Autores

Uber, J.A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ) ; Kleina, M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ) ; Santos, L.J.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ)

Resumo

O objetivo principal do trabalho foi realizar o mapeamento geomorfológico da Bacia hidrográfica do Rio Sagrado (Morretes/PR), cuja área é de 137,7 km². A metodologia baseia-se na proposta de Ross (1992), preconiza a visão detalhada do relevo, trazendo informações do seu passado e possibilitando um prognóstico para um cenário futuro. A imagem utilizada no mapeamento foi a RapidEye de 2012, cuja resolução espacial é de 5 metros. Também foram utilizadas imagens SRTM (Shuttle Radar Topography Mission), com resolução de 90 metros e o mapa geológico compatível com a escala 1:50.000. Como resultados foram identificados os seis níveis taxonômicos: Unidades morfoestruturais, morfoesculturais, morfológicas, tipos de relevo, tipos de vertentes e formas/processos atuais.

Palavras chaves

Mapeamento Geomorfológico; Unidades taxonômicas; Formas de relevo

Introdução

As representações cartográficas em geomorfologia buscam demostrar a distribuição das formas de relevo, os depósitos da superfície e sub- superfície, os processos que atuam na paisagem e o período de tempo dessa ação (AUGUSTIN et al., 2011). Para Casseti (2001), a Cartografia Geomorfológica se constitui em importante instrumento na espacialização dos eventos geomorfológicos, representando a gênese das formas e suas relações com a estrutura, dinâmica e processos, permitindo considerar a interação com a paisagem. Os mapeamentos geomorfológicos agregam informações sobre planejamento do uso da terra, engenharia, hidrologia, levantamento dos solos e sua conservação (COOKE e DOORKAMP, 1990), sendo subsídios para estudos de planejamento ambiental (CUNHA, 2012) como também para delimitação de unidades de paisagem (GUERRA e MARÇAL, 2006). De acordo com a União Internacional de Geomorfologia (UGI), os mapeamentos geomorfológicos devem conter quatro tipos de dados: morfométricos (dimensões das formas e das formações superficiais); morfográficos (forma da vertente); morfogênese (morfodinâmica - etapas de transformação da paisagem até atingir as características atuais) e morfocronologia (relacionada ao tempo, as diferentes fases morfogenéticas) (COLTRINARI, 1982). Como recorte espacial destaca-se a bacia hidrográfica, que possibilita a compreensão e elucidação de um grande número de questões sobre o relevo, pois os cursos d'água nela inseridos viabilizam alguns dos mais importantes e ativos processos morfogenéticos na esculturação da paisagem terrestre (CHRISTOFOLETTI, 1980). A bacia hidrográfica escolhida para o presente trabalho foi a do rio Sagrado (Figura 1), localizada no município de Morretes (Paraná - Brasil), com área de 137,7 Km², abrangendo porção da Serra do Mar e Planície Litorânea paranaense. Deste modo, o trabalho teve como objetivo produzir o mapeamento geomorfológico da Bacia Hidrográfica do Rio Sagrado, utilizando as Unidades Taxonômicas propostas por Ross (1992). Apesar dos avanços verificados no decorrer dos anos com quantidade considerável de trabalhos publicados no Brasil e no mundo, existe ainda grande potencial de pesquisa nesta área, possibilitando novas contribuições técnicas e metodológicas, especialmente se direcionadas à geomorfologia de detalhe (SILVA, 2010). De acordo com Christofoletti (1969), os estudos que envolvem a análise da rede hidrográfica podem auxiliar na compreensão de inúmeras questões geomorfológicas, já que esta é constituída por processos morfogenéticos, que atuam e alteram as formas existentes.

