Autores
Neves, S. (UFPA) ; Serrao, G. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARA) ; Morais Junior, H. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARA)
Resumo
A geomorfologia costeira é o ramo da ciência que se dedica a estudar as paisagens, gênese e dinâmica das formas de relevo, na zona de contato entre as terras e os mares. A ilha de Mosqueiro pertence ao município de Belém-Pará. Nos últimos anos, a erosão nas orlas de Mosqueiro tem preocupado a população local e adquirido grande repercussão nos noticiários, particularmente na orla do Maraú. A intensa ocupação na orla do Maraú, junto a erosão, configura-se um importante campo de análise dentro dos preceitos da zona costeira. Diante dessas constatações, este trabalho propõe uma análise da dinâmica costeira da orla do Maraú, em Mosqueiro, tendo como base os indicadores físicos, biológicos e antrópicos. A metodologia consistiu de: (a) levantamento e revisão e atualização bibliográfica sobre a zona costeira paraense, (b) trabalho de campo (c) trabalho de laboratório. Como resultado foram delimitados 4 setores distintos quanto a estrutura, uso e hidrodinâmica.
Palavras chaves
linha de costa; morfodinamica; erosao
Introdução
A preocupação em planejar a ocupação e utilização de ambientes costeiros é um processo crescente, sobretudo na região nordeste do estado do Pará. A presença de uma planície flúvio-marinha dominada por extensos manguezais e ecossistema singular tem sido motivo para a criação de inúmeras reservas de desenvolvimento sustentável. Paralelamente a isso, observa-se a importância de conhecer melhor a porção continental da zona costeira paraense. A ilha de Mosqueiro faz parte da cidade de Belém (PA) como um de seus distritos administrativos. Situa-se num típico ambiente estuarino sob atuação de processos flúvio-marinhos, devido sua localização, o litoral norte do país (MUEHE, 1998). Sob o ponto de vista geomorfológico esta ilha possui dois compartimentos bem definidos: Os baixos platôs que ocupam a porção norte da ilha e as planícies flúvio-marinhas que ocupam tanto a porção sul como as margens de rios afluentes em toda a ilha (LEIVA, 2013). Destaca-se na área de estudo a atuação dos processos erosivos na linha de costa, especificamente na borda do baixo planalto costeiro, que margeia quase toda a praia. Nos últimos anos a erosão nas orlas de Mosqueiro vem tomando conta da paisagem e dos noticiários no âmbito local. Devido esse problema de ordem ambiental e social que afeta as orlas da ilha e que causam uma enorme preocupação aos moradores, frequentadores e comerciantes, perante iminência de perdas pela erosão, é que a praia do Maraú merece destaque, vale ressaltar que o Maraú possui uma importância econômica para o distrito devido a movimentação de turistas e veranistas nessa praia durante as férias e o feriado. Na costa do Maraú os processos erosivos e antropogênicos urbanos se fazem sentir de maneira sensível nas mudanças da paisagem. A erosão na linha de costa, as construções de residências e bares na orla da praia são bastante notáveis assim como as tentativas por parte da população e dos donos dos comércios de conter a ações das ondas e da influência da mare nessa orla. Haja vista que estudos de planejamento e ocupação das áreas costeiras são relativamente recentes no Brasil (Muehe,1998.). Esse tema é mostrado na mídia de maneira superficial, quando aponta somente informações dos prejuízos e das providências sem estudos especializados para apontar as causas e minimizar o problema. Na orla do Maraú, há intervenções sem estudos adequados, tais como o empilhamento de sacos de areia, aterros e construção de muros de arrimo para a contenção dessa erosão. Diante do exposto levantamos as seguintes questões a respeito da orla do Maraú: Quais as causas da dinâmica costeira? Quais os seus principais fenômenos? Quais os fatores considerados como indicadores da dinâmica costeira? Quais os setores mais dinâmicos? No sentido de contribuir para este ramo da ciência, o artigo visa uma análise da dinâmica costeira da orla do Maraú, em Mosqueiro, tendo como base os indicadores físicos, biológicos e antrópicos. Importante neste trabalho destacar alguns conceitos para início de estudos na área da geomorfologia costeira, nesse arcabouço estarão presentes os conceitos: dinâmica costeira, costa e erosão costeira, baseados especialmente em autores que são referência no âmbito destas pesquisas, principalmente voltados para a zona de costa paraense e como recorte espacial a orla do Maraú na ilha de Mosqueiro servira de base para aplicação dos conhecimentos sobre a zona costeira.
