Autores

Vital, S.R.O. (UFRN) ; Barreto, A.M.F. (UFPE) ; Salun Filho, W. (IGEOLÓGICO) ; Santos, C.L. (UFPE)

Resumo

No município de João Pessoa-PB e regiões circunvizinhas, ocorrem formas do relevo terrestre que chamam a atenção por serem muito comuns e por apresentarem características típicas de depressões originadas por processos cársticos. Tendo em vista essas características, foram obtidas informações morfométricos, tais como: área, perímetro, amplitude média, elipsidade, simetria interna, relação profundidade/diâmetro e número e subdepressões. Os respectivos dados revelaram que as depressões possuem divisores bastante sinuosos, formas elípticas, grande extensão e pouca profundidade, acarretando em baixos índices de profundidade/diâmetro, indicando uma gênese relacionada à subsidência lenta.

Palavras chaves

Depressões fechadas; Morfomeria; João Pessoa (PB)

Introdução

No município de João Pessoa-PB e regiões circunvizinhas, ocorrem formas de relevo que chamam a atenção por serem muito comuns e por apresentarem características típicas de depressões originadas por processos cársticos, levando em consideração não apenas sua forma, mas o embasamento geológico que é formado por uma cobertura areno-argilosa, onde ocorrem as depressões, e calcários subjacentes, correspondentes à Formação Gramame. Alguns pesquisadores chegaram a tratar dessas feições, especialmente no sítio urbano de João Pessoa, denominando-as como formas resultantes de carste ou pseudocarste (LUMMERTZ, 1997; OLIVEIRA, 2001; MELO et al. 2001; FURRIER, 2007; MARINHO, 2011; ARAÚJO, 2012), porém, em nenhum desses estudos foi realizada uma análise pormenorizada acerca da gênese dessas depressões. Tendo em vista essa questão, é viável a realização de estudos que visem esclarecer suas características geomorfológicas a amplitude do fenômeno e seus possíveis mecanismos genéticos. De acordo com Ferrari et al. (1998), o estudo morfométrico de dolinas é um meio importante para a compreensão dos fatores genéticos envolvidos na elaboração dessas feições, a partir do momento em que a correlação dos parâmetros obtidos aliada à correlação de determinados tipos de processos naturais pode levar ao estabelecimento de modelos de evolução da paisagem. Atualmente, as técnicas para a detecção de feições geomorfológicas tem se desenvolvido em detrimento do surgimento e avanço das técnicas de análise espacial, onde tem sido utilizada os mais variados tipos de ferramentas e produtos. Dentre estes, estão os Modelos Digitais de Elevação (MDE). O uso de Modelos Digitais de elevação para estudos geomorfológicos tem sido uma tendência seguida por diversos autores nos últimos anos (GROHMANN et al., 2008; MAGALHÃES; RODRIGUES, 2010; VITAL et al., 2011; SOUZA; ALMEIDA, 2014; HIRUMA; FERRARI, 2014), dentre outros pesquisadores. Para estudos voltados à detecção de feições de natureza cárstica, poucas foram as iniciativas, a exemplo do trabalho realizado por Oliveira e Maillard (2001), onde a detecção desenvolveu-se a partir da classificação espectral e morfológica de imagens. Outro estudo que merece destaque foi realizado por Hiruma e Ferrari (2014), que tratou justamente do uso de Modelos Digitais de Elevação para a detecção de dolinas. Como justificativa para essa análise, os autores afirmam que as cartas topográficas, embora de detalhe (1:10.000) e semidetalhe (1:50.000), ainda não são capazes de representar adequadamente a complexidade da rede de drenagem e das feições morfológicas típicas de terrenos cársticos. Para isso, foram utilizados dados do SRTM (Shuttle Radar Topographic Mission), os quais foram comparados à dados obtidos por métodos convencionais de fotointerpretação, chegando ao entendimento que os valores morfométricos de área e perímetro obtidos automaticamente a partir do MDE foi muito próximo dos valores obtidos a partir da estereoscopia. Diante desse quadro, o presente estudo tem como objetivo, utilizar o Modelo Digital de Elevação SRTM (Shuttle Radar Topographic Mission) para identificação e mapeamento de depressões fechadas na região de João Pessoa e municípios circunvizinhos, assim como obter parâmetros morfométricos que auxiliem na interpretação genética acerca das mesmas. Localização da área de estudo A área em estudo encontra-se localizada na faixa costeira do estado da Paraíba, Nordeste do Brasil, abrangendo os municípios de João Pessoa, Bayeux, Lucena, Santa Rita e Cabedelo (Figura 1).

Material e métodos

Os dados SRTM foram obtidos gratuitamente na página do Banco de Dados Geomorfométricos do Brasil (TOPODATA) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Inicialmente, foi realizado um processo de extração automática das drenagens e das curvas de nível do terreno, onde foram identificados padrões de drenagem e o traçado dos divisores topográficos das referidas bacias fechadas. As subdepressões foram detectadas a partir da identificação das cotas mínimas do terreno onde foram observadas drenagens com um padrão radial centrípeto, isto é, pontos de convergência do fluxo superficial. A amplitude média foi obtida a partir do cálculo da diferença entre o ponto de elevação máxima e mínima, em metros. Os dados relativos à elipsidade foram extraídos a partir da razão entre o eixo maior e menor das depressões, onde, valores acima de 1 indicam certo grau de elipsidade. A simetria interna, que corresponde à regularidade dos divisores da depressão, foi auferida a partir da relação entre comprimento e largura e entre as partes do eixo longitudinal de cada lado do ponto de menor altitude (produto de simetria), conforme a equação: Ps = R1 x Rw, onde, Ps = produto de simetria, R1 = L1/L2 e Rw = W1/W2, conforme proposto por Williams (1972). Os parâmetros de profundidade/diâmetro (P/D) foram calculados a partir do produto entre a amplitude da depressão e seu eixo médio. O P/D é um índice importante no estudo da gênese de depressões fechadas, pois caracteriza quantitativamente a sua forma em perfil, classificando tipos de perfis íngremes (acima de 1) e suave (abaixo de 1), sendo, em geral, o íngreme característico de processos de colapso e o suave de processos lentos. Os valores de área e perímetro de cada depressão, por sua vez, foram obtidos a partir da medição do limite interpretado, através de um Sistema de Informações Geográficas.

