Autores
Morais, E. (URBEVITAL) ; Serrano, D. (URBEVITAL) ; Rigon, B. (URBEVITAL) ; Pina, F. (URBEVITAL)
Resumo
Áreas de Preservação Permanente são regulamentadas para assegurar a biodiversidade, a preservação dos recursos hídricos, a estabilidade geológica e outras funções. Neste estudo o objetivo foi avaliar se as inundações restringem-se à APP em um trecho do ribeirão Pinguim, localizado em uma zona de expansão urbana do município de Marialva, Paraná. As avaliações foram realizadas com levantamentos cartográficos, seções topo- batimétricas e estimativas de vazões. Os resultados indicam que seções a montante possuem maior suscetibilidade as inundações, porém as avaliações também indicam que as inundações não excedem os limites da APP. Aplicações como estas demonstram que as variações espaciais da morfologia do canal e da planície de inundação relacionam-se à suscetibilidade de inundações, e, portanto, tais abordagens destacam como à geomorfologia fluvial pode contribuir com o planejamento ambiental.
Palavras chaves
inundação; área de preservação permanente; rio meandrante
Introdução
Inundações são eventos naturais e em áreas carentes de planejamento podem causar severos danos em infraestruturas e riscos à população. Nas áreas urbanas a impermeabilização do solo potencializa ainda mais o risco destes eventos. Desse modo, para precaver a incidência de inundações, o ordenamento territorial deve ser orientado por avaliações que incluem parâmetros hidrológicos e geomorfológicos (Tucci, 2012; Cestari Jr, 2015; Momo, 2016). No Brasil ao longo das faixas marginais dos recursos hídricos um conjunto de leis prevê às áreas preservação permanente (APP), como na lei federal 4.771 de 1965, recentemente revisada com a lei federal 12.651 de 2012. Dentre as funções dessas áreas, prevista nestas leis, destacamos principalmente a preservação dos recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a aplicabilidade para se assegurar o bem-estar das populações humanas. Com base nestes preceitos este estudo tem como objetivo avaliar se as inundações em um trecho do ribeirão Pinguim, na zona de expansão urbana do município de Marialva, estado do Paraná, restringem-se exclusivamente à APP. Para isso foram realizados levantamentos em campo com mensuração de seções topo-batimétricas. As mudanças do canal ao longo dos últimos 30 anos foram avaliadas para atestar a mobilidade fluvial. A geometria do canal fluvial e da planície de inundação foram avaliadas com seções topográficas transversais e a cobertura pedo-sedimentológica analisada com tradagens. Com base nessas informações foram realizadas análises para se estimar vazões em seções transversais, considerando nível de margens plenas da área de preservação permanente comparada com a estimativa de vazão da bacia hidrográfica. O estudo contribui principalmente com a apresentação de uma avaliação que afere se a delimitação atual de APP´s para o tamanho de canal fluvial avaliado comporta as inundações.
Material e métodos
A área em estudo é o trecho de 1,14 km de extensão do ribeirão Pinguim no município de Marialva, estado do Paraná (Figura 1). O estudo baseou-se em avaliações de produtos cartográficos em sistemas de informação geográfica (SIG), levantamentos em campo de aspectos geomorfológicos, medições de seções topo-batimétricas e aplicação de equações para estimativas de vazões. Levantamentos em campo e a avaliação multitemporal de produtos cartográficos foram utilizados para se determinar as seções amostrais representativas para estimativa de vazões. Nos levantamentos em campo observamos as morfologias do leito do canal e aspectos sedimentológicos da planície de inundação. Os produtos cartográficos são fotografias aéreas do ano de 1980, disponível em www.itcg.gov.pr.br, e imagens orbitais do ano de 2003, 2010 e 2014 obtidas, no Google Earth®. Essas avaliações foram utilizadas para compreender as transformações na morfologia do canal e, principalmente, no uso e ocupação do solo. Para avaliação da suscetibilidade de inundação foram realizados estudos com estimativa de vazões baseada no escoamento superficial da bacia hidrográfica (Qbh) comparado a vazões do nível de margens plenas do canal (Qmp) e para a seção da área de preservação permanente (Qapp). Desse modo, admitiu-se neste estudo que em caso de Qbh maior que Qapp as cheias possuem competência para extrapolar o limite determinado para APP. Estimativa de vazão conforme