Autores

Daudt, C. (UERJ - FFP) ; Sousa, R. (UERJ - FFP) ; Costa, F. (UERJ - FFP) ; Rocha-leão, O. (UERJ - FFP)

Resumo

O presente trabalho tem como pressuposto analisar a degradação ambiental na bacia hidrográfica do Rio Alcântara localizado no município de São Gonçalo (RJ). Pretende-se abordar os impactos físicos e sociais que influencia esses ambientes. O trabalho almeja, ainda, contribuir para o melhor entendimento da dinâmica fluvial da bacia hidrográfica alterada pela expansão urbana. A bacia é altamente urbanizada com suas encostas e margens de canais densamente ocupados. Com a necessidade de se criar espaços muitas obras foram feitas, como a canalização de rios em aproximadamente toda sua extensão, tornando-os “rios invisíveis”, que contribui intensamente para alterações ao longo de toda bacia hidrográfica. Em áreas urbanas os solos são em grande parte impermeáveis, dificultando a infiltração da água e levando a existência do escoamento superficial ocasionando a elevação da vazão em eventos pluviométricos de grande intensidade, suscitando as enchentes urbanas.

Palavras chaves

Bacia hidrográfica; drenagem urbana; geomorfologia fluvial

Introdução

A bacia hidrográfica é um recorte espacial que vem sendo largamente utilizado para análises ambientais, já que permitem a integração dos processos de encosta aos processos fluviais (DUNNE, 1970; DUNNE et al, 1975; DUNNE E LEOPOLD, 1978; COELHO NETTO, 1985 & GUERRA, 1994). As bacias são empregadas para compartimentação do relevo, permitindo a classificação das sub-bacias que compõem o sistema hidrológico, segundo sua dinâmica geomorfológica. No município de São Gonçalo, leste metropolitano do Rio de Janeiro onde se localiza a área de estudo do rio Alcântara, esta é considerada a maior bacia hidrográfica do município. Nela encontram-se solos degradados em grande parte de suas encostas, dificultando o processo de regeneração de cobertura vegetal. A degradação ambiental em áreas urbanas é um problema que vem se agravando nos últimos anos, particularmente em áreas periféricas com o intenso adensamento populacional. Essa degradação tem como elemento principal a cobertura vegetal, os solos e os sistemas hídricos, que potencializam os processos erosivos nas encostas, além de incrementar as perdas de solo. Desse modo, intensificam-se os processos de assoreamento dos canais fluviais que drenam as baixadas adjacentes a essas encostas, e contribuem fortemente para o problema das enchentes nas áreas urbanas. Esse trabalho, portanto, tem como objetivo fazer a análise morfométrica da bacia hidrográfica do rio Alcântara, localizado no município de São Gonçalo. Os resultados preliminares dessa pesquisa fornecem subsídios para uma pesquisa mais ampla, que busca compreender as transformações hidrológicas que se operaram na bacia pertencentes ao município. Nas últimas décadas o processo de urbanização acelerado acabou provocando intensas transformações fisiográficas na paisagem, acarretando modificações na dinâmica hidrológica das bacias que drenam o município. Dessa maneira, intensificaram-se os problemas ambientais associados ao escoamento da água, especialmente aqueles associados às enchentes urbanas. A importância desse trabalho se justifica também por contribuir com o levantamento de dados científicos sobre o Município de São Gonçalo, que carece de um maior conhecimento da realidade ambiental das bacias hidrográficas em que está inserido. Área de estudo O propósito deste estudo é realizar uma análise da Bacia do Rio Alcântara, que se situa na porção leste da Baía de Guanabara. Sua área tange aos municípios de Niterói (onde está localizada sua nascente), Itaboraí (uma pequena fração de sua área) e São Gonçalo (perpassa por 53 bairros) O clima do município de São Gonçalo é classificado como Clima Tropical Quente (média superior a 18°C), geomorfologicamente está situado em uma região de colina, maciço, planícies e tabuleiros costeiros. A ocupação nesta área promoveu gradativamente a devastação da vegetação natural, pois foi sendo substituída pela cultura cítrica e pela própria urbanização na década de 60. Em função da alta taxa de urbanização, a rede hidrográfica do município aufere grande influência, já que dispõe de um alto grau de modificação do ambiente natural, como canalização, retilinização, colocação de manilhas e pontes. A bacia hidrográfica apresenta como característica a geometria de forma alongada e padrão de drenagem dentrítica. A área da bacia é formada pelos rios: Pendotiba, Muriqui, Camarão, Guaxindiba, Monjolo, Goiânia, Alcântara, Sapê, Maria Paula, Rio das Pedras, Colubandê, e Mutondo. Vale ressaltar que grande parte desses rios eram navegáveis e possuíam biodiversidades, entretanto com a urbanização, estes foram modificados. As principais implicações diretas da urbanização na drenagem urbana são a degradação e assoreamento dos rios, além do lançamento de lixo esgoto in natura.

