Autores
Mangueira, C.G. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ) ; Goudard, G. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ) ; Santos, L.J.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ)
Resumo
O noroeste do estado do Paraná congrega diversos fatores que contribuem para a deflagração de erosões lineares aceleradas, sendo que a maior parte dos estudos relativos a esta temática, enfatiza a erodibilidade dos solos, em detrimento da erosividade das chuvas. Dessa forma, o presente trabalho objetiva analisar a evolução de processos erosivos associada a erosividade das chuvas nos municípios de Umuarama e Paranavaí de 2005 a 2015. Para tanto, foram mapeadas, com base em imagens do Google Earth, as evoluções das feições erosivas, bem como foram utilizados índices de erosividade e coeficientes de chuva baseados nas equações de Fournier (1960) e Rufino et al. (1993), de modo conjugado a análises de persistências das precipitações e eventos pluviais extremos com o intuito de compreender as relações de diferentes impactos pluviais frente às erosões. Os resultados indicaram associações dos anos de avanços erosivos com a concentração de chuvas extremas e consecutivas na
Palavras chaves
Erosividade; chuvas; noroeste
Introdução
Os processos erosivos geralmente ocorrem em áreas nas quais há uma conjunção de fatores que as tornam suscetíveis, sendo que a geologia, o relevo, o clima, o solo e as atividades antrópicas merecem destaque neste contexto. Segundo Boin (2000), uma significativa parcela dos estudos sobre erosão hídrica privilegia enfoques sobre a erodibilidade dos solos, em detrimento do estudo da erosividade das chuvas. Esta tendência determina um distanciamento do conhecimento da dinâmica atmosférica e do seu papel na gênese, distribuição e intensidade das chuvas, as quais configuram-se como causadoras e potencializadoras de processos erosivos. O noroeste do Paraná congrega diversos fatores que contribuem para a deflagração de erosões lineares aceleradas. Ressalta-se, neste sentido, a geologia - o Grupo Caiuá – visto que tratam-se de rochas sedimentares, essencialmente arenosas. O substrato geológico condiciona fortemente os processos erosivos, uma vez que determina a natureza e a textura dos solos, formados a partir da alteração das rochas, condicionando também o desenvolvimento das formas de relevo. Nesse sentido, os solos predominantes na região, Latossolos e Argissolos, e sua posição no relevo, também tornam-se de importância para o entendimento da instalação e desenvolvimento das erosões. Por estar localizado preferencialmente no terço superior da vertente, os Latossolos não constituem um solo preferencialmente erosivo, por serem espessos, mais homogêneos e com porosidade intercomunicantes, o que facilita a infiltração e percolação da água. Já os Argissolos localizam-se preferencialmente nos terços médios e finais das vertentes, onde há rupturas de declividades e, por ter uma descontinuidade textural, promove um escoamento subsuperficial, em um primeiro momento, possibilitando o surgimento das feições nesse contato (MANGUEIRA et al, 2013). Do ponto de vista das chuvas, estas contribuem tanto nos processos de formação e transformação dos solos, como também atuam removendo seus constituintes, em uma constante relação de formação/remoção, onde a erosão é natural dentro do sistema. Contudo, quando esse equilíbrio é rompido por algum fator, em sua maioria pela interferência antrópica, este processo é alterado, intensificando a remoção do solo em detrimento à sua formação. Neste caso, considera-se a erosão como acelerada. Em sua forma mais desenvolvida, a erosão linear estabelece elevado grau de degradação e é de difícil contenção. Dessa forma, a ocupação e instalação das cidades da região coloca em evidência grande parte das respostas para o número de processos erosivos que afligem as áreas urbanas. Os principais núcleos urbanos se estabeleceram por praticidade e funcionalidade, preferencialmente no entroncamento entre as cumeadas principais e secundárias (BARNABÉ, 1989). Essa disposição das cidades culminou para um histórico de manejos inadequados, resultando em escoamento concentrado e acúmulo das águas no terço médio das vertentes e, consequentemente, no desenvolvimento de processos erosivos, de modo que, atualmente, nas cidades do noroeste do estado verificam-se erosões ativas, muitas delas com avanço rápido remontante. Neste contexto, partindo-se da concentração de processos erosivos na região, bem como da carência de estudos voltados à erosividade, este trabalho objetiva analisar a dinâmica pluvial em dois municípios do noroeste do Paraná, Umuarama e Paranavaí (figura 1), visando a identificação de diferentes impactos pluviais frente às erosões. Para tanto, foram utilizados índices de erosividade, coeficientes de chuva, persistências e eventos extremos de chuva, de modo conjugado ao mapeamento da evolução de processos erosivos previamente cadastrados na região. As duas cidades foram selecionadas, pois apresentam grande número de erosões dentro da área urbana, bem como estão entre as cidades de maior expressividade populacional da região. Além disso, suas estações pluviométricas.
