Autores
Silva, F.J.L.T. (UFPI) ; Ribeiro, K.V. (UFPI) ; Aquino, C.M.S. (UFPI)
Resumo
As pesquisas relacionadas ao campo da Geomorfologia têm apresentado significativo aumento de publicações no cerne dos seminários científicos. Nesse sentido, analisar os enfoques temáticos e ainda os aportes teórico- metodológicos da ciência geomorfológica no âmbito destes eventos é de suma importância para se acompanhar o desenvolvimento dos estudos deste específico campo da Geografia Física. Com este intuito, a presente pesquisa tem como foco de análise os trabalhos publicados nos Anais do Simpósio Nacional de Geomorfologia – SINAGEO, compreendendo as edições de 2006, 2010, 2012 e 2014. A partir deste recorte temporal, os objetivos da pesquisa foram: (a) analisar os enfoques e as tendências temáticas dos trabalhos; (b) discutir as abordagens conceituais e teórico-metodológicas predominantes; (c) identificar as principais escalas de tratamento dos estudos e (d) apontar os ramos da Geomorfologia mais trabalhados no âmbito do SINAGEO, nas edições analisadas.
Palavras chaves
Geomorfologia; Eventos científicos; Abordagens temáticas
Introdução
A Geomorfologia, enquanto integrante da análise geográfica, procura evidenciar, de forma integrada, as derivações ambientais resultantes do processo de apropriação e transformação do relevo pelo homem, acentuando, assim, a importância da pesquisa geomorfológica para o dimensionamento dos sistemas ambientais com vistas ao planejamento físico-territorial (CASSETI, 2005). Em um cenário em que o paradigma da questão ambiental comanda o direcionamento das pesquisas no âmbito dos estudos geográficos, a Geomorfologia emerge em posição privilegiada dentre as ciências da natureza, pois é de fundamental importância para as análises empreendidas no meio ambiente (ROSS, 2007). Guerra e Marçal (2006) reforçam este viés interpretativo ao afirmarem que a Geomorfologia detém metodologias e ferramentas de grande importância para as pesquisas ambientais, subsidiando a espacialização das interações entre os diferentes componentes do quadro natural. Evidência da relevância que a ciência geomorfológica possui no cenário das pesquisas no Brasil pode ser encontrada nas publicações dos eventos científicos que perfazem o calendário dos pesquisadores dedicados aos estudos geomorfológicos. Neste ínterim, destacam-se os Anais/Cadernos de Resumos editados pelos eventos científicos, constituindo-se em documentos de suma importância para se analisar o desenvolvimento teórico-metodológico e ainda os (re)direcionamentos temáticos da Geomorfologia ao longo dos últimos anos. Nesse sentido, dentre os eventos dedicados aos ramos Geografia Física, destaca-se o Simpósio Nacional de Geomorfologia (SINAGEO), promovido pela UGB – União da Geomorfologia Brasileira, e cuja primeira edição foi realizada em Uberlândia-MG, no ano de 1996 (SOUZA, 2006). A última edição ocorreu em Manaus-AM, no ano de 2014, e a próxima realizar-se-á em Maringá- PR, em setembro de 2016. Ao longo das nove edições subsequentes àquele encontro inaugural em Uberlândia, o SINAGEO foi se estabelecendo como fórum privilegiado para se debater os rumos, aplicações e perspectivas da pesquisa geomorfológica no Brasil, sendo que a cada nova edição são postos à vista as mais refinadas técnicas de pesquisa e ainda as mais recentes preocupações temáticas, evidenciando o potencial da comunidade científica nacional, refletindo-se, ainda, no crescente número de participantes e trabalhos publicados. A partir destas considerações preliminares, esta pesquisa buscou responder aos seguintes questionamentos: Quais foram os temas mais discutidos nas últimas edições do SINAGEO (2006, 2010, 2012 e 2014)? No contexto do enquadramento teórico-metodológico das pesquisas, quais abordagens se sobressaíram? Quais as escalas de tratamento privilegiadas nos estudos levantados? Por fim, dentre os ramos ou especialidades de estudo da Geomorfologia, quais apresentaram maior desenvolvimento no contexto das últimas edições do SINAGEO? Na tentativa de responder aos problemas levantados, foram estabelecidos os seguintes objetivos: (a) analisar os enfoques e as tendências temáticas dos trabalhos levantados; (b) discutir as abordagens conceituais e teórico- metodológicas predominantes; (c) identificar as principais escalas de tratamento dos estudos e (d) apontar as especialidades da Geomorfologia mais desenvolvidas no âmbito do SINAGEO, no período de análise considerado.
