Autores
Coelho Nepomoceno Junior, J. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO OESTE DA BAHIA) ; Costa Lima, L. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO OESTE DA BAHIA) ; Barbosa dos Santos, G. (Universidade Federal do Oeste da Bahia)
Resumo
O Patrimônio Pedogeomorfológico é considerado como conjunto de feições geomorfológicas e pedológicas, resultantes da interação entre elementos bióticos e abióticos responsáveis pela esculturação da paisagem. Adotou-se como categoria de análise a bacia hidrográfica do rio de Ondas situada no oeste da Bahia, inserida na unidade geotectônica do Cráton do São Francisco, que reúne particularidades sobre a evolução geohistórica e de ocupação recente. Neste trabalho objetivou-se realizar o levantamento e organização de bases cartográficas que permitam a escolha de geossítios de interesse didático científico. Foram compiladas informações geomorfométricas do projeto Topodata/INPE, geológicas da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, e pedológicas da Secretaria Estadual de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. A partir da análise dos mapas temáticos foi possível identificar doze pontos de interesse relacionados à diversidade de formas e processos morfogenéticos e pedogenéticos.
Palavras chaves
Patrimônio Pedogeomorfológico; Bacia do rio de Ondas; Mapeamento
Introdução
A bacia hidrográfica do rio de Ondas está localizada no oeste da Bahia abrangendo parte dos municípios de Barreiras e Luís Eduardo Magalhães representando um importante manancial para a região (Figura 1). A geodiversidade desta bacia possui elementos que representam boa parte da evolução da história geológica do oeste baiano. Segundo Brilha (2005) o termo mais difundido para Geodiversidade é o adotado pela Royal Society for Nature Conservation do Reino Unido: “Consiste na variedade de ambientes geológicos, fenômenos e processos ativos que dão origem a paisagens, rochas, minerais, fósseis, solos e outros depósitos superficiais que são suporte para a vida na Terra”. Os parâmetros regidos para a proteção e conservação da geodiversidade mais difundidos são os propostos por Gray (2004) e consistem nos valores intrínseco, cultural, estético, econômico, funcional, científico, e educativo da geodiversidade. Assim, a necessidade de conservar um geossítio é igual à soma do seu valor mais as ameaças que o mesmo enfrenta, para tanto, adota-se uma sequência de etapas que visa sistematizar as tarefas no âmbito da conservação do Patrimônio Geológico de uma área, as quais são: invetariação, quantificação, classificação, conservação, valorização, divulgação e por fim monitoramento (BRILHA, 2005). Esta bacia hidrográfica encontra-se geologicamente inserida sobre a porção ocidental do Cráton São Francisco, no domínio morfoestrutural da Bacia Sedimentar do São Francisco. Sua composição litológica abrange desde unidades pelito- carbonáticas do Grupo Bambuí do neoproterozoico, arenitos e conglomerados cretáceos do Grupo Urucuia e coberturas cenozóicas inconsolidadas (EGYDIO- SILVA,1987). O contexto geomorfológico da bacia do rio de Ondas é compartimentado nas unidades morfoesculturais do Chapadão o do Urucuia, os Planaltos em Patamares bordejando o Chapadão e a Depressão do São Francisco (ALVES, 2011). Segundo a classificação de Köppen, o clima do oeste baiano é caracterizado por apresentar duas estações bem definidas com um verão chuvoso se estendendo de outubro a abril, e um inverno seco que vai de maio a setembro (ALVES, 2011). De acordo com o mapeamento pedológico disponibilizado pela Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI) com escala de 1: 1.000.000, grande parte da bacia é formada pelos Latossolos Vermelho- Amarelos distróficos, que são solos maduros, bastante intemperizados. Próximo às veredas, em áreas alagadas predominam os Gleissolos Háplicos. Por sua vez, os Neossolos se dividem em Neossolos Quartzarênicos com maior ocorrência no relevo plano, além de ser possível encontrá-lo em áreas de veredas; como os Neossolos Litólicos Distróficos, presentes em regiões de relevo suave ondulado. A vegetação na bacia do rio de Ondas é típica do bioma Cerrado, que possui arbustos perenifólios que nas áreas de veredas presentes as margens dos rios é a principal responsável pela manutenção do regime hidrológico da região (TOMASONI, 2008). Estas características influenciaram e influenciam, direta ou indiretamente, os processos de ocupação territorial no oeste baiano. Esta posição a coloca como importante manancial que atende os mais variados segmentos, tais como irrigação agrícola, abastecimento urbano, dessedentação animal, produção de energia, as práticas de turismo e lazer dentre outros (ARAÚJO et al., 2010). E para isso, esta pesquisa tem por objetivo realizar levantamento e organização de bases cartográficas para auxiliar na escolha de locais que tenham potencial para serem geossítios, que segundo Brilha (2005) possam ser bem delimitados geograficamente e que possuam um ou mais elementos da geodiversidade. Neste caso geossítios de interesse geomorfológico, buscando entender a forma e os processos envolvidos nesses compartimentos; e o Pedológico, na construção de seções verticais de diferentes perfis de solo removido do campo e montado para estudos posteriores em laboratório conhecidos como macropedolitos.