Material e métodos
Os procedimentos metodológicos deste trabalho incluíram o levantamento bibliográfico e revisão de literatura; trabalho de campo; e trabalho de laboratório. Foram feitos em 3 etapas: 1ª Etapa: nessa primeira etapa foi necessária a atualização bibliográfica e pesquisa documental. A bibliografia deve abordar os seguintes conceitos: (a) zona costeira e agentes costeiros; (b) processos e dinâmica costeira; (c) indicadores físicos e socioeconômicos de dinâmica costeira; (d) orla costeira e sua delimitação. 2ª Etapa: Foi realizado um trabalho de campo para levantamentos de dados a partir de indicadores físicos e sócio-econômicos de dinâmica costeira. O trabalho de campo contou com aplicação de planilha de descrição da zona costeira, coletas de dados morfométricos na costa do Maraú. Outro procedimento da visita de campo foram os registros fotográficos. O material coletado foi analisado posteriormente para a setorização das áreas erosivas e sedimentares dessa zona costeira. 3ª Etapa: o trabalho de laboratório. Nesse procedimento foi feito o levantamento da base cartográfica da área estudada, tratamento de imagens de alta resolução, para identificar setores dinâmicos da costa. Nessa etapa foi confeccionado um mapa de localização da área estudada com auxílio do programa ArcGis 9.3. Todos esses procedimentos culminam nos resultados para a produção textual da pesquisa.
Resultado e discussão
A geomorfologia é a ciência que se preocupa em estudar as formas de relevo
(CHRISTOFOLETTI, 1980), mas este conceito não contempla a diversidade de
temas que podem ser abordados diante desses estudos. A geomorfologia
costeira é um ramo dessa ciência, e dentro desse ramo a zona de costa é um
campo de estudo que há muito tempo preocupa a sociedade.
Um dos principais problemas da zona de costa é a erosão na orla, que
inclui a erosão das praias e outros ambientes naturais e antrópicos (SOUZA,
2009). Diante da ação dos agentes que ao provocar erosão, transporte e
deposição de sedimentos levam a constantes modificações na configuração do
litoral (MUEHE, 2001). Segundo Picanço (2003) dentre os principais agentes
de dinâmica costeira pode-se destacar os agentes climáticos (vento, chuva,
calor e umidade), as ondas, as marés, a tectônica, e as mudanças
morfológicas costeiras.
Devido a ação dos agentes da dinâmica de costa nesses setores ocorrem
múltiplas e rápidas alterações morfológicas e sedimentológicas, por isso,
estão em constante mudança, seja temporal seja espacial. (SUGUIO, MENDES,
2005 apud PICANÇO, 2013). Outro conceito importante dentro dos estudos
geomorfológicos das orlas, são as linhas de costa, que caracterizam-se pela
instabilidade de alterações através de efeitos naturais e antrópicos, podem
ser alteradas devido a disponibilidade de sedimentos, clima de ondas e
altura relativa do nível do mar. (MUEHE, 2001. P-254).
A erosão costeira é percebida em toda a costa brasileira (LINS-DE-BARROS;
MUEHE, 2009). Compreendida por Sousa (2005) como um processo que ocorre ao
longo da linha de costa, atingindo promontórios, costões rochosos, falésias,
praias. De ocorrência natural em decorrência do balanço sedimentar negativo,
resultado de processos morfodinâmicos com perdas de material sedimentar das
formações costeiras. Na referida área de estudo é percebida através dos
fatores físicos (ondas, ventos, mares e outros) e antropogênicas (através do
uso e ocupação do solo) que condicionam as dinâmicas da linha da costa.
Esses processos geomorfológicos mesmo sendo de ocorrência física é muitas
vezes pode ser intensificada pela ação antrópica.
Mosqueiro faz parte do Golfão Marajoara, formado pelas
desembocaduras dos rios Amazonas e Tocantins, além de diversos outros cursos
d’água de menor importância. A ilha é subdividida de acordo com El-Robrini,
Apud Costa & El-Robrini (1992.) em duas seções fisiográficas: planície
aluvial de inundação, inserida no compartimento das planícies flúvio-
marinhas, com altitude entre 5-10m; e terraços aluviais pleistocênicos com
altitude entre 15-25m (Baixos Platôs) e está no quadro do setor continental
estuarino formando com outros dois setores: i) costa atlântica do salgado e
ii) insular estuarina, a chamada Zona Costeira do Pará – ZCP (MMA, 1996). A
área de estudo (figura 1) está situada no estuário do Rio Pará, tendo a Baía
do Marajó bem à sua frente. Sua localização lhe confere um regime de meso
maré semidiurna com amplitude de até 3,65m (El-Robrini), situação propicia
para receber as ondas produzidas pela baía, sofrendo assim com intensos
processos hidrodinâmicos que modelam a paisagem consideravelmente.
