Autores

Martins, I. (USP) ; Villela, F.N.J. (USP)

Resumo

Objetiva-se calcular as perdas de solo na bacia hidrográfica do Ribeirão São José, localizada no Oeste Paulista, por meio da Equação Universal de Perdas de Solo (EUPS). A região na qual se insere a bacia hidrográfica é marcada por intensos processos erosivos e degradação da biodiversidade, em contraste com a existência de importantes fragmentos de Cerrado indicados à conservação pelo programa BIOTA/FAPESP. Para verificar como a erosão pode interferir e como as perdas de solo refletem estes processos, faz-se uso do estudo do meio físico, fundamental para entender o desenvolvimento da erosão. Esta pesquisa aborda a conjugação de fatores geológicos, geomorfológicos, climatológicos, pedológicos e de uso da terra no cálculo dos volumes de perda de solo, sendo estas menores nas áreas de vegetação nativa e culturas de plantio em contorno ao relevo, predominantes na área de estudo.

Palavras chaves

Erosão; Equação Universal de Perda de Solo; Bacia hidrográfica

Introdução

A bacia hidrográfica do Ribeirão São José abriga fragmentos consideráveis de Cerrado, que foram considerados prioritários à conservação da biodiversidade no estado de São Paulo pelo programa de pesquisa do BIOTA/FAPESP de acordo com Fiori & Fioravanti (2001). Entretanto, a região está situada no Oeste Paulista, marcada pelo alto grau de degradação da biodiversidade pelo avanço de atividades antrópicas como agricultura, pecuária e urbanização. Consequentemente, a mesma torna-se mais vulnerável aos processos erosivos combinados às formas do relevo, declividades, solos, ação das chuvas, cobertura vegetal, etc. De acordo com Kertzman et al. (1995) o desmatamento, cultivo das terras e urbanização de modo inadequado são fatores decisivos para originar e acelerar os processos erosivos. No estado de São Paulo este processo acelerado atinge cerca de 80% das áreas cultivadas, que possuem perdas de solo acima dos limites de tolerância. A análise dos processos erosivos na bacia hidrográfica indica o grau de degradação deste ambiente, associados ao uso da terra e suas potencialidades, causando perdas de solo e impactos na preservação da biodiversidade nas áreas de cerrado remanescentes na área de estudo. A utilização da Equação Universal de Perda de Solo (EUPS), fundamentada nas pesquisas apontadas por Wischmeier & Smith (1978), visa estimar as perdas em diferentes situações encontradas na bacia, concernentes aos fatores que a compõem para calculá-la. Com o valor obtido é possível verificar se as perdas de solo estão dentro de limites tolerados para o estado de São Paulo, estabelecidos por Bertoni & Lombardi Neto Neto (1990).