I.PAI.WU Para determinação da vazão baseada no escoamento da bacia hidrográfica (Qbh) utilizou-se a metodologia de I.PAI.WU, técnica recomentada pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica – DAEE do Estado de São Paulo para bacias com área de drenagem de até 200km². Para obtenção dos dados através do método aplicado seguiu-se a equação (1). Q=0,278*C*i*A0,9*k (1) Onde: Q = vazão (m³/s) c = coeficiente de deflúvio i = intensidade da precipitação (mm/h) A = área drenada (km²) K = coeficiente de distribuição espacial Estimativa de vazão conforme Manning A determinação de vazões na área estudada foi realizada com apoio de seções topo-batimétricas e aplicação do método de Manning (Willians, 1978), pois dispensa a utilização de dados de estações fluviométricas, que são desconhecidas na bacia hidrográfica em estudo. As aplicações desta técnica foi realizada de acordo com o estudo de Fernandez (2003). Abaixo (4) apresenta-se a equação de Manning. (4) Q=(1/n)A (〖Rh〗^0,06) Onde: A e Rh representam a área da seção transversal (m2) e do raio hidráulico (m), S a declividade do leito (m/m) e o coeficiente de rugosidade de Manning. Para determinação do coeficiente N utilizou-se a proposta Cowan (Eq. 2) explicitado por Fernandez (2003). Esse coeficiente é alcançado com a expressão: N=(N_1+N_2+N_3+N_4 )*N_5 Tais N´s referem-se, respetivamente, a índices que rementem a variações do material envolvido, grau de irregularidade, variações da seção transversal, efeito de obstruções, vegetação e sinuosidade (cf. Fernandez, 2003).
Resultado e discussão
Mudanças do canal
Na Fig. 1 nota-se que durante o intervalo de 30 anos houve intensas mudanças
no canal do ribeirão Pinguim. Preliminarmente, no ano de 1980 a morfologia
do canal possuía a menor sinuosidade. Durante o intervalo de 23 anos houve o
incremento da sinuosidade do canal, constatado com a formação de meandros em
2003. Na sequencia, entre 2003 e 2010 predominou a ocorrência de migrações
laterais do canal. Por fim, no ano de 2014, o canal apresentava morfologia
com menor sinuosidade e aproximando-se de uma forma mais retilínea.
Mudanças do canal, como essas constatadas no ribeirão Pinguim ocorrem
naturalmente, porém, esta bacia hidrográfica foi ocupada pela urbanização
dos municípios de Maringá e Sarandi nos últimos anos. Ademais se ressalta o
possível impacto de uma represa a montante na década de 1980, e a
desativação deste reservatório entre os anos de 2003 e 2005. A presença de
reservatório a montante implica diretamente na regulação do canal, de modo
geral, entende-se que vazões máximas e mínimas foram controladas pelo
barramento. Esse tipo de variação no fluxo implica diretamente no
comportamento fluvial. A variação do escoamento decorrente das áreas urbanas
a montante, com o contínuo aumento da impermeabilização, e o reservatório
são fatores influenciaram no ajustamento deste sistema fluvial. Essas
mudanças implicaram no regime hidro-sedimentológico, que por sua vez, podem
estar associados às mudanças na morfologia em planta do canal, como também
na incisão do leito fluvial.
Declividade do canal
A declividade do leito fluvial é um importante indicador da energia
do canal (stream power), e, portanto, da velocidade de fluxo do sistema
fluvial. A variação da declividade ao longo do curso, com medidas na parte
montante, central e à jusante, respectivamente, 0,011; 0,005 e 0,010 m/m
demonstra a variação espacial da declividade ao longo do curso. Nota-se que
a montante e a jusante os valores de declividade são maiores, enquanto que
na parte central o canal exibe aproximadamente a metade desses valores.
Portanto, o canal tende a apresentar velocidade fluxo superior, e
consequente maior energia nas extremidades a jusante e montante do trecho em
estudo.
Características do leito fluvial
O canal do ribeirão Pinguim no trecho em estudo apresenta sequencia
típica de corredeira-poço-corredeira. Essa variação do leito está
diretamente relacionada à sinuosidade dos meandros. As mudanças na forma de
leito atendem a resistência do substrato litológico, que em alguns pontos é
demonstrada com o afloramento de basaltos. As seções topográficas demonstram
que a geometria hidráulica do canal muda
progressivamente em direção à jusante. No setor a montante, seções 1-3
(Fig.1), o ribeirão Pinguim exibe diques pouco expressivos, aproximadamente
2,5 m, e
planície de inundação é mais expressiva, tanto na margem direita como
esquerda.
