Autores

Santos, C.J.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA) ; Souza, J.O.P. (UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA)

Resumo

O presente estudo analisou um sistema fluvial semiárido e suas características físicas, com foco de avaliar no ambiente fluvial as modificações nas margens no canal principal da bacia hidrográfica do riacho Jucurutu, através da analise do uso e cobertura do solo e a composição do material da margem. A pesquisa foi realizada na Bacia riacho Jucurutu faz parte da drenagem do rio Paraíba, sua bacia está inserida no Cariri Paraibano, localizado no município de São João do Tigre-PB, incluído na área geográfica de abrangência do semiárido brasileiro. Tomou-se como procedimento metodológico a realização de mapeamentos de estabilidade das margens com ênfases na analise da resistência do material sedimentar e a cobertura vegetal, a fim de atribuir uma classificação de estabilidade para os trechos fluviais estudados.

Palavras chaves

Estabilidade das margens; cobertura vegetal; semiárido

Introdução

Na abordagem sistêmica os elementos físicos da paisagem estão inter-relacionados como um todo organizado (MATTOS e PEREZ FILHO, 2004; MORIN, 1977). Mutuamente a organização está ligada a estabilidade do sistema, pois o padrão de organização gera estabilidade, como também a estabilidade mantém a organização. Indicando a capacidade do sistema, mesmo quando submetido a distúrbios, manter seu padrão global de organização, seja no mesmo estado em que se encontra antes da perturbação ou em um outro estado, sendo assim, significa que a manutenção da identidade do sistema é dada pelo seu padrão de organização. No entanto, a estabilidade não deve ser entendida como um estado no qual o sistema permanece estático, imóvel, e sim como uma estabilidade relativa e dinâmica, nesse estado, o sistema está em constante renovação e transformação, como é o caso dos sistemas fluviais (MATTOS e PEREZ FILHO, 2004; MORIN, 1977). No sistema fluvial é primordial entender como ocorrem os processos se comportam quando exposto a mudanças na resistência do sistema. Como colocado por Fisrwg (1998), os sistemas fluviais funcionam dentro de um limite natural de fluxo, movimento de sedimento, temperatura e outras variáveis, no que é denominado de equilíbrio dinâmico. Quando mudanças nestas variáveis vão além dos seus limites naturais, o equilíbrio dinâmico pode ser perdido, frequentemente, resultando em ajustes no ecossistema que poderá conflitar com as necessidades da sociedade. Em algumas circunstâncias, as mudanças estão relacionadas não com modificações na dinâmica ambiental, mas sim na estrutura, especialmente nos níveis de resistência a mudanças da paisagem. Ao pensar no semiárido brasileiro, seus sistemas fluviais estão caracterizados por dois extremos hidrológicos: cheia e seca, que são os agentes de perturbação naturais mais importantes destes sistemas. Estes dois eventos de perturbação hidrológica (cheia e seca) exercem forte influência na organização e no funcionamento dos rios (MALTCHIK, 2012). Assim, a principal característica hidrográfica do semiárido brasileiro é o caráter intermitente dos rios, a descontinuidade dos fluxos. Esta característica está diretamente relacionada com a precipitação da região, onde o fluxo de água superficial desaparece durante seu período de estiagem. Desse modo, os processos em ambientes semiáridos, e em ambientes sub-úmidos, apresentam características processuais diferenciadas em relação aos ambientes úmidos. E com essa diferenciação processual vai resultar em diferentes formas e estrutura no sistema (SOUZA, 2015). As condições de estabilidade não são rígidas estas variam de acordo com as características endógenas de cada sistema fluvial e dentro do próprio deste pode também variar de forma notável. No qual o fator dominante para estabilidade depende das características presentes no sistema (o escoamento, presença de vegetação, o tipo e classe do canal e clima), no essencial a estabilidade das margens de um rio depende da composição e disposição do material da margem (MAGALHÃES, 2010), bem como na cobertura e uso das mesmas. Baseado nesses parâmetros o presente artigo procura avaliar no ambiente fluvial as modificações nas margens do canal principal da bacia hidrográfica do riacho Jucurutu, através da análise da cobertura do solo e a composição do material da margem.