Material e métodos
Quanto à evolução dos processos erosivos Para compreender a interação entre as dinâmicas pluviais e a evolução do processo erosivo nos municípios escolhidos, foram selecionadas duas voçorocas – uma em cada cidade – a fim de acompanhar sua evolução no período de 10 anos (2005-2015). As informações das erosões já fazem parte do banco de dados do Laboratório de Biogeografia e Solos da Universidade Federal do Paraná. Em convênio com o Serviço Geológico do Paraná (MINEROPAR), foram identificados 33 municípios com erosões, em um total de 98 feições. Dentro do município de Paranavaí, 8 erosões urbanas foram identificadas, sendo que para esse trabalho a voçoroca PA04 foi selecionada. Já para o município de Umuarama, destacam-se 4 erosões urbanas, sendo que a selecionada foi a UM02. As erosões foram escolhidas por estarem perto de equipamentos urbanos e moradias. O mapeamento foi realizado no software ArcGIS 10.1 e imagens de satélites liberadas gratuitamente do software Google Earth Pro, de resolução 1500x944. Com a imagem retirada do Google Earth Pro, foi possível fazer o georreferenciamento usando o banco de dados de imagens base. A seguir, delimitaram-se os polígonos de diferentes datas avaliadas e fez-se um cálculo estimado do aumento das erosões em m². Quanto às dinâmicas pluviais e o índice de erosividade As análises das condições pluviais foram realizadas com base em aportes da literatura e dados diários das estações meteorológicas de Paranavaí (02352017) e Umuarama (02353008) na temporalidade de 2005 a 2015, cujos dados foram disponibilizados pelo IAPAR – Instituto Agronômico do Paraná. O cálculo da erosividade mensal e anual baseou-se no coeficiente de chuva, determinado pela equação de Fournier (1960), segundo a qual Rc = p²/ P (equação 01), em que Rc é o coeficiente de relação da chuva, p é a precipitação média mensal (mm) e P é a precipitação média anual (mm). Os valores mensais de Rc possibilitaram a estimativa do índice de erosividade através de equações lineares (equação 02 e 03) propostas por Rufino et al (1993) e revalidadas por Waltrick (2010) para os municípios do estado do Paraná divididos em 8 regiões: Y = 164,12 ± 39,44 x (equação 02 - Paranavaí) Y = 182,86 ± 56,21 x (equação 03 - Umuarama) A variável Y corresponde à erosividade mensal (EI30), e X o coeficiente de chuva (Rc). Destaca-se que a soma dos EI30 mensais resultou no EI30 anual para o recorte temporal de estudo. De modo conjugado, com o intuito de compreender as relações entre os processos erosivos e as dinâmicas pluviais, foram analisados os eventos extremos de chuva, considerados no presente estudo como aqueles iguais ou superiores ao percentil 99% (ETCCDMI, 2009), correspondente a 1% das precipitações mais expressivas em uma série de dados e, utilizado de maneira satisfatória em estudos recentes (HALLAL, 2007; BARCELLOS, 2009; GOUDARD, 2015) para a determinação de elevados totais pluviais diários com potencial de deflagração de impactos. Os limiares de chuva extrema foram determinados a partir de análises de dados diários para um período de 30 anos (1986 a 2015) no contexto das estações meteorológicas supracitadas, sendo estes valores iguais a 53,4 mm/24h e 58,1 mm/24h para Paranavaí e Umuarama, respectivamente. Estes eventos foram analisados quanto à frequência anual, relativa ao número de eventos no ano iguais ou superiores aos limiares determinados. Sabendo-se que a erosão encontra-se relacionada ao impacto e concentração da chuva no solo, também foram analisadas precipitações médias mensais, bem como, parâmetros de persistência das precipitações. A persistência relaciona-se à consecutividade de dias de chuva diária iguais ou superiores a 0,1 mm (MARTÍN-VIDE, 2003). No âmbito deste estudo foram calculados os números totais de dias consecutivos de chuva de 2005 a 2015, concomitantemente ao total anual da consecutividade máxima mensal, com o intuito de evidenciar os impactos das chuvas.
Resultado e discussão
A erosão PA04 (figura 02), de Paranavaí, segundo a última imagem de satélite
disponível de 2014, tem extensão de 279 metros no seu eixo principal, com
sua cabeceira situada no terço médio da vertente e não está conectada à rede
de drenagem. Apresenta pouca vegetação herbácea na cabeceira de drenagem
principal. Já na ramificação lateral, não apresenta vegetação alguma,
sinalizando seu caráter ativo.
