Autores

Borges de Oliveira, R. (UFG) ; Godinho Vespucci, A. (UFG) ; Rodrigues da Silva, V. (UFG)

Resumo

O município de Inhumas destaca-se no estado de Goiás como um polo produtor de cana-de-açúcar, entretanto tal atividade tem condicionado o surgimento de processos erosivos. Nesse sentido, o presente trabalho objetivou analisar a vulnerabilidade à perda de solo do município, a fim de fornecer subsídios orientadores para o planejamento e gestão territorial visando compatibilizar as atividades antrópicas com as potencialidades e limitações da paisagem. Para tanto, utilizou-se a metodologia de Crepani et al. (2001) apoiada em ferramentas de geoprocessamento. Foram identificados três estágios de evolução morfodinâmica, qualificados como moderadamente estável/vulnerável, moderadamente vulnerável e vulnerável. Os resultados indicaram o predomínio de áreas em estágio de equilíbrio, todavia não minimizam a necessidade da adoção de práticas conservacionistas no manejo do uso da terra, principalmente em localidades com ocorrência de Argissolos.

Palavras chaves

Vulnerabilidade; Erosão; Inhumas

Introdução

O relevo, componente do estrato geográfico que permite a existência do homem como ente biológico e social, possui formas que são dinâmicas e se manifestam de modo diferenciado no tempo e no espaço, em função da troca de energia e matéria deste com os demais componentes (ROSS, 2001). Casseti (1995) destaca o relevo como um recurso natural, que enquanto componente da natureza é apropriado e transformado pela sociedade. Nesse sentido, a interferência da sociedade pode induzir efeitos sobre o relevo e por isso as ações humanas no ambiente deveriam ser precedidas pelo entendimento do ambiente, uma vez que o entendimento do relevo passa pela compreensão da paisagem (ROSS, 2001). Desse modo, ressalta-se a importância da apreensão da paisagem e aplicação deste conhecimento em mecanismos disciplinadores da ação antrópica no meio ambiente, como na gestão territorial. Em Inhumas, município do Estado de Goiás, desde a década de 1990, destaca- se a produção de cana-de-açúcar, entretanto a dinâmica exploratória do solo envolvida nessa produção tem gerado diversos impactos ambientais, como lixiviações e erosões (TEIXEIRA; COUTO, 2013). O município, pertencente à mesorregião do Centro Goiano, distante cerca de 35 km da capital Goiânia (Figura 1), segundo dados do IBGE (2010), possui área de 612,95 km² e uma população de 48.246 pessoas, apresentando PIB per capita acima dos R$ 18.200,00. Apresenta economia considerável dentro da Região Metropolitana de Goiânia (RMG), figurando entre os cincos municípios mais competitivos na borda da capital, tanto pela sua produção de cana-de-açúcar, laranja, banana, tomate e mandioca, quanto por ter boa participação na produção de gado, aves, suínos, leite e ovos (TEIXEIRA, 2013). De acordo com este autor, no município houveram vários ciclos produtivos e diversas formas de uso e ocupação do solo ao longo das décadas, destacando-se o café na década de 1940; a pecuária na década 1970; o alho na década 1980; a laranja na década 1990; e a cana-de-açúcar da década de 1990 chegando até os dias atuais. O mesmo autor ressalta ainda que as lavouras canavieiras vêm avançando sobre áreas de pastagem e áreas onde se poderia produzir outras culturas, contribuindo para consolidação de Inhumas como grande polo açucareiro no estado. Entretanto, a perda de solo decorrente de processos erosivos resultantes de práticas de manejo inadequadas condiciona empobrecimento químico dos solos e baixo retorno socioeconômico da atividade agrícola, além do carreamento de sedimentos para os cursos d’água. A fim de se evitar problemas como estes, Lago et al. (2009) apontam a importância do acesso dos órgãos governamentais ou privados aos mapas de vulnerabilidade à perda de solo. Tais mapas, de acordo com os autores, auxiliam na tomada de decisões à medida que representam a distribuição e intensidade da vulnerabilidade, considerando o estágio de evolução morfodinâmica em relação às respostas da dinâmica de uso e ocupação do solo. Diante do exposto, o objetivo desta pesquisa foi avaliar a vulnerabilidade à perda de solo do município de Inhumas, por meio da metodologia de Crepani et al. (2001).

