Autores
Pôssas, I.B. (UFG) ; Cherem, L.F.S. (UFG)
Resumo
A borda oriental do Vão do Paranã é marcada pela presença de paisagens cársticas desenvolvidas sobre rochas do Grupo Bambuí, exumadas pelo recuo da cuesta que limita a oeste o Chapadão Oeste da Bahia, denominada Serra Geral de Goiás. Essa paisagem cárstica apresenta diferenças morfográficas entre as porções norte e sul. Esse trabalho objetiva identificar e definir compartimentos dessa região cárstica, a partir do exocarste, da borda noroeste do Grupo Bambuí e tipificar áreas com características chaves, sendo usadas imagens de satélite, modelos digitais de elevação e hidrográfica da região. Os resultados demonstram que a região apresenta quatro compartimentos principais, onde o exocarste aumenta sua presença a medida que segue rumo a norte.
Palavras chaves
exocarste; mapeamento; Vão do Paranã
Introdução
Os processos denudacionais e seus registros na superfície dos continentes são distribuídos na paisagem de acordo com a relação entre aspectos endógenos, exógenos e derivados da relação entre os dois. Essa relação é estabelecida nos domínios morfoclimáticos globais. Em escala local, a distribuição dos processos superficiais e de seus registros depende e, menor medida, das grandes variações entre os domínios morfoclimáticos globais e requer análise mais pormenorizada, com maior detalhamento (SUMMERFIELD, 1991). Uma das possibilidades é o mapeamento geomorfológico que, desde a década de 1970, utilizado no entendimento da estrutura superficial da paisagem, o que facilita a compreensão objetiva da evolução das formas recentes exibidas pelo relevo (AB’SABER, 1969, p.12). Nessa escala de maior detalhe, as feições e processos observados e interpretados correspondem àqueles elaboradas durante o Quaternário, o que se aplica à todas paisagens, granítica, quartiziticas, cieniticas e carbonáticas (GOUDIE, 2008). As paisagens carsticas (endocarsticas, epicarsticas e exocarsticas), que não fogem a regra, foram, predominantemente modeladas durante o Quaternário (White, 1988). Ford e Williams (2007), estimam que o relevo cárstico ocupa cerca de 10–15% da área continental mundial. No Brasil, tais paisagens correspondem a aproximadamente 3% da superfície do território brasileiro (KARMANN, 2009). A maior área corresponde ao grupo Bambuí, cobrindo porções do noroeste de Minas Gerais, leste de Goiás, sudeste de Tocantins e oeste da Bahia. Especificamente, a porção noroeste do Grupo Bambuí está localizada em uma região reconhecida como Vão do Paranã, em Goias e a porção oriental do Jalapão, em Tocantins (Figura 1). Nessa região, as cabeceiras de drenagem que nascem na porção leste, drenam sobre uma cuesta, conhecida como serra geral de Goiás, uma feição gerada a partir da erosão da bacia sedimentar Uricuia. Nessa região, a paisagem carstica apresenta uma visível diferenciação latitudinal ainda não estudada. Esse trabalho tem o objetivo de compartimentar essa região carstica, partir do exocarste, da borda noroeste do Grupo Bambui e tipificar áreas com características chaves.