Material e métodos

Na análise quantitativa da perda de solo da BHRSJ (bacia hidrográfica do Ribeirão São José) foi utilizada a Equação Universal de Perda de Solo, desenvolvida por Wischmeier & Smith (1978) como base original e Bertoni & Lombardi Neto Neto (1990) para aplicação da EUPS no estado de São Paulo, visando o planejamento conservacionista. A erosão pode ser entendida como o processo de desprendimento e transporte de partículas causadas pela água e pelo vento. A água é o agente mais importante da erosão, pois através de cursos d’água são levadas a maior parte das partículas de solo (BERTONI & LOMBARDI NETO NETO, 1990). Os processos erosivos podem ser estudados a partir de uma unidade espacial elementar como uma bacia hidrográfica, para estimar as perdas de solo erodidas pelos cursos d’água provenientes das águas pluviais. Nesta pesquisa a EUPS foi utilizada para quantificar a perda de solo anual na bacia hidrográfica de acordo com o uso da terra e prática conservacionista utilizada nas propriedades, sendo os dados representados através de mapas elaborados em SIG (software Arc Gis). A EUPS é composta pela seguinte fórmula: A = R K L S C P (Equação 1). A variável “A” é a perda de solo dentro de uma unidade de área (em ton./ha); “R” é o fator de precipitação relacionado à capacidade de erodir (em MJ/ha.mm/ha); “K” é o fator de erodibilidade do solo (em MJ/ha.mm/ha); “L” é o fator comprimento de rampa; “S” é o grau de declividade; C é o fator de uso e manejo e “P “ é o fator quanto à prática conservacionista adotada. As formas do relevo são o principal palco para o desenvolvimento dos processos erosivos, e a bacia hidrográfica trata da unidade elementar na análise desses processos. Faz-se necessária a obtenção de dados que condicionam a Equação Universal de Perda de Solo, sendo preciso caracterizar a bacia hidrográfica antes de combinar os parâmetros da equação, a fim de obter-se os resultados por meio dos fatores calculados. A bacia hidrográfica do Ribeirão São José abrange os municípios paulistas de Campos Novos Paulista, Echaporã, Marília e Ocauçu (Figura 1). De acordo com Talamoni et al. (2003), a área da bacia está dentro da Unidade de Gerenciamento dos Recursos Hídricos - UGRHI 17 - Médio Paranapanema. A bacia hidrográfica possui cerca de 156,58 km² e perímetro de 65,5 km. Grande parte da bacia é dominada por Latossolos (Figura 1). Figura 1. Localização municipal da bacia hidrográfica do Ribeira São José e características quanto à hipsometria, pedologia e uso da terra. A análise do contexto do meio físico em que a BHRSJ está inserida foi estudada pelas características hidrográficas, geológicas, geomorfológicas, pedológicas, climáticas e de uso da terra. Para os dados de hidrografia foram consultadas as cartas do IBGE (1975) para a identificação dos cursos d’água e topografia. Para contextualização da geologia foi utilizado o mapa geológico de Perrota et al. (2005), com identificação da litologia e unidades estratigráficas que compõem a bacia. Para contextualização geomorfológica foram utilizados dados de Ponçano et al. (1981) e Ross & Moroz (1997) para a identificação, respectivamente, das formas de relevo e unidades morfoestruturais e morfoesculturais. Os dados de unidades de solo foram obtidos a partir do mapa pedológico do estado de São Paulo segundo Oliveira et al. (1999), para identificação dos solos e suas características. Para a análise climática da área foram utilizados os dados de precipitação na região da bacia obtidas em posto pluviométrico do DAEE (2016) localizado em Ocauçu-SP, em razão da sua localização próxima à bacia e dados da série histórica de 1972 a 2014. Para o uso da terra o mapeamento feito no software Arc Gis utilizou as imagens de satélite do Google Earth Pro para o ano de 2014, seguindo a metodologia do IBGE em Sokolonski (1999).

