Autores

Alves, N.S. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS - UEA) ; Carvalho, B.L. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS - UEA) ; Rodrigues, R.C.C. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS - UEA) ; Santos, W.R. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS - UEA)

Resumo

As inundações urbanas vêm se constituindo em um dos mais importantes impactos sobre a sociedade e podem ser agravadas pelas alterações causadas pelo homem no ambiente urbano. Esta pesquisa buscou identificar os fatores naturais e/ou antrópicos que contribuem para a constituição de áreas de risco a inundações na Bacia Hidrográfica do Igarapé do Mindu. As bases teórico-metodológicas desta pesquisa estão fundamentadas em estudos de Geomorfologia Urbana, Bacias Hidrográficas e de Risco. Os procedimentos adotados compreenderam os níveis dos levantamentos de dados, a sistematização, as análises e discussão dos resultados. Dados da Defesa Civil e notícias veiculadas pelos meios de comunicação (jornais on-line) indicam que o risco de inundação na bacia é recorrente. Este risco é resultado de uma combinação de fatores como o crescimento urbano e pressão sobre o meio ambiente; ocupação das margens e planície de inundação dos igarapés pela população; e eventos pluviométricos extremos.

Palavras chaves

Urbanização; Eventos Extremos; Risco

Introdução

O risco no qual a sociedade está sujeita num ambiente urbano é alto devido aos vários fatores relacionados com a oferta dos recursos naturais, impactos inter-relacionados, ocupação de áreas de risco, eventos naturais e antrópicos. Neste mesmo ambiente estes riscos, quando relacionados com a água, são principalmente devido ao efeito sobre a população e sobre o meio ambiente natural ou devido aos processos antropogênicos (TUCCI, 2007). A cidade de Manaus apresenta uma densa malha de cursos fluviais, os igarapés, que formam as bacias hidrográficas urbanas, dentre as quais se destaca as bacias hidrográficas do Tarumã e do Puraquequara, que estão parcialmente inseridas na malha urbana da cidade, as bacias do São Raimundo e do Educandos que se encontram integralmente no perímetro urbano de Manaus, além das sub-bacias dos igarapés do Bindá, Passarinho, Mauazinho, Mauá, Quarenta e Mindu. Esta morfologia natural contribui para o risco de inundações nas bacias hidrográficas urbanas, cujo fenômeno é acentuado principalmente no período de janeiro a maio, que configura o período do inverno amazônico caracterizando uma temporalidade quase sazonal desse risco (GAMA; ALVES, 2014, CRUZ; COSTA, 2012). De acordo com Oliveira (2008) a rede hidrográfica de Manaus exerceu e exerce forte influência na configuração do sítio urbano e de certa maneira na morfologia da cidade. Até o final do século XIX foram os igarapés que condicionaram a direção de crescimento da cidade, já no século XX, os fatores naturais delimitadores da cidade foram sendo superados por aterramentos e construção de pontes. A partir dos anos setenta houve a ocupação das margens dos vários igarapés da cidade de modo mais intenso. Este processo de ocupação das margens dos igarapés urbanos vem se acentuando ao longo dos últimos 50 anos configurando áreas de risco, com destaque para as inundações. A bacia Hidrográfica do Mindu, contribuinte da bacia do São Raimundo na área urbana de Manaus, foi selecionada como objeto de estudo devido ao aumento no número de registro e ocorrências de eventos de inundações na sua área, tornando este um fenômeno recorrente e que atinge diretamente diversos bairros da cidade com danos sociais e econômicos. Destarte, o presente trabalho teve como objetivo identificar os fatores naturais e antrópicos que contribuem para a constituição de áreas de risco a inundações na Bacia Hidrográfica do Igarapé do Mindu.

