Autores
Silva, F.J.L.T. (UFPI) ; Aquino, C.M.S. (UFPI)
Resumo
Refletir sobre a importância da abordagem geomorfológica enquanto ponto de partida para o estudo integrado dos sistemas ambientais a partir do viés sistêmico constituiu tarefa das mais empolgantes. O principal recurso metodológico utilizado para a elaboração desta pesquisa foi a revisão de literatura. Demonstrar as contribuições da Geomorfologia aos estudos geográficos no contexto das pesquisas regionais, mediante a construção de um panorama geral dos enfoques temáticos, possibilitou um melhor entendimento sobre os caminhos que vêm sendo trilhados por aqueles que se dedicam ao esclarecimento das potencialidades naturais da Região Nordeste brasileira. O relevo foi enaltecido como componente integrador dos demais elementos do quadro natural. Ao se analisar o temário geral das pesquisas, evidenciou-se que significativa parcela dos pesquisadores está seriamente engajada em subsidiar, cientificamente, o tratamento das questões de cunho ambiental e de ordenamento territorial.
Palavras chaves
Relevo; Sistemas ambientais; Temas e abordagens
Introdução
A apropriação espontaneísta da natureza pela sociedade e a ineficiência dos programas de planejamento ambiental vêm comprometendo a qualidade e o equilíbrio dos sistemas ambientais, concebidos por Souza et al. (2009) como o arranjo espacial decorrente da similaridade de relações entre os componentes naturais – de natureza geológica, geomorfológica, hidroclimática, pedológica e fitoecológica. Nessa perspectiva, tendo em vista a conservação e/ou preservação do meio ambiente, os pesquisadores estão permanentemente elaborando métodos de investigação mais refinados para melhor compreender os mecanismos regentes da dinâmica da natureza, levando as ciências a importantes desenvolvimentos conceituais, teóricos e metodológicos no intuito de operacionalizar o uso sustentável dos recursos naturais. No contexto da Geomorfologia, a abordagem geossistêmica vem sendo trabalhada como possibilidade metodológica, em que o relevo é enaltecido como suporte e âncora para o estudo da organização espacial dos sistemas ambientais, incorporando mais adequadamente as variáveis ambientais e sociais ao estudo da organização do espaço – o objeto de estudo da Geografia. Com base nestas colocações preliminares, o desenvolvimento da pesquisa foi norteado a partir do seguinte objetivo geral: refletir sobre a importância do conhecimento geomorfológico enquanto ponto de partida para o estudo integrado dos sistemas ambientais a partir da abordagem sistêmica. Os objetivos específicos foram: (a) realizar o levantamento de estudos aplicados no Nordeste brasileiro e (b) analisar os enfoques temáticos e os aportes teórico-metodológicos dos estudos regionais.
Material e métodos
O principal recurso metodológico utilizado para a elaboração desta pesquisa foi a revisão de literatura, compreendendo levantamento bibliográfico referente à natureza, à importância e ao escopo investigativo da ciência geomorfológica.
Resultado e discussão
Apresenta-se, a seguir, um levantamento preliminar de estudos no cerne dos
quais a
abordagem geomorfológica é o fio condutor das investigações.
1. Avaliação geoambiental do município de Jacobina-BA através das técnicas
de
geoprocessamento: um suporte ao ordenamento territorial (PINHEIRO, 2004).
Respaldando-se na perspectiva geossistêmica, este estudo teve por objetivo
analisar
as condições de estabilidade/instabilidade das unidades geossistêmicas no
município
de Jacobina, Bahia, evidenciando, também, os limites e potencialidades de
cada
unidade para fins de planejamento ambiental. Foram cartografadas 6 unidades
geossistêmicas e as respectivas subunidades geoambientais, num total de 16
subunidades. Os resultados, obtidos a partir da análise da morfodinâmica,
acusaram
as seguintes classes e índices de estabilidade na área estudada: Boa
estabilidade
(12,5%); Estabilidade satisfatória (25,0%); Estabilidade moderada (39,0%);
Estabilidade ruim (23,3%); Estabilidade crítica (0,20%).