Material e métodos

A bacia em estudo está inserida em um arcabouço de fatores físicos e sociais semelhantes à grande parte do semiárido nordestino, sendo representativa em relação as bacias de cabeceiras dos maiores rios do semiárido nordestino. A bacia encontra-se localizada no município de São João do Tigre-PB, que está incluído na área geográfica que abrange o semiárido brasileiro. O clima é do tipo o Bsh, quente, semiárido, com temperatura média anual de 28ºC(nos meses de dezembro a janeiro, chegando a quase 40ºC). O índice pluviométrico médio anual é 440 mm, período chuvoso vai do mês de janeiro a maio. O riacho Jucurutu faz parte da drenagem do rio Paraíba, e sua bacia está inserida no Cariri Paraibano, apresentando cerca de 564 km², com variação altimétrica de 500 até 1100 metros na interface da Depressão Sertaneja com as serras altas do lineamento PE/PB. Para alcançar os objetivos proposto nesse estudo foram estruturados alguns passos metodológicos, nos quais considerou-se dois fatores essenciais para a análise de estabilidade da margem fluvial: materiais que compõem as margens e a vegetação associada. Desse modo, foi realizado um mapeamento prévio através de imagem de satélite do Google Earth, para identificar os possíveis trechos fluviais que apresentam características diferenciadas destes dois fatores, nos quais estão diretamente relacionados a estabilidade das margens na bacia. Desse modo foram elencados sete pontos no canal principal e em um dos afluentes da bacia (figura 01), onde ocorreram as visitas de campo com a utilização do GPS topográficos PRO-XH – Trimble, que teve por objetivo a confirmação e identificação desses trechos fluviais, para o mapeamento das diferentes classificações de estabilidade das margens, e como também a realização do teste de consistência do material das margens, e análise da vegetação associada. Para elaboração do perfil lateral do canal, foi utilizada a estação total. Assim, os testes de consistência foram realizados com base no Manual Técnico de Pedologia do IBGE, (2007) e a textura das margens pelo fluxograma de Thien (1979) apud (CAVALCANTI, 2014). Na análise da vegetação associada foi identificada a forma de crescimento, cobertura vegetal e a dominância com base em Cavalcanti, 2014. De maneira geral a consistência do material sedimentar e a cobertura vegetal no ambiente fluvial, é um dos maiores condicionantes da estabilidade fluvial, pois a presença do material de textura coesa nas margens, e a cobertura vegetal densa conservada manterão diferentes formas e estrutura de organização do ambiente fluvial. Por fim, para alcançar o objetivo proposto no trabalho, foram elaboradas tabelas com informações da vegetação da zona riparia, da textura e consistência do material das margens, coletados em campo, para fazer uma compilação das informações e assim poder chegar a uma classificação de estabilidade de todos os trechos que foram analisados (figura 01), dividindo em margens estáveis, intermediárias e instáveis. Desse modo elencou-se três trechos representativos da bacia hidrográfica, no qual apresenta condicionantes diferenciados de estabilização das margens.