Material e métodos

As bases teórico-metodológicas desta pesquisa estão fundamentadas em estudos de Geomorfologia urbana, Bacias hidrográficas urbanas e de Risco. A ênfase da abordagem é voltada para a análise do risco, ou seja, do risco de inundações urbanas na área da bacia hidrográfica do igarapé do Mindu. Estes estudos servem para entender o comportamento das sociedades urbanizadas ao se deparar com desastres causados pela modernização e desenvolvimento dos espaços urbanos, e tentar amenizar estes impactos. Estudos de geomorfologia se fazem necessários no ambiente urbano, principalmente diante do atual quadro de crescimento das cidades de forma acelerada e desordenada que, na maioria das vezes, contribui para a ocorrência de desastres ambientais, comuns em países em desenvolvimento. Este crescimento acelerado e desordenado das cidades culminou em um cenário onde as aglomerações possuem altos índices de ocupação informal, carente de infraestrutura e serviços básicos, caracterizando os assim chamados assentamentos urbanos precários: favelas, ocupação de margens de igarapés, palafitas e assemelhados. Adami e Rodrigues (2011) conceituam a bacia hidrográfica como um sistema que compreende um volume de materiais, sendo os mais predominantes, sólido e líquido, estando próximo à superfície terrestre, delimitado interna e externamente por todos os processos que, a partir do fornecimento de água pela atmosfera, interferem no fluxo de matéria e de energia de um rio ou de uma rede de canais fluviais. Este sistema, quando do desenvolvimento urbano, sofre importantes alterações que promovem mudanças inevitáveis na hidrologia natural. Nesta perspectiva, as alterações hidrológicas nas bacias hidrográficas urbanas são ampliadas após a construção completa da cidade, diminuindo a capacidade de infiltração do solo e resultando em um grande aumento no volume do escoamento superficial, e consequentemente das inundações urbanas (ARAUJO et al., 2005). Os riscos ambientais resultam da associação entre os riscos naturais e os riscos decorrentes de processos naturais agravados pela atividade humana e pela ocupação do território. O risco de inundações nas áreas urbanas representam as áleas mais largamente presentes no planeta, e afetam numerosas populações distribuídas em todos os continentes. As áreas ribeirinhas, correspondentes ao leito maior do canal fluvial, por serem planas são propícias para o assentamento humano principalmente quando a frequência de inundação é baixa, a ocupação destas áreas vem assim configurar o risco (TUCCI, 2007; VEYRET, 2007). Os procedimentos adotados nas etapas da pesquisa compreenderam os níveis dos levantamentos de dados, a sistematização, as análises e discussão dos resultados. No nível dos levantamentos de dados foram realizados levantamentos bibliográficos, cartográficos, climatológicos e levantamentos de campo. O levantamento cartográfico e as etapas de campo subsidiaram o diagnóstico do uso e ocupação do solo na área da bacia hidrográfica do Mindu, e a identificação das áreas suscetíveis a inundações. Ainda, com o suporte cartográfico e uso de imagens de satélite e do programa de Sistema de Informação Geográfica Quantum Gis (QGIS), foi realizada a caracterização morfométrica da bacia hidrográfica determinando-se parâmetros como área e perímetro da bacia, densidade de drenagem, comprimento do canal principal, tipos de canais e padrão de drenagem. Outro levantamento realizado foi o do número de ocorrências de inundações na área da bacia, junto a Secretaria Municipal de Proteção e Defesa Civil do município e de notícias veiculadas em meios de comunicação como jornais, revistas, internet, principalmente em jornais on-line, incluindo registro fotográfico. Dados pluviométricos, total precipitado anual, mensal e diário, foram levantados no site do Instituto Nacional de Meteorologia – INMET e na Estação Meteorológica da Escola Superior de Tecnologia – EST da Universidade do Estado do Amazonas – UEA.