2. Análise geoambiental como subsídio ao planejamento territorial do
município de
Maracanaú-CE (ALMEIDA, 2005).
Este estudo analisou o contexto geoambiental do município em epígrafe,
procedendo-se
à delimitação dos sistemas ambientais com vistas a subsidiar o zoneamento
ambiental.
A compartimentação geoambiental foi feita a partir das unidades
geomorfológicas,
reconhecidas como critério de maior facilidade para fins de identificação e
delimitação preliminar das unidades de paisagem. Foram projetados 4 domínios
naturais (unidades geossistêmicas): (a) Planícies de Acumulação Aluvial e
Terraços;
(b) Glacis de Deposição pré-Litorâneos; (c) Depressão Sertaneja e (d)
Maciços
Residuais. No cerne destas unidades geossistêmicas foram distinguidas 8
sistemas
ambientais (unidades de geofácies): (a) Planície Fluvial do rio
Maranguapinho; (b)
Planície Fluvial do rio Timbó; (c) Planícies Flúvio-Lacustres, Lacustres e
Áreas de
Acumulação Inundáveis; (d) Tabuleiros Pré-Litorâneos de Pajuçara; (e)
Tabuleiros
Pré-Litorâneos de Jaçanaú; (f) Depressão Semiárida/Subúmida de
Maranguape/Aratanha;
(g) Vertente Norte-Oriental Subúmida/Seca da Serra de Aratanha; (h)
Vertente Norte-
Ocidental Úmida/Subúmida da Serra de Maranguape.
3. Análise ambiental do alto curso da microbacia do rio da Batateira no
município do
Crato-CE: subsídios ao zoneamento ecológico-econômico (MAGALHÃES, 2006).
Esta pesquisa focalizou a análise dos condicionantes geoambientais da área
de estudo
em epígrafe, visando a orientar o uso e ocupação da terra a partir do
zoneamento
ecológico-econômico. O estudo analisou também as potencialidades e
limitações das
unidades geossistêmicas delimitadas. Foram projetados 3 geossistemas, a
saber: (a)
Chapada do Araripe/Patamar do Entorno; (b) Depressão Periférica Meridional e
(c)
Vales Úmidos do Cariri cearense. As unidades de geofácies identificadas
foram: (a)
Platô Oriental; (b) Vertente Oriental da Chapada do Araripe; (c) Sertões do
Cariri
cearense e (d) Planície Fluvial do rio da Batateira. Dentre as
potencialidades
sublinhadas no âmbito desta microbacia, podem ser destacadas: bom potencial
hídrico,
solos profundos, turismo e lazer. Em relação às limitações da área,
destacam-se:
cobertura vegetal antropizada, solos lixiviados, irregularidade
pluviométrica e
riscos de inundações sazonais.
4. Análise geoambiental e socioeconômica dos municípios costeiros do litoral
norte
do Estado de Sergipe – diagnóstico como subsídio ao ordenamento e gestão do
território (ALVES, 2010).
Pautando-se nos princípios geomorfológicos e na metodologia geossistêmica,
Alves
(2010) objetivou realizar o diagnóstico geoambiental de quatro municípios
costeiros
de Sergipe, com vistas ao zoneamento ecológico-econômico da área estudada,
utilizando-se dos graus de vulnerabilidade ambiental das unidades de
paisagem
identificadas e da classificação ecodinâmica dos ambientes. Considerando a
paisagem
enquanto unidade concreta de análise, a autora em epígrafe delimitou os
seguintes
macrocompartimentos paisagísticos: (a) Paisagem das morfologias de agradação
dos
ambientes costeiro e eólico; (b) Paisagem das morfologias de agradação dos
ambientes
inundáveis; (c) Paisagem das morfologias de erosão do ambiente eólico; (d)
Paisagem
das morfologias de agradação do ambiente de vertentes; (e) Paisagem das
morfologias
da superfície de aplanamento conservada; (f) Paisagem das morfologias da
superfície
de aplanamento dissecada; (g) Paisagem das morfologias da superfície
dissecada.