Material e métodos
Para realização da compartimentação do relevo cárstico proposto pela presente pesquisa, foi realizada uma extensa revisão bibliográfica sobre o tema, a fim de contextualizar os processos responsáveis pela formação da paisagem e o perfeito entendimento das técnicas de geoprocessamento, já que segundo Ab’Saber (1969), para a realização da compartimentação do relevo, é necessário parte-se da análise da carta topográfica e das imagens de satélite. A delimitação dos compartimentos levou em consideração os seguintes aspectos: declividade, nível de exposição e feições do carste, e o tipo de drenagem. Para identificação dos maciços cársticos da região estudada os procedimentos realizados partiram da obtenção das imagens de satélite através do site da USGS – U.S. Geological Survey, para o ano de 2015 - LC82200692015337, LC82200702015337 e LC82210682015248, obtidas através do satélite Landsat 8 OLI. A metodologia utilizada para a composição da imagem, de forma que os maciços cársticos ficassem mais ressaltados, é a chamada falsa cor (ROSA, 2007). Os mapas de localização e declividade foram elaborados a partir das bases cartográficas disponíveis pelo Sistema Estadual de Geoinformação (SIEG) do estado de Goiás e as imagens SRTM, disponibilizadas pela USGS, respectivamente. O mapa de declividade foi crucial para a delimitação dos compartimentos, já que quanto mais expressiva for a declividade, maior será o relevo de carste exumado. A drenagem, dado também disponibilizado pelo SIEG, foi utilizada para a delimitação dos compartimentos, já que a drenagem também influencia no comportamento do relevo. As imagens de satélite em alta resolução disponibilizadas pelo ArcGis, auxiliaram na definição das feições cársticas superficiais, tais como lápias.
Resultado e discussão
Foram identificados quatro grandes compartimentos, denominados aqui de
1-
Buritinópolis, 2 – Posse, 3 – São Domingos e 4 – Taguatinga. Os três
primeiros, estão localizados no nordeste do Estado de Goiás e o ultimo
no
sul de Tocantins. O primeiro compartimento, Taguatinga, ao sul do
estado de
Tocantins, destaca-se pela presença de maciços e vales encaixados,
desenvolvidos sobre rochas carbonáticas da porção norte do Grupo
Bambuí. A
altitude do compartimento varia entre 400m a 600m. Com uma declividade
predominante entre Forte Ondulado a Montanhoso (20 a 45º graus de
inclinação, Figura 2A). Os locais onde ocorrem o afloramento de
calcário, o
maciço é marcado pela presença de falhas e fissuras (Figura 3A),
correspondente aos lapiés, "conjunto de formas composto por
pequenas
depressões, sulcos e formas acanaladas localizadas sobre as
superfícies rochosas aflorantes nas áreas de relevos cársticos”
(GONÇALVES, 2013). Podem ser observadas ainda, a presença de cavernas
entre
a região nordeste e sudoeste do compartimento.
O segundo compartimento, São Domingos, na porção leste do grupo Bambuí,
possui feições exumadas devido a erosão diferencial com o arenito,
pertencente ao Grupo Urucuia, abrangendo a cuesta da Serra Geral de
Goiás. A
declividade encontrada nesse compartimento, varia entre Forte Ondulado
e
Montanhoso (Entre 20 e 45º de inclinação, Figura 2B). A mais marcante é
a
altitude em que o carste está parcialmente encoberto, ou seja, parte de
suas
feições ainda estão encobertas. Sua altitude varia entre 600 a 750m. Na
imagem de satélite (Figura 3B), é possível verificar a presença de
fissuras,
mas não é possível confirmar, se são produto da dissolução do calcário.
Nesse compartimento, também é possível encontrar cavernas desenvolvidas
em
rochas carbonáticas, é aqui que se encontra a Caverna Terra Ronca, que
dá
nome ao Parque Estadual de Terra Ronca, no município de São Domingos,
Goiás.
O compartimento denominado de Posse, terceiro a ser caracterizado, se
distingue dos demais por predominar como o exocarste encoberto. Sua
declividade varia entre Suave Ondulado (3 a 8º graus de inclinação,) a
Forte
Ondulado (20 a 45º graus de inclinação, Figura 2C). Tal compartimento é
considerado como um compartimento intermediário, por possuir feições
encobertas quanto feições já exumadas. A facie oeste dos maciços e
drenagem
são as regiões com maior declividade e apresentam as feições mais
expostas,
mas numa proporção relativamente menor que o resto do compartimento. A
altitude desse compartimento varia de 500m a 750m de altitude. Não é
possível identificar através da analise das imagens de satélite (Figura
3C)
a presença de lapiés. Do compartimento de Posse até o compartimento
seguinte, Buritinópolis, a concentração de cavernas já identificadas é
menor, ao comparar com os compartimentos anteriores.