Material e métodos

Os métodos e procedimentos adotados na pesquisa podem ser divididos em duas etapas principais: trabalho de gabinete, compreendendo a revisão bibliográfica e ambiente SIG (Sistemas de Informações Geográficas), onde as unidades geomorfológicas foram identificadas; e, por fim, trabalho em campo, onde estas, os processos e feições existentes foram confirmados. A base cartográfica utilizada foi fornecida pelo Instituto de Terras, Cartografia e Geociências do Governo do Paraná (ITCG, 2009), com curvas de nível cuja equidistância é de 10 metros. Deste modo, atributos topográficos como declividade, hipsometria e curvatura das vertentes foram confeccionados a partir desses dados. A hipsometria foi obtida a partir de curvas de nível, pontos cotados e hidrografia, por meio da ferramenta 3D Analyst do software ArcGis 9.3, cujo método selecionado foi o Triangulated Irregular Netwok (TIN). Quanto à declividade, que informa o ângulo de inclinação da superfície local em relação ao plano horizontal, foi classificada conforme a proposta de Ross (1992), dividida em cinco principais classes: <5, 5-12, 12-30, 30-47 e >47%. Em relação à curvatura das vertentes, foi incluída no estudo apenas a baseada no perfil destas. As imagens de satélite utilizadas tiveram origem pelo Rapideye 2012, cuja resolução espacial é de 5 metros, adquiridas pelo Governo do Estado do Paraná. Também deram subsídio ao mapeamento as imagens de radar SRTM (Shuttle Radar Topographic Mission) disponibilizadas pela EMBRAPA (2009), com resolução de 30 metros, bem como o Mapa Geológico fornecido pelo Programa CAD (2009) na escala 1:50.000. Em ambiente SIG, foi realizada a interpretação visual, bem como a interrelação entre os atributos topográficos e demais dados do meio físico, onde todas as unidades geomorfológicas foram classificadas segundo as Unidades Taxonômicas de Ross (1992). Foram contemplados todos os níveis taxonômicos: Unidade Morfoestrutural (primeiro táxon); Unidades Morfoesculturais (segundo táxon); Subunidades Morfoesculturais (terceiro táxon); Padrões de Relevo (quarto táxon); Formas de Relevo (quinto táxon) e Processos (sexto táxon). O primeiro corresponde as Unidades morfoestruturais, denominada Cinturão Orogênico do Atlântico; o segundo táxon as Unidades morfoesculturais (Primeiro Planalto Paranaense e Serra do Mar Paranaense); o terceiro táxon às Unidades morfológicas ou de padrões de formas semelhantes (subunidades morfoesculturais), representadas pelo Planalto do Complexo Gnáissico- Migmatítico, Serra do Mar, Rampas de Pré-Serra e Planícies; o quarto táxon aos Tipos e padrões de formas de relevo (padrões de relevo), que correspondem ao Planalto Dissecado, Serras, Morros, Áreas coluviais e Planícies fluviais; o quinto táxon aos Tipos de vertentes (formas de relevo); e por fim, o sexto táxon às Formas de processos atuais, ou seja, as cicatrizes de deslizamentos e feições fluviais de depósitos, abrangendo a morfologia existente na calha fluvial ou na planície do rio Sagrado. Em relação aos processos (sexto táxon), utilizou-se dados referentes às cicatrizes de movimentos de massa identificadas por Marés Mikosik et al., (2009 e 2010) e feições fluviais de depósitos por Kleina et al., (2014). O mapa obtido apresenta como resolução a escala 1:25.000, no entanto, para representação, neste trabalho, foi exposto em 1:45.000.