Resultado e discussão

A partir diversidade da variável de vegetação identificadas nos trechos estudado da bacia riacho Jucurutu, foram atribuídos classificação da influencia do mesmo para estabilização da margem, pois a cobertura vegetal da margem, e a quantidade de raízes existentes em função da cobertura contribui para o aumento da resistência à erosão. Sendo assim, para áreas com presenças de espécie arbóreas/arbustiva densa foram classificadas como estável; para áreas antropizadas ou de predominância herbácea foi classificada como instável e para presença de espécies arbóreas/arbustiva espaçada classificou-se como intermediário. Para a forma da cobertura vegetal também foram atribuído classes de estabilidade, as espécies densa foi classificada como estável, já as de cobertura espaçada foi classificada com estabilidade intermediaria, já os ambientes fluvial com vegetação escassa ou degradada foi classificada como instável. Do mesmo modo foram atribuídos classificação para composição do material coletados nas margens dos trechos, no qual as propriedades mecânicas de uma margem estão relacionadas à composição granulométrica. No caso da resistência à erosão, a coesividade é uma variável importante, estando relacionado com a porcentagem de argilas e de silte, porcentagem de matéria orgânica, do grau de consolidação e do tamanho do material granular. Deste modo, a resistência do material virá da combinação das resistências devido à coesão do material fino, do grau de consolidação do material e do tamanho das partículas. A coesividade dos sedimentos é proporcional ao teor de argila e de matéria orgânica, contudo como o manto de intemperismo da região apresenta baixo teor de matéria orgânica, quanto mais argilosa a margem, possivelmente ela será mais resistente aos processos de remoção. Analisando as texturas encontradas na bacia, as margens rochosas e com textura argilosa foram classificadas como estável; as de textura franco-argila arenosa e franco-argiloso como intermediário, e margens de textura arenosa e de areia-franca como instável. Sendo assim, foram realizados uma compilação das informações da composição e disposição do material da margem e a distribuição da vegetação na área, a assim foi classificado os sete trechos analisado. Para cada representação de estabilidade fluvial foi escolhido um trecho que apresentasse características representativas de estabilidade que foram identificadas na bacia, e para cada um desses trechos foi realizado um mapeamento de detalhe da composição do material fluvial, uma tabela de informação, perfis laterais e imagens da área. Para classificação final de estabilidade dos ambientes fluviais analisados (figura 01), foi primordial a elaboração da tabela de cruzamentos das informações da consistência do material da margem e a cobertura vegetal. Assim os ambientes fluviais que apresentava uma textura do material sedimentar argiloso, que é bastante resiste devido sua consistência, assim como a presença de espécie arbóreas e arbustiva de cobertura densa, como um ambiente fluvial estável. O primeiro trecho foi definido como confluência de estabilidade intermediária, localizado a jusante da bacia, próximo da foz foi classificando como nível de estabilidade intermediário, devido à cobertura de vegetação da área que está degradada principalmente na planície de inundação que apresenta sem revestimento de vegetação, sendo utilizado para fins agrícolas, diminuindo tanto o fator de proteção do impacto da chuva contra o solo, bem como a função das raízes na coesão dos materiais da margem. Enquanto em relação ao material das margem, foi encontrado um material muito resistente, que apresenta uma alta coesão devido ao presença de argila no material sedimentar . Assim, na margem esquerda do canal afluente foi identificada uma textura argilo siltosa, que frações a granulometria é representa em média 25% de silte e 30% a 40% de argila, na direita a textura é argilosa. Já na margem esquerda do canal principal, apresenta uma textura argilo siltosa e na margem direita uma textura franco-argilosa, em media apresenta 25% de silte e 30% a 40% argila . Ou seja, este trecho na variável de analise da vegetação apresenta como trecho mais antropizada da bacia, porem em relação a composição do material por ser coeso, este trecho não foi classificado como instável e sim como intermediário. Ou seja, apesar da degradação da vegetação a resistência interna do material superficial gera um certo controle da erosão, tendo uma estabilidade intermediária inclusive em eventos de eventos chuvosos fortes e algumas horas após esses eventos, quando as vazões atingem seus picos é a energia do fluxo vai esta alta. No perfil lateral médio onde temos uma visualização do corte lateral do canal, podemos observar a morfologia destes trechos. Ainda no percurso do canal principal da bacia, a jusante do trecho anterior, o segundo trecho foi definido como arenoso de estabilidade intermediária, esse trecho foi escolhido para ser analisado por se caracteriza como canal é semi-confinando e a textura tanto do leito quanto das margens é arenosa. Ao contrario do trecho anterior, este apresenta uma cobertura vegetal bastaste densa, e o material das margens apresta o material menos coeso. Na margem esquerda, os testes de consistências apresentam um material, com característica solta, não plástica e muito friável, sendo identificando, assim uma textura de areia, que de acordo com Fryirs, K.; Brieley (2012) apresenta entre 5% a 10% de argila. Já na margem esquerda a consistência apresentou características macia, plástica e muito friável, a textura identificada como franco-argilo siltosa, que no caso estas frações granulométricas é representa em media por 25% de silte e 30% a 40% de argila. Desse modo, por apresenta uma porcentagem baixa de frações granulométricas de silte e argilas é um material que não apresentam coesão, no qual torna este trecho menos resistente a erosão. E suscetível a modificação da morfologia, que como pode-se observar é o canal apresenta forma sinuosa. Contudo, foi classificando com nível de estabilidade intermediário, pois neste apresentam presença de espécie arbóreas e arbustiva sendo a predominância de vegetação arbustiva de cobertura densa, a vegetação aumenta a estabilidade das margens criando uma estrutura de raízes que apresenta uma elevada tensão resistente e reduzindo a velocidade da água junto à margem, no período de alta vazão. Por fim, o terceiro e último trecho detalhado, é definido como rochoso estável, sendo representativo para os canais da bacia tanto de cabeceira quanto das encostas das serras e de suas bases. Este trecho encontra-se no canal secundário, apresenta características como encosta íngreme nas laterais, canal confinando de leito e margem rochoso e presença de blocos grandes, assim é possível visualizar no perfil lateral, o confinamento do canal. E de acordo atribuição de classificação de estabilidade das margens fluvial, este trecho foi classificado como estável, não só pelo fator da resistência do material das margens, cujo a rochosidade é fator controlador, mas também, pela presença de espécie arbóreas e arbustivas de cobertura densa, como podemos observa na imagem desse trecho fluvial, tanto na margem esquerda como na direita, apresenta blocos rochoso e vegetação densa, apresentando maior densidade em comparação aos outros pontos visitados da bacia, a cobertura vegetal não predominava com tanta intensidade. De modo geral, o papel que a cobertura vegetal e a composição do material da margem desempenham na estabilidade ficou comprovado, verificando-se que as margens com cobertura vegetal as espécie herbáceas arbustiva de cobertura densa e compostas por materiais com elevadas percentagens de argilas e siltes têm uma maior resistência às ações do escoamento e erosão , ao contrário das margens com pouco revestimento vegetal e compostas essencialmente por materiais granulares que têm menor resistência.