Material e métodos
Para auxiliar a escolha dos locais de interesse geomorfológico e pedológico com valor geocientífico foi criado um banco de dados com mapas temáticos georreferenciados. Realizou-se um mosaico de imagens SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) disponibilizadas no site http://www.dsr.inpe.br/topodata/, referente às quadrícula nº 11s465 e 12s465 que abarca a bacia do rio de Ondas, utilizou-se as seguintes extensões das imagens de forma de terreno (FT), altitude (ZN), relevo sombreado (RS) e declividade (SC). Esses dados foram tratados em ambiente de SIG (Software ArcView 10). Com os dados já processados e a delimitação da bacia concluída, foram produzidos os mapas de interesse para esta pesquisa: geomorfológico, hipsométrico, forma das vertentes e declividade. Para o mapa de solos, foram utilizados dados da Secretaria Estadual de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), com escala 1:1.000.000. Os dados litológicos e hidrográficos foram adquiridos na base de dados da CPRM (Serviço Geológico do Brasil) com escala de 1:1.000.000 disponível em http://geobank.cprm.gov.br/. Para a escolha dos pontos para a realização do mapeamento, foi utilizado todo o acervo de mapas temáticos previamente confeccionados. Posteriormente foi realizada a interpretação desses dados em ambiente SIG (Software ArcView 10) realizou-se a sobreposição dos mapas sobre a área de interesse da pesquisa e assim, foram delimitados locais com potencial didático e de melhor logística para o acesso em campo.
Resultado e discussão
A partir dos mapas
confeccionados foi feito uma série de
relações
entre os produtos gerados para se
obter algumas interpretações à cerca
da
área pesquisada.
O mapa de litologia exibe a
disposição das unidades geológicas que
compõe a bacia do rio de Ondas, são
elas: pequeno afloramento de rochas
metapelíticas das formações Riachão
das Neves e Serra da Mamona,
pertencentes ao Grupo Bambuí, a leste
da bacia; os arenitos e conglomerados
cretáceos do Grupo Urucuia que afloram
em praticamente toda área da bacia; e
os Depósitos Aluvionares cenozoicos
que correspondem aos depósitos de
cascalho, areia, silte e argila que
ocorrem nas planícies fluviais (Figura
2a). O mapa de Unidades do Relevo
exibe as unidades que estruturam as
paisagens da Bacia: Depressão do São
Francisco que ocorre a leste da bacia
com altitude entre 450 e 480 metros;
os Planaltos em Patamares entalhados
nas vertentes paralelas aos canais
fluviais principalmente na porção
leste
da bacia com altitude entre 450 e 700
metros; e Chapadão do Urucuia que
abrange a maior área da bacia, com
altitudes entre 700 e 926 metros
(Figura
2b).
