Autores
Cavazini, A.J. (UNIOESTE/FB) ; Fujita, R.H. (UNIOESTE/FB) ; Paisani, J.C. (UNIOESTE/FB)
Resumo
O propósito deste estudo foi realizar uma caracterização morfométrica para a bacia do rio dos Touros, localizada no município de São José dos Ausentes -RS. Para isso foram aplicadas metodologias quantitativas, delineadas no estudo do padrão e propriedades da rede de drenagem, perfil longitudinal e índices para detecção de anomalias. A bacia hidrográfica do rio dos Touros foi dividida em 3 compartimentos: alto, médio e baixo curso. Em geral, apresenta padrões de drenagem e as propriedades de drenagem que mostram um grande controle estrutural. O rio dos Touros encontra-se em desajuste fluvial, marcados pela presença de knickpoints. Os resultados evidenciam que a área encontra-se sob controle estrutural, sendo que as áreas identificadas com a presença de anomalias de 1ª ordem são áreas influenciadas pela tectônica ativa.
Palavras chaves
desajuste fluvial; anomalia de drenagem; controle estrutural
Introdução
Os canais fluviais são de grande importância nos estudos geomorfológicos e estruturais pois são as variáveis mais sensíveis as modificações crustais (ETCHEBEHERE, 2000). Uma das formas de se identificar a influência estrutural e litológica para uma determinada região é a utilização de estudos de cunho quantitativo para a rede de drenagem (ANDRADES FILHO, 2010). Os estudos os perfis longitudinais configuram uma das representações mais empregadas para a detecção destas modificações, pois respondem aos processos de soerguimento atual e também podem indicar estruturas ativas (GORNITZ & SEEBER, 1990). Qualquer alteração de ordem tectônica, climática e antrópica geram modificações nos cursos fluviais que vão à procura de seu novo equilíbrio, assim adquirem certas anomalias em seu padrão de drenagem (BARBOSA et al, 2013). O Grupo de Estudos de Gênese e Evolução de Formações Superficiais, vinculados a UNIOESTE/Francisco Beltrão vêm estudando a evolução geomorfológica do Planalto das Araucárias, com ênfase nos estados do Paraná e Santa Catarina, utilizando de assinaturas biológicas, pedológicas e sedimentológicas. Recentemente, vêm sendo aplicadas algumas análises fluviomorfométricas para identificação de unidades morfoestruturais, bem como os processos morfotectônicos ocorridos nessa região, as quais estão sendo muito eficazes para o compreensão da evolução geomorfológica. Visando encontrar essas unidades detectadas na área investigada pelo Grupo de Estudos, procurou-se dar continuidade ao trabalho utilizando os mesmos critérios, mas agora ao Sul do Planalto das Araucárias, entre os municípios de São Joaquim (SC) e Vacaria (RS). Assim, esse trabalho tem como intuito caracterizar a bacia do rio dos Touros, localizada em São José dos Ausentes-RS a partir de estudos morfométricos. A BH do rio dos Touros ( bacia hidrográfica do rio dos Touros) localiza- se no estado o Rio Grande do Sul (Figura 1), e pertence ao sistema fluvial Pelotas, no Planalto das Araucárias. A área de estudo está alocada sob as rochas do grupo São Bento, no domínio das rochas ácidas (Fácies Caxias e Fácies Paranapanema) pertencentes à Formação Serra Geral, estruturalmente a área é influenciada por falhas e fraturas .O relevo é suavemente ondulado e segmentado por vales e apresenta clima temperado com temperaturas médias de 14ºC.
Material e métodos
Para o estudo foram utilizadas as bases cartográficas do IBGE, em escala de 1:50.000 digitalizadas. Para a análise da rede de drenagem foram utilizados os padrões propostos por Howard (1967) e o gabarito proposto por Soares e Fiori (1978). A partir dos dados morfométricos de altitude e extensão do canal fluvial foi elaborado o perfil longitudinal do rio dos Touros e analisado a partir da metodologia sugerida por McKeown et al. (1988), que considera desajustes fluviais os segmentos afastados acima de 10 metros da linha do perfil de equilíbrio. Quando os afastamentos estiverem acima do perfil de equilíbrio serão consideradas áreas ascendentes, por sua vez quando estiverem abaixo do perfil de equilíbrio, segmentos em subsidência. Para o cálculo do índice de gradiente (RDE) por trecho e em sua totalidade foi utilizada a metodologia descrita por Hack (1973). Já para a determinação das anomalias de drenagem foi utilizada a razão entre RDETrecho/ RDEtotal. Os valores compreendidos entre os limiares 2 e 10 correspondem a anomalias de 2ª ordem, já os valores superiores a 10, anomalias de 1ª ordem. As anomalias detectadas foram integradas a base geológica e estrutural da área de estudo para a análise dos resultados morfofluviométricos. Por fim, foi aplicado o índice Fator de assimetria de bacia de drenagem (FABD).
Resultado e discussão
A bacia do rio dos Touros possui um perímetro de 146,52 km e uma área de
aproximadamente 543 km². A partir da análise da rede de drenagem foi possível
fazer uma pré-compartimentação da bacia em três segmentos: alto, médio e baixo
curso.