Resultado e discussão

Foram identificadas 7 depressões fechadas, as quais foram confirmadas a partir dos trabalhos de campo, conforme figura 2. Com a extração dos índices morfométricos, percebeu-se que a maioria dessas feições apresentam extensões acima de um quilômetro quadrado e formas bastante assimétricas, elipsoidais, com eixos maiores seguindo direções preferenciais, muito semelhantes aos lineamentos regionais. Suas amplitudes não ultrapassam, em média, 35 metros, salvo alguns casos onde as bacias chegam a alcançar 69 metros. A extração dos valores relativos à área e ao perímetro chegam a, aproximadamente, 2 km e 5 km, respectivamente. Ao relacionar a amplitude e extensão (eixo maior) através do índice profundidade/diâmetro (P/D), percebeu-se que as mesmas apresentam ondulação muito suave, remontando a uma gênese provavelmente ligada à subsidência lenta do terreno. A profundidade/diâmetro apresentou-se, em média, com valores abaixo de 0,05. A simetria, que fornece uma medida da regularidade interna das depressões, diminui à medida que os divisores das depressões se tornam irregulares (WILLIAMS, 1972), o que foi confirmado nas depressões da área em estudo, onde valores acima de 1, caracterizam divisores bastante assimétricos. A morfologia predominante, com uma relação entre profundidade e diâmetro (P/D) muito baixa, caracteriza um relevo dominado por vertentes de inclinação bastante suave e fundo plano. A declividade predominantemente plana e suave ondulada reflete o mergulho estrutural da área, que é de camadas plano-paralelas, com suave inclinação para leste, influenciando também no alinhamento do fluxo geral. A partir do Modelo Digital de Elevação tornou-se possível realizar uma análise de cada uma das depressões detectadas, extraindo valores morfométricos importantes para a elucidação de seus agentes morfogenéticos, conforme exposto na tabela 1. A depressão D1 encontra-se localizada no município de Lucena-PB, onde nota- se claramente, através da imagem do SRTM, a variação de altitude, com uma amplitude de 33 metros e uma área de 1,17 km2. Dentre suas características morfométricas gerais, têm-se um valor de 1,84 de elipsidade, 1,08 de sinuosidade e 0,02 de profundidade/diâmetro, caracterizando uma depressão mais extensa que profunda, originada por processos de subsidência lenta do terreno. A depressão D2, por sua vez, encontra-se localizada no município de Santa Rita-PB, no Distrito de Livramento, apresentando características morfométricas semelhantes à depressão anteriormente citada. Da mesma forma, podem ser consideradas as depressões D3 e D4. Uma particularidade dessas depressões diz respeito ao seu elevado grau de elipsidade, facilmente perceptível no Modelo Digital de Elevação, alcançando valores de até 2,76, demonstrando forte condicionamento estrutural (Figura 2-D2-D4). A depressão D5, que também se encontra localizada no município de Santa Rita-PB, denominada Lagoa Seca de Baixo, apresenta um formato bastante característico, facilmente perceptível em campo. A área total da bacia chega a 2,1 km2 por 30m de amplitude, alcançando uma relação profundidade/diâmetro de 0,016, também, característico de depressões mais extensas que profundas. Esta é uma tendência geral que se repete para todas as depressões analisadas (Figura 2-D5). A depressão D6 apresenta uma particularidade, pois encontra-se localizada em uma zona urbanizada, no centro da cidade de João Pessoa. Isso faz dessa feição, uma das mais importantes do estudo, tendo os riscos inerentes à sua localização. Seus valores morfométricos não se diferem muito das demais, com 2,1 km2 de área por 28m de profundidade, alcançando um P/D igual 0,016 (Figura 2-D6). A depressão D7 se encontra em um contexto semelhante, porém numa área economicamente e estruturalmente menos favorecida, o que potencializa os riscos na região. É a menor dentre as depressões, com 502 m2 por 25m de profundidade, alcançando um P/D igual a 0,03. Esta depressão apresenta uma elipsidade bastante expressiva e orientada, alcançando o valor de 1,60 (Figura 2-D7).

Figura 1

Localização da área em estudo

Figura 2

Mapeamento das depressões fechadas e dolinas na região de João Pessoa (PB)

Figura 3

Depressões analisadas na área em estudo

Considerações Finais

Os dados do SRTM se revelaram bastante eficientes na identificação de depressões fechadas, uma vez que permitiu a extração das drenagens e das curvas de nível com certo grau de detalhe. O levantamento sistemático referente aos atributos morfométricos das depressões permitiu identificar características importantes, tais como: canais de diferentes ordens, variações de profundidade e extensão, grau de sinuosidade e elipsidade dos divisores, dentre outras informações. Dessa forma, recomenda-se o uso de Modelos Digitais de Elevação para estudos de identificação de morfologias dessa natureza em grandes áreas, uma vez que o uso de fotografias aéreas seria um recurso dispendioso e, até certo ponto, inviável, tendo em vista a extensão de determinadas áreas.

Agradecimentos

Agradeço à CAPES pela concessão da bolsa de estudos e ao Programa de Pós- Graduação em Geociências da UFPE.

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