O mapa Pedológico evidencia a
abrangência e tipos de solos que
ocorrem na bacia do rio de Ondas. O
Latossolo vermelho-amarelo distrófico
ocorre na maior parte da área da bacia
por estar muito associado às regiões
planas do Chapadão do Urucuia. Os
Neossolos Quartzarênicos e Neossolos
Litólicos distróficos encontram-se
dispostos nas regiões dos Planaltos em
Patamares e Depressão do São Francisco
à leste da bacia. Já os Argissolos,
Gleissolos e Neossolo flúvico
eutrófico estão associados às áreas
dos vales
fluviais, veredas e planícies de
inundação (Figura 2c).
Figura 2. Bacia hidrográfica do rio de
Ondas: (a) Litologia; (b) Unidades de
Relevo; (c) Tipos de solos.
Já no mapa de Declividade são
demonstrados os valores em porcentagem
das maiores e menores inclinações da
bacia. Os valores que mais ocorrem,
praticamente em todas as áreas da
bacia, vão de 0 a 3% caracterizando
padrões de relevo planos a suaves
ondulados correspondendo ás regiões
das
chapadas e das planícies fluviais. Já
restrito a parte leste os padrões
variam de ondulado a montanhoso aonde
os valores de inclinação vão de 8 a
75%, correspondendo às porções de
maior potencial para processos
morfogenéticos da bacia (Figura 3a).
O mapa das Formas do Terreno
evidencia a combinação da curvatura
vertical e horizontal das vertentes,
nota-se que a maior parte das
vertentes
da bacia são a retilíneo-divergente
(37,3%), retilíneo-convergente (37%) e
retilíneo planar (21,3%), ocorrendo
também as demais formas, embora em
menor
proporção, principalmente nas áreas
onde ocorrem o entalhe da rede fluvial
(Figura 3b). A drenagem da bacia do
rio de Ondas apresenta um padrão
paralelo, possivelmente condicionado
pelas camadas sedimentadas sub-
horizontalizadas das rochas do Grupo
Urucuia. A combinação destas rochas
permeáveis, solos arenosos e baixa
declividade podem condicionar também a
baixa densidade de drenagem como
ilustra a Figura 3c.
Figura 3. Bacia hidrográfica do Rio de
Ondas: (a) Declividade; (b) Formas do
Terreno; (c) Drenagem.
A partir da análise dos mapas
temáticos descritos acima foi possível
perceber que a maior diversidade dos
elementos de cada tema ocorre no
extremo leste da bacia do rio de
Ondas, coincidindo com o contato
litológico
das três unidades geológicas que
ocorrem na bacia. É também nesta
porção da
bacia que está localizada a área
urbana da cidade de Barreiras,
apresentando
muitas vias de acesso. A porção oeste
da bacia possui características
homogêneas em todos os temas
investigados. Tais informações foram
relevantes
para a escolha dos pontos (geossítios)
de interesse pedogeomorfológicos
(Figura 4).
Figura 4. Pontos de interesse
geocientífico Geomorfológico e
Pedológico.
Foram plotados dois pontos de
interesse Geomorfológico, estão
representados por triângulos vermelhos
(Figura 4). Estes alvos foram
delimitados ao longo e próximos ao
contato entre o Chapadão do Urucuia e
dos
Planaltos em Patamares, por
consistirem locais sínteses onde é
possível
observar todo o contexto geral dos
elementos que compõe boa parte da
bacia
hidrográfica como as unidades
litológicas e as unidades do relevo
(Figura 2a
e 2b), além de apresentarem pontos
potenciais para processos erosivos,
pela
maior diversidade de formas do terreno
e dos maiores valores de declividade
(Figura 3a e 3b).