No alto curso, ocorre o predomínio de drenagens subdendríticas,
paralelas
e angulares. O médio curso apresenta maior densidade de drenagem e o padrão
dendrítico e retangular, nota-se a presença de curvaturas anômalas , que podem
ser
indicativo de tectônica recente ou inversão de relevo (VARGAS, 2011). Já o baixo
curso é marcado por densidade de drenagem baixa e a presença de padrões
subdendríticos e paralelos.
Quanto as propriedades de drenagem, sugeridas por Soares e Fiori (1978)
para a BH rio dos Touros, foi também seguida a compartimentação em 3 segmentos,
e
foi classificada conforme mostra o quadro 1. Os resultados evidenciam forte
controle estrutural para a bacia estudada.
A presença desses padrões de drenagem e os resultados das propriedades
da
drenagem na área de estudo remete a um contexto de controle estrutural que são
marcados pelas presenças de lineamentos estruturais (fraturas/falhas). De acordo
com Ribeiro (2016), essas características apresentadas pela rede de drenagem
sugerem o controle estrutural e evidencia uma adaptação dos canais à atual
paisagem.
Quadro 1: Resumo da classificação das propriedades da rede de drenagem. Onde: A:
densidade, B: Sinuosidade, C: Angularidade, D: Tropia, E: Assimetria, F: Formas
anômalas
Compartimento A B C D E F
ALTO Média Misto Alta Bidirecional Fraca Cotovelos e arcos
MÉDIO Alta Misto Alta Tridirecional Fraca Cotovelos e arcos
BAIXO Baixo Retilíneo Média Unidirecional Fraca Cotovelos
O rio dos Touros nasce no município de São José dos Ausentes (RS) a 1220
m
e percorre uma aproximadamente 75km para desaguar no rio Pelotas, na divisa dos
estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, a 700 m de altitude. Ao longo de
sua extensão foram diagnosticados desajustes fluviais, dois segmentos em
subisdência e um em ascensão, e um pequeno trecho em equilíbrio fluvial (figura
2). Essas irregularidades nos perfis longitudinais são ocasionadas por fatores
como por exemplo a entrada de tributários, heterogeneidade da litologia ou ainda
atividade tectônica (VOLKOV et al,1967).
Os segmentos em subsidência são verificados entre as altitudes 1220 a 1200m,
perfazendo a extensão de 2km, e entre altitudes 820 a 700m, que representa os
últimos 47km de extensão do curso fluvial estudado. O segmento em ascensão
representa uma extensão de 20km e situa-se entre 1200 a 820m de altitude. Já o
trecho diagnosticado em equilíbrio fluvial situa-se entre 1200 e 820m, e
corresponde a 6km de extensão do canal fluvial.
Ao longo do rio dos Touros é verificado uma sequência de ressaltos topográficos
(knickpoints), que representam níveis de base local. Nesses locais onde as
rochas possuem maior resistência litológica são encontrados os gradientes mais
elevados (GORNITZ & SEEBER, 1990), como é o caso do topo (soleira) do salto que
coincide com a desembocadura do rio dos Touros, junto ao rio Pelotas, o qual
apresenta uma amplitude de aproximadamente 50 m.
Com a aplicação do índice de Hack, foi possível segmentar o rio dos Touros em 32
trechos, sendo 23 com presença de anomalias. Foram diagnosticadas 7 anomalias de
1ª ordem e 16 anomalias 2ª ordem (16), os outros 9 trechos foram classificados
como equilíbrio.
As anomalias de 1ª ordem estão localizadas entre as cotas 880 a 820m e 750 a
700m, os valores que variaram de 16,20 a 265,68, já as anomalias de 2ª ordem
foram verificadas entre as cotas 1180 a 1150m, 1140 a 1120m, 1100 a 1060m, 1020
a 950m, 940 a 880m e 820 a 750m e apresentaram valores de razão que variaram de
2,12 a 9,90. Os trechos classificados como em equilíbrio são verificados nas
demais cotas.
Ao analisar a figura 3, verificamos que a área de estudo sofre forte controle
estrutural, o qual influencia diretamente a organização da rede de drenagem. As
anomalias de 2ª ordem são justificadas pela influencia estrutural, evidenciadas
pela presença de falhas/fraturas, e a confluência de canais, que aumenta a vazão
e o calibre dos sedimentos, o que auxilia na maior potencia de canal (CARLSTON,
1969). Em relação a litologia não houve influência significativa para a
ocorrência dessas alterações.
As anomalias de 1ª ordem ocorrem ao longo de médio e baixo curso do rio dos
Touros. Essas anomalias alocadas no médio curso estão influenciadas pelo
controle estrutural e a ocorrência de saltos e cachoeiras. De acordo com
Etchebehere (2000) e Fujita et al (2011) as anomalias de 1ª ordem podem ser
originadas a partir de diversas causas, dentre elas à proximidade de áreas de
intensa atividade tectônica que propicia a formação de soleiras e que constituem
níveis de base local e a formação de saltos e cachoeiras, que são indícios de
tectônica ativa. Para o baixo curso, as anomalias de 1ª ordem, representam
também saltos e cachoeiras e concentram-se em local com padrão de drenagem
paralelo e basculamento para o flanco esquerdo da bacia, que apresentou um valor
de fator de assimetria de bacia (FAB) de 43,12, o que corrobora com a ideia de
indícios tectônicos.
