Autores
Cheliz, P.M. (UNICAMP) ; Oliveira, R. (UNICAMP)
Resumo
Buscamos aqui apresentar contribuição referente a delimitação e caracterização dos subcompartimentos de relevo da Ilha do Cardoso (Litoral Sul de São Paulo). São apresentados subcompartimentos vinculados aos compartimentos das Serranias e das Planícies Diversificadas da referida Ilha, enfatizando-se interface entre condições morfodinâmicas predominantes, atributos litológicos e padrões morfométricos na delimitação dos referidos subcompartimentos.
Palavras chaves
compartimentação do relevo; litoral sul de são paulo; ilha do cardoso
Introdução
Os padrões geomórficos da Ilha do Cardoso pautam-se como discrepantes no setor da costa (Litoral Sul Paulista) que situa-se. Apresenta-se como ilha continental com predomínio de escarpas rochosas no segmento costeiro do Complexo Lagunar Cananéia-Iguapé (Besnard, 1950), pautado por interiorização e distanciamento da linha de costa dos principais alinhamentos serranos litorâneos, e prevalência de planícies areno-argilosas rentes ao oceano e laguna. Sua localização de exceção realça a Ilha diante de vários enfoques possíveis dentro da Geomorfologia Costeira, inclusive no contexto dos estudos de compartimentação e subcompartimentação do relevo. Diante deste quadro presente trabalho buscou realizar estudo geomórfológico da Ilha do Cardoso em escala 1:50.000 dialogando com a proposta tríade de Ab’Saber (1969) objetivando fornecer contribuições para compartimentação do relevo local . Acredita-se que a despeito da área total relativamente diminuta – cerca de 150 quilômetros quadrados - os quadros de relevo da Ilha são suficientemente variados para justificar um estudo morfológico de semi-detalhe como o aqui proposto, centrado na interface com o primeiro nível da proposta tripartide elencada, a compartimentação da paisagem.
Material e métodos
Foram preparadas como etapa preliminar cartas bases em ambiente SIG para subsidiar criação de mapas morfométricos (altimétria e clinografia) tendo como balizadores cartas de satélite Landsat, fotografias aéreas e mapeamento topográfico do IBGE de 1972 conforme procedimentos sugeridos por Gigliote (2010). Trabalhos de mapeamento em campo foram realizados para balizar cartas digitais e para revisão das cartas litológicas pré-existentes, incluindo procedimentos convencionais para mapeamento geológico (Lilse, 2010) e coleta de amostras de rochas e sedimentos para posterior análise laboratorial por meio de petrografia ótica com foco caracterizar variações mineralógicas e texturais das rochas que pudessem ter importância na sua compreensão como fatores do modelado do relevo (Dorr, 1969 e Almeida, 1968 e 1970). Sobreposição do conjunto das cartas previamente elaboradas ponderada pelas observações de campo foi empreendida para delimitação dos compartimentos de relevo da Ilha – com delimitação de unidades próximas ao que seria considerados formas referentes as quarta e quinta ordem de grandezas de Cailleux e Tricart (1956) e de Mescerjakov (1968), ou ao terceiro táxon de cartografia morfológica de Ross (1992). Deu-se ênfase na delimitação também a critérios morfodinâmicos predominantes, próximo sobretudo a concepção de Tricart (1977) referente a fluxos de energia e matéria.
Resultado e discussão
Referente as Serranias, pudemos delimitar os seguintes subcompartimentos de
relevo:-Baixas Vertentes (20-120m): próximos aos sopés das Serranias as
declividades das vertentes das Serranias mostram-se relativamente reduzidas.
Dificilmente inclinações ali superam 20 graus, tanto nos segmentos norte
quanto sul. As distâncias entre os interflúvios permanecem com valores
relativamente reduzidos, raramente excedendo algumas centenas de metros.
Fundos de vales assumem declividades próximas do aplainamento, com
inclinações dificilmente acima de 5 graus. Desníveis verticais locais também
pautam-se modestos, raramente excedendo uma centena de metros. Estes
atributos gerais apresentam diferenciações em relação aos valores absolutos
em diferentes setores da Ilha, sobretudo ao considerarmos a sobreposição a
diferentes combinações de unidades litológicas .
Dialogando com os esquemas de Tricart (1977), as Baixas Vertentes inseridas
no contexto geral das Serranias da Ilha poderiam apresentar-se como áreas
receptoras de fluxos de matéria e energia – com dinâmica de sedimentação
predominando sobre as de erosão.