5. Análise de sistemas ambientais aplicada ao planejamento: estudo em macro
e
mesoescala na região da bacia hidrográfica do rio Apodi, Mossoró-RN, Brasil
(CARVALHO, 2011).
Baseando-se nos pressupostos da abordagem geossistêmica e ainda sublinhando
o relevo
enquanto elo de integração do ambiente físico, Carvalho (2011) identificou 7
sistemas ambientais: (a) Faixa de praia e dunas frontais – sistema
caracterizado
como fortemente instável; (b) Terraço marinho – sistema caracterizado como
de
transição; (c) Campo de dunas – sistema caracterizado como fortemente
instável; (d)
Planície flúvio-marinha – diagnosticado como sistema fortemente instável;
(e)
Planície flúvio-lacustre – sistema identificado como fortemente instável;
(f)
Chapada do Apodi – sistema identificado como de transição e (g) Tabuleiro
Costeiro –
sistema caracterizado como estável.
6. Sistemas ambientais e vulnerabilidades ao uso terra no vale do rio Pacoti
- CE:
subsídios ao ordenamento territorial (CRISPIM, 2011).
A pesquisa analisou os sistemas ambientais do município de Pacoti, no Ceará,
considerando os diferentes estágios morfodinâmicos de cada sistema e suas
vulnerabilidades. A partir dos aspectos geomorfológicos, Crispim (2011)
reconheceu 3
unidades ecodinâmicas e respectivas unidades de intervenção, num total de 10
sistemas: (a) Ambientes Frágeis com Ecodinâmica de Ambientes Instáveis
(Faixa de
praia e campo de dunas móveis, Dunas fixas, Planície flúvio-marinha,
Parcelas das
planícies fluviais, Parcelas das planícies lacustres, Parcelas das vertentes
íngremes e Cristas/morros residuais); (b) Áreas Medianamente Frágeis com
Ecodinâmica
de Ambientes em Estado de Transição (Maciços residuais); (c) Áreas
Medianamente
Estáveis com Ecodinâmica de Ambientes Estáveis (Áreas medianamente estáveis
dos
tabuleiros costeiros e Áreas medianamente estáveis da depressão sertaneja).
Os estudos anteriormente apresentados possibilitaram a construção de um
panorama
geral dos enfoques temáticos trabalhados pelos pesquisadores regionais.
Dentre as
constatações aferidas, destacam-se: (a) o forte direcionamento dos estudos
para as
questões ambientais e subtemas afins; (b) o destaque da abordagem
geossistêmica como
instrumental teórico-metodológico e (c) o enaltecimento da Geomorfologia
como
ciência âncora para os estudos ambientais, em que o relevo é a categoria de
análise
ressaltada para os estudos integrados (Figura 1).
O tema mais sublinhado pelas pesquisas regionais foi zoneamento ambiental,
perfazendo 40,0% das pesquisas.
Os estudos sobre vulnerabilidade ambiental despontaram como outra tendência
temática
no seio dos estudos regionais, com o montante de 20,0% do total das análises
levantadas.
Para certos intérpretes, a abordagem geossistêmica estará plenamente
desenvolvida
apenas quando a dimensão social for adequadamente trabalhada pela Geografia
(MENDONÇA, 2001). Logo, não basta realizar o estudo integrado dos
condicionantes
naturais, fazendo-se necessária, ainda, a compreensão dos agentes sociais e
políticos atuantes na organização do espaço, cujo reflexo das dinâmicas
socioambientais projetam-se em determinado recorte espacial. Este
direcionamento
temático tem encontrado respaldo no cerne dos estudos regionais, somando
significativos 20,0% das pesquisas.
Com 10,0% das análises, os estudos sobre a dinâmica das bacias hidrográficas
continuam atraindo a atenção dos pesquisadores.
A questão ambiental deu a tônica aos estudos sobre desertificação e
degradação
ambiental, computando 10,0% do total.