Localização da área de estudo
Perfil longitudinal do rio dos Touros
Mapa geológico e de distribuição das anomalias de drenagem
Tabela resumo das variáveis morfométricas do Rio dos Touros. Onde: RDETotal 46,2715.
Considerações Finais
Os resultados obtidos a partir da aplicação de análises morfométricas, delineadas no estudos de padrão de drenagem, perfil longitudinal , aplicação do índice de Hack e fator de assimetria de bacia de drenagem, permitiram caracterizar morfometricamente a bacia hidrográfica do rio dos Touros, localizada em São José dos Ausentes - RS. Diante dos resultados apresentados, puderam-se chegar as seguintes considerações: • A bacia hidrográfica do rios dos Touros possui controle estrutural. Este controle é verificado a partir da organização da rede de drenagem, seus padrões e propriedades; • O rio dos Touros encontra-se em desequilíbrio fluvial, apresentando áreas em ascensão e subsidência, e apresenta rupturas de declive (knickpoints). Esses desajustes ocorrem devido a influência estrutural e encontro de canais; • As anomalias são ocasionadas, principalmente, pelo controle estrutural. As anomalias d 2ª ordens são também originadas de encontro de canais fluviais; • As anomalias de 1ª ordem localizam-se em áreas de saltos e cachoeiras, que são relacionados a áreas tectonicamente ativas e em áreas com padrões de drenagem que refletem diretamente a influência tectônica. • Frente aos resultados obtidos, ainda se faz necessário uma maior investigação da bacia do rios dos Touros, principalmente para fazer a checagem dos pontos considerados anômalos.
Agradecimentos
Ao CNPq Proc.441647/2014-2016 pela concessão de bolsa pesquisador e iniciação científica. Programa de Pós-Graduação em Geografia - UNIOESTE/FB pela concessão da bolsa de pós-doutoramento (PNPD/CAPES)
Referências
ANDRADES FILHO, C. O. Análise morfoestrutural da porção central da Bacia Paraíba (PB) a partir de dados MDE-SRTM e ALOS-PALSAR FBD. 177 f., 2010. Dissertação (Mestrado em Sensoriamento Remoto). Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Ribeirão Preto.
BARBOSA, TS., LIMA, VF., FURRIER, M. Anomalias em padrões de rede de drenagem como fator de verificação neotectônica - um estudo de caso nas subbacias do rio Mamuaba-PB. Revista do Departamento de Geografia – USP, Volume 26 (2013), p. 195-213.
CARLSTON, C.W., Longitudinal slope characteristics of rivers of the mid-continent and the Atlantic east Gulf slopes. Bulletin of the International Association of Scientific Hydrology. XIV, 4, 1969.
ETCHEBEHERE MLC. (2000) Terraços neo-quaternários no vale do rio do Peixe, planalto ocidental paulista: Implicações estratigráficas e tectônicas. Tese (Doutorado) - Instituto de Geociencias e Ciências Exatas/UniversidadeEstadual Paulista Júlio de Mesquista Filho, Rio Claro-SP.
FUJITA, R. H.; GON, P. P.; STEVAUX, J. C.; SANTOS, M. L.; ETCHEBEHERE, M. L. C.(2011) Perfil longitudinal e a aplicação do índice de gradiente (RDE) no rio dos Patos, bacia hidrográfica do rio Ivaí, PR. RevistaBrasileira de Geociências.
HACK, J.T. (1973) Stream-profile analysis ands tream-gradient index. U.S. Geol. Survey, J. Research, v. 1, n. 4, p. 421-429.
HOWARD, A. D. Drainage analysis in geologic interpretation: A summation. AAPG Bulletin, v. 51, p. 2246-2259, 1967.
McKEOWN, F.A. et al.(1988) Analysis of stream-profile data and inferred tectonic activity, Eastern Ozark Mountain region. Denver. U.S. Geol. Survey Bull. 1807, 39 p.
SEEBER, L & GORNITZ, V., River profile along the Himalayan arc as indicators of active tectonics. Tectonophysics, 92: 335-367, 1983.
SOARES, P. C.; FIORI, A. P. Lógica e sistemática na análise e interpretação de fotografias aéreas em Geologia. Boletim Geográfico, Rio de Janeiro, v. 36, n.258-259, p. 35-59, 1978.
VARGAS, K. B. Caracterização morfoestrutural e evolução da paisagem da bacia hidrográfica do ribeirão Água das Antas – PR. 98 f., 2012. Dissertação (Mestrado em Geografia) Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual de Maringá, Maringá, Paraná, Brasil.
VOLKOV, N.G., SOKOLOVSKY, I.L. & SUBBOTIN, A.I., Effect of recent crustal movements oh the shape of longitudinal profiles and water levels in river. General Assembly of Bern International Association of the Scientific Hydrology, 1967.