Antes da conversão da Ilha em Unidade de Conservação, era um dos
subcompartimento de relevo preferencial para ocupação dos agricultores
sitiantes ilíadas. Presença de solos relativamente mais férteis que das
planícies, declividades e altimetrias reduzidas quando comparada aos outros
subcompartimentos serranos, e rios navegáveis apresentam-se como alguns dos
fatores para justificar tal opção.
-Médias Vertentes (120-400m): ao considerarmos segmentos das Serranias
pautados pelas Médias Vertentes a distância entre interflúvios amplia-se,
podendo atingir a ordem das milhares de metros. Também recebem incrementos
as inclinações médias das vertentes, que oscilam entre 20 e 40 graus.
Distância vertical entre o topo dos interflúvios e as sendas mais profundas
limitadas por eles passa a abranger a ordem das centenas de metros,
pautando-se por vales profundos e de fundos estreitos. As calhas dos vales
apresentam também declividades mais significativas, quebrando o padrão de
vales de fundos planos antes prevalecentes. Registram-se valores de
inclinações predominantes entre 5 e 15 graus para os canais fluviais das
Médias Vertentes.
Como nas Baixas Vertentes, esta descrição de caráter geral apresenta
oscilações nos valores absolutos das combinações de distâncias entre os
interflúvios e das declividades das vertentes, com parcial correlação com as
oscilações das unidades litológicas da Ilha (ver figuras 3 e 4). Referente
aos esquemas de fluxos de energia previamente citados (Tricart, 1977 ),
Médias Vertentes podem ser interpretados como unidades transmissoras – sem
predomínio claro da dinâmica de sedimentação ou erosão. Longamente foram
usados nos segmentos limitrófes com baixas vertentes para geração de energia
com instalação de rodas e moinhos de água pelos agricultores do passado, que
aproveitavam a maior declividade das calhas de seus rios.
-Altas Vertentes e Interflúvios Elevados (400-720): mostram-se como
vertentes de altas declividades margeando canais fluviais, que correm em
leitos rochosos desnudos de inclinações que podem superar 50 graus. As
mesmas vertentes mostram-se seccionadas por canais secundários que lhes
impõe entalhes semiverticais. A montante de suas cabeceiras prevalecem
esporões salientes do tipo “Dedo de Deus” ou cumeadas em crista. Nota-se
também a presença de anfiteatros de erosão nas cabeceiras, com drenagem se
ramificando. Sobretudo no segmento sul das Serranias nota-se que paralelo
aos auréolos de maior extensão das cabeceiras surgem outros secundários, de
menor área de captação e ligados aos canais nodais por estreitos vales a
eles perpendiculares.
Morros Mamemolizados (0-30m): envolvem porções do substrato rochoso que
salientam-se e emergem em meio as Planícies que bordejam as Serranias. Sua
dimensão em área vária de algumas centenas de metros quadrados para os mais
discretos como o Morro do Pereirinha a ordem de alguns quilômetros quadrados
no caso dos maiores, como no Morro do Marujá. Ocorrem tanto associados a
conjunto de Granitos Diversificados quanto as Rochas Metamórficas
Miscigenadas. Situados predominantemente adjacentes a linha de costa, são
pautados por assimetria das vertentes. Aqueles situados em áreas sob ação
morfodinâmica mais enérgica do mar e laguna apresentam vertentes de
declividades próximas da vertical voltada para águas circundantes. Nas
vertentes opostas a linha de costa, assumem declividades que oscilam entre
15 e 30 graus e caráter mamemolizado. Os de maiores extensões chegam a
conseguir reter águas o suficiente para sustentar pequenas nascentes,
capazes de suportarem córregos perenes de água corrente. Alguns dos maiores
pautam-se por serem seccionados por vales fluviais similares aos registrados
nas Baixas Vertentes voltadas tanto para águas circundantes como para as
próprias Planícies Costeiras.