Resultado e discussão

O primeiro táxon, Unidade Morfoestrutural, é denominado Cinturão Orogênico do Atlântico. De acordo com Fiori (1994), o traçado da Serra do Mar é descontínuo entre o Maciço de Itatins até o limite entre São Paulo e Paraná. O segundo nível taxonômico, denominado de Unidades Morfoesculturais, é representado no mapeamento pela Serra do Mar. Formada por elevadas declividades e geomorfologia acidentada, tanto em relação ao primeiro planalto como em relação à zona pré-Serra do Mar e planície costeira atlântica. O terceiro nível taxonômico compreende as Subunidades Morfoesculturais, Serra do Mar, Rampas de Pré-Serra e Planícies (SANTOS et al., 2006). A Serra do Mar Paranaense, em sua maioria, possui relevo com direções NE-SW, N-S e NW-SE, alta dissecação e declividade, com gradiente altimétrico de 1.320 metros s.m.n., topos angulosos, vertentes retilíneas e vales em “V” encaixado. O relevo das Rampas de Pré-Serra é dissecado, que se articula com as áreas de planície, onde predominam declividades médias, vertentes retilíneas e vales em “V”. O gradiente altimétrico é 400 metros, com altitudes que variam de 200 metros a 600 metros s.n.m. Por fim, as Planícies referem-se as áreas onde ocorrem deposições dos sedimentos inconsolidados do período quaternário (SILVA, 2010). No quarto e quinto nível taxonômico (Padrões e Formas de relevo) encontram- se as Serras, Morros, Áreas coluviais, Planícies Aluviais e Mangues (Figura 2). As serras predominam na geomorfologia da bacia do rio Sagrado, com 105,747 km², ou seja, mais de 76% da área total, com declividades entre 30 a 47% (alta), e amplitude altimétrica 1420 metros s.m.n., assim como presença de afloramentos de rochas. A área é entrecortada por diques de diabásio no sentido SE-NO, e falhas na direção SO-NE, com predominância de vertentes côncavas da formação do complexo Gnáissico- Migmatítico. Os morros correspondem apenas 0,76 km² da bacia (0,55%), localizados juntamente à planície de inundação. Tratam-se de feições isoladas com topos arredondados (relevo suave ondulado), cujas vertentes são retilíneas, com grau de inclinação média (12 a 30%), esculpidas sobre a formação Complexo Gnáissico-Migmatítico. A amplitude altimétrica é 362 metros s.m.n, com possibilidade baixa de ocorrência de movimentos de massa. As áreas coluviais somam 2,15 km² da bacia do rio Sagrado, ou 1,56%, correspondem aos locais onde ocorre acúmulo/deposição dos sedimentos recentes de origem coluvial, originados pelas porções mais altas da bacia, especificadamente das serras. Predominam declividades baixas (5 a 12%) e vertentes côncavas, que formam rampas suaves que recobrem o sopé das serras e morros, conectando-se com as planícies fluviais. As planícies aluviais ou fluviais correspondem a 25,39 km², ou 18,53% da área total da bacia, com amplitude de 38 metros s.m.n. e declividades muito baixas (<5%). São formadas por sedimentos recentes compostos por areias, argilas, sites e cascalhos, como também pelos depósitos fluviais interconectados com os depósitos de colúvio nas áreas distantes do canal hídrico principal. Os manguezais também são formados por sedimentos recentes e representam 3,64 km², ou 2,65% da bacia. A amplitude altimétrica não ultrapassa 5 metros s.m.n., o relevo é plano e a declividade é classificada como muito baixa (<5%). No sexto nível taxonômico (Formas e Processos atuais) têm-se os depósitos de calha de rio, na planície aluvial, representados pela Figura 3, bem como as cicatrizes de movimentos de massa, inseridas na Serra do Mar. Os depósitos de calha fluvial são feições geomorfológicas encontradas em leitos de rios, caracterizados por sedimentos depositados (ilhas e barras de pontal). As ilhas são formadas, em sua maioria, por material arenoso, de granulometria que varia de fina a grosseira, com cascalhos nas camadas superiores, enquanto que as barras de pontal estão localizadas nos terços médios e inferiores dos rios Sagrado e Sambaqui (principal afluente da bacia). As feições fluviais de depósito foram mapeadas para o rio Sagrado por Kleina et al., (2014) nos anos de 2006 e 2011, possibilitando avaliar sua evolução. A análise temporal contribuiu para verificar o crescimento considerável na quantidade de feições durante os anos mapeados, com um acréscimo de 47% na quantidade identificada de um ano a outro. As feições concentram-se no terço médio devido a elevada sinuosidade do canal (meandrante), diferentemente do terço inferior, que sofreu retificação, onde a maioria dos sedimentos encontram-se em suspensão. Estes depósitos não possuem cobertura vegetal em sua superfície, indicando instabilidade do canal e consequentemente da bacia. Quanto às cicatrizes de movimentos de massa, contextualizadas na Serra do Mar, então inseridas nas formações Granito Serra da Igreja, Complexo Granítico-Gnáissico e Complexo Gnáissico-Migmatítico, bem como declividade alta a muito alta (30 a acima de 47%) e em vertentes convexas. Devido à geomorfologia acidentada, associado aos tributos topográficos e elevada incidência pluviométrica na Serra do Mar, o modelado está em constante evolução, sendo movimentos de massa frequentes neste contexto.

Figura 1

Localização da bacia do rio Sagrado

Figura 2

Mapeamento Geomorfológico da bacia do rio Sagrado

Figura 3

Depósitos fluviais da bacia do rio Sagrado

Considerações Finais

A metodologia aplicada demonstrou-se satisfatória, uma vez que a classificação geomorfológica abrangeu até o sexto nível taxonômico (Ross, 1992), gerando um produto cartográfico em escala de detalhe, 1:25.000. Para isso, o uso de SIG e geoprocessamento foi imprescindível. Observou-se que na bacia do rio Sagrado predominaram as áreas de Serra, com declividades e hipsometria elevadas, curvatura de vertente convexa, presença de diques, falhas e processos como movimentos de massa. Diferentemente das Serras, na planície aluvial prevalecem baixas declividades e hipsometria, favorecendo o aumento da sinuosidade fluvial, e, consequentemente, acréscimo na quantidade de feições de depósito encontradas (KLEINA et al., 2014). O mapeamento geomorfológico proposto demonstra as potencialidades e restrições de uso na Bacia do Sagrado, além de que este produto pode ser utilizado como subsídio ao planejamento ambiental e ordenamento territorial, uma vez que demonstra as especifidades identificadas em cada nível taxonômico, partindo do macro, unidades morfoestruturais, como o Cinturão Orogênico do Atlântico, até o micro, processos geomorfológicos e depósitos fluviais, como as cicatrizes de movimentos de massa e depósitos na calha fluvial.

Agradecimentos

Referências

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