Material e métodos

O presente trabalho foi fundamentado e adaptado ao modelo de análise de multicritérios desenvolvido por Crepani et al. (2001), empregando a álgebra de mapas com auxílio do software ArcGis 10.4. A metodologia busca avaliar, de forma relativa e empírica, o estágio de evolução morfodinâmica da paisagem com base no conceito de Ecodinâmica de Tricart (1977). Às categorias morfodinâmicas resultantes dos processos de morfogênese ou pedogênese são atribuídos valores de estabilidade, sendo que quando predomina a morfogênese, prevalecem processos erosivos, modificadores do relevo, e quando predomina a pedogênese, prevalecem os processos de formação do solo. Ressalta-se ainda que os valores de estabilidade variam entre 1 e 3, aos quais valores próximos de 1 refletem o predomínio dos processos de pedogênese em situações que tendem a estabilidade, valores ao redor de 2 revelam situações intermediárias em equilíbrio pedogênese/morfogênese, já nas situações em são atribuídos valores próximos de 3 há instabilidade devido ao predomínio da morfogênese. Para tanto, os temas componentes da paisagem Geologia, Geomorfologia, Solos, Vegetação/Uso da terra e Clima (Figura 2) foram analisados conforme a escala de vulnerabilidade à perda de solo; posteriormente, obteve-se um valor final a partir da média aritmética dos valores individuais. Salienta- se que para o tema Geomorfologia a vulnerabilidade foi obtida por meio da média aritmética das vulnerabilidades atribuídas à dissecação do relevo pela drenagem (densidade de drenagem), amplitude altimétrica e declividade, classificados de acordo com as unidades geomorfológicas. Os dados vetoriais de geologia, geomorfologia, solos e vegetação/uso foram adquiridos junto aos portais Sistema Estadual de Geoinformação de Goiás (SIEG) e Visualizador da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais, em escala de 1:250.000. A partir da rede de drenagem do SIEG, em escala de 1:100.000, chegou-se a densidade de drenagem. Os dados raster, utilizados na amplitude altimétrica e declividade, foram obtidos a partir do Modelo Digital de Elevação do satélite ALOS, sensor PALSAR, disponibilizados pela Agência Japonesa de Exploração Aeroespacial (JAXA) por meio do Portal Alaska Satellite Facility (UAF/NASA), com resolução de 12,5m. Os dados pluviométricos também foram disponibilizados pelo SIEG, enfatizando que foram utilizadas médias mensais do mês de janeiro por se considerar que as chuvas desse mês possuem maior expressão erosiva na área. Silva et al (2008) corroboram com essa perspectiva ao observarem que o mês de janeiro é o mais chuvoso da região do Cerrado, onde se insere a área de pesquisa, e Nascimento (2016) assiná-la que o maior índice de erosividade média foi verificado nos meses de dezembro e janeiro, meses representativos do verão, a estação mais chuvosa na região.

