Autores
Franzin, M.E. (UNESP RIO CLARO) ; Lupinacci, C.M. (UNESP RIO CLARO)
Resumo
A urbanização tem sido apontada como um fator impactante sobre os processos e as formas de relevo, alterando a morfodinâmica e a morfogênese. O objetivo deste trabalho é apresentar os resultados das análises da dissecação horizontal e vertical do relevo, do setor oeste da cidade de Rio Claro (SP), área de expansão urbana do município. Por meio da análise de cartas morfométricas, foi possível avaliar a potencialidade dos terrenos aos processos morfodinâmicos, e observar a dinâmica fluvial e erosiva que ocorre no relevo. As cartas morfométricas foram elaboradas a partir de técnica automática, reduzindo consideravelmente o tempo de confecção. A partir da análise dessas cartas, foi possível identificar os setores potencialmente mais suscetíveis a inundações, a intenso escoamento superficial e ação erosiva. Assim, considera-se que as cartas de dissecação do relevo são ferramentas úteis ao planejamento ambiental-urbano.
Palavras chaves
morfodinâmica; dissecação; expansão urbana
Introdução
Nas últimas décadas os estudos em geomorfologia têm apontado a urbanização como um fator impactante sobre os processos e as formas de relevo (NIR, 1982; GOUDIE e VILES, 1997; HAFF, 2001). Apesar da menor extensão espacial em relação a outras formas de uso da terra, como a agricultura, a pecuária e a silvicultura, a urbanização possuí algumas características únicas, como a concentração e densidade, a influência e disparidade dos fatores econômicos e de engenharia, os quais estão relacionados ao uso de técnicas e tecnologia na ocupação do relevo (CHENGTAI, 1996). Reconhece-se, portanto, a importância dos estudos geomorfológicos voltados à compreensão dos problemas ambientais oriundos da urbanização, considerando a expansão urbana nos centros de médio porte no interior paulista e a necessidade do planejamento ambiental das áreas urbanas. Dentre os efeitos causados pela urbanização estão as alterações morfodinâmicas, decorrentes das intensas modificações do uso e ocupação da terra, com a ocupação de vertentes íngremes, a impermeabilização do solo, a ocupação de áreas de planícies aluviais, a retificação e/ou a canalização das drenagens (RODRIGUES, 2005; 2010). De acordo com Casseti (2005), entende-se processo morfodinâmico como “as transformações evidenciadas no relevo, considerando a intensidade e frequência dos mecanismos morfogenéticos no momento atual ou subatual, associadas ou não às derivações antropogênicas”. Uma das formas de se avaliar a potencialidade dos terrenos aos processos morfodinâmicos é por meio dos parâmetros morfométricos, como as cartas de dissecação horizontal e dissecação vertical, as quais servem de instrumentos de análise da dinâmica fluvial e erosiva que ocorre no relevo. Além disso, permitem a identificação de setores potencialmente mais suscetíveis a inundações, escoamento superficial e ações erosivas, configurando-se como ferramentas úteis ao planejamento ambiental de áreas urbanas. Diante deste contexto, o objetivo desse trabalho é apresentar a análise dos parâmetros morfométricos de dissecação horizontal e vertical do setor oeste da cidade de Rio Claro (SP). A área de estudo trata-se de um setor de expansão urbana, de acordo com o Plano Diretor Municipal (Lei complementar nº 20 de 2015), com 18Km², localizada na unidade geomorfológica da Depressão Periférica Paulista, zona do Médio Tietê, situada na borda leste da Bacia Sedimentar do Paraná, sobre rochas sedimentares das Formações Corumbataí (Paleozoico) e Rio Claro (Cenozoico). Segundo Penteado (1976), o relevo da região é caracterizado pelo predomínio de colinas tabuliformes de vertentes suavemente convexas e patamares de fraca inclinação.
