Autores
Haak, L. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ) ; Silveira, C.T. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ)
Resumo
Na maior parte do Brasil há uma carência de mapas detalhados e precisos em escalas úteis para o planejamento e a gestão ambiental. O uso de geotecnologias para a obtenção de atributos topográficos, obtidos de Modelos Digitais de Elevação (MDE) são ferramentas que auxiliam as análises ambientais. A escolha do modelo a ser usado depende da disponibilidade dos dados de entrada, do tipo de terreno e da intenção de uso. O objetivo do presente trabalho é caracterizar e comparar a obtenção da variável declividade para a bacia hidrográfica do Rio da Prata,SC gerada a partir de dois modelos digitais de elevação distintos: o modelo gerado através de grades regulares retangulares (GRID), e o modelo gerado por meio de redes irregulares triangulares (TIN) em duas escalas distintas: 1:50.000 e 1:10.000. A partir dos mapas gerados foram identificadas diferenças e variabilidades nos resultados obtidos para o mesmo atributo topográfico analisado.
Palavras chaves
Modelo Digital de Elevação (MDE); Declividade; Bacia Hidrográfica do Rio da Prata
Introdução
A topografia é um componente de grande importância para o estudo do meio físico. No campo da pesquisa ambiental é relevante para o estudo de padrões de uso e ocupação do solo, associados às vantagens locacionais, facilidade de deslocamento, e áreas de risco. Dentre as aplicações de variáveis derivadas de dados topográficos como declividade, orientação das vertentes, plano de curvatura, etc., nos estudos ambientais pode destacar a determinação de áreas propícias aos assentamentos humanos, áreas de risco de movimentos de massa, mapeamento de potencial erosivo e estudo de processos geomorfológicos (SILVA JR; FUCKNER, 2010) e formas do relevo. Para análise do relevo os mapas de declividade são uma ferramenta de suma importância, constituindo uma forma de representação temática da distribuição espacial dos diferentes graus de inclinação existentes em um terreno, contribuindo para a análise da paisagem (COLAVITE; PASSOS, 2012). Os progressos atuais no campo da informática e o avanço das geotecnologias intensificaram o emprego de técnicas digitais na análise do relevo. O emprego de técnicas digitais na análise do relevo, apoiadas na representação da superfície terrestre na forma de Modelos Digitais Numéricos (MDN), Modelos Digitais do Terreno (MDT) ou Modelos Digitais de Elevação (MDE), permitem extrair variáveis que representam a morfologia do relevo e auxiliam no avanço da cartografia geomorfológica (SILVEIRA et al, 2014). Existem diferentes métodos de geração de MDE, os quais podem ser construídos através de redes irregulares triangulares (TIN) ou grades regulares retangulares (GRID), com a utilização de diferentes algoritmos de interpolação. A escolha do melhor modelo depende da disponibilidade dos dados de entrada, do tipo de terreno e da intenção de uso (FERNANDES; MENEZES, 2005). No Brasil as fontes de dados altimétricos mais comuns para a geração de MDE são curvas de nível, pontos cotados e, de forma complementar, a rede hidrográfica, obtidas das cartas topográficas do levantamento sistemático de dados cartográficos, principalmente aquelas elaboradas pela Diretoria do Serviço Geográfico (DSG) e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essas cartas topográficas estão disponíveis nas escalas 1:250.000, 1:100.000, 1:50.000 e 1:25.000, dependendo da região. Cartas topográficas de escalas maiores, como 1:10.000, 1:5.000, 1:2.000, e 1:1.000, são de áreas condicionadas a levantamentos de regiões específicas. De acordo com Sousa et al. (2008), todo método por interpolação apresenta uma incerteza em relação à realidade, assim a elevação verificada em determinado ponto pode não coincidir com a elevação verificada no terreno. Cada método também possui vantagens e desvantagens, a escolha do melhor método depende dos dados disponíveis para a confecção do modelo e a intenção de uso. A eficiência de cada método de interpolação está relacionada à qualidade do mesmo. Saber qual interpolador induz ao menor erro é fundamental, pois toda interpolação traduz uma incerteza no ponto estimado (FERNANDES; MENEZES, 2005). Muitas vezes os métodos de modelagem existentes nos Sistemas de Informações Geográficas são utilizados de maneira indiscriminada, sem uma avaliação crítica. Desta forma, alguns resultados podem comprometer as análises efetuadas (FERNANDES; MENEZES, 2005). Para verificar as diferenças que podem ocorrer na representação da informação extraída dos MDEs para áreas representativas do estudo proposto, foram testados dois métodos diferentes de interpolação em duas escalas distintas. O objetivo do presente trabalho é caracterizar e comparar a obtenção da variável declividade para a bacia hidrográfica do Rio da Prata gerada a partir de dois modelos digitais de elevação distintos: o modelo produzido pelo interpolador Topo to Raster gerado através de grades regulares retangulares (GRID), e o modelo gerado por meio de redes irregulares triangulares (TIN), em duas escalas distintas: 1:50.000 e 1:10.000.