Material e métodos
Pesquisa de construção teórica, fundamentada em revisão de literatura, compreendendo levantamento bibliográfico referente à natureza, à importância e ao escopo investigativo da ciência geomorfológica e também consulta aos Anais do Simpósio Nacional de Geomorfologia, edições de 2006, 2010, 2012 e 2014.
Resultado e discussão
No Quadro 1 apresenta-se,inicialmente,um panorama do total de trabalhos
publicados no Simpósio Nacional de Geomorfologia,compreendendo o recorte
temporal indicado para esta análise (2006, 2010, 2012 e 2014),
especificamente as edições VI, VIII, IX e X do referido Simpósio.Houve, no
período considerado, um crescimento no número total de trabalhos publicados
pelo evento em apreço.
O VI SINAGEO (2006) teve por tema nuclear “Geomorfologia das regiões
tropicais e subtropicais: processos, métodos e técnicas”, cujos debates
fundamentaram-se nos seguintes eixos: 1) Geomorfologia, intemperismo e
formação de solos; 2) Geomorfologia fluvial e paleohidrologia; 3) Formação,
evolução e dinâmica de vertentes; 4) Processos geomorfológicos acelerados e
degradação ambiental; 5) Geomorfologia cárstica; 6) Geomorfologia costeira e
submarina; 7) Atividade eólica nos trópicos e subtrópicos; 8) Geomorfologia
estrutural e neotectônica; 9) Geomorfologia e planejamento e Geomorfologia
urbana; 10) Geotecnologias e cartografia geomorfológica; 11) Ensino de
Geomorfologia; 12) Geomorfologia e mudanças globais; 13) Temas gerais.
O tema principal do VIII SINAGEO (2010) foi “Sensitividade de Paisagens: a
geomorfologia no contexto das mudanças ambientais globais”, e foi discutido
a partir dos seguintes enfoques: 1) Geomorfologia fluvial e recursos
hídricos; 2) Geomorfologia costeira; 3) Geomorfologia do Quaternário; 4)
Megageomorfologia e megatectônica; 5) Geomorfologia e reconstrução de
paleoambientes áridos e semiáridos; 6) Geomorfologia e conservação do
patrimônio natural; 7) Relação morfogênese x pedogênese; 8) Geomorfologia e
arqueologia; 9) Evolução e dinâmica de encostas; 10) Técnicas, mapeamento e
aplicações em geomorfologia.Já o IX SINAGEO (2012) teve por lema
“Geomorfologia e eventos catastróficos: passado, presente e futuro”, e foi
estruturado nos eixos temáticos a seguir: 1) Geomorfologia de encostas; 2)
Geomorfologia fluvial; 3) Geomorfologia cárstica; 4) Geomorfologia costeira;
5) Geomorfologia glacial; 6) Interações pedo-geomorfológicas; 7)
Geocronologia e evolução da paisagem; 8) Geotecnologias e mapeamento
geomorfológico; 9) Ensino de Geomorfologia, formação e profissionalização do
Geomorfólogo; 10) Outros.As discussões do X SINAGEO (2014) foram norteadas
pela temática “Geomorfologia, ambiente e sustentabilidade”, desdobrando-se
em dez eixos temáticos, a saber: 1) Geomorfologia de Encostas; 2)
Geomorfologia Costeira; 3) Geotecnologias e mapeamento geomorfológico; 4)
Geomorfologia da Amazônia; 5) Geomorfologia Estrutural, Neotectônica e
