de terraço isolado de superfície plana, em altitudes superiores aos do depósito lagunar adjacente. Do ponto de vista sedimentológico, está composto por sedimentos mal selecionados de granulometria areno-siltosa com coloração acinzentada e quantidades significativas de matéria orgânica. A gênese deste depósito está relacionada à influência fluvial sobre um depósito lagunar progressivamente colmatado durante o Holoceno, influência essa intensificada durante época de cheias (LIVI & HORN FILHO, 2010). O Depósito paludial, aflorante em pequena porção na localidade, encontra-se próximo à desembocadura de rios e está associado aos manguezais. Apresenta feições de planície de maré, e quando representado por turfeiras, apresenta feições de terraço. Está caracterizado por apresentar textura fina, podendo ocorrer à presença de sedimentos mais grossos. São ricos em matéria orgânica, o que lhes confere coloração e odor característicos e apresentam, ocasionalmente, biodetritos. O Depósito marinho praial subatual em forma de cordões arenosos regressivos litorâneos, representa uma área de 4 km² na área de estudo e apresenta uma planície de cordões arenosos regressivos em forma de meia-lua, seguindo a linha de costa do embaimento da Praia da Pinheira com presença de dunas frontais. Conforme Santos (2015) os sedimentos marinhos praiais em forma de planície de cordões regressivos apresentam alinhamento de cordões paralelos à linha de costa atual. Ocorrem na forma de terraços, comumente, recobertos pelos depósitos eólicos holocênicos, sendo constituído por areias claras, de granulometria areia média a fina, moderadamente selecionada nos cordões e, por sedimentos areno-siltosos enriquecidos por matéria orgânica nas cavas. Isto proporciona uma paisagem em que na crista dos cordões o acúmulo de água e matéria orgânica seja mínimo, e a vegetação que se desenvolve nessas áreas, a barlavento e a sotavento, seja arbustiva, já nas regiões da cava entre as cristas - o acúmulo de matéria orgânica é maior, formando ambientes praticamente pantanosos nos quais apenas vegetação herbácea se desenvolve. De acordo com Bitencourt (2016) os cordões litorâneos regressivos podem ser de dois tipos: do tipo praia (beach ridges) e do tipo duna frontal (foredune ridges).

Figura 1

Localização da área de estudo

Figura 2

Mapa Geológico-geomorfológico da Praia da Pinheira e entorno (SC).

Figura 3 a, b e c



Considerações Finais

A planície costeira de Santa Catarina possui elevada importância socioambiental, tanto pela quantidade de recursos naturais que a mesma possui quanto pelo efetivo populacional que utiliza esses recursos. Essas características justificam a necessidade de conhecimento dessa unidade, dos seus ecossistemas e da base física que a sustenta, com destaque para suas características geológicas e geomorfológicas (HORN FILHO, N.O. et al, 2014). O presente trabalho apresentou uma diversidade de ambientes costeiros geológicos e geomorfológicos na localidade da Praia do Sonho, Praia da Pinheira e Guarda do Embaú. Também se entende que a área estudada, por ser bastante representativa em termos de ambientes deposicionais e sistemas litorâneos, em geral é uma área interessante do ponto de vista acadêmico, principalmente pela feição quase integralmente preservada dos cordões arenosos regressivos litorâneos, relíquia do período de transgressão e regressão marinha, o qual pode ter testemunhos importantes para pesquisas neste tema. Por outro lado, a região do Maciambú vem sofrendo profundas modificações em sua gestão territorial, mediante o processo de desafetação do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro ocorrida em 2009 e sua inserção da APA do Entorno Costeiro, caracterizando um prejuízo a conservação dos recursos naturais dessa região por ser a categoria APA extremamente permissiva em relação a ocupação e uso do solo.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) pela oportunidade de realização desse estudo, ao Programa de Pós-graduação em Geografia e aos professores da disciplina pela dedicação e ensinamentos.

Referências

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