A Figura 1 apresenta um panorama dos temas mais trabalhados em âmbito regional.
Considerações Finais
O levantamento preliminar de estudos aplicados na Região Nordeste brasileira ofereceu importantes subsídios para a discussão sobre a importância da Geomorfologia enquanto ciência de integração dos condicionantes ambientais, a partir do viés sistêmico. Embora significativa parcela das pesquisas apresentadas seja de natureza geográfica, construídas a partir do paradigma interdisciplinar, vislumbrou-se que os métodos e princípios próprios da abordagem geomorfológica têm constituído fonte de inspiração para os pesquisadores regionais no contexto dos estudos integrados. Constatou-se também que, em termos regionais, a temática ambiental deu a tônica às investigações, sob os mais variados enfoques temáticos, e tem sido preferencialmente tratada sob a égide teórico-metodológica da Geografia Física, cujos estudos buscam refúgio em matrizes teóricas integrativas, destacando-se o receituário metodológico geossistêmico (SOTCHAVA, 1977; CHRISTOFOLETTI, 1999; MONTEIRO, 2000; BERTRAND, 2004). Em relação aos enfoques temáticos, os mais focalizados em âmbito regional foram: zoneamento ambiental (40,0%), vulnerabilidade ambiental (20,0%), dinâmicas socioambientais (20,0%), análise de bacias hidrográficas (10,0%) e desertificação/degradação ambiental (10,0%).
Agradecimentos
Referências
ALMEIDA, Lutiane Q. de. Análise geoambiental como subsídio ao planejamento territorial do município de Maracanaú, CE. 235 f. Dissertação (Mestrado em Geografia). Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, 2005.
ALVES, Neise M. de S. Análise geoambiental e socioeconômica dos municípios costeiros do Litoral Norte do Estado de Sergipe – diagnóstico como subsídio ao ordenamento e gestão do território. 321 f. Tese (Doutorado em Geografia). Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2010.
BERTRAND, Georges. Paisagem e geografia física global: esboço metodológico. Revista Ra’ega, Curitiba, v. 8, p. 141-152, mai. 2004.
CARVALHO, Rodrigo G. de. Análise de sistemas ambientais aplicada ao planejamento: estudo em macro e mesoescala na região da bacia hidrográfica do Rio Apodi, Mossoró-RN, Brasil. 269 f. Tese (Doutorado em Geografia). Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2011.
CHRISTOFOLETTI, Antonio. Modelagem de sistemas ambientais. São Paulo: Edgard Blücher, 1999.
CRISPIM, Andrea B. Sistemas ambientais e vulnerabilidades ao uso terra no vale do rio Pacoti - CE: subsídios ao ordenamento territorial. 201 f. Dissertação. (Mestrado em Geografia). Universidade Estadual do Ceará, 2011.
MAGALHÃES, Alessandra de O. Análise ambiental do alto curso da microbacia do Rio da Batateira no município do Crato-CE: subsídios ao zoneamento ecológico-econômico. 200 f. Dissertação (Mestrado em Geografia). Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2006.
MENDONÇA, Francisco. Geografia socioambiental. Terra Livre. AGB. São Paulo, n. 16, 2001, p. 113-132.
MONTEIRO, Carlos A. de F. Geossistemas: a história de uma procura. São Paulo: Contexto, 2000.
PINHEIRO, Christiane F. Avaliação geoambiental do município de Jacobina-BA através das técnicas de geoprocessamento: um suporte ao ordenamento territorial. 267 f. Dissertação (Mestrado em Geografia). Universidade Federal da Bahia. Instituto de Geociências, Salvador, 2004.
SOTCHAVA, Viktor B. O estudo de geossistemas. Métodos em questão, IG/USP, n.16, p. 2-52. São Paulo, 1977.
SOUZA, Marcos J. N.; NETO, José M.; SANTOS, Jader O.; GONDIM, Marcelo S. Diagnóstico geoambiental do município de Fortaleza: subsídios ao macrozoneamento ambiental e à revisão do Plano Diretor Participativo – PDPFor. Fortaleza, 2009.