O quarto compartimento, Buritinópolis, apresenta um relevo
predominantemente
ondulado (8 a 20º graus de inclinação, Figura 2D), e excepcionalmente
nos
canais de drenagem, a declividade passa a ser entre forte ondulado a
montanhoso (20º a > 45º graus de inclinação). Neste compartimento, o
carste
está totalmente encoberto, só é possível verificar a presença dos
calcários
nos canais de drenagem, onde são observados cânions com margens
solapadas
que isolam esses canais. Nem mesmo as feições típicas do carste como
dolinas, uvalas e poljés são identificáveis na imagem de alta resolução
(Figura 3D). É também o compartimento com maior altitude, variando
entre
600m a 800m.
Observou-se que, em geral, as feições exocarsticas aumentam sua
representatividade em direção a norte, isto é, do compartimento
Buritinopolis rumo ao compartimento Taguatinga, os maciços ganham
volume
exumado, as declividades médias aumentam, enquanto a drenagem
superficial
perde densidade, passando a cânions com sumidouros, até passarem a ser
completamente criptorreica.
Mapa de Localização da área de estudo
Representação da declividade dos quatro compartimentos identificados
Imagens de Satélite dos compartimentos
Considerações Finais
A pesquisa sobre a morfogênese da área de estudo encontra-se nos primeiros estágios de execução e esses resultados preliminares apontam para a existência de dois fafores principais no controle dessa dinâmica. O primeiro é a dissecação da paisagem pelo rebaixamento do nível de base regional que controla a indução fluvial e dissecação do relevo. O segundo é a dinâmica da paisagem cárstica que segue toda a extensão da área de norte a sul. A exumação do carste é mais intensa na porção norte, expondo maciços e cavernas. Nas porções sul, onde o carte é encoberto, os canais principais atravessam-no em canions e as feições exocarsticas se resume a algumas verrugas cárstica. Os resultados indicam que há possibilidade de realização de outras análises da paisagem, especialmente da bacia hidrográfica do Rio Paranã, para aprofundar o entendimento dessa dinâmica.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao CNPq pelo suporte a elaboração desse projeto por meio do financiamento do projeto CNPq Universal 462421/2014-7.
Referências
AB’SABER, A. N. Um conceito de geomorfologia a serviço das pesquisas sobre o Quaternário. Geomorfologia, São Paulo, n. 18, p. 1-23, 1969. Versão digitada pelo Prof. Fabio Sanches – Universidade de Taubaté, SP. (2009).
CASTRO, S.S. & SALOMÃO, F.X.T. 2000. Compartimentação Morfopedológica: Considerações metodológicas. GEOUSP, São Paulo, nº. 7, p.29-35.
FORD, Derek WILLIAMS, Paul. Karst hydrogeology and geomorphology. United Kingdom, 2007, 578p.
GONÇALVES, Frederico Augusto Alves. Morfodinâmica e morfogênese de um carste suspenso e evolução geomorfológica de longo termo: uma aproximação com base no caso do Setor Oeste do Curral de Pedras I, Jequitaí – MG. (Dissertação de Mestrado) Belo Horizonte, Universidade Federal de Minas Gerais, 2013. 162p.
KARMANN, Ivo. Água: ciclo e ação geológica. In: Decifrando a terra. 2. ed. - São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2010. p. 186-209.
ROSA, Roberto. Introdução ao sensoriamento remoto. 6. ed. Uberlândia: EDUFU, 2007. 248 p.
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TRAVASSOS, Luiz Eduardo Panisset. Considerações sobre o carste da região de Cordisburgo, Minas Gerais, Brasil. 1. ed. Belo Horizonte: Tradição Planalto, 2010. v. 1. 102p.
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WHITE, William B. Geomorphology and hydrology of karst terrains. New York; Oxford: Oxford University Press, 1988. 464 p.