Autores

Silva, A.F.P.L. (UFPB)

Resumo

As pesquisas voltadas à gestão dos recursos hídricos vêm ganhando importância crescente nos últimos anos no Brasil, sobretudo no nordeste, em decorrência dos anos de estiagem prolongada em ambientes semiáridos. Nesse contexto, a exploração dos aqüíferos aluviais surge como alternativa complementar para suprir a carência hídrica, buscando aperfeiçoar as formas de captação armazenamento e uso de água pelas comunidades. Além disso os aluviões têm maior capacidade de armazenar água da chuva, são fáceis de escavar ou perfurar, tornando sua exploração simples e viável, contribuindo para o desenvolvimento na região através da agricultura familiar. Assim, este trabalho buscou identificar e caracterizar os trechos fluviais na qual haja a possibilidade de haver aqüíferos aluviais, de modo que a comunidade local possa melhorar as técnicas de captação, uso e armazenamento de água através da exploração desses ambientes. A pesquisa foi realizada no município de São João do Tigre – PB.

Palavras chaves

Aquíferos aluviais; Ambientes fluviais semiáridos; Gestão da água

Introdução

O Gerenciamento de recursos hídricos está cada vez mais presente nas políticas públicas, no entanto, é possível perceber que na maioria das vezes as aplicabilidades das práticas de planejamento estão focadas no elemento água, deixando de lado outros elementos físicos da bacia hidrográfica. O desafio da gestão da água torna-se mais complexo quando se trata de um ambiente fluvial semiárido, devido à escassez de chuva e à ausência de cursos perenes de água, além da insuficiência de disponibilidade hídrica nos reservatórios durante maior parte do ano (SOUZA e ALMEIDA, 2015). A carência de água juntamente com o impasse de integrar estrategicamente os recursos superficiais e subterrâneos constitui um desafio para o nordeste brasileiro, sobretudo para o semiárido. Nesse contexto, pensando em abordagens que tenham como objetivo aperfeiçoar a captação, armazenamento e uso dos recursos hídricos pelas comunidades, a exploração dos aquíferos aluviais surge como alternativa complementar para suprir a carência de água no semiárido, principalmente nos períodos de estiagem. Os depósitos aluviais são formados por sedimentos clásticos depositados pelas correntes fluviais nas margens e no leito das drenagens. São de grande importância no contexto do semiárido brasileiro, pois estes apresentam grande capacidade de armazenamento hídrico, tornando-se expressivas reservas de águas subterrâneas, os aquíferos aluviais. Além disso, os trechos aluviais são mais favoráveis às recargas oriundas da precipitação e são fáceis de escavar ou perfurar, tornando sua exploração simples e de baixo custo, podendo possibilitar um melhor desenvolvimento socioeconômico na região através da agricultura de pequena escala (SÁ e DINIZ, 2012). No entanto, a locação dos poços efetuada pela população sem prévio conhecimento das características do aquífero tornou-se um problema, podendo comprometer o sucesso referente à captação da água (SÁ e DINIZ, 2012). A garantia de melhor qualidade de vida e o desenvolvimento socioeconômico da região depende (não exclusivamente) de um modelo adequado de planejamento e gerenciamento das bacias hidrográficas e seus recursos naturais integrados. Nesse sentido, o presente trabalho tem visa realizar a identificação e caracterização dos trechos fluviais na qual haja a possibilidade de haver a presença de aquíferos aluviais, de modo que a população residente possa melhorar as técnicas de aperfeiçoamento de captação, uso e armazenamento dos recursos hídricos através da exploração dessas áreas. A pesquisa foi realizada no município de São João do Tigre, Cariri Paraibano.

