Autores
Guerra, F.C. (UNESP/RIO CLARO) ; Zacharias, A.A. (UNESP/OURINHOS)
Resumo
O presente artigo apresenta alguns indicadores do relevo, a partir do mapeamento das variáveis geomorfométricas – declividade, dissecação horizontal e dissecação vertical - para a análise das influências das vertentes em áreas potencialmente danosas aos processos hidrogeomorfológicos, por alagamentos e enxurradas na área urbana de Ourinhos/SP, uma cidade média que se localiza na porção do Sudoeste do Estado de São Paulo. As razões que influenciaram esta correlação são pelo fato dos riscos hidrológicos, na atualidade, se caracterizarem em um problema, cada vez mais crescente, nas diferentes áreas urbanas das cidades brasileiras. E, segundo que, quando relacionadas às técnicas da representação espacial dos mapeamentos geomorfométricos, sobretudo às cartografias de síntese permitidas por suas variáveis, seus objetos tornam- se importantes indicativos de sustentabilidade na ordenação territorial, uma vez que espacializam as áreas de potencialidades e vulnerabilidades de um dado território.
Palavras chaves
Cartografia Morfométrica; Processos Hidrogeomorfológicos ; Planejamento Ambiental
Introdução
As vertentes representam um dos mais importantes estudos da geomorfologia. Deste então busca-se entender os sistemas morfogenéticos e sua conexão dinâmica entre o interflúvio e o fundo de vale, além de demais processos atuantes como o escoamento que abarca uma serie de mecanismos, principalmente no meio urbano. Nas áreas urbanas os agentes sociais assumem grande importância, principalmente na ocupação intensa e desordenada e a inadequação do sistema de drenagem. Dentre essas modificações geradas na geormorfologia urbana, destaca-se a impermeabilização de grandes áreas devido o elevado grau de urbanização. Deste então, a população das cidades brasileiras vem se tornando cada vez mais afetas por fortes chuvas, e que deflagram movimentos de massa nas encostas e enchentes de proporções alarmantes nas áreas baixas. (GUERRA, 2011). É importante destacar que o caos gerado pelos eventos naturais tem relação direta com o desmatamento das margens dos rios e a diminuição dos ambientes naturais reguladores. Com base em dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB, 2000), realizada pelo IBGE (2002), verificou que a Região Sudeste é a mais afetada, devido à inclusão do maior número de municípios, seguida da Região Sul. Pode-se destacar que os fatores agravantes dos municípios atingidos são devido à obstrução de bueiros, bocas de lobo, obras inadequadas, dimensionamento inadequado do projeto adensamento populacional, interferência física e lençol freático alto. Além da insuficiência das atividades de manutenção podendo ser mencionadas os serviços de limpeza urbana, ausência de coletas de lixo ligadas na maioria das vezes, a ocupações irregulares e de baixa renda, e problemas de erosão, assoreamento e estrangulamento do sistema de drenagem no perímetro urbano, o que implicam a diminuição das seções de vazão e, portanto maiores riscos a ocorrências de inundação. (GUERRA, 2011). Considerando a importância do mapeamento/diagnóstico das áreas com potencial de risco alto e muito alto de inundações e enchentes, além de deslizamentos recorrentes em zonas tropicais, será apresentada uma análise das características morfométricas e morfológicas das bacias de drenagem da área urbana de Ourinhos/SP. A fim de, fazer uma análise mais integrada através das variáveis geomorfológicas, buscando princípios a precaução e preservação nos estudos e ao ordenamento territorial.
