Autores
Lima, A.P.M. (PUC-RIO) ; Pinto, R.W.P. (PUC-RIO) ; Freitas, M.M. (PUC-RIO)
Resumo
As voçorocas são feições resultantes de processos erosivos em subsuperfície que marcam parte da paisagem do Vale do paraíba. Acredita-se que a incisão fluvial seja o motor de maior influência que o uso do solo nessa configuração. Para o estudo da distribuição espacial das voçorocas e seus possíveis condicionantes (no Vale do Paraíba), tem sido realizado um mapeamento das mesmas fazendo uso do Google Earth (para identificação da UTM) e Arc Gis 10.2 (para conversão de kml para shape e produção do mapa). O mapeamento inicial, apresentado aqui, compreende três sub bacias do entorno de Barra do Piraí, e através dele podemos identificar que há uma variação no alinhamento das voçorocas, havendo a predominância no sentido nordeste. O número significativo de voçorocas, próximas a calha principal do Rio Paraíba do Sul e seus lineamentos de direção predominante nordeste, mostra evidencias de que esse processo pode estar intimamente associado a litologia do local e a evolução da rede de drenagem.
Palavras chaves
Voçorocas; Vale do Paraíba; Transformação da Paisagem
Introdução
As voçorocas são resultado de processos erosivos em subsuperfície. Os fluxos subsuperficiais podem formar dutos (pipes), cujas paredes são erodidas pela passagem de água (Guerra, 2011). A intensificação desse processo gera o rompimento desses dutos, levando a formação das voçorocas. Entre os fatores associados ao processo de voçorocamento estão: a susceptibilidade erosiva dos solos, o uso do solo, erosividade da chuva, presença ou ausência de cobertura vegetal e características da encosta (Guerra e Botelho, 2006; Guerra, 2011). São esses fatores, que associados tornam certas áreas mais suscetíveis aos processos erosivos que outras. Outros fatores como: tipo de solo, a porosidade e granulometria determinam o volume de escoamento das chuvas, sua distribuição temporal e as descargas máximas em superfície e subsuperfície (Coelho Neto,2011) e essenciais para compreender o processo de voçorocamento, que está associado ao comportamento hídrico em subsuperfície. Nas faces de exfiltração (retorno de água subsuperficial a superfície) há um trabalho erosivo que pode conduzir a formação de canais e vales, levando até mesmo a expansão da rede de drenagem (Dune, 1980). As pesquisas de Coelho Neto et. al, (1988), Coelho Neto e Fernandes (1990) e Avelar e Coelho Neto (1992) no vale do Paraíba do Sul indicam que os mecanismos de erosão subsuperficial exercem grande influência na evolução do relevo nessa região. Meis e Moura (1984) propõem um modelo de evolução de encostas onde os níveis de base locais se destacam nas feições da topografia e sequencia deposicional. As variações do nível de base, sobretudo no holoceno, impulsionaram variações no direcionamento e intensidade nos processos erosivos. Moura e Mello (1991) reconheceram um evento de destaque no holoceno (evento manso), caracterizado pelo encaixamento da drenagem, onde houve um intenso processo de voçorocamento de significativa expressão na região do vale do Paraíba. Moura & Silva (1998) afirmam que notoriamente essa paisagem se reajustou. Freitas (2007) retoma a evolução da paisagem geomorfológica no Vale do Paraíba apontando os eventos tectônicos responsáveis pela formação da plataforma continental. Destacam-se os eventos de abertura do oceano Atlântico entre 150 e 120 Ma e sua atividade até 60 Ma, que foram responsáveis pelo reordenamento da rede de drenagem que se deu a partir do rebaixamento dos níveis de base, pois antes da abertura do oceano essas bacias drenavam para a bacia do Paraná (Ricominni et al., 2010; Cherem et al., 2012). Somado a este processo há o trabalho erosivo que perdura até hoje e é manifestado nos processos de captura e voçorocamento. Freitas (2007) aponta que “sob o mesmo histórico de ocupação os vales dessa região apresentam comportamento diferenciado quanto ao processo erosivo tendo relação direta com os níveis de base locais”. Questiona-se, então, até que ponto o uso do solo é determinante no processo de voçorocamento, pois mostram-se evidencias de que os maiores determinantes sejam naturais, vinculados ao lineamento e sua resposta ao pulso erosivo dos níveis de base locais. Ha também uma grande influência de estruturas geológicas no desencadeamento de processos erosivos incisos, facilitando o escoamento subsuperficial. Avelar & Coelho Netto (1992) e Coelho Netto (2003) verificaram que as voçorocas nos eixos das concavidades apresentam relação com a direção das fraturas nas rochas do substrato, pois as fraturas funcionam como condutores hidráulicos facilitando a penetração dos fluxos subsuperficiais. Desta forma o presente estudo tem por objetivo apontar um mapeamento inicial do Vale do Paraíba, no entorno de Barra do Piraí (RJ), buscando identificar a distribuição espacial das voçorocas e o alinhamento em que se encontram. A partir dessa configuração espacial busca-se analisar os processos que influenciaram sua formação e o papel do voçorocamento na configuração desta paisagem.