Material e métodos
Uma das maneiras de se compreender como atuam os processos morfodinâmicos sobre o sistema relevo e a suscetibilidade física de uma área, é através dos parâmetros morfométricos de dissecação horizontal e vertical. A dissecação horizontal, representa quantitativamente a distância que separa os talvegues das linhas de cumeada (Spiridonov, 1981). A partir do mapeamento dessa variável é possível avaliar a dissecação em área realizada pelos rios no relevo. Enquanto que a dissecação vertical representa quantitativamente a altitude relativa entre a linha de cumeada e o talvegue, permitindo a avaliação do grau de entalhamento dos cursos dos rios(Spiridonov, 1981), assim como revela a potencialidade para o desenvolvimento de processos gravitacionais e erosivos. Para análise desses parâmetros, foram confeccionados dois produtos cartográficos que seguem as orientações de Spiridonov (1981), adaptadas por Mauro et. al. (1991). O procedimento técnico foi baseado em Ferreira et. al. (2014, no prelo), o qual desenvolveu uma técnica digital automática no software ArcGIS para esses tipos de mapeamento. A primeira etapa para elaboração dessas cartas, foi a inserção e o ajuste da base cartográfica, obtida junto ao Centro de Análise e Planejamento Ambiental (CEAPLA), UNESP, campus Rio Claro, na escala de 1:10.000. Em seguida foram delimitadas as sub-bacias presentes na área de estudo, as quais por vezes, extrapolam o limite da área. Com a base cartográfica e as sub-bacias delimitadas, empregou-se a técnica digital desenvolvida por Ferreira et.al (2014), para a elaboração da carta de dissecação horizontal. Essa ferramenta é capaz de gerar polígonos que representem a dissecação horizontal a partir de retas que conectem um ponto do canal de drenagem a um ponto mais próximo do limite da bacia, com um ângulo de aproximadamente 90 graus em relação ao canal de drenagem, de acordo com a adaptação de Mauro et al. (1991) da proposta de Spiridonov (1981). Para tanto, foi preciso criar o modelo digital do terreno (MDT), a partir dos dados altimétricos da base cartográfica. Este MDT, foi utilizado no processamento em conjunto com os canais de drenagem, os limites das sub-bacias e os parâmetros de segmentação e agrupamento. As classes de dissecação horizontal foram elaboradas a partir das orientações de Spiridonov (1981), considerando a menor classe com 10 m, por ser o menor segmento representado nessa escala de trabalho, e as classes seguintes estabelecidas pelo dobro da classe anterior, até a classe final com valor superior a 640m, que representa a dissecação máxima da área. Para a elaboração da carta de dissecação vertical, utilizou-se a técnica automática desenvolvida por Ferreira et. al. (no prelo), sendo necessário adicionar as feições utilizadas pela ferramenta que consistem nas drenagens, nos polígonos das sub-bacias, nas curvas de nível com seus valores altimétricos e no MDT. Esta técnica automática é baseada na proposta de Spiridonov (1981), tendo como procedimentos a delimitação das sub-bacias e, em seguida, a identificação dos pontos onde ocorrem as interseções entre o talvegue e cada curva de nível. Estes pontos são unidos em conjunto com as linhas de cumeada, de maneira a respeitar a linha de menor distância entre o talvegue e a linha de cumeada, em uma altitude superior a curva de nível cortada pela drenagem. As classes utilizadas foram definidas em agrupamentos de 10 em 10m, até se atingir a classe superior que generalizasse a dissecação vertical máxima da área, maior que 70m.
Resultado e discussão
O setor oeste da cidade de Rio Claro apresenta-se como área de expansão urbana do município, sendo necessário algumas medidas que visem a diminuir o impacto da urbanização sobre os processos geomorfológicos atuantes, pois se trata de um setor que ocupa a planície de inundação e as vertentes do Rio Corumbataí, caracterizado por intensa dinâmica fluvial e também por apresentar suscetibilidade à assoreamento e processos erosivos (FREDERICE et. al., 2010; ZAINE, 2000).
A partir das cartas de dissecação horizontal e vertical foi possível conceber algumas inferências sobre a área com relação a potencialidade do desenvolvimento de processos morfodinâmicos.