Material e métodos
Diante do exposto, este trabalho tem como base a concepção teórica o método de Investigação da Análise Sistêmica da Paisagem, em que combinam a natureza, a economia, a sociedade e a cultura, em um amplo contexto de inúmeras variáveis, as quais buscam representar a relação da natureza como um sistema e dela com o ser humano. Dentre as diversas variáveis geomorfométricas de mensuração do relevo, são apresentadas as cartas de declividade, dissecação horizontal e dissecação vertical, em associação a dados sobre as características físicas, edáficas e geomorfológicas da bacia, permitindo quantificar e tornar possível indicar o grau de suscetibilidade dos terrenos. A carta de declividade proposta por De Biasi (1970), é utilizada em estudos do meio físico e para o planejamento urbano e agrário. Já as cartas de dissecação horizontal e a dissecação vertical, propostas por Spiridonov (1981), avaliam hierarquicamente a potencialidade de suas características para o desenvolvimento de processos morfogenéticos, que mede a profundidade de entalhamento local e avalia o grau de domínio da rede de drenagem considerando os fatores do clima. Para isso utilizou-se a aplicação dos procedimentos metodológicos a partir da Análise Sistêmica, adaptado de Zacharias (2017), relacionados aos mapeamentos geomorfométricos da área urbana de Ourinhos/SP, na escala 1:50.000, viabilizadas pelo Sistema de Informação Geográfica – ArcGis10.2.2, detalhados a seguir. I – Etapa responsável pela realização, organização e revisão de literatura a fim de ter um amadurecimento teórico metodológico sobre os conceitos aqui abordados. II – Etapa responsável pela organização do inventário dos mapeamentos temáticos, os quais consistem em: a) Componentes Naturais (caracterização geomorfométricas): drenagem urbana e curvas de nível, obtidas a partir da carta topográfica de Ourinhos/SP (IBGE, 1973). b) Mapa de Declividade: a partir do Ábaco Principal de De Biasi (1970) e do Ábaco Suplementar de Sanches (1993), foram realizadas correções entre as curvas de nível, interflúvios, topos e crenulações (entre a mesma curva de nível). c) Mapas de Dissecação Horizontal e Dissecação Vertical: foram realizadas as técnicas automáticas de geoprocessamento, desenvolvidas em meio digital, pelo uso do software ARCGIS, por Vidotti et. al (2014, 2015). III – Etapa Analítica, responsável pela análise das unidades geoambientais a partir dos indicadores ambientais, e dos componentes antrópicos, os quais consistem na: a) Identificação das áreas emissoras (topos), áreas transmissoras (vertente), e áreas de acumulação (fundos de vale). b) Caracterização histórico-sócio-econômica, expansão urbana, uso e ocupação do solo. IV – Etapa responsável pelo diagnóstico do estado geoambiental, quanto às variáveis: a) Função socioeconômica. b) Processos Ambientais. c) Riscos Ambientais (alagamentos, enxurradas e inundações, registrados pela defesa civil entre os anos de 2011 a 2016). d) Problemas Ambientais. V – Etapa responsável pelas propostas de manejo. VI – Etapa responsável pela execução do planejamento e gestão ambiental.
Resultado e discussão
Ourinhos é uma cidade de médio porte, localizada na porção sudoeste do
estado de São Paulo, cujo limite territorial equivale a 294 km², sendo
63,93km² correspondentes ao limite urbano. A população estimada em 2017 pelo
IBGE é de 111,813, habitantes. Deste total 97,42% residem na área urbana e
2,58% na área rural.
O município encontra-se delimitado por três rios principais (Paranapanema,
Pardo e Turvo) apresentando consequentemente um forte potencial hídrico em
seu território. Na área urbana encontra-se oito córregos, tributários,
provenientes do rio Paranapanema - Monjolinho, Jacuzinho, Chumbeadinha, Água
das Furnas, Christoni, Água da Veada, Água da Furninha e água do Jacu. A
Tabela 1 indica as extensões da drenagem urbana.
Tabela 1 - Extensão dos Córregos Urbanos de Ourinhos/SP.
Drenagem Urbana Extensão (m) Extensão (Km)
Córrego Monjolinho 3745,99 3,7
Córrego Jacuzinho 6975,84 6,9
Córrego Chumbeadinha 4062,88 4,1
Água das Furnas 7487,01 7,4
Christoni 2693,62 2,6
Água da Veada 2448,08 2,4
Água da Furninha 3301,82 3,3
Água do Jacu 1627,22 1,6
TOTAL 28.596,47 28,5
Organização Guerra, (2017) – Atualizado.