Foram escolhidos três pontos
na bacia que abrangem tanto interesses
da geomorfologia como da pedologia,
estes estão representados na figura 4
por círculos amarelos. Estes pontos
foram plotados tanto no extremo leste
da
bacia na planície do rio de Ondas,
como também na área plana sobre o
Chapadão do Urucuia. Os locais do
extremo leste da bacia possuem a maior
variedade litológica e pedológica da
área de estudo e além de compreender
os
domínios morfoesculturais do Planalto
em Patamares e Depressão do São
Francisco, destacam importantes
elementos relacionados à geomorfologia
fluvial. Foi selecionado um ponto
sobre o Chapadão do Urucuia, que
representa tanto o Gleissolo Háplico
encontrado nas partes mais planas do
Chapadão, onde existem contato entre
rochas de diferente permeabilidade,
onde surgem as veredas, feições
típicas das vastas superfícies planas
dos
relevos tabulares desta porção da
bacia.
E por fim, representados por
quadrados azuis estão os sete pontos
correspondentes à pesquisa pedológica
(Figura 4). Compreendem os pontos
melhor distribuídos na área da bacia
hidrográfica ocorrendo em todas as
unidades de relevo. Estes pontos foram
selecionados buscando abarcar toda a
variedade pedológica existente na
bacia, desta forma abrangendo todos os
domínios litológicos e de unidades de
relevo da área pesquisada.
Localização da área de estudo.
Bacia hidrográfica do rio de Ondas: (a) Litologia; (b) Unidades de Relevo; (c) Tipos de solos.
Bacia hidrográfica do Rio de Ondas: (a) Declividade; (b) Formas do Terreno; (c) Drenagem.
Pontos de interesse geocientífico Geomorfológico e Pedológico.
Considerações Finais
O aprimoramento de produtos cartográficos contribuiu significativamente para nortear a escolha dos pontos de interesse geocientífico dentro do contexto da pedogeomorfologia da bacia do rio de Ondas. Todos os elementos sistematizados em mapas temáticos apresentaram maior diversidade na porção do extremo leste da bacia, com exceção dos tipos de solos que possuem boa distribuição na área de estudos, além disso, na região leste da bacia está localizada a área urbana de Barreiras, o que facilitará o acesso a estes geossítios. Este estudo ter um caráter de investigação preliminar, uma vez que se faz necessária a confirmação da potencialidade geocientífica destes pontos por meio de trabalhos de campo e coleta de macropedolitos, mas já serve de base para a sistematização de metodologias que visem balizar estudos relacionados à geodiversidade e geoconservação, bem como a relevância do uso de bacias hidrográficas como categoria de análises ligadas à estas temáticas.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a PROPGPI/UFOB mediante concessão de Bolsa de Iniciação Científica do primeiro autor.
Referências
ALVES, R. R. Gênese e evolução da superfície quaternária no médio São Francisco: fatos e evidências na bacia do rio Grande - Bahia. Uberlândia, Instituto de Geografia, Tese de Doutorado, Universidade Federal de Uberlândia, 314p. 2011.
ARAÚJO, N. S. P.; ALMEIDA, R. S.; LATUF, M. O. 2010. Análise Morfométrica da Bacia Hidrográfica do Rio de Ondas. I Simpósio Regional de Geografia do Cerrado – SIREGEO. 251p.
BRILHA, J. 2005. Património Geológico e Geoconservação: A conservação da natureza na sua vertente geológica. Palimage Editores. Viseu. 190 p.
EGYDIO-SILVA M. 1987. O sistema de dobramentos Rio Preto e suas relações com o Cráton São Francisco. Tese de doutorado, IGC-Universidade de São Paulo, São Paulo, 95 p.
GRAY, M. 2004. Geodiversity: Valuingand Conserving Abiotic. Nature, England: J. Wiley.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.Manual Técnico de Pedologia. 2ª edição. Rio de Janeiro, 2007.
TOMASONI, M. A. Análise das transformações socioambientais com base em indicadores para recursos hídricos no cerrado baiano: O caso da Bacia hidrográfica do Rio de Ondas/BA. Tese de Doutorado. Universidade Federal de Sergipe – UFS. São Cristóvão, Sergipe. 2008.
VALERIANO, M. M. 2008. Topodata: guia para utilização de dados geomorfológicos locais. São José dos Campos, SP: INPE: Coordenação de Ensino, Documentação e Programas Especiais (INPE-15318-RPE/818). 72p.