Autores

Fachin, P.A. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE) ; Tatiane, W. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE) ; Pereira, A.A. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE) ; Thomaz, E.L. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE)

Resumo

No Brasil, a agricultura tradicional ainda é muito praticada pelos pequenos agricultores, muitos ainda utilizam a queimada para limpeza de terreno para plantio, chamada de agricultura de roça-de-toco. O fogo causa diversas mudanças no solo: física, química e biológica. Muitos estudos têm mostrado as alterações físico-químicas no solo, no entanto, há uma carência na literatura de estudos que avaliem o comportamento do solo para melhor entendimento do sistema de pousio. O presente estudo avaliou a capacidade de infiltração de água em solos submetidos à queimada que se encontram em diferentes estágios de pousio, em uma escala de 0 a 15 meses e de 0 a 12 anos, na comunidade faxinalense, Tijuco Preto, no município de Prudentópolis, Paraná. O solo apresentou repelência no primeiro mês e maior condutividade no terceiro mês para as duas escalas analisadas. O aumento da condutividade hidráulica pós- queimada não se manteve permanente, diferenciando de outros resultados reportados na literatura.

Palavras chaves

Fogo; Solo; Infiltração de água

Introdução

O fogo é considerado um importante agente hidrológico e geomorfológico que influencia toda a dinâmica ambiental de uma bacia de drenagem ou ecossistema (SHAKESBY et al., 2003; CERTINI, 2005; ÚBEDA & BERNIA, 2005; DOERR et al., 2007). No Brasil a agricultura de roça-de-toco (agricultura de sistema tradicional), que usa a queimada controlada para limpeza de terreno, ainda é muito praticada pelos pequenos agricultores (13,14% do total dos incêndios no Brasil), (SOARES & SANTOS, 2002). Este tipo de agricultura é bastante encontrado na região central do estado do Paraná, é neste tipo de agricultura que é produzida a maior parte do feijão no estado, em especial no município de Prudentópolis – PR (maior produtor de feijão do Brasil) (EMATER, 2012). A roça-de-toco é feita por meio de procedimentos que compreendem o pousio e utilização do fogo. Os procedimentos do sistema são: a) roçada da área a ser queimada; b) espera da secagem da matéria vegetal cortada; c) queima da matéria seca; d) plantio, colheita e pousio. Depois da colheita, a área utilizada permanece em pousio por um período de 5 a 8 anos para descanso, regeneração da vegetação e restauração do solo por meio de reposição de matéria orgânica. Estudos têm demonstrado que o fogo causa diversas mudanças no solo. Fox et al., (2007) em ensaios de laboratório verificaram que a condutividade hidráulica em solos submetidos ao fogo apresentou redução de 37% para frações de 0,4-2,0 mm e 23% para frações de 2,0-5,0 mm quando comparada às mesmas frações não submetida ao fogo. Já em campo, Martin & Moody (2001), observaram que em solo vulcânico não submetido ao fogo a taxa de infiltração foi de 170 mm/h, enquanto que o mesmo solo submetido ao fogo apresentou taxa de infiltração de 26 mm/h. Gong et al., (2013), em estudo de restabelecimento de um solo subtropical vermelho degradado, observou que os solos têm capacidade de auto restaurar seus elementos alterados após a perturbação se submetidos a sistemas conservacionistas. De acordo com o tipo de sistemas de cultivo, muitas das características do solo demonstram variar ao longo do tempo durante o período de pousio, essas alterações podem ser codificadas em modelos que podem depois ser utilizada para quantificar o comportamento do solo sob diferentes cenários (YEMEFACK et al., 2006). Muitos estudos têm buscado avaliar os efeitos das queimadas nas mudanças físicas, químicas, biológicas de solos, bem como erosão e perda e água (DOERR et al., 1996; DE BANO, 2000; MARTIN & MOODY, 2001; DRAGOVICH & MORRIS, 2002; CERTINI, 2005; ÚBEDA & BERNIA, 2005; INBAR, 2014), no entanto, poucos estudos buscam avaliar o comportamento destes parâmetros alterados pelo fogo no decorrer do tempo de pousio. A partir disto, vê-se a necessidade de estudos que avaliem o comportamento das propriedades do solo a curto e longo prazo de tempo após a queimada. O presente estudo objetivou avaliar o comportamento da infiltração de água no solo em um curto e longo ciclo de pousio. Para isto foram utilizadas áreas agrícolas de roça-de-toco, na qual o fogo é utilizado para limpeza de terreno e o pousio para restabelecimento do solo.

Material e métodos

O estudo foi realizado no Sítio Nadir localizado na comunidade de Tijuco Preto. A comunidade é um faxinal a sudoeste do município de Prudentópolis – Pr, entre as coordenadas 25º 23’ 37” S; 51º 06’ 27” W e 25º 23’ 52” S; 51º 06’ 19” W na mesorregião sudeste do estado do Paraná, próximo (≤ 10 km) da borda da cuesta da Escarpa da Esperança na Bacia Sedimentar do Paraná (2º planalto paranaense). Segundo Santos et al., (2006), a área está inserida na subunidade morfoescultural do Planalto de Prudentópolis, onde a dissecação é considerada baixa, as vertentes possuem topos aplainados, as vertentes são convexas e os vales em V abertos, a altitude varia entre 580 m (mínima) e 1040 m (máxima) com gradiente de 460 m. No local de estudo o solo predominante é o Cambissolo Húmico. Todas as áreas analisadas encontram-se na mesma vertente, próximas uma a outra. A encosta possui forma convexa com declive variando, a maior parte, entre 12% e 20 %. No Sítio Nadir, os sistema de roça-de-toco é praticado a aproximadamente 70 anos, pela mesma família para o cultivo de feijão e milho. Deste modo, na propriedade existem áreas com diferentes anos de regeneração pós-queimada. Destaca-se que em todas as áreas escolhidas para o desenvolvimento do estudo, durante os últimos plantios e os períodos de pousio não foram empregadas máquinas agrícolas, corretivos (fertilizantes) nem revolvimento do solo. No Sítio Nadir, as queimadas sempre obedeceram a padrões parecidos (idade e tamanho da vegetação cortada para queimada, caracterísitcas climáticas, queimada no final da tarde sem propagação intensa de vento, baixa umidade da superfície), pois essas são as características principais a serem adotadas em uma queimada controlada para evitar que o fogo se espalhe para outras áreas da propriedade ou até mesmo propriedades vizinhas. Para avaliação da condutividade hidráulica durante os períodos de pousio pós-queimada, as análises foram dividas em duas escalas temporais: 1ª) curta escala, 2ª) larga escala. A primeira foi feito o monitoramento de uma área tendo o primeiro ensaio de infiltração 30 dias após a queimada e por seguinte de 90 em 90 dias até completar 15 meses. A segunda escala foram feito ensaios nas seguintes áreas: floresta nativa, R.Q (recém queimada 90 dias pós-queimada), 2 anos de pousio, 5 anos de pousio, 7 anos de pousio e 12 anos de pousio. As áreas localizam-se todas na mesma encosta, com o mesmo tipo de solo e a mesma declividade. Neste estudo foi utilizado o infiltrômetro mini disk (da marca Decagon Devices, Modelo S) por ser um equipamento de fácil manuseio e eficiente para medidas de condutividade hidráulica em pequenas profundidades. O infiltrômetro mini disk possui um tubo graduado superior que funciona como reservatório de alimentação para o fornecimento de água e outro reservatório tubular, possibilitando uma pressão constante menor ou igual à pressão atmosférica de fornecimento de água. É possível fazer ensaios com no máximo 90 ml de água e durante as medições é necessários que se façam as anotações do nível de descida de água do tubo a cada 30 segundos, como recomendado no manual. Em cada área foram feitos um total de 4 ensaios para avaliação da condutividade hidráulica no solo com as mesmas condições de umidade, em torno de 28%. A condutividade hidráulica (K) foi calculada segundo o método proposto por Zhang em 1997, no qual é relacionada à infiltração cumulativa (I) por tempo passado (t) segundo a função seguinte, onde C1 é o declive da curva da infiltração cumulativa em função da raiz quadrada do tempo e C2 é a absortividade do solo: I=C¹t+C²√t. A condutividade hidráulica pode ser calculada dividindo C1 por A (valor que relaciona os parâmetros de van Genuchten para um dado tipo de solo), a taxa de sucção do infiltrômetro e o diâmetro do disco do infiltrômetro: K=C¹/A Para as análises estatísticas foi utilizado o software Bioestat.

Resultado e discussão

O resultados das análises físicas e químicas para caracterização do solo, estão representados na tabela 1. Quanto a profundidade em análise (0-5 cm) foi delimitado de acordo com trabalhos realizados por uma considerável demanda de autores que constataram índices de maior influência da temperatura nos 5 primeiros centímetros do solo, mais precisamente nos 3 primeiros centímetros, com um uma variação máxima de 150 º C nas profundidades 5-10 cm e sem influência da temperatura abaixo de 10 cm.( CERTINI, 2005; DE BANO, 2000; DOERR et al., 1996; FARWIG et al., 2004; FOX et al., 2007; HUFFMAN ET AL., 2001; KETTERINGS et al., 2002). Muitos parâmetros do solo apresentam variações nos períodos de pousio, que correspondem a regeneração da vegetação, pois o desenvolvimento radicular influencia tanto a parte estrutural quanto composicional do solo. Sendo a condutividade hidráulica dependente de outros parâmetros, como; densidade, porosidade, hidrofobicidade, capacidade de retenção de água e outros que são alterados com o desenvolvimento radicular, esta também apresentará variações no decorrer do pousio. Os ensaios durante o monitoramento da curta escala temporal apresentaram variações significativas e um limite bem definido, pois o 3º mês pós- queimada apresentou a maior capacidade de condutividade hidráulica (14,04 cm/h), 38,5% maior que o 1º mês e 50,6% maior que o 6º mês. Já do 6º ao 15º mês todos apresentaram condutividades inferiores a 8,37 cm/h. Esse comportamento demonstra que o período que corresponde entre o 1º e o 3º mês de pousio ocorrem mudanças que potencializam a condutividade hidráulica (figura 1). Pradas et al., (1994), em monitoramento de condutividade hidráulica para 2 invernos em solo de floresta queimada na Espanha, observou redução de 41,1% entre a queimada e a primeira chuva, aumento de 37,5% entre a primeira e a segunda chuva, e redução de 45,8% para os eventos seguintes. Estas mudanças podem estar ligadas a fatores como: retirada das cinzas da superfície pelas primeiras chuvas que irá facilitar a entrada de água no solo, redução ou ausência de hidrofobicidade, retirada dos fragmentos sólidos que restaram da queimada nos poros de superfície pelas primeiras chuvas, e outros parâmetros físico-químicos como porosidade, capacidade de retenção de água, estabilidade de agregados, desidratação das argilas que podem variar nos meses iniciais após a queimada. Fica claro que para este tipo de solo e manejo a condutividade hidráulica não sofre alterações significativas permanentes, e que este mecanismo sofre alteração apenas nos primeiros meses de pousio. Com relação a larga escala temporal, assim como na curta escala, o 3º mês (área recém-queimada/R.Q) apresentou a maior capacidade de condutividade hidráulica (14 cm/h), 86,3% superior que a floresta nativa (área com menor índice 1,92 cm/h). Nas demais áreas, todas apresentaram-se superiores a floresta e inferiores a R.Q. Isto confirma o aumento da condutividade hidráulica no 3º mês de pousio, pois nos ensaios das duas escalas temporais os dados se apresentaram em torno de 14 cm/h e confirma a redução nos anos seguintes. No entanto nenhum dos anos a condutividade volta equivaler a da floresta nativa que se mostrou como a menor (figura 2). A menor diferença entre áreas ocorreu na área 5 anos e na floresta, esta primeira sendo a segunda menor capacidade de infiltração. Após a queimada observa-se o aumento na capacidade de infiltração de água no solo e por seguinte um decréscimo até 5 anos, voltando ter aumento entre 5 e 12 anos de pousio. No entanto, depois da queimada todas as áreas passaram a reduzir a capacidade de infiltração. Fox et al., (2007); Martin & Moody (2001) em estudo em laboratório e em campo observaram reduções de 30% a 84% respectivamente na capacidade de infiltração após a queimada, enquanto no presente estudo a taxa teve aumento de 84,6%. Inbar et al., (2014), em estudo de condutividade hidráulica com chuva simulada de 80 mm com duração de 100 minutos em área com superfície não queimada, superfície aquecida e superfície queimada, constataram redução na área aquecida e queimada em relação a área não queimada, e aumento da condutividade no primeiro evento e redução nos eventos posteriores. Nosso estudo constatou inicialmente o aumento da condutividade hidráulica, comportamento contrário do reportado em outros estudos onde o efeito do fogo reduziu a capacidade da condutividade hidráulica. Esta diferença pode estar ligada ao tipo de queimada e sua severidade, a textura dos solos, o tipo de vegetação queimada e outros fatores que irão apresentar comportamentos distintos para cada área e tipo de solo. Com relação a grande variação de comportamento entre as áreas da larga escala temporal, o mecanismo que as afeta está provavelmente relacionado às transformações mineralogia do solo, já que essas transformações são dependentes do grau da temperatura que a queimada apresentou, e cada área em pousio foi queimada em anos distintos e não foram feitos acompanhamentos de severidade dos fogos durante as queimadas.

Tabela 1

Características do solo

Figura 1

Condutividade hidráulica do solo em curtos intervalos de pousio.

Figura 2

Condutividade hidráulica do solo em longos intervalos de pousio.

Considerações Finais

1) Neste estudo o solo inicialmente mostrou repelência à água no primeiro mês. 2) Nossos resultados indicaram um padrão diferente do verificado na literatura, pois logo no terceiro mês há uma perda significativa da repelência. 3) Nas duas escalas temporais o terceiro mês pós-queimada apresentou os maiores índices de condutividade hidráulica 4) O estudo abre lacuna para novos trabalhos de correlação com outros parâmetros físico-químicos do solo.

Agradecimentos

Agradecemos a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES) pela concessão de bolsa de estudos ao primeiro auto.

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