Quando analisada do ponto de vista da área total estimada, constata-se seu
rápido avanço ao longo dos anos analisados. Do ano de 2006 para 2014, seu
aumento foi de 105%, sendo que o ano de 2010 merece destaque. Neste ano,
houve um aumento de 18,52% da área estimada, bem como o avanço e alargamento
da cabeceira, o aprofundamento do seu eixo principal e o rápido crescimento
da sua ramificação. A área calculada para o ano de 2014 também chama
atenção, entretanto seu aumento é referente ao acumulado de 4 anos
consecutivos.
De maneira geral, das 8 erosões cadastradas para Paranavaí, 6 delas
apresentaram mudanças significativas, principalmente no ano de 2010. Essas
mudanças incluem aparecimento de ramificações remontantes, alargamento das
margens, aparecimento de ravinas paralelas ao eixo principal da voçoroca e
avanço da cabeceira.
Quanto à erosão UM02 (figura 02), a última imagem disponível data de 2013,
com extensão de 1.200 metros, aproximadamente. Conjuntamente com a erosão de
Paranavaí, essa também não está ligada à rede de drenagem e está localizada
no terço médio da vertente. Apresenta vegetação em seu interior, indicando
possível estabilização da cabeceira.
Essa erosão, até 2013, era dividida em duas partes (figura 02). A porção
menor não sofreu alterações significativas ao longo do tempo, de modo que
não apresentou ramificações ou avanço remontante expressivo. Entretanto, a
segunda porção teve um avanço expressivo entre 2012 e 2013, chegando a se
conectar com a porção menor em 2013. No que diz respeito à área total
estimada, seu avanço de 2012 para 2013, chega a 39,11%. Quanto às feições
erosivas, pode-se observar na imagem a cabeceira de drenagem do eixo
principal avançar em direção a parte mais alta da vertente, algumas outras
pequenas ramificações laterais e o aprofundamento da erosão.
No ano de 2012/2013 em Umuarama, todas as 4 erosões cadastradas sofreram
avanço remontante significativo. Algumas não constam nas imagens dos anos
anteriores e aparecem somente nas imagens de 2012/2013. O avanço da
cabeceira de drenagem foi a principal forma de crescimento encontrada.
As erosões analisadas, dentro da área urbana das cidades, sofrem influência
antrópica direta, tanto pelo traçado do sistema viário quanto pela
deficiência de dissipação do sistema de drenagem de águas pluviais e
servidas.
A urbanização, como toda obra que interpõe estruturas pouco permeáveis entre
o solo e a chuva, faz com que o escoamento seja incrementado com a
diminuição da infiltração, promovendo uma mudança de regime de escoamento
local. A soma dos processos de ordem natural e de infraestrutura urbana,
quase sempre levam a uma incompatibilização entre o volume de água pluvial
que chega às caixas coletoras distribuídas na cidade e a capacidade da mesma
em dar vazão a esse volume, podendo levar ao rompimento da estrutura,
formando assim no local uma cicatriz erosiva.
Por esse motivo, quando se analisa a erosividade da chuva em ambientes
urbanos, podemos afirmar que a resposta desse fator controlador de erosões
avançadas será muito mais rápida em relação ao ambiente rural, de modo que a
compreensão das dinâmicas pluviais nestas áreas torna-se relevante.
No que se refere aos padrões de precipitação e as relações com os processos
erosivos (figura 03), em ambos os municípios, se nota uma sazonalidade das
condições favoráveis ao desenvolvimento de erosões, visto que as chuvas
concentram-se, sobretudo, nos meses de primavera e verão, em detrimento do
inverno e outono. Os maiores acumulados médios pluviais mensais são
verificados em outubro (200,7 mm), novembro (189,4 mm) e fevereiro (189,2
mm) para Umuarama e, em fevereiro (200,8 mm), janeiro (183,7 mm) e novembro
(181,6 mm) em Paranavaí. Em contrapartida, os menores valores destacam-se no
mês de agosto, sendo iguais a 61,4 mm e 43,2 mm para Umuarama e Paranavaí,
respectivamente.
Quanto à erosividade (figura 03), evidencia-se que esta encontra-se
fortemente atrelada a dinâmica pluvial, sendo também mais significativa nos
meses de verão e primavera. No município de Umuarama as erosividades médias
mensais são mais expressivas, com variações de 307 (agosto) a 1513 MJ mm
ha-1 h-1 ano-1 (outubro), ao passo que em
Paranavaí os valores variam de 211 (agosto) a 1177 MJ mm ha-1
h-1 ano-1 (fevereiro). Ressalta-se que os coeficientes
de chuva também seguiram os padrões supracitados.