A área de estudo possui pouca variação altimétrica que vai de plana a
levemente ondulada, se intercalando na área urbana entre as altimetrias 390m
a 540m na porção sudeste do município. Já os córregos urbanos estão
localizados entre as declividades de 5 a 10%, ao passo que as regiões
maiores que 450m a 500m de altitude estão em sua maioria nas áreas mais
urbanizadas, com maior adensamento urbano.
Embora Ourinhos possua 86 áreas verdes públicas, sua distribuição é
irregular pela malha urbana, tendo presença efetiva dessas apenas na parte
central e sudeste da cidade, além de setores habitados por populações de
maior poder aquisitivo, e locais particulares mais distantes do centro
(Rodrigues, 2008).
A área de estudo, possui uma “temperatura média do ar igual a 23,1ºC, sendo
os meses com temperaturas mais elevadas em fevereiro e março e os meses com
menores temperaturas junho e julho”. O índice de “precipitação média anual é
de 1405,3mm, os meses mais chuvosos são novembro, dezembro e janeiro (verão)
e os meses menos chuvosos são junho, julho e agosto (inverno)”, conforme
CARFAN, 2011, p. 49; 50.
Os resultados obtidos mostram que a área de estudo se caracteriza por topos
e vertentes amplos e convexos, os quais podem ser diretamente relacionados
com os processos hidrogeomorfológicos na área de estudo (Figura1), compondo
as diferentes configurações da paisagem urbana, quanto à frequência e grau
de intensidade aos riscos por enxurrada, alagamento e inundação.
A Figura 1 tenta sistematizar um conjunto potencial de hazards e de
vulnerabilidade ligados aos processos hidrogeomorfológicos para a área de
estudo. O modo como o ser humano se relaciona com meio, são importantes na
avaliação da vulnerabilidade presente na área de estudo. Já os hazards
manifestam-se com diferentes níveis de intensidade, induzidos ou não pelos
agentes sociais, mas que coloca em risco um conjunto de bens econômicos da
população, capazes de definir diferentes graus de vulnerabilidade.
O mapa de declividade é importante documento que indica a suscetibilidade
dos terrenos ao desenvolvimento de processos geomorfológicos. Sua
declividade está diretamente relacionada ao volume e á velocidade das águas
pluviais que escorrem pelas vertentes, uma vez que a declividade representa
a inclinação ao plano horizontal.
Foi possível constatar que os topos dos interflúvios se caracterizam pela
fraca declividade, situando-se entre < 2% até 5%, declividade recomendada
para ser urbanizada segunda a legislação. Ao passo que as declividades mais
acentuadas, que vão de 20% a 30%, estão associadas aos fundos de vale em
baixas vertentes. Enquanto que aquelas que vão de 5% a 20% são encontradas
nas médias vertentes da área urbana. (ZACHARIAS, 2016, 2010, p. 132).
A partir dos Mapas de Declividade, Dissecação Horizontal e
Dissecação Vertical, e da sobreposição das informações dos dados, uso e
ocupação do solo, e das ocorrências de alagamentos e enxurradas, pode-se
constatar que:
• As declividades superiores a 20%, embora não tenham tanta
predominância, encontram-se mais concentradas a montante dos córregos
urbanos, e a jusante dos córregos no encontro com os Rio Paranapanema e Rio
Pardo.
• As declividades de 5% - 10% e 10% - 20% são predominantemente
identificadas nos fundos de vale e apresentam proeminência com as
ocorrências de riscos mapeadas, principalmente das enxurradas. São encostas
coletoras responsáveis pelo volume de água devido a sua forma, além de serem
intensificadas pela impermeabilização do solo correspondente à intensa
urbanização, bem como pela ocupação irregular nas áreas de preservação
permanente.
• As declividades de 2% - 5% possuem as maiores concentrações dos
registros de alagamentos, principalmente nos interflúvios devido á seus
topos extensos e aplainados, “vertentes com perfis retilíneos a convexos,
vales abertos, planícies aluviais e presença eventual de lagoas perenes ou
intermitentes” [...] (ZACHARIAS, 2006, p. 154).