Cárste; 6) Geomorfologia Fluvial; 7) Interações pedo-geomorfológicas; 8)
Geomorfologia e ensino; 9) Geomorfologia e planejamento ambiental; 10)
Geocronologia e Evolução da paisagem. Apresenta-se, a seguir, o panorama
geral dos temas mais trabalhados no âmbito do SINAGEO, nos anos de 2006;
2010; 2012; 2014 (Gráfico 1).A análise do Gráfico 1 permite inferir o
predomínio de três tendências temáticas nas edições analisadas: Mapeamento
geomorfológico (20,2%), Estudos fluviais (17,1%) e a já consagrada Análise
de bacias hidrográficas (14,0%).Ainda com base no Gráfico 1 percebe-se que
embora em menor percentagem destacaram-se os temas: Dinâmica de encostas
(6,1%), Interações morfopedológicas (5,5%), Ambientes costeiros (5,1%),
Processos erosivos (5,0%), Dinâmica hidrossedimentar (3,6%), Movimentos de
massa (2,7%) e Uso e ocupação da terra (2,6%). Ressalta-se que mesmo em
percentagens menores estes temas são fundamentais, posto, tratarem de
assuntos “clássicos” e de inegável importância no cerne das pesquisas
geomorfológicas.Deve-se destacar ainda o tema Ensino de geomorfologia
(3,3%), o qual conquistou lugar cativo nos eixos temáticos do SINAGEO. Já o
tema Planejamento ambiental (11,1%) está relacionado, invariavelmente, ao
paradigmático quadro dos estudos ambientais e multidisciplinares e, por
vezes, multitemáticos, sendo que esta última característica dificultou, em
certa medida, a classificação temática de alguns trabalhos. Degradação,
impactos ambientais, análise integrada da paisagem,
fragilidade/vulnerabilidade ambiental e ainda desertificação despontam como
alguns dos subtemas focalizados pelos estudos voltados ao planejamento e à
gestão ambiental. Por fim, no item Outros (3,6%), podem ser citados os temas
Geomorfologia estrutural, Estudos do Quaternário e, em menor escala, os
estudos sobre Ambientes cársicos, sem esquecer-se das temáticas Geoturismo e
Geoconservação/Geodiversidade. Dentre as perspectivas de maior envergadura
teórica e, portanto, de maior poder explicativo dos fenômenos do mundo
físico, destacaram-se as abordagens geográficas integrativas ou sistêmicas,
dentre elas: 1) Abordagem Geossistêmica; 2) Análise Ecodinâmica; 3)
Geoecologia das Paisagens; 4) Perspectiva Socioambiental e 5) Análise
Geoambiental. Foram identificados, ainda, métodos de maior especificidade,
tais como: análise morfométrica, análise hipsométrica, análise topológica,
relação declividade x extensão (RDE), índice de sinuosidade e índice de
rugosidade, todos preferencialmente aplicados aos estudos em bacias
hidrográficas, canais fluviais e demais estudos sobre padrões de drenagem e
hierarquia fluvial. Dentre as técnicas de interpretação mais vislumbradas
nos trabalhos analisados, sobressaíram-se os produtos do geoprocessamento e
do sensoriamento remoto, integralizados nos Sistemas de Informações
Geográficas. Uma das primeiras constatações desta análise relaciona-se ao
predomínio dos estudos de âmbito local, destacando-se a escala municipal.