A praia do Maraú recebe influência de diversas variáveis ambientais
que atuam sobre as formas de relevo da costa. A primeira a se destacar é a
oceanográfica, que atuou na colmatação do Golfão Marajoara desde o período
anterior ao Quaternário. Este processo, juntamente com mudanças
glaucioeustáticas do Pleistoceno Superior, foi responsável pela formação e
modelagem de um verdadeiro nível de terraços regionais denominados “nível de
Belém-Marajó” (AB’SABER, 1996). A dinâmica costeira dessa porção pode ser
vista a partir da sazonalidade das chuvas. O regime equatorial com chuvas
abundantes de dezembro a maio (70% do total anual) influencia as marés, a
salinidade da água, a velocidade das correntes e dos ventos e
consequentemente a intensidade do intemperismo e da erosão nas praias locais
(LIMA et al., 2000). Portanto, a configuração que uma região costeira é o
resultado do somatório de forças exercidas sobre ela: essas forças são de
ordem antropogenéticas e naturais, como a erosão que ocorre na orla do
Maraú, que consiste em intensos processos hidrodinâmicos associado ao
processo de ocupação humana, principalmente a porção que se encontra em
permanente fricção com as correntes de mesomarés.
A praia do Maraú vem sentido essas alterações, seja elas
sedimentológicas ou morfológicas.
As praias da ilha de Mosqueiro seguem uma mesma fisiografia,
formadas por grandes enseadas e promontórios rochosos nas extremidades,
normalmente elevados ao nível das falésias. A praia do Maraú não foge à essa
regra. Os resultados mostram que através da setorização de dinâmicas
costeiras nessa orla foi possível encontrar 4 setores distintos que se
diferenciam quanto a sua estrutura, hidrodinâmica, processos erosivos e
utilização. O setor 1 é o mais frequentado da praia, possui além de casas e
restaurantes na orla, sobre a zona de pós-praia e superior da zona de
intermarés, essa porção da praia caracteriza-se pela ocupação voltada ao
comercio, veraneio e turismo. Possui indicadores de erosão, tais como, muros
tombados, cercas quebradas, ruas eliminadas pela erosão e soterramento pela
areia da praia, arco praial com medidas de 10 a 15m. Sem falésias. Nesse
setor a erosão se mostra com mais intensidade, devido aos indicadores
descritos. O segundo setor 2 apresenta um relevo de linha de costa
diferenciado das demais partes, o baixo platô costeiro não chega até a
borda da plataforma de abrasão, a não ser quando este se aproxima do
promontório que divide os setores 2 e 3. Notavelmente nesta porção a
presença de paleodunas com baixa amplitude em contato direto com o relevo
praial é percebida. A plataforma de abrasão com largura de 25 metros visto
através de perfil apresenta baixa declividade. O setor 3 apresenta uma
pequena faixa de zona de pós-praia, plataforma de depositada no promontório,
além desses indicadores de dinâmica, encontramos também raízes expostas,
arvores tombadas, sopé das falésias com marcas de solapamento de ondas,
dentro dos indicadores antropogênicos não há comércios e residências, ou
seja, ocorre erosão nas falésias, porem essa erosão está ligada ao
escoamento das aguas pluviais. O último setor, 4 apresenta, cordão arenoso
da praia, com falésias ativas, com matacões grande plataforma de abrasão,
presença intensa de argilito e arenito ferruginoso. Configura-se como uma
área de erosão tanto por maré quanto por fricção das ondas que atingem
diretamente o planalto rebaixado. Esta última unidade de relevo citada
encontra elevada a alturas superiores a 6 metros e comporta na sua orla
casas de veraneio. Constata-se que os setores 1 e 4, formados pelos
promontórios, plataformas de abrasão com bancos de cascalhos entre outros
indicadores físicos, são setores que indicam erosão. Já os setores 2 e 3 da
praia apresentam equilíbrio em decorrência do balanço dos sedimentos e
indicadores de sedimentação com a extensa faixa de pós praia, característica
que se diferencia dos setores 1 e 4.
Considerações Finais
A praia do Maraú está sendo afetada pelos processos antropogênicos urbanos que ao somar-se aos naturais estão modificando a dinâmica desse ambiente costeiro o que acaba recaindo sobre a comunidade em geral que utiliza essa praia para os mais diversos usos. A depredação da paisagem e bem sintomático nesse caso. A linha de costa do baixo planalto costeiro aponta um elevado grau de erosão, devido os ataques constantes das marés com ondas de média e altas amplitudes. Isso mostra o quanto dinâmico são os processos hidrodinâmicos atuantes sobre a ilha e em especial a praia em questão que associada de forma desordenada a ocupação humana na orla da praia. A pressão sobre o relevo e o desmatamento das margens, favorecem a erosão, os quais somados à fragilidade ambiental inerente à costa, tendem a desencadear alterações refletindo na degradação da paisagem e dos ecossistemas, podendo comprometer, até mesmo, o desenvolvimento das atividades econômicas. Os 4 setores distintos e relacionados entre si mostram que a praia do Maraú tem diferentes níveis de erosão e sedimentação da linha de costa e a pressão humana sobre o ambiente costeiro intensifica o processo. Podemos identificar nesse estudo primário, essa correlação, sendo, portanto necessário, uma pesquisa e monitoramento da área através do sensoriamento remoto e geoprocessamento e outros trabalhos de campo que complementem os dados adquirido neste primeiro trabalho, pois são importantes no âmbito dos trabalhos geomorfológicos.
Agradecimentos
Referências
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