O mapa de dissecação horizontal, documento cartográfico fundamental para
avaliar o trabalho de dissecação elaborado pelos rios sobre a superfície de
interesse, mostrou que Ourinhos/SP se posiciona em áreas de amplos
interflúvios, com predomínio de extensões que variam de 400 a 800 metros ou
superiores. Esta característica indica que, por não apresentar uma forte
atuação da dinâmica fluvial e, consequentemente, um lento escoamento
superficial, a região pode ficar vulnerável à terrenos alagadiços, em épocas
de intensos indicies pluviométricos, ou seja, forte intemperismo químico
ZACHARIAS (2016, 2010, p. 134).
Ao passo que, o mapa de dissecação vertical, documento de extrema
importância para a identificação de áreas mais susceptíveis a ações
gravitacionais e, portanto, mais frágeis aos processos denotativos, destacou
que o grau de entalhamento da área urbana de Ourinhos/SP, se destaca pelo
predomínio de setores com altitudes relativas, que vão de 20 a 80m, sendo
que, em alguns setores apresentam altitudes relativas superior a 100m.
Resultados que exemplificam uma maior velocidade do fluxo do escoamento
superficial, tendo como princípio que setores com maiores desníveis
altimétricos indicam que o escoamento será mais rápido. (ZACHARIAS, 2006,
2010, p. 234-135).
Um exemplo que pode ser apresentado foi o episódio que ocorreu em setembro
de 2014, durante uma tempestade convectiva, que deixou a cidade em estado de
calamidade pública. Uma das ocorrências foi um movimento de massa em média
vertente, do tipo corrida de terra, tendo como material em movimento o
regolito, causado pela forte enxurrada e enchente do córrego monjolinho,
afetado pela perda de patrimônio, memoria, identidade e vida - moradora do
local.
Essas são algumas reflexões a partir da cartografia morfométrica, repensando
as políticas publicas de sustentabilidade, associadas aos projetos de
infraestrutura urbana, os quais em sua maioria não favorecem a uma gestão
ambiental positiva, o que potencializa as áreas mais vulneráveis.
Organização: Guerra (2017) – Adaptado de Correia R. B. (2011).
Elaboração: Guerra (2017).
Elaboração: Guerra (2017).
Considerações Finais
A partir das análises dos mapas juntamente com a análise das ocorrências, foi possível notar a forte correlação entre as menores e médias declividades e o comprimento das vertentes, indicando os setores susceptíveis a fragilidades do terreno. Conclui-se, que os mapeamentos geomorfométricos, apresentam importantes variáveis para a leitura e entendimento do comportamento da dinâmica da paisagem urbana, totalmente eficazes em trabalhos que envolvem políticas públicas ambientais, voltadas ao ordenamento territorial, como os Planos Diretores Municipais. Especialmente após, as novas políticas ambientais federais – prevista pela Lei nº 12.608/2012 −, que estabelecem como competência do município identificar e incorporar os mapeamentos de vulnerabilidades e, nos em seus planos diretores, a fim de captação de recursos federais e estaduais que promovam a fiscalização dessas áreas para a preservação do patrimônio ambiental urbano. Diante desta realidade, incorporar mapeamentos com diretrizes que visem à proteção e controle ambiental, sobretudo em áreas de: fundo de vale, denso fluxo de mananciais, declividades impróprias, probabilidades de erosão, aumento de permeabilidade do solo, grande potencial para contaminação, intensificação de poluição e formação de ilha de calor, entre outras, minimizando impactos tornam-se, as contribuições prevalentes, em dias atuais, para a gestão pública.
Agradecimentos
Á FAPESP, pela bolsa de mestrado concedida (processo nº 2017/005642 e nº 2014/11832-0) e ao CNPq (processo nº 116232/2016-1) pelos apoios financeiros importantes para a realização desta pesquisa. E também à professora Lupinacci, C. M., e aos colegas Fagundes, A., Stefanuto, E. B., Zanatta, F. A. S., Bernardelli, V. C. pela colaboração e troca de experiências.
Referências
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