Material e métodos

Os métodos de investigação e de interpretação de informações propostos buscam a integração entre os componentes naturais, sócio-econômicos e políticos da maior bacia hidrográfica de São Gonçalo, incorporando o conceito de complexidade (MORIN, 2002; 2006), a perspectivas geossistêmica (NASCIMENTO & SAMPAIO, 2004/2005), sócio-ambiental (associando sociedade e natureza, segundo MENDONÇA, 2001) e histórico-ambiental (ligando a história natural à história social, valorizando o papel e o lugar da natureza na vida humana, segundo FREITAS, 2002). Tendo em vista a importância das questões relacionadas à dinâmica das águas em ambientes urbanos, procurou-se sistematizar uma metodologia para realização de diagnósticos da bacia do rio Alcântara em áreas urbanas, com identificação dos impactos, modos de ocupação e riscos ambientais envolvendo a dinâmica das águas (NASCIMENTO et al. 2007; AFONSO et al., 2008; AFONSO & ARMOND, 2009). Visto que a bacia está localizada em uma região totalmente afetada pela urbanização, a qual causou diversas modificações na mesma com o decorrer do tempo. Nesse sentido, o presente trabalho empregou uma abordagem metodológica temporal, comparando-se fontes de dados entre as décadas de 1970 e de 2010. Este intervalo de tempo é muito significativo para a região, pois engloba a construção da Ponte Presidente Costa e Silva (Ponte Rio- Niterói, inaugurada em 1974), a qual estimulou o crescimento populacional de São Gonçalo. Além disso, desde 2008, ocorre a construção do Complexo Petroquímico Integrado do Rio de Janeiro (COMPERJ) e de outros empreendimentos associados, no município vizinho de Itaboraí. Para a realização da pesquisa, inicialmente, foram realizadas pesquisas e discussões bibliográficas para o entendimento das bacias hidrográficas com foco na hidrologia urbana, e a busca de dados e informações sobre a área de estudo. Em seguida, houve a realização de mapeamentos da área de estudo, através do software ArcGis (Esri, 2010). Nessa etapa foi utilizada carta topográfica do município de São Gonçalo com escala de 1: 10 000, com variação de 5 metros nas curvas de níveis. A rede de drenagem foi extraída e comparada a partir das cartas da Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (FUNDREM), do ano de 1976, e da base digital do projeto do Plano de Despoluição da Baía de Guanabara, do ano de 1994. Além disso, foi utilizada a imagem do satélite Quickbird do ano 2006 do município de São Gonçalo, que possui resolução espacial de 61 centímetros, para observar os pontos de maior densidade urbana e as principiais interferências nos rios pertencentes á bacia hidrográfica. O trabalho de campo foi uma metodologia também empregada. Pois através deste, foi possível percorrer trechos da bacia hidrográfica para uma análise da distribuição espacial dos usos do solo, identificação, avaliação e mapeamento em campo dos problemas mais críticos e dos agentes responsáveis pela degradação do ambiente fluvial urbano. Isto é, a partir da ida a campo, conseguiu-se observar os processos que vem ocorrendo na região e registrá- los.

Resultado e discussão

A bacia do Rio Alcântara, localizada no município de São Gonçalo (Figura 1), apresenta as condições gerais de degradação da área urbana, que são representativas das condições de deterioração das bacias hidrográficas da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. É importante ressaltar que ao longo de suas margens se deu o desenvolvimento da cidade, e por consequência disso a isso a mesma possui um grande potencial econômico devido as suas águas de boa qualidade. Figura 1: Mapa de localização do município de São Gonçalo. Fonte: IBGE Na região da bacia hidrográfica predominavam, entre meados do século XIX e início do século XX, as chamadas “culturas de chácara”, destinadas a abastecer, em parte, a crescente cidade do Rio de Janeiro, como frutas, legumes e verduras. Isso foi importante para a região porque resultou na urbanização absoluta dos municípios de Niterói e São Gonçalo. Porém, com a industrialização e a urbanização do município no final do século XXI, o rio Alcântara sofreu grandes transformações com obras de engenharia (canalização, retilinização, pontes, travessas etc.) para facilitar as edificações e aumentar a infraestrutura urbana. No entanto, a intensificação da urbanização aumentou o despejo de esgoto in natura e a quantidade de lixo lançados nos rios apresentando alto grau de deterioração. A bacia (figura 2) enquadra-se aproximadamente entre as coordenadas métricas 7.467.000, 7.484.000 (N) e 704.000, 705.000 (L), possui 53 bairros incluso em seu perímetro e uma área de aproximadamente 198 Km². O seu canal principal, o rio Alcântara, tendo cerca de 29 Km. As suas principais sub-bacias são: rio Guaxindiba (23,16 Km²) e rio Goiana (18 Km²), e na hierarquia de canais, segundo o critério de Strarhler (1952), a bacia hidrográfica possui canais de primeira a quinta ordem. Figura 2: Mapa da hidrografia do Rio Alcântara Fonte: Leandro da Silva Após visitas a campo, nota-se que a área onde essa bacia está localizada, é densamente povoada, o que contribui para determinados problemas socioambientais nas margens de seus rios. Os municípios correspondentes á localização da bacia, principalmente São Gonçalo, sofrem com a questão da falta de saneamento básico, o qual é um importante contribuinte para a degradação dos recursos hídricos da bacia hidrográfica do rio Alcântara. A bacia em questão é a de maior área de todo leste da Baía de Guanabara e sofre constantes processos de intervenção antrópica, como a urbanização e a industrialização, ressaltando, assim, a questão do uso inadequado do solo nas margens dos rios. Segundo Vieira e Cunha (2001) as modificações feitas nos canais em áreas urbanas têm provocado mudanças nos processos fluviais, pois com o uso desordenado do solo, o aumento da erosão e das áreas impermeáveis aumenta o assoreamento do rio e as inundações. A remoção da vegetação, que é uma característica urbana, em torno dessa bacia hidrográfica também favorece a erosão de suas margens, além de contribuir para a redução na capacidade de infiltração, originando um aumento no fluxo de chuvas e a erosão acelerada do solo. Sendo assim, ocasiona-se a impermeabilidade do terreno e alagamentos, favorecendo a ocorrência de inundações em eventos de chuvas fortes. Como ocorreu nos dias 5 e 6 de abril de 2010, em que as inundações causaram transtornos em todo município, onde um forte evento pluviométrico atingiu a região. A área de estudo do presente trabalho, possui intensas ocupações de encostas e margens de rios, que oferecem grandes riscos á polução a qual reside nesses locais. Além disso, a construção de moradias nas margens dos rios, e a consequente poluição (figura 3) contribui para a erosão e o assoreamento dos rios da bacia Alcântara, bem como a má qualidade da água e alterações na dinâmica hidrológica. Desse modo, correlaciona-se as características de desenvolvimento urbano com o uso inadequado do solo. Figura 3: Fotos ao longo do curso do Rio Alcântara. Fonte: Arquivo pessoal. Na bacia foram detectados vários pontos com manilhas saindo diretamente nos rios com esgoto dos bairros inseridos na mesma. O alto, médio e baixo curso estão altamente poluídos, e baixo curso leva grandes quantidades de poluentes e lixo em direção aos mangues afetando a APA de Guapimirim e a Baía de Guanabara. As enchentes são um dos maiores problemas urbanos, que ocorrem devido à ineficiência da drenagem, ocasionadas pela presença de solos expostos e impermeabilizados. Decorrente disso, a água tem como destino final os canais, que devido a seu assoreamento e a reduzida capacidade de comportar quantidade de água elevada gera as enchentes ou inundações urbanas. A relação das enchentes com os aspectos urbanos traz consequências graves, pois de acordo com Botelho e Silva (2004) durante as enchentes, as águas dos rios invadem lixões e vazadores situados ás margens e arrastam os detritos sólidos para dentro do sistema de drenagem. Além disso, segundo Almeida (2010), a alteração da hidrologia natural e a destruição dos sistemas de drenagem, têm resultado na degradação ou destruição de vários ecossistemas aquáticos (mangues, rios, estuários etc.). A degradação dos recursos hídricos gera impacto para a própria população, provocando doenças e mau cheiro na convivência da sociedade. Isso é comprovado com o trabalho de campo, a partir dos relatos dos moradores e pela visão da sociedade sobre o rio, que o vê como um “valão” devido ao alto índice de poluição.