Referente as Planícies Diversificadas, foram delimitados os seguinte
subcompartimentos: - Planícies Alagáveis(0-1m) : mostram-se como extensões
semiaplainadas rentes aos níveis marinhos. Altimétricamente, permanecem
elevada rentes as águas circundantes ou apenas assumindo dimensão
decimétrica ou métrica acima do nível dela. Encontra-se superimpostas por
coberturas argilosas pautadas por alto conteúdo de matéria orgânica e a
associações vegetais de manguezais. Cabe recordar porém que embora a origem
das Planícies Alagáveis seja ligada a condições morfodinâmicas relativamente
plácidas (Souza, 2012), tal apontamento não necessariamente significa que
sua presença significa que sejam essas as condições dominantes no momento
atual. Nas áreas de progradação haveria menor hidrodinamismo, deposição
gradual de sedimentos e o manguezal apresenta-se em “construção”, com
vegetação de mangue adentrando e fixando sedimentos recém-depositados. Nas
áreas de predomínio de retrogradação, haveria maior hidrodinamismo e
ausência de colonização da vegetação.
- Planícies Costeiras(0-4m): associam-se a depósitos sedimentares arenosos
que se distribuem a retaguarda da linha de praias em expressivos segmentos
da Ilha. Concentram-se sobretudo no nordeste entre o Morro do Pereirinha e o
Costão do Itacuruça e no Sudoeste entre o Morro do Marujá e a Barra do
Pontal (ver fotos 19 e 20). No nordeste mostram-se contidos entre as cotas
altimétricas 0,5 e 5 metros, apresentando-se na forma de terraços marinhos e
flúvio-marinhos de declividade dificilmente superior a 3 graus recobertos
por restingas abertas. No sudeste podem chegar a atingir altimetrias
próximas a 10 metros, envolvendo associação de dunas, cordões, depressões
intercordões e terraços.
A despeito de certa heterogeneidade morfométrica dentre as feições
associadas a Planícies Costeiras, os seus conjuntos de associações de formas
de relevo foram no presente estudo agrupados num mesmo subcompartimento
geomorfológico. Escolha se deu sobretudo pelas semelhanças no que se refere
a aspectos essenciais enfocados pelo presente trabalho, em especial as
condições morfodinâmicas as quais estão expostas. Estariam acima da linha de
ação das marés mas abaixo da linha de tempestade. Seriam próximos ao que
Tricart (1969) designa de primeiro nível de terraços, o conjunto de terraços
mais proximais a orla litorânea. Apresentam altimetria crescente no sentido
de distanciamento da linha de costa.
- Planícies Litorâneas(4-20m): mostram-se predominantemente a montante das
Planícies Costeiras, cujo anteparo as resguarda da ação direta da mais
agressiva dinâmica marinha. Encontram sua maior expressão no segmento norte
da Ilha, onde apresentam trechos com continuidade em área proximais a 20
quilômetros quadrados. Também ocorrem em caráter fragmentado em segmentos do
sul da Ilha, especialmente nas margens convexas diante do Canal de Ararapira
e a retaguarda das pocket beachs que marcam o segmento sudeste da Ilha
Considerações Finais
Com o conjunto e a interação entre os levantamentos de campo, análise de imagens de sensoriamento remoto e produção de material cartográfico sintético, espera-se ter se alcançado traçar quadro geral da compartimentação e subcompartimentação do relevo da Ilha do Cardoso. Procurou-se discutir atributos morfométricos, distribuição e direções do contorno dos compartimentos de relevo elencados a luz da interface dos diferentes processos exôgenos aos quais encontram-se submetidos e atributos de sua caracterização litológica e das condições morfodinâmicas predominante. Verificamos que extensão areal dos subcompartimentos serranos apresenta correlação com oscilações nas condições morfodinâmicas predominantes referente ao papel na recepção, transmissão e recepção de energia nas Serranias e ao distanciamento vertical do topo das Serras e de seus sopés , com associações possíveis com variações significativas em atributos como variações verticais dos vales e extensões em plantas entre os interflúvios. Sendo que tais variações correlatas a variações das condições morfodinâmicas dos subcompartimentos serranos apresentavam valores absolutas ao serem superimpostas a diferentes litologias, mas manifestando uma variação relativa similar. Referente aos subcompartimentos serranos, a variação da intensidade e frequência da ação morfodinâmica marinha direta mostrou-se principal fator aparente a marcar distribuição areal dos subcompartimentos.
Agradecimentos
Agradecimentos a CAPES pelo fornecimento de bolsa de mestrado para possibilitar a presente pesquisa. Agradecimentos ao Instituto e Fundação Florestal pela autorização para as atividades de mapeamento na Ilha do Cardoso. Agradecimento aos moradores, trabalhadores e direção do Parque Estadual da Ilha do Cardoso (PEIC) pelo apoio as atividades de campo.
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