Resultado e discussão

Os resultados revelaram 3 classes de vulnerabilidade ambiental, suas características referentes ao meio físico encontram-se descritas no Quadro 1. Tais classes revelam 3 estágios de evolução morfodinâmica: uma mais próxima da estabilidade, relevando-se moderadamente estável/vulnerável, marcada por médias entre 1,7 e 2,2; outra em um estado intermediário, apresentando-se moderadamente vulnerável em decorrência das médias entre 2,2 e 2,6; e outra instável, demonstrando-se vulnerável com médias entre 2,6 e 3,0 (Figura 3). A classe Moderadamente Estável/Vulnerável apresenta uma área com 507,9 km², o que representa 83,51 % de toda a área do município de Inhumas. Localiza- se, principalmente, em áreas dos Planaltos Ocidentais do Divisor Maranhão- Paranaíba e da Superfície de Goiânia. No primeiro encontram-se declives que variam de 3,5 a 27,9%, com uma amplitude altimétrica de 380 metros, tendo uma alta densidade de drenagem, já no segundo observam-se declives de 3,5 a 12,9%, com amplitude altimétrica de 222 metros e baixa densidade de drenagem. A litologia condiciona intensidades variáveis na resistência ao intemperismo. Os Latossolos e Argissolos são predominantes nessa classe. Os Latossolos são solos muito intemperizados, de boa drenagem e profundos, caracterizando-se por grande homogeneidade de características ao longo do perfil, praticamente ausência de minerais primários de fácil intemperização e mineralogia da fração argila (IBGE, 2007). Os Argissolos são caracterizados pelo aumento de argila do horizonte superficial A para o subsuperficial B que é do tipo textural (Bt). Os Latossolos, de modo geral, apresentam reduzida suscetibilidade à erosão, já os Argissolos apresentam maior suscetibilidade em virtude da diferenciação textural e estrutural ao longo do perfil. Com relação a Vegetação e o Uso, há predomínio de Cultura Anual e Floresta Estacional Decidual Submontana, descrito pelo projeto RADAMBRASIL (1983) como “Mato Grosso Goiano”, o que auxilia na infiltração da água nos solos e diminuição do impacto das chuvas. A classe Moderadamente Vulnerável apresenta uma área de 99,02 km², representando 16,28% da área total do município de Inhumas. Predomina na área as formas dos Planaltos Ocidentais do Divisor Maranhão-Paranaíba com declives entre 3,5 e 27,9%, amplitude altimétrica de 380 metros e alta densidade de drenagem. Nas Serras e Superfícies Intermediárias das Altas Bacias do Paranaíba contém declives entre 12,9 e 27,9%, uma amplitude altimétrica de 368 metros e alta densidade de drenagem, já na Superfície de Goiânia se encontram declives entre 3,5 e 12,9%, com amplitude altimétrica de 222 metros e também com alta densidade de drenagem. Nessa classe de vulnerabilidade, observou-se a preponderância do tema Geologia, demonstrando a vulnerabilidade de áreas de associação supracrustais do Complexo Anápolis- Itauçu composta de rochas carbonatadas e de rochas ricas em minerias máficos e de áreas de depósitos aluvionares. Quanto ao tema Vegetação/Uso, predomina na área Moderadamente Vulnerável a Cultura Anual da cana-de-açúcar, havendo ainda fragmentos remanescentes da Floresta Estacional Decidual Submontana, mas em menor proporção se considerada a área Moderadamente Estável/Vulnerável. Nesse sentido, a baixa densidade da cobertura vegetal deixa o solo desprotegido da ação das águas provenientes das precipitações pluviais, que na área apresentam médias entre 269 e 280 mm, no mês considerado como o mais chuvoso. Já a classe Vulnerável apresenta uma área de apenas 1,29 km², representando apenas 0,21% do total da área do município de Inhumas, porém esta é a classe que exige maior atenção, pois é onde se encontra a maior vulnerabilidade ambiental do município. Nesta classe se apresenta o predomínio Superfície de Goiânia com declives entre 3,5 e 12,9% e amplitude altimétrica de 222 metros com baixa densidade de drenagem, e os Planaltos Ocidentais do Divisor Maranhão-Paranaíba, com altos declives de 12,9 e 48,1% que favorecem o escoamento superficial em detrimento da infiltração. Nessa classe, observou- se a preponderância do tema Geologia e Geomorfologia, demonstrando a vulnerabilidade de áreas de depósitos aluvionares existentes na Superfície de Goiânia e de áreas de rochas calcissilicáticas em elevadas declividades dos Planaltos Ocidentais. Nas vertentes côncavas em áreas de dissecação da Superfície de Goiânia, a suscetibilidade à erosão dos Gleissolos é ampliada. Na escala analisada, a Vegetação é praticamente inexistente nessa classe, deixando assim o solo mais exposto, o que se torna mais propício a ação erosiva das chuvas.

Figura 1

Localização do município de Inhumas

Figura 2

Temas avaliados para analisar a vulnerabilidade à perda de solo.

Figura 3

Mapa de vulnerabilidade à perda de solo no município de Inhumas - GO.

Quadro 1

Características das classes de vulnerabilidade do município de Inhumas.

Considerações Finais

A partir do mapa de vulnerabilidade natural à erosão do município de Inhumas, em escala de 1:250.000, foi possível identificar áreas mais suscetíveis à atuação de processos morfogenéticos, com destaque para áreas em estágio moderadamente vulnerável e vulnerável, e, portanto, mais vulneráveis à ocupação. Ressalta-se que o predomínio de áreas em estágio de equilíbrio pedogênese/morfogênese não minimiza a necessidade da adoção práticas conservacionistas no manejo do uso da terra, principalmente nas áreas de Argissolo. A visão espacial da distribuição e intensidade da vulnerabilidade, ainda que em escala apropriada a análise regional, constitui importante subsídio preliminar para o planejamento e gestão territorial, mas não dispensa investigações posteriores em escala de detalhe amparadas por trabalhos de campo.

Agradecimentos

Os autores agradecem a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo apoio através da concessão de bolsa de mestrado à primeira autora.

Referências

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