Material e métodos
As representações de relevo utilizadas foram obtidas a partir de um MDE, os MDEs se referem aos valores altimétricos contemplando os objetos existentes na superfície. Segundo SILVA JR; FUCKNER (2010), MDE é uma representação digital de uma seção da superfície, dada por uma matriz de pixels com coordenadas planimétricas (x,y) e um valor de intensidade do pixel, correspondente à elevação. Nesse trabalho foram utilizados MDEs gerados a partir de duas fontes de dados: carta topográfica na escala 1:50.000, disponível pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 1981) com equidistância vertical de 20 metros entre curvas altimétricas utilizando as folhas: Garuva (SG-22-Z-B-II-1) e São Miguel (SG-22-Z-B-I-2); e Base Cartográfica do Município de Joinville na escala 1:10.000, disponível pela Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão/Prefeitura Municipal de Joinville (2010), com 5 metros de equidistância vertical entre as curvas altimétricas. Os procedimentos de geração do MDE e extração de atributos topográficos foram conduzidos em ambiente SIG, com o uso do software ArcGIS 10 . Foram gerados quatro MDEs distintos referentes à mesma área de estudo. Os MDEs foram gerados a partir da altimetria vetorial (curvas de nível com equidistância de 20 m), pontos cotados e, rede de drenagem, obtidas da carta topográfica na escala 1:50.000, e altimetria vetorial (curvas de nível com equidistância de 5 m), pontos cotados e, rede de drenagem, obtidas da carta topográfica na escala 1:10.000. Foram utilizados dois métodos interpoladores para a geração dos MDEs, um método de interpolação com base em grade regular retangular – módulo TOPOGRID (convencionado neste trabalho como modelo TOPOGRID) – e um método de interpolação utilizando grade irregular triangular – TIN (convencionado neste trabalho como modelo TIN). O módulo TOPOGRID utiliza um método de interpolação especificamente projetado para criar MDE hidrologicamente corretos. O TOPOGRID possui a opção de utilizar a drenagem e outros corpos d’água, suavizando e aumentando sensivelmente a precisão dos modelos gerados. É baseado no programa ANUDEM desenvolvido por HUTCHINSON (1989 apud. KOZCIAK et al., 1999). O método de interpolação de grade irregular triangular (TIN) utilizado foi o de triangulação de Delaunay, esse método preserva as características topográficas, e utiliza dados de fundamental importância na busca de um maior refinamento do MDE, que são as linhas de máximo (divisores) e linhas de mínimo (hidrografia) (FERNANDES; MENEZES, 2005). A geração dos MDEs módulo TOPOGRID foi através do módulo Spatial Analyst Tools → Iterpolation → Topo to Raster. A definição da resolução de pixel adotada para cada modelo foi baseada na proposta de Hengl (2006) para determinar o tamanho da célula da grade apoiado em dados de contornos das curvas de nível da área de estudo, conforme a Equação 1. ρ= A/(2.∑∫) (Equação 1) onde: ρ é o tamanho do pixel, A é a área total e ∑∫é o somatório do comprimento de todas as curvas de nível do recorte avaliado. A resolução de pixel adotada para o modelo gerado através das variáveis obtidas na carta topográfica na escala de 1:10.000 foi de 3 metros, e a resolução de pixel adotada para o modelo gerado através das variáveis obtidas na carta topográfica na escala de 1:50.000 foi de 17 metros. A geração dos MDEs módulo TIN foi através do módulo 3D Analyst Tools → TIN Management → Create TIN. Após a criação da grade TIN foi efetuada a conversão TIN para Raster através do módulo 3D Analyst Tools → Conversion → From TIN → TIN to Raster. A partir da derivação do MDT foram geradas as declividades da área através do módulo Spatial Analyst Tools → Surface → Slope. A classificação das declividades foi realizada conforme as classificações adotadas pela Embrapa (1979), sendo elas: 0 – 3 %(relevo plano), 3 – 8 %(relevo suave ondulado), 8 – 20 %(relevo ondulado), 20 – 45 %(relevo forte ondulado), 45 – 75 %(relevo montanhoso) e > 75%(relevo escarpado).
Resultado e discussão
A área de estudo adotada para a elaboração dos MDEs foi a bacia hidrográfica
do Rio da Prata, localizada no município de Joinville, região Nordeste do
Estado de Santa Catarina, tendo como limite as coordenadas de latitudes
26º10'0” S e 26º14'0” S e longitudes 49°02'0” O e 48°57'0” O, conforme
Figura 1.
A bacia hidrográfica do Rio da Prata está localizada na Escarpa da Serra do
Mar e possui uma área total de 28,61 km2. O curso principal tem o
comprimento da nascente até sua foz de aproximadamente 11 km. O ponto de
maior altitude localizado na bacia hidrográfica compreende 960 metros e o
ponto de menor altitude apresenta 40 metros onde se faz a foz com o Rio
Cubatão do Norte. Com uma amplitude altimétrica de 920 metros, a bacia
hidrográfica do Rio da Prata apresenta áreas com declives acentuados. A
precipitação total anual na bacia hidrográfica varia entre 2.100 a 2.500 mm
(PANDOLFO, 2002). Os declives acentuados associados às chuvas intensas que
ocorrem na bacia hidrográfica causam frequentes eventos de movimentos de
massa nas áreas de encosta. Nesse contexto um MDE de melhor precisão
auxiliará nas tomadas de decisões para ações de prevenção de riscos e gestão
da área.
