Autores
Rodrigues, J.M. (UFPB) ; Souza, J. (UFPB)
Resumo
Neste projeto será apresentado um estudo com o objetivo de identificar e caracterizar os estilos fluviais em uma bacia de drenagem que está situada em sua maior parte no município de São João do Tigre/PB, mais precisamente no cariri paraibano fazendo divisa no lineamento PB/PE. Área esta situada em um ambiente semiárido que passa por muitos problemas de gestão hídrica, pelo fato de existir um déficit de água nos meses secos. Nessa perspectiva é necessário que se faça estudos para entender a dinâmica fluvial nesses ambientes. Contudo, este estudo tem como base fazer a parte da classificação de canais, onde será feito nos 3 principais canais da bacia de drenagem, a partir de dados altimétricos de declividade, tipo de vale e sinuosidade do canal. Estas informações foram obtidas por imagens de satélite do Google Earth, trabalhadas e validades por meio do software ArcGIS.
Palavras chaves
BACIA DE DRENAGEM; GESTÃO HÍDRICA; FLUVIAL
Introdução
O Nordeste brasileiro ocupa uma área de 1.219,000 km², uma enorme extensão em terra, que ocupa aproximadamente um quinto do território brasileiro. Possui 9 estados onde vivem cerca de 18,5 milhões de habitantes (CIRILO, 2007, p.33). Já o semiárido brasileiro abarca uma extensão de cerca de 900 mil Km², considerando-se no Nordeste brasileiro e no norte de minas, caracterizado pela baixa umidade e pouco volume pluviométrico e elevadas temperaturas, resultado em déficit hídrico e causando problemas de disponibilidade de água para as áreas urbanas e rurais na maior parte do ano (Vieira, 2003); Com isso, algumas medidas são tomadas para o aumento da disponibilidade de água, como a escavação de cacimbas no leito de rios, que são feitos em trechos aluviais com preenchimento sedimentar, nos chamados aquíferos de leito de rio, e também a criação de barragens para retenção de água, o que faz com que haja um acúmulo de sedimento, uma redução na energia do fluxo no canal, o que pode gerar desequilíbrios no sistema fluvial semiárido, mudando as características fisiográficas e morfológicas do rio tanto para montante quanto para jusante. Contudo a gestão de recursos hídricos no semiárido por vezes carece de informação técnica sobre o comportamento fluvial resultando em problemas como erros no prognóstico dos volumes de água nos barramentos ou até problemas como enchentes urbanas e rompimentos de barragens nos anos chuvosos (SOUZA, 2016). Pensando nisso, o presente trabalho buscou estudar as características e o comportamento fluvial em uma área localizada no semiárido paraibano, onde esses problemas são visíveis. Assim, objetiva-se uma primeira aproximação no entendimento dos sistemas fluviais, também para entender como se dá a dinâmica fluvial e ter uma melhor compreensão da classificação de canal nesse contexto semiárido. Desse modo, será avaliado os canais principais de uma bacia hidrográfica semiárida no município de São João do Tigre, semiárido paraibano, onde serão avaliados os 3 principais, tendo como base para a análisea proposta teórico-metodológica dos estilos fluviais (Brierley e Fryirs, 2005), onde a partir da identificação e caracterização das unidades geomórficas é possível avaliar os processos de comportamento fluvial. A identificação de feições fluviais em um rio serve como parâmetro chave para caracterizar e mapear estilos fluviais. Sendo assim, feições morfológicas de área fonte, fluxo e deposição de sedimento são associadas a declividade da área, litologia, tipo de vale e classificação de canal, as quais as informações são importantes para análise dos estilos fluviais. Assim serão apresentados também os principais atributos morfológicos, onde são classificados e representados os três principais seguimentos da bacia (Brierley e Fryirs, 2003, apud KLEYNA, M.2014). A identificação e interpretação das unidades geomórficas possibilita a interpretação dos processos que refletem o comportamento dos estilos fluviais. Desta forma os estilos fluviais e seus padrões são avaliados em relação ao contexto paisagístico e as ligações espaciais e temporais dos seus processos geomorfológicos (CORRÊA, SILVA, et al., 2009; SOUZA e CORRÊA, 2012b, apud SOUZA, J. 2014). Como objetivos específicos têm-se, portanto, fazer a verificação de algumas características dos riachos (sinuosidade, declividade e tipo de vale), utilizando imagens de satélite e realizando trabalhos de campo para validação dos dados.
Material e métodos
Segundo Kondolf (2003, apud SILVA e RODRIGUES, 2012), cada rio tem sua característica, com um conjunto de variabilidades que dependem do seu grau de dinamismo, como tamanho e forma do canal, o presente trabalho pretendeu obter dados morfológicos e geomorfológicos fluviais, como por exemplo, características de tipos de vale, declividade e classificação do canal. Para caracterização dos estilos fluviais é necessário informações sobre o tipo de vale em cada trecho do canal, pois as formas de vale variam muito de acordo com a posição, como também é influenciado pela litologia do terreno e a declividade onde o mesmo está inserido. Uma informação de grande valia para a caracterização do tipo de vale é a presença ou não de planícies de inundação, sabendo que a mesma é formada a partir do extravasamento do fluxo do canal, onde CHRISTOFOLETTI (1980) afirma que é uma faixa composta por sedimentos depositados nas suas margens, formando várzeas(linguagem popular) e que constitui a forma mais comum de sedimentação em ambientes fluviais, principalmente quando ocorrem enchentes. Dentro da concepção de tipo de vale, este pode ser definido como confinado, parcialmente confinado e não confinado, onde cada um desses possui um conjunto de atributos. Outro aspecto muito importante para a caracterização dos estilos fluviais é sobre declividade do terreno, onde a mesma influenciará na velocidade da vazão, capacidade de erosão, contribuição da massa sedimentar no transporte do rio, como também está associado diretamente com o tipo de vale. Tanto para obtenção de informações para a presença ou não de planícies de inundação, tipo de vale, declividade e sinuosidade do canal, terá como ferramenta dados espaciais obtidos a partir de fotointerpretações de imagens de satélite, e estações totais, sendo trabalhado no software ArcGis. Por fim, uma última informação e não menos necessária, é sobre a classificação de canal. Não existe unanimidade para classificação de tipos de canais, no entanto, existe algumas bases, desse modo eles serão classificados de forma provisória como: reto, sinuoso ou meandrante.. Christofoletti afirma que para saber se um rio é meandrante ou não, é necessário que se faça um cálculo, onde, divide-se o valor do comprimento do canal pela distância do eixo do vale, se o resultado do cálculo for maior que 1,5 quer dizer que o rio pode ser considerado meandrante, menos que isso é sinuoso ou retilíneo. Dentro da questão da sinuosidade, ele pode ser regular ou irregular. Essa medição de extensões foi feita através das imagens de satélite do Google Earth, utilizando a ferrramenta “régua” e depois delimitada pela opção “caminho”.
Resultado e discussão
Tendo como base os três principais canais da Bacia de São João do Tigre, foi
feito primeiramente a delimitação dos níveis de altitude da bacia (MDE-
Modelo Digital de Elevação), onde para fazer esse mapeamento foi utilizado o
software ArcGIS 10, a escala utilizada foi de 1:250.000, essa informação
serve como parâmetro para se saber a correlação que os níveis de altitude
tem com os tipos de vale, sinuosidade do canal e declividade do terreno
(figura 1).
A correlação existente entre o canal 1 e a declividade do terreno (MDE) se
faz pelo fato de que sua cabeceira está localizada numa altitude que pode
ser considerada como moderada em comparação com as demais, com cerca de 700m
a 800m e caindo para valores entre 500 e 600 metros. Neste, o canal é
contínuo em todo o percurso, não havendo áreas de vale preenchidos.
Já no segundo canal, a nascente está situada em uma altitude com cerca de
600m a 700m, e sua confluência com o primeiro canal está entre 500m a 600m.
O fato de ele manter baixas declividades, incluindo longos trechos de
declividade plana, faz com que durante o percurso da drenagem haja trechos
onde a incisão vertical seja muito pequena, incluindo trechos onde o canal é
descontinuado chegando a apresentar áreas de leque aluvial, resultado da
baixa energia do fluxo que mostra-se, nesses trechos incapaz de escavar o
leito (Figura 2). Uma observação é que a maioria das comunidades que estão
inseridas nesta bacia, estão marjoritariamente situadas nessa área de baixo
gradiente, ou seja, onde há amplas planícies de inundação sendo ambientes
mais propício para escavação de poços e cacimbas pela presença do aquífero
aluvial.
O terceiro canal está situado próximo as maiores altitudes da bacia, onde
sua cabeceira está situada ente 900m a 1000m e ele também faz confluência
com o primeiro canal numa altitude com cerca de 600m a 700m. O que chama
bastante atenção é que ele está situado sobre uma linha de falha, mostrando-
se quase que retilíneo e com mínima presença de planícies de inundação,
sendo assim, caracterizado como confinado.
Também, relacionado à caracterização do tipo de vale, a identificação de
unidades morfológicas em ambientes fluviais como as planícies de inundação,
foi feita através de foto interpretação de imagens de satélite e validadas
em campo. Essas áreas de maior deposição não apresentam a presença de
vegetação nativa, devido as características ambientais locais, são áreas
prioritárias para o uso agrícola, onde a vegetação é removida para a
preparação da terra, podendo indicar o nível de “estabilidade” ou
“instabilidade”, sendo considerada, assim, uma área instável. Estes
ambientes deposicionais foram identificados com facilidade no canal 1(figura
3), bem como feições de usos agrícolas.
Dessa forma já se pode fazer uma classificação sobre os tipos de vale, onde
no canal 1 ele é parcialmente confinado com a presença de áreas de planícies
de inundação, no caval 2 é não confinado com áreas de canais descontínuos e
no canal 3 um canal confinado, relacionando com a presença de uma linha de
falha. Toda essa classificação está altamente associada com a declividade
que influencia diretamente na velocidade da vazão e na energia do fluxo.