Material e métodos
Foi realizado o levantamento bibliográfico sobre o processo de voçorocamento, sobretudo no Vale do Paraíba, a fim de compreender os fatores associados a formação de voçorocas e o seu papel no processo de evolução do relevo. Para o mapeamento inicial das voçorocas no Vale do Paraíba foram delimitadas sub-bacias do médio vale do Paraíba do Sul. Foi utilizado o programa Google Earth para identificação das voçorocas e o levantamento das coordenadas geográficas das mesmas. O programa também foi utilizado para a marcação do eixo das voçorocas e identificação do alinhamento do processo de voçorocamento na área de estudo. A partir dos pontos e linhas marcados, foi feita a conversão desses arquivos para KML. Com os arquivos em KML foi realizada a conversão dos mesmos para shapefile no software Arc Gis 10.1. Foi, então, elaborado o mapa da distribuição das voçorocas associado aos limites de bacia neste software. Com o alinhamento das voçorocas em KML foi feita a conversão para shapefile, onde foram extraídos os valores de azimute através da ferramenta Cogo. Os valores obtidos, foram tratados e analisados no programa Stereonet, onde foi elaborada uma roseta com o direcionamento do alinhamento das voçorocas identificadas. Por fim, os dados foram analisados e relacionados com a bibliografia levantada sobre o tema.
Resultado e discussão
Barra do Piraí é um município localizado no sul do estado do Rio de Janeiro.
Este município está dividido em 5 distritos, sendo eles: Barra do Piraí,
Dorândia, São José do Turvo, Vargem Alegre e Ipiabas. A população de Barra
do Piraí é cerca de 94.800 habitantes, sendo a maioria de área urbana.
Apenas 3% da população vive em área rural (Martins, 2014).
As três sub bacias analisadas se localizam no limite de Barra do Piraí com o
município de Vassouras. Estas bacias tem a maior parte de solo exposto e uma
pequena parte de cobertura florestal. A maioria das voçorocas desta área se
encontram em trechos de interseção entre a área florestal e área de solo
exposto, e nas áreas de média declividade.
No mapeamento de voçorocas na área de estudo foram identificadas 72, sendo
4 voçorocas provocada por cortes de estrada e 68 voçorocas aparentemente de
ordem natural. Esses números indicam elevada ocorrência de voçorocamento na
área. Importante ressaltar que estas voçorocas encontram-se nos
compartimentos mais rebaixados próximos a calha principal do Rio Paraíba do
Sul, onde o nível de base mais baixo, define a dissecação destes trechos do
baixo curso das bacias afluentes. Para os trechos das bacias em
compartimentos suspensos por níveis de base locais a ocorrência de voçorocas
é quase nula. Quanto a orientação destas feições incisas, os lineamentos dos
eixos das voçorocas indicam uma variação de suas direções, havendo
predominância na direção nordeste. Buscou-se então, um entendimento das
bases geológicas locais, a fim de compreender os processos de erosão
diferencial que os litotipos da área apresentam aos processos erosivos e
intempérico na evolução do relevo. Além disso, as zonas de fraqueza das
rochas como fraturas, falhas, foliação/ e bandamento composicional estão
entre os condicionantes geológicos analisados, cujas influências de origem
associada a processos geológicos e geomorfológicos que atuaram no passado,
podem ainda estar atuando (Fernandes e Amaral, 2012).
A roseta abaixo indica a direção do lineamento das voçorocas. Como pode
ser observado, boa parte das voçorocas ocorrem na direção NE. Além disso,
podem ser observadas quantidades representativas nos eixo E-W. Heilbron et
al., (2007) aponta que o mergulho das camadas das rochas da região se dá na
direção NW, com strike para NE. Ou seja, as voçorocas têm ocorrido em
associação a estrutura geológica. De acordo com o mapeamento realizado por
Heibron et al. (2007) na folha Barra do Piraí, os litotipos reconhecidos
estão associados à gnaisses aluminosos bandados da Unidade Silimanite
Gnaisse bandado e granitos, granodioritos e quartzo diorito do Complexo
Quirino. Segundo Viero (2004), os processos geológicos de formação
litológica exercem um importante papel no desenvolvimento das voçorocas
sobretudo nos lineamentos, que potencializam a erosão e intemperismo (Viero,
2004).
A concentração de voçorocas nesta área indica a ação de uma frente erosiva
atuante. O rebaixamento dos níveis de base tem impulsionado o recuo das
encostas, gerando acumulo de sedimentos. Neste sentido, muitas cabeceiras e
reentrâncias foram preenchidos por pacotes de sedimentos, e atualmente essas
unidades têm sido atingidas pelo processo de voçorocamento, como apontam
Moura & Silva (1998).
O mapa mostra a distribuição espacial das voçorocas identificadas e sua relação com a rede de drenagem e a declividade da área estudada
A roseta indica as direções do lineamento das voçorocas estudadas.
Considerações Finais
A evolução das voçorocas e sua distribuição espacial pode nos ajudar a entender o processo de evolução da paisagem, pois elas podem indicar onde está o pulso erosivo e indicar evidenciais de onde esse processo está ativo e onde ele está mais estabilizado. O mapeamento inicial tem indicado como o voçorocamento é intenso na área de Barra do Piraí, mostrando-se um processo relevante na evolução geomorfológica desta paisagem. Sob o mesmo uso do solo há diferentes processo de voçorocamento. Com isso, acredita-se que os condicionantes geológicos, a litoestrutrura de cada ponto seja o fator de maior peso nesse processo. O lineamento do eixo da maioria das voçorocas está orientado para nordeste, acompanhando o alinhamento da faixa móvel ribeira, o que ratifica a hipótese acima. Ressaltamos que os resultados são ainda iniciais, sendo necessários outros estudos para melhores constatações que permitam o embasamento das hipóteses colocadas ou que as refutem. Outros dados têm sido levantados a fim de enriquecer a pesquisa e complementá-la sobre outras perspectivas.
Agradecimentos
Agradecemos a PUC Rio pelo auxílio a pesquisa, em especial ao grupo Morfotektos onde a pesquisa tem sido desenvolvida e discutida, sobretudo a graduanda em Geografia Raphaela Almeida pelo auxílio na elaboração do mapa aqui apresentado. Também agradecemos a Capes pelo financiamento a pesquisa.
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