A análise dos resultados obtidos permite verificar a diferença e
variabilidade dos resultados obtidos para o mesmo atributo topográfico. Para
o estudo proposto foram gerados quatro mapas de declividade e realizada a
quantificação das áreas em diferentes intervalos, ressaltando o percentual
para cada classe de declividade em relação à área total (Figura 2) (Tabela
1).
Através da interpretação dos modelos, pode-se notar na Tabela 1 que os
maiores valores consolidados estão na classe forte ondulado nos modelos TIN
nas escalas 1:10.000 e 1:50.000 e TOPOGRID na escala 1:50.000. Para o modelo
TIN nas escalas 1:10.000 e 1:50.000 a classe forte ondulado apresentam
respectivamente 34,41% e 35,25%, e para base TOPOGRID maiores valores se
encontram na escala 1:50.000 na mesma classe com 35,31%.
Os menores valores encontrados estão nas classes plano e suave ondulado nos
quatro modelos distintos. O modelo que apresentou o menor valor foi o TIN na
escala 1:50.000 na classe suave ondulado (Gráfico 1).
Em geral, ambos os modelos tiveram resultados semelhantes para as classes de
declividades de 0 a 20%. Para as classes acima de 20% o modelo TOPOGRID na
escala 1:10.000 apresentou uma discrepância maior em relação aos outros
modelos.
Os resultados do modelo TOPOGRID na escala 1:10.000 apresentou uma
disparidade em relação aos outros modelos nas classes de declividade de 20 a
45% e maior que 75%. Este modelo acentuou a classe de declividade maior que
75% e reduziu a classe de declividade de 20 a 45%, quando comparado com os
outros modelos gerados para este estudo.
É notória uma diferença quanto a classificação levando em conta os quatro
modelos, o modelo TOPOGRID na escala 1:10.000 apresenta um maior
detalhamento do terreno e a distribuição mais homogênea das diferentes
classes.
Nos mapas elaborados em escalas menores (1:50.000), tanto no modelo TIN como
no modelo TOPOGRID, o detalhamento do terreno apresentado é menor em relação
aos modelos efetuados em escalas maiores (1:10.000).
Na maior parte do Brasil, há uma falta crônica de mapas detalhados e
precisos em escalas úteis para o planejamento do uso da terra ou para o
monitoramento de áreas de risco e gestão ambiental. A disponibilidade de
dados, o conhecimento do tipo do terreno e a intenção de uso devem ser
levados em conta para definir o melhor modelo a ser utilizado em determinada
área. Os resultados acima demonstram que é de suma importância o gestor
avaliar os MDEs disponíveis para as áreas a serem analisadas de modo com que
possam contribuir positivamente para a análise efetuada.
Localização da Bacia Hidrográfica do Rio da Prata,SC.
Mapas de declividade em diferentes modelos digitais de elevação.
Porcentagem das classes de relevo dos mapas de declividade em diferentes modelos e escalas.
Porcentagem das classes de relevo dos mapas de declividade em diferentes modelos e escalas.
Considerações Finais
O avanço das geotecnologias e progressos no campo da informática impulsionaram o emprego de técnicas digitais na análise do relevo. Os modelos digitais de elevação (MDE) são ferramentas que auxiliam as análises ambientais, podendo contribuir para determinar áreas propícias aos assentamentos humanos, áreas de risco, estudos de processos geomorfológicos e forma de relevo. Para análise do relevo os mapas de declividade são uma ferramenta de suma importância para a gestão de determinada área. Um mapa de declividade pode ser gerado através de diferentes modelos e escalas. Cada modelo possui vantagens e desvantagens, a escolha do melhor modelo depende dos dados disponíveis para a confecção do modelo e a intenção de uso. No presente estudo foram gerados 4 mapas distintos, utilizando modelos e escalas diferentes. Os resultados apontaram uma diferença e variabilidade dos resultados obtidos para um mesmo atributo topográfico em uma mesma área. Isto posto, é de suma importância o gestor ao analisar um mapa de declividade estar ciente de qual modelo e escala foram utilizados, e a partir disso verificar se são adequados para a análise da área em questão. A escala dos dados, estrutura e método de geração do modelo, resultará em um produto de maior detalhe ou maior generalização. O conhecimento de qual MDE apresenta uma melhor precisão para a área de estudo auxiliará nas tomadas de decisões para ações de prevenção de riscos e gestão da área.
Agradecimentos
Agradeço à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES e ao Programa de Pós Graduação em Geografia da Universidade Federal do Paraná - UFPR.
Referências
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