Para fazer a análise do índice de sinuosidade, foi utilizada a proposta de
Chistofoletti, onde, como já explicitado, seria a relação entre o
comprimento do canal e a distância do eixo do vale. Podendo ser utilizado
para uma classificação do canal baseado na sinuosidade, podendo chegar a um
valor que indicará se o canal é meandrante. O valor generalizado que serve
como ponto de partida para fazer esse índice é de 1,5; pois se o valor
ultrapassar, o canal é considerado meandrico, menos que isso entra em outra
classificação: como sinuoso ou retilíneo. A partir desse arcabouço de
informações, agora é possível fazer o cálculo de sinuosidade do canal
(tabela 1).
No primeiro seguimento, o resultado deu equivalente a 1,01 sendo considerado
assim, não meandrico, contudo o canal apresenta alguns trechos com
curvaturas características em canais meandricos, no caso, se o rio fosse
trabalhado por trechos, por exemplo, o trecho que está representado na
figura 3 seria considerado meandrico, pois o canal está representado numa
escala de 1:125.000, e o trecho está numa escala maior, de 1:30.000. Mas
como a análise do trabalho é para o canal completo, ele é classificado como
sinuoso.
No segundo canal o resultado é de 1,02 e o canal classificado como irregular
por conter uma mínima escavação de leito, sendo assim, impossível de
enquadra-lo em uma classificação mais específica. Já o terceiro por estar
encaixado em uma linha de falha, é classificado como retilíneo.
Para a classificação de canal, correlacionou-se os elementos morfológicos e
geomorfológicos fluviais, que numa interação determinam as características
do tipo de vale que está associado com as planícies de inundação que estão
associadas com a declividade (altitude) e formam os estilos fluviais que é
um conjunto de determinações de unidades fluviais presentes no ambiente
fluvial (tabela 1). O primeiro foi considerado como parcialmente confinado,
tendo em seu percurso algumas áreas com planícies de inundação em uma margem
e vale na outra, principalmente nos canais ondulados, variando em altitudes
de 500m á 800m e sendo caracterizado como sinuoso.
O canal 2 é tido como não confinado por não conter vales em quase toda a
extensão, também pelo fato de que tem uma pequena variação no gradiente da
declividade com valores aproximados de 500m á 700m e sofre também um alto
grau de intervenções antrópicas, sendo caracterizado como irregular.
E o terceiro canal é o que está localizado nas maiores altitudes da bacia,
estando encaixado em uma linha de falha o que o torna retilíneo e confinado,
possuindo mínimas planícies de inundação.
figura 1: a) Drenagem da Bacia na parte de cima. B) Mapa do MDE em baixo.
Figura 2: a) Forma do canal 2 considerado sinuoso, contendo uma imagem do Google Earth. b) forma do canal 1, também irregular . c) forma do canal 3
Figura 3: canal 1 com as áreas identificadas com a presença de maior deposição e também em destaque as formas bem onduladas que o canal apresenta em
Tabela 1: a) grau de sinuosidade, comprimento dos três canais e a distância do eixo. b) classificação do canal, tipo de vale, estilo fluvial, altitude
Considerações Finais
Em um ambiente semiárido onde a falta de água é um problema regional, existe a necessidade de se compreender em como a caracterização de estilos pode ajudar na melhoria da gestão hídrica. A classificação de Estilos Fluviais é uma metodologia complexa, sendo realizado uma classificação simplificada, a partir das relações entre a morfologia dos canais e as unidades geomorfológicas, tais como gradiente, tipo de vale e presença de planícies de inundação. Podendo indicar como elas interagem na dinâmica do outro. Nessa perspectiva tais estudos podem indicar, por exemplo, locais mais propícios para escavação de poços e em até que ponto a interferência antrópica modifica o funcionamento normal de um ambiente fluvial. Os 3 canais aqui analisados foram caracterizados apresentado características distintas em relação a terreno e forma de canal, apesar da homogeneidade dos elementos ambientais a quais eles estão inseridos, mostrando assim a sua complexidade da bacia.
Agradecimentos
Referências
CIRILO et al., 2008 . A questão da água no semiárido brasileiro. Cap. 5: 82.
CHRISTOFOLETTI, A. 1980. Geomorfologia. EDITORA BLUCHER. 2º EDIÇÃO. SÃO PAULO. 1980. P.75.
KLEYNA, M. 2014. ANÁLISE COMPARATIVA DOS ESTILOS FLUVIAIS DO RIO SAGRADO (MORRESTES/PR) PARA OS ANOS DE 2006 E 2011. REVISTA GEOGRAFAR. Curitiba, v.9, n.1, p. 27-44.2014.
Silva, J.P. (IBGE) ; Rodrigues, C. (USP). 2012. Anais: Geomorfologia fluvial. Revisão teórica dos sistemas de classificação de canais fluviais aluviais. Rio de Janeiro.
SOUZA, BARROS, CORRÊA, IN PRELO. 2016. ETILOS FLUVIAIS DE UM SISTEMA FLUVIAL SEMIÁRIDO, BACIA DO RIACHO DO SACO, PERNAMBUCO.
SOUZA, J. 2014. REVISTA GEONORTE, Edição Especial 4, V.10, N.1, p.222-227, 2014.