Material e métodos

A área de estudo fica na Bacia do Riacho do Jucurutu, localizada no município de São João do Tigre-PB, cujo apresenta área de 816.166 km², situado na mesorregião da Borborema e na microrregião do Cariri Ocidental. O bioma predominante é a caatinga e o clima é Tropical semiárido, com chuvas de verão nos períodos entre novembro e abril e apresentando pluviosidade média anual de 431,8mm (IBGE, 2016). Contudo, foram selecionados três trechos de canais aluviais para análise: Trecho 1, canal arenoso com localização na foz da bacia; trecho 2, canal arenoso, largo, apresentando vegetação conservada e algumas intervenções antrópicas (cacimbas no leito); trecho 3, área de cabeceira, canal semi confinado, leito rochoso com lâminas de areia; As análises foram desenvolvidas a partir dos dados obtidos no trabalho de campo, com o auxílio do Google Earth e do software ArcGis. Buscando atingir o objetivo da foram adotados alguns passos metodológicos que consiste em: Identificar, tipificar e mapear os diferentes trechos aluviais da bacia do Jucurutu; caracterizar sedimentológicamenteos trechos aluviais; e identificar o uso do terreno e os impactos antrópicos nos trechos aluviais. Os dados necessários para o desenvolvimento da pesquisa serão obtidos através da literatura, dados de relevo do SRTM (Shuttle Radar TopographyMission), cartas topográficas, imagens de satélite (as imagens disponibilizadas no Google Earth e outros que estejam disponíveis) e por fim os dados dos trabalhos de campo exploratório, passando por uma análise básica por sensoriamento remoto. Os dados de campo serão adquiridos através dos dados de GPS e dos mapeamentos de campo, fazendo o uso do GPS, trena, estação total. A identificação, tipificação e mapeamento dos diferentes trechos aluviais da bacia serão realizados através de uma caracterização geral dos trechos aluviais, buscando analisar a localização, vazão, cobertura, geometria, declividade/gradiente, área de captação hídrica, perfil lateral e largura do canal. Ao mesmo tempo será buscada a tentativa de tipificar o motivo da retenção de sedimentos que controla os trechos aluviais, tais como: as declividades, barramentos ou contrições, visando o comportamento do processo de sedimentação. Para a caracterização sedimentológica dos trechos aluviais, foi coletado para análise posteriori que foi realizado em campo uma análise simplificada da granulometria usando o diagrama de Thien, com o objetivo de avaliar a possibilidade de erosão/re- trabalhamento do material. Em campo, a textura é avaliada através de uma amostra de solo molhada, esfregando a amostra entre os dedos após amassada e homogeneizada; através do tato, a areia dá sensação de atrito, o silte dá sensação de sedosidade e a argila revela sensação de pegajosidade. (IBGE, 2007). Além da granulometria e textura, a consistência do material também foi avaliada. Para avaliar a consistência de um solo em estado seco, deve-se comprimir um torrão entre os dedos indicador e polegar. A amostra úmida é caracterizada pela friabilidade, para avaliar é necessário esboroar uma amostra selecionada (ligeiramente úmida) entre o indicador e o polegar. Já a consistência do solo molhado é caracterizada pela plasticidade e pegajosidade na qual é avaliada através de uma amostra pulverizada, homegeneizada e molhada (IBGE, 2007). Além disto, será realizado o mapeamento detalhado dos trechos aluviais quanto ao uso e ocupação do solo, podendo ser acrescentadas além das características naturais as formas de construção antrópica – como, por exemplo, as estradas, cercas, barragens e casas – como também as áreas de exploração da comunidade (agricultura e pecuária).

Resultado e discussão

O trecho1 situa-se na foz da bacia, corresponde a um canal arenoso entrelaçado com presença de algumas barras arenosas e detritos lenhosos. A partir das análises realizadas em trabalho de campo, na vegetação é possível perceber a presença de poucas arbóreas, arbustivas com cobertura intermediária e herbáceas com cobertura densa, com predominância de vegetação arbustiva. Com o auxílio do ArcGis foi possível gerar o mapeamento da área, e a partir deste fazer a identificação da geometria, da área de captação hídrica e largura do canal. O Perfil lateral e o gradiente do canal foram elaborados com dados obtidos no campo através da estação total. O Gradiente em m/km foi calculado através da divisão do comprimento do canal pela altura, resultando em 1,1m/km. A partir do mapeamento do trecho foi possível obter informações adicionais, como: a largura do canal, equivalente a 111m; a geometria, que é a própria forma do canal; e a área de captação, cujo cálculo do fluxo acumulado apresentou 531,3 km². No leito, a granulometria dos sedimentos se apresentou arenosa. As análises das amostras de solo das margens e das planícies apresentaram textura franco- argilosa. A análise da consistência nas margens resultou em friável (amostra seca), ligeiramente plástica e ligeiramente pegajosa (amostra úmida). O trecho 2 integra canal principal e está localizado numa zona intermediária na bacia, entre a foz e as áreas de cabeceira. O canal é arenoso, com presença de algumas cacimbas no leito, uma das intervenções antrópicas mais comum na região. A vegetação nas encostas tem presença de arbóreas e arbustivas com cobertura espaçada; nas margens e no canal é possível perceber a predominância de herbáceas (cobertura intermediária) e algumas arbustivas (cobertura intermediária). O gradiente é de 5,7 m/km, a largura do canal mede 46m e a área de captação que é 197,7 km². Referente às análises granulométricas dos sedimentos, a granulometria do leito se apresentou arenosa. As amostras de solo das margens apresentou textura de areia. A consistência é solta quanto às amostras secas, as amostras úmidas não apresentaram plasticidade e pegajosidade. O trecho 3 está localizado em área de cabeceira e corresponde a um canal semi confinado, sendo a margem esquerda confinada – do lado da encosta íngreme – e a margem direita não confinada, com possibilidade de inundação em épocas de cheia. O leito é rochoso, com lâminas de areia e alguns blocos. Ao lado da margem esquerda é possível perceber uma estrada, algumas casas e terrenos utilizados para agricultura. A cobertura da vegetação se alterna entre intermediária e densa, com presença de poucas arbóreas na encosta esquerda e muitas herbáceas e arbustivas. As herbáceas se concentram densamente na encosta; As arbustivas predominam na margem direita, no leito e em parte da encosta. Após a elaboração e análise do mapeamento – além de dados da estação total – foram obtidas as seguintes informações: A largura do canal é 11m; o gradiente, cujo cálculo resultou em 9,5 m/km; e a área de captação hídrica que é de 31,6 km². O resultado dos testes de granulometria no leito correspondeu às características de areia. As amostras de solo das margens correspondeu às características de textura franco-argiloarenosa. O teste de consistência realizado nas amostras secas resultou em Friável; nas amostras úmidas o resultados foram ligeiramente plástica e ligeiramente pegajosa. De maneira geral, os depósitos aluviais (areia, cascalhos e finos) estão concentrados nos leitos dos canais analisados e nas planícies de inundação. O rio é intermitente com vazão ausente durante maior parte do ano, tendo em média menos de 40 dias de vazão por ano. Contudo não há dados observados, sendo que essa é a média padrão de vazão para a região. referente à retenção de sedimentos, no trecho 1 o processo de sedimentação pode ser atribuído à baixa declividade e baixa energia do fluxo, se tratando de um canal consideravelmente largo. No trecho 2, as cacimbas propiciam a escavação do leito quando há fluxo no canal; a vegetação controla o transporte de sedimentos; e as contrições provocadas pelo estreitamento do canal à jusante. No trecho 3, os sedimentos de origem coluvial se concentram na margem esquerda, e contato com a encosta na soleira rochosa. Já os sedimentos fluviais se concentram no leito, na margem direita e na planície de inundação, justamente por se tratar de um trecho semi confinado.