Resultado e discussão

A Bacia Hidrográfica do igarapé do Mindu é considerada uma das bacias urbanas mais importantes da cidade de Manaus, pois abrange parte dos bairros de Adrianópolis, Aleixo, Cidade de Deus, Cidade Nova, Coroado, Flores, Gilberto Mestrinho, Jorge Teixeira, Nossa Senhora das Graças, Novo Aleixo, Parque 10 de Novembro, São José Operário e Tancredo Neves, integrantes das Zonas Leste, Norte e Centro-Sul da cidade. O igarapé do Mindu cruza a área urbana no sentido NE-SW, sua principal nascente localiza-se no bairro Cidade de Deus, próximo a Reserva Adolpho Ducke, nas coordenadas 301´07.31” S e 5955`29,84” W e sua foz no bairro São Jorge, localizada no encontro deste com o Igarapé dos Franceses, nas coordenadas 307´44,74” S e 6002´05,04” W, abrangendo cerca de 20 km de extensão. Para efeitos deste estudo a bacia hidrográfica foi subdividida em 03 sub- bacias: a Bacia do Alto Mindu com uma área de 2.652 ha, e perímetro de 28.435 metros; Bacia do Médio Mindu com 3.213 ha e perímetro de 27.146 metros; e a Bacia do Baixo Mindu com 680 ha e perímetro de 11.151 km (Figura 01). Parâmetros morfométricos como fator de forma da bacia e índice de circularidade indicam que a bacia não possui forma circular, mas sim, uma tendência de forma alongada, e mostra-se pouco suscetível a inundações em condições normais de precipitação, a exceção de eventos extremos. Em bacias com forma circular, há maiores possibilidades de chuvas intensas ocorrerem simultaneamente em toda a sua extensão, concentrando grande volume de água no tributário principal (CARDOSO et al., 2006). Os levantamentos de campo e análises de imagens de satélite mostram que a bacia do Mindu encontra-se densamente ocupada, incluindo as áreas marginais do igarapé do Mindu e dos mais de cerca de 40 afluentes do mesmo. Estas áreas marginais foram desmatadas e o igarapé, nestes locais, funciona como via de escoamento de esgotos domésticos e resíduos sólidos que são lançados diretamente em seu leito pela população ribeirinha, agravando o assoreamento do canal e a poluição de suas águas potencializando o risco de inundações nestas áreas. Segundo a Secretaria Municipal de Finanças Públicas – SEMEF (2012) os bairros que margeiam a bacia do Mindu apresentam aproximadamente 155.534 lotes de terra. De acordo com o IBGE (2010) existem 87.529 domicílios particulares incluindo domicílios ocupados, comerciais e não ocupados próximo ao curso principal do igarapé que contribuem para a ocupação da bacia. A sub-bacia do Alto Mindu apresenta uma densidade de ocupação menor quando comparada as sub-bacias do Médio e Baixo Mindu, entretanto, em trechos localizados, são comuns as ocorrências de inundações devido à intensa ocupação das margens do igarapé e da morfologia das vertentes que apresentam maiores declividades. Este índice de ocupação menor é devido às unidades de conservação existentes na sub-bacia: o Jardim Botânico Adolpho Ducke e o Parque Municipal Nascentes do Mindu, com área de 16 ha, que foi criado para proteger e preservar as principais nascentes que dão origem ao Igarapé do Mindu. A sub-bacia do Médio Mindu encontra-se densamente ocupada, salvo as áreas contempladas pelo Parque Municipal do Mindu e a Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN Moto Honda. Nesta sub-bacia as margens do igarapé, a exceção das unidades de conservação citadas, são ocupadas pela população de baixa renda que construiu suas moradas na planície de inundação do igarapé e estão sujeitas a eventos de inundações e cheias do igarapé. O poder público municipal está em fase de implementação do Corredor Ecológico Urbano do Igarapé do Mindu, e para este fim foram desapropriadas diversas moradias e estão sendo realizadas intervenções como obras e serviços de saneamento, urbanização, habitação e melhoria do sistema viário. A sub-bacia do Baixo Mindu apresenta um elevado índice de ocupação. As ocupações são na maioria de residências e empreendimentos residenciais multifamiliar, além de um número expressivo de empreendimentos comerciais, a exemplo de shoppings que ocupam a área de preservação do igarapé. Trechos do igarapé do Mindu, a exemplo do Passeio do Mindu, foram retificados na década passada numa tentativa de reduzir o risco de inundações no local. Inundações urbanas são frequentes na área da Comunidade de Vila Amazonas e estão associados à ocupação das margens do igarapé e a eventos extremos de chuva (GAMA, 2013). Nesta sub-bacia o poder público municipal construiu o Parque dos Bilhares, no bairro Nossa Senhora das Graças, próximo à foz do igarapé. Dados obtidos junto a Secretaria Municipal de Proteção e Defesa Civil do município e a pesquisa realizada em jornais e internet apontam, que nos últimos anos, eventos de inundações se tornaram comuns na bacia hidrográfica do Mindu (Figura 02). Para o período de 2007 a 2015 foram levantadas na mídia local, cerca de 88 notícias de inundações na área da bacia, a maioria associado a eventos extremos de chuva: "9 fev. 2011: Por causa das fortes pancadas de chuva que atingiram a cidade, a Defesa Civil do Município recebeu 58 chamadas da população, por meio do número de emergência 199. A maioria dos pedidos de ajuda informava sobre risco de desabamento de barrancos e alagações. As zonas Norte e Leste foram as mais afetadas. Das 58 chamadas, 30 foram sobre risco de desabamento de barrancos, e 23 informavam sobre alagação. Os outros pedidos de ajuda informavam sobre o risco de desabamento de casa de madeira (2 casos), queda de muro (2 casos) e rachaduras em parede (um caso). De acordo com a SEMCOM, sete viaturas da Defesa Civil e 40 homens trabalharam durante toda a chuva, em parceria com o Corpo de Bombeiros. Um dos pontos mais atingidos pelas alagações foi a comunidade Riacho Doce, no bairro Cidade Nova, na Zona Norte (A CRÍTICA, 2011)." Para o mesmo período (2007-2015) a Defesa Civil registrou um total de 711 ocorrências, com destaque para o ano de 2007 com um total de 358 ocorrências. Em relação ao total precipitado na cidade de Manaus a média anual, para o mesmo período, é de 2.424,65 mm/ano com uma concentração das chuvas nos meses de fevereiro e março, período onde também foi registrado o maior número de ocorrências pela Defesa Civil (Tabela 01). Gama (2013) observou na área da Comunidade de Vila Amazonas que, um único evento de chuva com volume precipitado acima de 40mm, pode ocasionar o transbordamento das águas do igarapé e atingir diversas moradias.

Figura 01

Bacia Hidrográfica do Igarapé do Mindu

Figura 02

Inundação provocada pelo transbordamento das águas do igarapé do Mindu na Rua Capiúba no bairro Jorge Teixeira em 07/04/2012 Fonte: DM24AM (2012)

Tabela 01

Dados de precipitação para Manaus e total de ocorrências e notícias de inundações registradas para o período de 2007-2015 na Bacia Hidrográfica do Mindu.

Considerações Finais

Ao longo das últimas décadas, a área ocupada pela Bacia Hidrográfica do Mindu tem sido densamente ocupada, incluindo as margens e planície de inundação do igarapé do Mindu e de seus afluentes. Neste processo acelerado e desordenado de ocupação, o igarapé teve grande parte de sua mata ciliar suprimida e suas margens ocupadas tanto pela população de baixa renda, a exemplo das sub-bacias do Alto e Médio Mindu, como pela população de poder aquisitivo mais elevado e construção de grandes empreendimentos comercias (shoppings), a exemplo da sub-bacia do Baixo Mindu. Esse processo de ocupação, além do desmatamento, reduz a taxa de infiltração no solo das águas pluviais e promove o aumento no escoamento das águas superficiais. Associado tem-se a poluição das águas dos igarapés e assoreamento dos cursos d´água por sedimentos e resíduos sólidos que são lançados no mesmo, contribuindo para o risco de inundações na bacia. Observa-se na Bacia Hidrográfica do Mindu o crescente aumento nos últimos anos de desastres e de pessoas afetadas por inundações. Este risco está relacionado principalmente ao crescimento urbano e pressão sobre o meio ambiente, a urbanização; ao acréscimo populacional nas áreas de risco como margens de igarapés e suas planícies de inundação e a eventos pluviométricos extremos. Estes fatores combinados explicam o número de ocorrências de inundações registradas na área da Bacia Hidrográfica do Mindu pela Defesa Civil do município e meios de comunicação local.

Agradecimentos

A Fundação de Amparo a Pesquisa no Estado do Amazonas - FAPEAM, pela concessão de bolsas aos alunos no âmbito do Programa de Apoio à Iniciação Científica do Amazonas - PAIC/AM

Referências

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CARDOSO, C. A.; DIAS, H. C. T.; SOARES, C. P. B.; MARTINS, S. V. Caracterização Morfométrica da Bacia Hidrográfica do Rio Debossan, Nova Friburgo, RJ. R. Árvore, Viçosa-MG, v.30, n.2, p. 241-248, 2006
CRUZ, D.R.; COSTA, R. C. Inundações urbanas em bacias hidrográficas urbanas de Manaus – Comunidades Bairro União e N. S. de Fátima. Revista Geonorte, Edição Especial, V.1, N. 4, p. 759-771, 2012
GAMA, E. B. Inundações Urbanas e seus Impactos na Bacia Hidrográfica do Igarapé do Mindu na Área da Vila Amazonas, Manaus-AM. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Geografia). Universidade do Estado do Amazonas – UEA. 2013. 74 p.
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