Do ponto de vista da erosividade média anual, Umuarama apresentou o valor de
10806 MJ mm ha-1 h-1 ano-1 e Paranavaí,
7799 MJ mm ha-1 h-1 ano-1. Estes resultados
encontram-se em concordância com os estudos de Waltrick (2010), ao
identificar a distribuição espaço-temporal da erosividade no estado do
Paraná no período de 1986 a 2008, colocando em evidência as regiões
sudoeste, litorânea e noroeste em face das erosividades mais expressivas,
tanto total, como mensalmente. Neste estudo, a região noroeste apresentou
valores de erosividades médias anuais variando de 7000 a 11000 MJ mm
ha-1 h-1 ano-1.
No âmbito dos eventos pluviais extremos (figura 04), constataram-se
variações anuais significativas entre 2005 e 2015, de modo que o número de
dias com elevados totais pluviais destacou-se nos anos de 2006, 2011 e 2015,
em Umuarama, com 7, 5 e 8 eventos extremos, respectivamente. Em Paranavaí,
evidenciaram-se 6 dias de eventos pluviais extremos em 2009 e 2013, e 12
eventos em 2015.
O ano de 2015 apresentou os valores mais expressivos em ambas as estações em
função de tratar-se de um ano de El Niño (EN) forte (NOAA, 2016), sendo que,
de acordo com Grimm et al. (1998, 2009), o EN impacta fortemente a
frequência de eventos extremos de precipitação sobre o Sul do Brasil,
intensificando a ocorrência destes processos.
A análise conjugada dos eventos extremos (figura 04) e da evolução dos
processos erosivos (figura 02), permite constatar que os anos de 2009 e 2011
apresentaram, respectivamente, as maiores quantidades de extremos pluviais
para os municípios de Paranavaí e Umuarama, sendo que após anos com maiores
frequências destes eventos, os avanços das feições erosivas foram mais
expressivos, como em 2010 para Paranavaí e 2012/13 para Umuarama.
Em relação à persistência das precipitações (figura 04), em Umuarama nos
anos de 2013 (114 dias/ano) e 2015 (113 dias/ano) constataram-se as maiores
frequências de dias de chuva consecutiva. Este fato também foi evidenciado
em face dos totais anuais de persistências máximas mensais, os quais
destacaram-se nos mesmos anos. Ressalta-se ainda, que o ano de 2013 foi o
que apresentou as maiores evoluções dos processos erosivos na área.
Em Paranavaí, no que se refere às persistências totais anuais, os anos de
2009 (110 dias/ano) e 2015 (117 dias/ano) foram mais significativos, ao
passo que em relação às consecutividades máximas, 2009 (51 dias/ano) e 2010
(54 dias/ano) merecem destaque. Do ponto de vista da evolução das feições
erosivas, 2010 apresentou avanços estimados de 18,52%, coincidindo com o ano
seguinte as maiores concentrações de eventos pluviais extremos e totais
anuais de dias de chuva consecutiva, bem como configurando-se como o ano de
maiores totais de persistência máxima mensal.
Localização da área de estudo.
Evolução das erosões de Paranavaí e Umuarama.
Precipitação Média Mensal e Erosividade Média Mensal de Umuarama e Paranavaí (2005 – 2015).
Eventos Pluviais Extremos e Persistência da Precipitação para Umuarama e Paranavaí (2005 – 2015).
Considerações Finais
Em relação à evolução das erosões e a dinâmica pluvial verificou-se uma sazonalidade significativa das chuvas associada aos processos erosivos no noroeste do Paraná, com acumulados médios pluviais mensais e erosividades mais significativos no âmbito dos meses de primavera e verão. Quanto à erosividade média anual, Umuarama apresentou o valor de 10806MJ mm ha-1 h-1 ano-1 e Paranavaí, 7799MJ mm ha-1 h-1 ano-1 para o recorte temporal deste estudo. O crescimento total da erosão de Paranavaí, no período de 2005 a 2015, foi de 105%, sendo que o ano de 2010 se destacou com um percentual de 18,52%. Para Umuarama, o crescimento total no período foi de 66%, sendo 2012 e 2013 os anos de destaque da evolução, com crescimento de 39,11%. Ressalta-se, neste sentido, que a dinâmica pluvial associada à intervenção antrópica corresponderam aos principais fatores de avanço e crescimento das erosões urbanas nestas cidades A análise conjugada destes processos com os eventos pluviais extremos e a consecutividade de dias de chuva, permitiu constatar que após anos com maiores frequências de eventos extremos, os avanços das feições erosivas foram mais expressivos, bem como, em contextos de persistências de precipitação, estes processos também ganham relevância. Dessa forma, o ano de 2015 merece atenção, em função de tratar-se de um ano de El Niño forte, de modo que as relações encontradas neste estudo, indicam tendências de avanços erosivos expressivos no ano consecutivo à 2016.
Agradecimentos
Referências
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