Mapa de Localização e Classificação de Estabilidade das Margens



Mapa de Trecho Argiloso de Estabilidade Intermediária



Mapa de Trecho Arenoso de Estabilidade Intermediária



Mapa de Trecho Rochoso- Estável



Considerações Finais

O presente artigo procurou enfocar nos principais elementos e processos relacionados a estabilidade fluvial no ambiente semiárido. Ambiente este, que apresentam características processuais diferenciadas, como também condições de estabilidade fluvial diferenciada de acordo com as características especificas de cada trecho fluvial analisado. E de acordo com resultados obtidos, na aplicação metodológica foi possível representar três situações de estabilidade das margens, a onde não apresentou características de ambiente fluvial instável de acordo com paramento analisado, que mesmo que se apresenta um déficit vegetação, por outro lado o material sedimentar encontrava-se resistente, equilibrando-o assim a estabilidade do mesmo. Deste modo, essa classificação atribuída aos ambientes fluviais do semiárido exerce importante função do ponto de vista hidrológico e ecológico, contribuindo assim para identificação de áreas no qual apresente modificação, como também contribuir para uma resiliência do sistema fluvial. E desta maneira possibilita uma visão sistêmica e integrada dos componentes do ambiente fluvial tendo como foco a preservação ambiental e principalmente dos recursos hídricos e gerenciamento dos usos do mesmo.

Agradecimentos

Referências

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