Mapa do uso e ocupação do solo - trecho 1



Mapa do uso e ocupação do solo - trecho 2



Mapa do uso e ocupação do solo - trecho 3



Considerações Finais

A partir dos resultados gerados, pode-se concluir que a área de estudo está inserida nos padrões normais de uma bacia hidrográfica. O trecho 1 corresponde a um canal arenoso largo, entrelaçado, com baixa declividade e abrangendo uma área extensa de captação hídrica (531,3 km²). A baixa energia do fluxo só permite o transporte de sedimentos por carga de suspensão. A formação das barras arenosas pode ser atribuída aos detritos lenhosos situados no leito do canal. O trecho 2 também corresponde a um canal arenoso, com largura considerável. As margens apresentam susceptibilidade à erosão conforme os testes de consistência, porém a cobertura vegetal impede que esse processo seja mais intenso. As cacimbas escavadas no leito contribuem para a formação de barras arenosas à jusante na medida e que o canal se estreita. No trecho três o canal é de leito rochoso semi-confinado e com presença de lâminas de areia. Grande parte dos sedimentos são transportados à jusante devido à alta energia do fluxo, prevalecendo o transporte por carga de fundo, sendo capaz de deslocar os sedimentos mais grosseiros. Observando todos os trechos de maneira geral, a energia do fluxo é mais intensa à montante e a capacidade de infiltração é maior à jusante, tendo em vista os valores de declividade apresentados nos trechos 1, 2 e 3, resultando em 1,1m/km, 5,7m/km e 9,5 m/km respectivamente. Além disso, os valores do cálculo do fluxo acumulado demonstram que a área de captação hídrica se torna maior à jusante.

Agradecimentos

Agradeço ao professor Dr. Jonas Souza (UFPB) e a todos os membros do GEAFS (Grupo de Estudos em Ambientes Fluviais Semiáridos), na qual contribuíram para o desenvolvimento dessa pesquisa. Agradeço também a minha esposa Camila Carneiro e meus pais (Adonai de Lima Silva e Maria de Lourdes Pereira de Lima Silva), pelo incentivo dado desde o começo. E por fim, agradeço a Deus por permitir que eu realizasse esse trabalho.

Referências

CAVALCANTE, A. A.; CUNHA, S. B. Morfodinâmica Fluvial em Áreas Semiáridas: Discutindo o Vale do Rio Jaguaribe – CE – Brasil. Revista Brasileira de Geomorfologia. v. 13, n 1, p. 39 – 49, 2012.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. IBGE – Cidades, 2016. Disponível em: < http://cidades.ibge.gov.br
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Manual técnico de pedologia. 2° Ed. Rio de Janeiro, 2007.
SÁ, J. U.; DINIZ, J. A. O. Aproveitamento das aluviões do semiárido do nordeste. In: XVII Congresso Brasileiro de águas subterrâneas e XVII Encontro Nacional de perfuradores de poços. Bonito: 2012.
SANTOS, M. V. C.; FREIRE, C. C.; SOUZA, V. C. B. Comportamento do fluxo subterrâneo em um aqüífero aluvial no semi-árido alagoano. In: XVIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos. Campo Grande: 2009.
SOUZA, J. O. P.; ALMEIDA, J. D. M. Processos Fluviais em Terras Secas: Uma Revisão. Revista OKARA: Geografia em Debate. V. 9, n.1, p. 108 – 122, 2015.