Do ponto de vista da dissecação realizada pela ação dos rios sobre o relevo, verifica-se que as maiores classes de dissecação horizontal estão localizadas no trecho centro oeste da área, na confluência das drenagens tributárias com o principal curso fluvial da área, o Rio Corumbataí (Figura 1).
Existem também setores ao norte, onde as maiores classes de dissecação horizontal ocorrem entre canais de primeira ordem, em trechos de média vertente.
Nas áreas de alta vertente e topo, a dissecação horizontal é menos significativa, com um relativo distanciamento das nascentes até o limite das sub-bacias, superior a 620m, sendo esta situação verificada principalmente no setor sul e em parte do setor norte.
Com relação a ação denudativa provocada pela ação dos rios, nota-se na paisagem e na carta de dissecação vertical, a presença de vários vales entre as amplas colinas existentes, e em alguns casos, esses vales apresentam relativo desnível altimétrico, o que demonstra o potencial erosivo da área.
Essa situação, é identificada em todos os setores da área de estudo onde existem longas vertentes e topos aplainados, que apresentam maior dissecação vertical, com classe superior a 50m (Figura 2), sendo a atuação da gravidade sobre o escoamento pluvial superficial maior nessas situações.
Este fato, associado a ocupação urbana, pode gerar episódios de intenso escoamento superficial em função da impermeabilização do solo e dos arruamentos que seguem o caimento da vertente, assim como aumentar e potencializar os processos erosivos nas áreas peri-urbanas devido ao forte poder abrasivo adquirido pela água quando escoa até a baixa vertente.
Quando correlacionados os dados morfométricos, nota-se que os setores norte e central apresentam grande potencialidade a ocorrência de processos denudativos. Isso se deve a concentração dos maiores valores de dissecação horizontal (entre 10m e 80m), e também ao alto desnível altimétrico, com valores de dissecação vertical superiores a 50m.
Em campo, foi possível constatar a presença abundante de sulcos erosivos e ravinas, sendo que muitas dessas feições erosivas, encontram-se próximas a borda urbana e possuem relação com o tipo de urbanização implementada que segue o caimento da vertente, sem qualquer preocupação com a quebra de energia da água.
Os episódios de intenso escoamento superficial, tem provocado enxurradas e alagamento das vias urbanas localizadas em baixa vertente nos setores norte e centro oeste, sendo possível em campo, observar o excesso de material transportado e depositado após a ocorrência de chuva.
Assim, as cartas de dissecação horizontal e vertical do relevo, se apresentaram como instrumentos viáveis para compreensão da atuação dos processos morfodinâmicos sobre o sistema relevo, pois como revela a análise, foi possível identificar os setores de maior potencialidade a ação denudativa e de suscetibilidade física ao desenvolvimento de processos denudativos.
Carta de dissecação horizontal do setor oeste da cidade de Rio Claro (SP).
Carta de dissecação vertical do setor oeste da cidade de Rio Claro (SP).
Considerações Finais
É oportuno informar que a utilização das técnicas automáticas mostrou-se de importante validade para a elaboração das cartas de dissecação horizontal e vertical, devido a qualidade dos dados gerados pelas ferramentas, como também pelo tempo reduzido, quando comparado com técnica manual ou semiautomática. O material cartográfico produzido aponta os setores do relevo que são potencialmente mais suscetíveis ao desenvolvimento de processos denudativos. Portanto, estas cartas podem ser um instrumento importante para o planejamento da expansão urbana no setor oeste da cidade de Rio Claro (SP), considerando o Plano Diretor do Município que indica esta área como vetor da expansão urbana. Desse modo, este trabalho pode contribuir com difusão técnica e metodológica no campo da geomorfologia, pois se utiliza de referências tradicionais adaptadas as tecnologias contemporâneas dos Sistemas de Informações Geográficas, assim como, fornece subsídios ao planejamento ambiental-urbano do município.
Agradecimentos
Agradecemos a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela concessão de bolsa de mestrado junto ao Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, campus Rio Claro.
Referências
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Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista.