Autores
Macedo, H.S. (UFS) ; Araújo, H.M. (UFS) ; Lima, L.P. (UFS) ; Santos, A. (UFS) ; Campos, I.M. (UFS) ; Cruz, R. (UFS)
Resumo
O presente trabalho teve como objetivo geral, analisar a dinâmica socioambiental da bacia costeira Caueira/Abaís na perspectiva do zoneamento como proposta de ordenamento território-ambiental. Os resultados desse estudo mostram que o território da bacia apresenta graus diferenciados de fragilidade ambiental, devido às características apresentadas pelos condicionantes físico- ambientais, além dos impactos que a ação antrópica vem provocando ao longo do tempo, através da ocupação, implementação de infraestrutura, especulação imobiliária e atividades turísticas, principalmente, nos entornos das praias da Caueira, Abaís e Saco. No intuito de mitigar tais impactos, foi proposto um zoneamento geoambiental, sendo estabelecidas cinco zonas: Zonas de Áreas de Proteção Ecológica, Zonas Restritas ao Uso Agrário, Zonas de Áreas de Preservação Severa, Zonas de Interesse Turismo/Residência e as Zonas de Áreas de Exploração Mineral.
Palavras chaves
Ordenamento Território-Ambiental; Bacia Hidrográfica; Dinâmica Costeira
Introdução
As alterações ambientais, decorrentes dessa relação histórica “sociedade – natureza” têm gerado intensas discussões em todos os segmentos da sociedade. É importante lembrar, de acordo com De Nardin (2009), que o ritmo de acumulação do capital é distinto do ritmo de funcionamento da natureza, ficando assim aparente, que o modelo de desenvolvimento se mostra tanto irregular para os homens quanto danoso para os sistemas ambientais. Já se pode prevê segundo Ab’Saber (2003), que entre os padrões para o reconhecimento do nível de desenvolvimento de um país, devam figurar a capacidade do seu povo em termos de preservação de recursos, o nível de exigência e o respeito ao zoneamento de atividades, assim como, a própria busca de modelos para uma valorização e renovação corretas dos recursos naturais. Diante dessa preocupação com o uso sustentável dos recursos naturais de um país, inúmeras medidas estão sendo implementadas na tentativa de mitigar ou mesmo coibir a utilização desordenada de tais recursos, entre os quais podemos destacar os recursos hídricos. Em meio a essas medidas que estão sendo tomadas nas últimas décadas, visando à otimização e gestão de ambientes naturais, uma de maior destaque vem sendo a adoção da bacia hidrográfica como instrumento para o planejamento ambiental. Segundo Araújo (2010), a bacia hidrográfica se estabelece como unidade física bem caracterizada, facilitando a integração de inúmeros indicadores geoambientais. O Governo do Estado de Sergipe, por meio da Secretaria de Estado e Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos – SEMARH – juntamente com a comunidade científica sergipana, vem buscando estratégias para o uso racional e manutenção dos recursos hídricos no Estado. Através do Plano Estadual de Recursos Hídricos, realizado em 2009, estabeleceu-se uma nova divisão hidrográfica para Sergipe, no intuito de facilitar o planejamento desses recursos hídricos, além de serem utilizados como unidades de planejamento. O território sergipano passou a conter oito bacias hidrográficas: Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Bacia Hidrográfica do Rio Japaratuba, Bacia Hidrográfica do Rio Sergipe, Bacia Hidrográfica do Rio Vaza-Barris, Bacia hidrográfica do Rio Piauí, Bacia Hidrográfica do Rio Real e as bacias costeiras 01 e 02, denominadas em 2012 pela SEMARH, respectivamente de: Bacia Costeira Sapucaia e Bacia Costeira Caueira/Abaís. Diante disso, e considerando a análise aqui esboçada na perspectiva integrada da paisagem, o presente artigo traz uma proposta de zoneamento geoambiental para a Bacia Costeira Caueira/Abaís, como instrumento para subsidiar o ordenamento território-ambiental dessa nova bacia hidrográfica sergipana, buscando através dessa proposta, mecanismos de uso sustentável do solo, respeitando os limites dos elementos naturais que constituem a presente paisagem.
Material e métodos
O levantamento de dados iniciou-se com a revisão bibliográfica, sendo possível contemplar informações de grande relevância para a construção da base teórico-metodológico. Esta etapa foi marcada pelas visitas à Biblioteca da Universidade Federal de Sergipe, à Biblioteca do NPGEO/UFS, aos órgãos do Estado, como a SEPLAG, SEMARH, CODISE, COHIDRO, e às Prefeituras dos Municípios com terras vinculadas à bacia, visando ao acesso às informações cartográficas e dados secundários, como clima, geologia, recursos hídricos, cobertura vegetal, uso e ocupação do solo. Além de visitas a órgãos do Governo do Estado, visitou-se também a EMBRAPA, para o acesso às informações sobre as questões pedológicas. O trabalho de campo para observações in loco consistiu num total de oito visitas à bacia costeira, sendo utilizados equipamentos associados às novas geotecnologias, como: GPS, computadores portáteis (para o armazenamento dos dados coletados), câmera fotográfica e filmadora. Para subsidiar a proposta de compartimentação da paisagem utilizando o método geossistêmico, tornou-se necessário fazer o levantamento de dados secundários durante os trabalhos de campo. No que pese ao levantamento cartográfico vários mapas e cartas foram consultados. A carta- base que viabilizou a elaboração dos produtos cartográficos foi extraída do Atlas Digital sobre Recursos Hídricos de Sergipe, publicado em 2012/2013, a qual sofreu algumas atualizações e acréscimos de vários elementos importantes espacializados ao longo da pesquisa. A área de estudo abrange a carta topográfica Estância, Folha SC.24-Z-D-I, na escala de 1:100.000, com equidistância das curvas de nível de 40 metros, produzidas pela SUDENE em 1974. Na elaboração da Carta de Zoneamento Geoambiental, inicialmente, tornou-se necessária a elaboração da carta de compartimentação da paisagem, uma vez que ela apresenta a integração dos elementos da natureza com a sociedade, demonstrando especificamente o arranjo das atividades humanas sobre o território da bacia. Nesse sentido, observaram-se as proporções litológicas, da cobertura vegetal, tipos de solo e uso e ocupação da terra nos domínios ambientais, para posterior cruzamento de informações. Esse procedimento auxiliou no delineamento das Zonas estabelecidas na proposta de ordenamento território/ambiental da bacia.
Resultado e discussão
Foram definidas as seguintes zonas para a Bacia Costeira Caueira/Abaís:
Zonas de Áreas de Proteção Ecológica (ZAPE); Zonas Restritas ao Uso Agrário
(ZRUA); Zonas de Áreas de Preservação Severa (ZAPS); Zonas de Interesse
Turismo/Residência (ZITR) e as Zonas de Áreas de Exploração Mineral (ZAEM) –
Figura 01.
Zonas de Áreas de Proteção Ecológica (ZAPE)
Representa a maior zona da bacia costeira. Isso devido às características
físico-ambientais de tal unidade da paisagem. Essa zona está inserida nos
geossistemas Planície Costeira e Tabuleiros Costeiros, e nas geofácies
Planície Fluviomarinha, Planície Fluviolagunar, nos Terraços Marinhos, Dunas
Continentais e Superfícies Dissecadas em Colina.
São áreas que atendem as especificações do Código Florestal; localizam-se em
áreas de nascentes que estão dispostas linearmente às margens do rio Água
Doce, bem como outros riachos que compõem a rede de drenagem da bacia;
complexo lagunar, campos de dunas continentais, campos de várzea, e áreas de
mangue
Esses ambientes apresentam, ainda, certo grau de preservação em relação a
suas condições primitivas, porém a expansão da infraestrutura para práticas
de atividades econômicas coloca em risco tais sistemas ambientais (Figura
02).
O uso do solo de maneira desordenada sobre a ZAPE pode afetar, entre outras
coisas:
• Mananciais, que abastecem o rio Água Doce e seus riachos;
• Complexos lagunares, para o uso da piscicultura;
• Retirada de vegetação dos topos dos tabuleiros;
• Desmonte de dunas e aterros para a construção de residências, ou
outros empreendimentos;
• Manguezais, para a prática da carcinicultura, entre outros.
Zonas Restritas ao Uso Agrário (ZRUA)
São áreas que possuem algum tipo de restrição ao uso agrícola ou pecuário,
devido por exemplo, às características pedológicas e susceptibilidade à
erosão, e, por isso, devem possuir formas de utilização que não agridam
diretamente as suas características físicas, como a mecanização de cultivos,
a não rotação de culturas e o excesso hídrico, sendo então preciso um manejo
adequado.
Essa Zona na bacia corresponde as porções onde atualmente algumas práticas
agrícolas são desenvolvidas, principalmente, a cultura do coco-da-baía, e de
áreas destinadas à prática da pastagem, que vem se proliferando nos
geossistemas da bacia costeira.
Zonas de Áreas de Preservação Severa (ZAPS)
Essa Zona ocupa áreas do Geossistema Planície costeira, sobre a Geofáceis
Terraços Marinhos e trecho da geofácies Planície Fluviomarinha.
São zonas que possuem restrição quanto à exploração de recursos naturais e
uso para implementação de infraestrutura, ou qualquer tipo de ocupação
antrópica, e que por isso, devem ser conservadas em sua integridade. Abrigam
ecossistemas com remanescentes da flora e na fauna, campos de dunas, áreas
próximas à linha de costa, enfim, ambientes que apresentam elevada
fragilidade ambiental, devido as suas características físicas.
Na bacia costeira Caueira/Abaís, é comum encontrar na prática várias
atividades de lazer na ZAPR, principalmente nos finais de semana, quando a
população busca lazer nas praias da bacia, e também, nas imediações próximas
à foz do rio Água Doce.
Constatou-se, através dos trabalhos de campo, que essas práticas acabam
comprometendo ecossistemas diretamente relacionados com tais ambientes, pois
são descartados resíduos sólidos ao longo das margens do rio, como também,
sobre o ambiente praial.
Zonas de Áreas de Exploração Mineral (ZAEM)
Zona criada devido à presença de jazidas de exploração de argila sobre o
Geossistema Tabuleiros Costeiros. Essa atividade, causadora de impactos
ambientais diretos nas áreas onde se estabelecem, representa uma atividade
econômica tradicional nas terras vinculadas à bacia hidrográfica. A ação
dessas mineradoras acaba acarretando consequências para os sistemas
ambientais presentes nesse geossistema (Figura 03).
Zonas de Interesse Turismo/Residência (ZITR)
São áreas destinadas à ocupação para primeira e segunda residência. Essas
áreas foram criadas devido a sua existência sobre o espaço da bacia costeira
e ao seu crescimento ao longo das últimas décadas.
O processo de ocupação da linha de costa da bacia ocorreu de forma
desordenada e irregular, pois não houve a preocupação por parte da esfera
pública municipal de elaborar um projeto de urbanização que ordenasse a
ocupação da planície costeira de forma que garantisse a proteção das
estruturas morfológicas do sistema praial, e que durante os períodos de mar
mais agitado impedisse a possível erosão das construções e da infraestrutura
instalada sobre os ambientes costeiros.
Trata de uma Zona que ocupa o Geossistema Planície Costeira, sobre a
Geofáceis Terraços Marinhos e na porção centro sul da bacia, a Geofáceis
planície fluviomarinha. Nessas áreas, encontram-se as praias de maior uso
para a prática de veraneio. A constituição urbana é formada por
empreendimentos comerciais, diários e sazonais, que atendem
preferencialmente os turistas, que buscam, nessas praias, práticas de lazer.
Parte da estrutura urbana é constituída por casas de veraneio, pousadas e
pequenos hotéis (Figura 04). No trecho urbano, não há uma presença
significante da população local ocupando tal infraestrutura.
Zoneamento Geoambiental. Bacia Costeira Caueira/Abaís,2014.
Ambientes presentes na ZAPE. (A)PLanície Fluvio marinha;(B)Dunas pleistocênicas; (C)Paleofalésias; (D) Estuário. Itaporanga D’ Ajuda e Estância, 2014.
As atividades de exploração da argila na ZAEM. Itaporanga D’Ajuda, 2013.
Casas de veraneio, comércio, e o descarte de resíduos sólidos, marcando a paisagem nessa Zona. Estância, 2013.
Considerações Finais
A ausência de ordenamento territorial-ambiental no uso e ocupação do solo na área da bacia está acelerando os processos degradacionais das coberturas vegetais remanescentes, que servem de berçários para diversos ecossistemas, além de servirem de proteção natural contra os impactos erosivos sobre os solos. Pouco mais de 20% da área da bacia possui alguma restrição no tocante à atividade agrária e que estas acabam sendo o abrigo de culturas não rotativas e permanentes e sem grande alcance ou orientação comercial. São cultivos familiares que usam a base dos tabuleiros costeiros e alguns trechos das planícies fluviolagunares e fluviomarinha As zonas destinadas à preservação permanente responderiam a 60% de toda a bacia, mas na prática estão bem comprometidas pelo intenso uso agrário, e a expansão do turismo, com a implementação de grandes obras de infraestrutura, o que ocasiona a supressão da vegetação original e comprometimento das estruturas ambientais dessa zona. As unidades de conservação, RPPN, reservas ecológicas e demais componentes da zona de conservação e uso indireto merecem ser ampliadas pois garantem a plena conservação de remanescentes vegetais em todos os geossistemas e o resguardo dos recursos hídricos da bacia. As áreas destinadas ao turismo e à construção de residências na bacia respondem em torno de 5%, bem como a zona de uso de mineração, que só é encontrada no geossistema Tabuleiros Costeiros, e representa também 5% da área total da bacia.
Agradecimentos
Agradeço a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pelos recursos disponibilizados através da bolsa de pesquisa para o mestrado acadêmico, ao Grupo de Pesquisa em Dinâmica Ambiental e Geomorfologia – DAGEO – pelo espaço e equipamentos para o desenvolvimento da pesquisa e ao Núcleo de Pós-graduação em Geografia (NPGEO) da Universidade Federal de Sergipe (UFS).
Referências
AB’ SABER, A.N.Os domínios da natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. 4.ed.
São Paulo: Ateliê Editorial, 2003.
ARAÚJO, Hélio Mário de, A Bacia Hidrográfica como unidade geográfica de planejamento e gestão ambiental,In: ARAÚJO, H. M. de, SANTOS, N. D. dos (orgs.).Temas de Geografia Contemporânea: teoria, método e aplicações - São Cristóvão: Editora UFS, 2010.
DE NARDIN, Dionara. Zoneamento Geoambiental no oeste do Rio Grande do Sul: um estudo em bacias hidrográficas. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Instituto de Geociências. Programa de Pós Graduação em Geografia, Porto Alegre, 2009.
SEMARH. Atlas Digital 2011. Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Sergipe, Aracaju, 2011.
_________. Atlas Digital 2012. Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Sergipe, Aracaju, 2012.
_________. Atlas Digital 2013. Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Sergipe, Aracaju, 2012.
SERGIPE. Elaboração do Plano Estadual de Recursos Hídricos de Sergipe. Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos - Programa Nacional de Desenvolvimento dos Recursos Hídricos - PROÁGUA Nacional, 2013.