Nas seções 4 e 5 (Fig. 1) o canal passa a exibir maior
sinuosidade e também diques mais expressivos. Na área dessas seções os
diques possuem altura entre 4 e 5,5 m. Em direção à jusante, Seções 5-7
(Fig. 1) os diques na margem esquerda aumentam progressivamente,
conforme nota-se na seções topográficas estas morfologias alcançam até 12m.
Como parte dessas mudanças notou-se que, a partir da
seção 4, em direção à jusante, ocorre paralelo ao leito à formação de
patamares. Tais depósitos acomodam-se no leito e
com a presença de vegetação fixam-se ao sistema canal-planície.
Estimativa de vazões baseada no escoamento da bacia hidrográfica
A avaliação do deflúvio da bacia de contribuição pela equação de I.PAI.WU
forneceu as seguintes vazões de deflúvio, sendo Qpadrão=16,56 m³/s
e o Qcrítico 259,30 m³/s. Esta última foi utilizada como referência para
a comparação com as vazões estimadas para as seções na APP.
Estimativa de vazões em seções topo-batimétricas (equação de Manning)
Os levantamentos em campo e a avaliação multitemporal da morfologia
do canal, observado em planta, possibilitou identificar o coeficiente N para
cada seção (Tabela 1). Adicionalmente, com o uso de levantamento topográfico
alcançamos os demais parâmetros morfométricos necessários à aplicação da
estimativa da vazão.
O conjunto das informações tornou possível a estimativa de vazão para
as seções topográficas com uso da equação de Manning (Tabela 2). Devido as
seções em direção à jusante possuírem distinta
geometria hidráulica e declividade de leito fluvial a vazão de
extravasamento para a planície, ou seja, o nível de margens plenas,
não apresenta uma contínua progressão. Especialmente nas seções 5-7 a
incisão do canal favoreceu a altura do dique propiciando uma maior geometria
hidráulica para o escoamento do fluxo.
Localização das seções avaliadas e as mudanças do canal ao longo de 34 anos.
Parâmetros morfométricos das seções.
Vazões estimadas no ribeirão Pinguim com a equação de Mainning.
Considerações Finais
Neste estudo foram interpretados aspectos geomorfológicos e apresentadas estimativas de vazões referentes ao nível de margens plenas do canal, bem como vazões referentes aos limites da área de preservação permanente. As avaliações sobre a bacia hidrográfica do ribeirão Pinguim foram utilizadas para estimar os valores de deflúvio na seção do trecho em estudo. A comparação entre os valores estimados (Qbh e Qapp) indicam que à APP comporta as inundações. Desse modo, entende-se que à planície de inundação, ou seja, a faixa marginal que é acometida pelos eventos atuais de cheia, está contida nos limites da área de preservação permanente. Portanto, não há indícios de áreas sujeitas a inundação exterior ao limite da área de preservação permanente, conforme demonstrado com as estimativas de vazão e demais aspectos geomorfológicos do canal.
Agradecimentos
Referências
Fernandez, O. V. Q. Determinação do nível e da descarga de margens plenas. Boletim de Geografia, v. 21, p. 97-109, 2003.
Cestari Jr, E., Sobrinho, M. D., Oliveira, J. N., Estudo de propagação de ondas para auxiliar a elaboração do plano de ação emergencial externo – PAE. Revista Brasileira de Recursos Hídricos. 2015, 20, 689-697.
Momo, M. R., Pinheiro, A., Pinheiro, A., Severo, D. L., Cuartas, L. A., Nobre, A. D., Desempenho do modelo HAND no mapeamento de áreas suscetíveis à inundação usando dados de alta resolução espacial. Revista Brasileira de Recursos Hídricos. 2016, 21, 200-208.
Tucci, C. E. M., Gerenciamento da Drenagem Urbana . Revista Brasileira de Recursos Hídricos. 2002, 7, 5-27.
Willians, G. P. Bank-full discharge of rivers. Water Recourse Research, v. 14, p. 1141-1158, 1978.