Suertegaray e Nunes (2001) defendem a tese segundo a qual esta
particularidade está inerentemente ligada ao paradigma ambiental, visto que
os estudos locais buscam privilegiar a análise das intervenções da sociedade
na natureza e as derivações ambientais daí resultantes, em que se focalizam
os temas da degradação e impactos ambientais.Os estudos sobre mapeamento
geomorfológico, por exemplo, focalizam a identificação e caracterização das
feições ou unidades de relevo no contexto dos municípios; os estudos
fluviais não objetivam analisar as bacias hidrográficas ou os canais
fluviais em escala estadual ou regional, mas sim e preferencialmente
naqueles perímetros mais densamente urbanizados, cuja relação sociedade-
natureza pode ser visualizada em toda sua plenitude, privilegiando, assim,
as análises pontuais, em escala local; o mesmo vale para as pesquisas com
fins de planejamento ambiental, as quais se concentram na busca de soluções
e estabelecimento de diretrizes, a curto e médio prazo, para a recuperação
de áreas degradadas e, portanto, mais suscetíveis aos impactos provocados
pelo antropismo.Analisando os estudos publicados no SINAGEO nos anos aqui
considerados, infere-se que os ramos mais trabalhados da Geomorfologia no
âmbito deste evento são os seguintes (Gráfico 2): A Geomorfologia Fluvial
(31,1%) engloba os estudos sobre sistemas fluviais no geral (canais
fluviais, bacias hidrográficas, ambientes lacustres, dentre outros.); a
Cartografia Geomorfológica (20,2%) detém técnicas e métodos que a colocam
como a maior subsidiária dos mapeamentos geomorfológicos; a Geomorfologia
Ambiental (19,2%) é concebida por muitos autores como a verdadeira
especialidade aplicada da Geomorfologia; a Geomorfologia de Encostas (13,8%)
qualifica-se como a especialidade de estudo em que a vertente e os processos
nela atuantes (movimentos de massa, erosão, dentre outros) são tomados como
categorias preferenciais de análise; enquanto que a Geomorfologia Litorânea
(5,1%) tem por escopo central a dinâmica dos ambientes costeiros. Outras
especialidades com menor impacto no contexto geral dos estudos publicados no
SINAGEO (Geomorfologia cársica e Geomorfologia do Quaternário, por exemplo),
somadas àqueles ramos de estudo ainda sem identidade disciplinar própria
(como Ensino de Geomorfologia) contabilizam os outros 10,6% do balanço
geral.
O Quadro 1 mostra o balanço total de trabalhos publicados no SINAGEO, nas edições de 2006, 2010, 2012 e 2014.
O Gráfico 1 apresenta o balanço dos principais temas trabalhados no âmbito do SINAGEO ao longo das edições de 2006, 2010, 2012 e 2014.
O Gráfico 2 apresenta as especialidades mais trabalhadas no contexto do SINAGEO, nas edições de 2006, 2010, 2012 e 2014.
Considerações Finais
Esta foi uma pesquisa de aproximação, uma tentativa de retratar, o mais fielmente possível, o panorama geral dos estudos publicados no mais importante evento dedicado às pesquisas geomorfológicas no Brasil. Uma grave lacuna desta pesquisa refere-se a não inclusão da 7º edição do SINAGEO (2008) no cerne das discussões, em virtude das dificuldades de acesso ao referido documento. As propostas teóricas dos trabalhos analisados fundamentaram-se nas abordagens integrativas ou sistêmicas, a saber: 1) Abordagem Geossistêmica; 2) Análise Ecodinâmica; 3) Geoecologia das Paisagens; 4) Perspectiva Socioambiental e 5) Análise Geoambiental.Temáticas clássicas da geomorfologia como: Geomorfologia Fluvial, Cartografia Geomorfológica, Geomorfologia Ambiental e Geomorfologia de Encostas totalizaram 87,3% da preferência dos pesquisadores em geomorfologia nas edições de 2006, 2010, 2012 e 2014 do SINAGEO.Nesse sentido, acredita-se que os resultados ora apresentados são sim passíveis de críticas e melhoramentos, mas ainda assim oferecem subsídios interessantes para a análise e compreensão dos atuais caminhos e perspectivas das pesquisas geomorfológicas no âmbito dos Simpósios Nacionais de Geomorfologia.
Agradecimentos
Referências
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