Localização do município

Figura 1: Mapa de localização do município de São Gonçalo. Fonte: IBGE

Drenagem do Rio Alcântara

Figura 2: Mapa da hidrografia do Rio Alcântara Fonte: Leandro da Silva

Fotos do Rio Alcântara

Figura 3: Fotos ao longo do curso do Rio Alcântara. Fonte: Arquivo pessoal

Considerações Finais

O presente trabalho aborda a importância do estudo da geomorfologia fluvial em áreas urbanas, discutindo a interferência do homem no meio físico e a mudança que o mesmo perpetra em seu lugar de viver. É preciso que se avance mais nessa pesquisa, por se tratar de um tema tão recente e de poucos estudos, para melhor entender a nova dinâmica que o sistema de uma Bacia Hidrográfica em área urbana possui. Na bacia do rio Alcântara, a densidade de ocupação urbana nas encostas e planície fluvial afeta o balanço entre infiltração e escoamento superficial, causando maiores picos de inundação em períodos chuvosos. Isso ocorre devido às intervenções antrópicas no canal principal da bacia, que provocam ora alargamento do leito ora o seu estreitamento, criando pontos de inundação. As imagens representam a localização da bacia, bem como seus rios, além de demonstrarem aspectos característicos da ação humana, como a remoção da vegetação das margens dos rios, ocupação de suas margens, lançamento de lixo doméstico, esgoto e dejetos industriais. Nota-se como é fundamental o estudo e a análise da degradação ambiental em bacias hidrográficas urbanas. Portanto, o presente trabalho representa uma análise das drenagens e da degradação da bacia, indicando assim a necessidade da realização de um mapeamento geomorfológico detalhada. Desse modo, destaca-se a importância da continuação da pesquisa para um melhor aprimoramento geomorfológico e para melhor compreensão da geomorfologia da bacia hidrográfica do Rio Alcântara.

Agradecimentos

Agradecemos a todos os professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro campus Faculdade de Formação de Professores, por contribuir na construção do presente trabalho, aos colegas do grupo de pesquisa e o professor Orientador Otávio pela paciência e por compartilha seu conhecimento.

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