Resultado e discussão

O fator R da equação, que necessita de dados referentes à precipitação, foi obtido a partir de dados do DAEE (2016) no posto pluviométrico D6-094, localizado no município de Ocauçu-SP. Foram calculadas as médias históricas para cada mês do ano e relacionou-se com a erosividade da chuva em cada mês através da equação EI = 67,355 (r²/P)0,85 (Equação 2), onde EI corresponde à média mensal do índice de erosão (em MJ.mm/ha.L), r é a precipitação média mensal (em mm) e P é a precipitação média anual (em mm). Para este fim, também foram utilizados parâmetros fornecidos por Bertoni & Lombardi Neto (1990) (Figura 2). Com pluviosidade média anual de 1364,13 mm, os meses de verão (dezembro a março) registram maior precipitação e são responsáveis por 67% do índice de erosividade na bacia, e consequentemente aumentam as perdas de solo pelo maior volume de água no escoamento ao longo das vertentes. O valor de R para esta região é considerado abaixo das médias padronizadas, de acordo com os cálculos de Bertoni & Lombardi Neto (1990). O fator K está relacionado ao comportamento do solo em relação aos processos erosivos. Na BHRSJ há predominância de Latossolo Vermelho (LV78) e Argissolos Vermelho-Amarelos (PVA 2 e PVA 10). O índice de erodibilidade destes solos é baseado na aproximação das características encontradas na BHRSJ e no horizonte superficial destes solos, e, portanto, para as áreas de Argissolo Vermelho – Amarelo o valor de referência obtido foi de 0,049, baseado no índice dos solos identificados como Podzolizados de Lins e Marília, variação Marília (Bertoni & Lombardi Neto, 1990). Para as áreas de Latossolo Vermelho o valor de referência foi caracterizado como 0,017, baseado no índice do Latossolo Vermelho e Latossolo Vermelho Escuro, fase arenosa. Cada tipo de solo possui uma particularidade em relação à sua resistência aos agentes que condicionam os processos erosivos na bacia e que estão contidos na equação, como por exemplo, a concentração das chuvas, a cultura utilizada e o fator topográfico, expresso pelos fatores L (comprimento de rampa) e S (declividade). Para os fatores L e S são necessários cálculos a partir do comprimento de rampa e grau de declive nas vertentes na bacia hidrográfica considerada, utilizando-se também o mapa hipsométrico (Figura 1) em parcelas da área de estudo, ainda a ser ainda realizado nesta pesquisa. De acordo com os dados obtidos, as variações altimétricas entre divisores de água e os cursos d’água não são maiores que 80 metros, em uma distância de comprimento de rampa de até 3 quilômetros entre os topos e os fundos de vale no médio e baixo curso do Ribeirão São José, quando este atinge as cotas de 480 a 420 metros de altitude, respectivamente. Esta análise permite estimar que o fator topográfico da equação não será alto, pois maiores variações altimétricas e menores medidas de comprimento de rampa configuram maiores declividades e maior potencial erosivo. Nos fatores da equação que consideram o tipo de cultura (fator C) e a prática conservacionista (fator P), foi realizado mapa de uso da terra (Figura 1) para o ano de 2014 a fim de identificar as culturas e os períodos em que o solo fica coberto ou descoberto durante o período de um ano. O fator P foi verificado para cada tipo de prática conservacionista: plantio morro abaixo, plantio em contorno, alternância de campinas e plantio e contorno e cordões de vegetação permanente, com valor atribuído a cada uma das glebas de uso da terra. Na BHRSJ é predominante o plantio em contorno, o que pode promover o desenvolvimento de sulcos que aceleram ainda mais os processos erosivos. A obtenção de valores de C e P pode ser feita em conjunto, em razão da relação entre manejo e prática conservacionista (CUNHA, 1997). Combinando-se os fatores C e P na BHRSJ é possível encontrar os usos da terra e os respectivos valores resultantes finais e parciais conforme as Figuras 3 e 4. Nestas, vê-se que o plantio em contorno tem a metade do valor do tipo de plantio morro abaixo no sentido de orientação da vertente. É importante lembrar que na bacia considerada há fragmentos florestais que são considerados prioritários à conservação e que registram menor índice potencial erosivo (valor 0,2). Os valores mais utilizados na equação para estes fatores serão os de pastagem, cultura anual e mata. Aos combinarem-se os dados obtidos e aqueles que ainda estão sendo calculados serão gerados diferentes valores de “A” por unidades homogêneas, com os resultados finais da equação em toneladas/hectares. Com estes valores será possível verificar as diferenças de perdas de solo dentro da BHRSJ e as intensidades dos processos erosivos para o ano de 2014 em relação ao limite tolerado para os solos do estado de São Paulo. Como resultado final, será elaborado um mapa com uma tabela comparativa.

Figura 1

Mapas de localização, hipsométrico, pedológico e uso da terra na BHRSJ

Figura 2

Tabela de médias mensais de precipitação e valor do fator R da equação.

Figura 3

Tabela de valores dos fatores C e P.

Figura 4

Tabela de resultados preliminares de fatores da equação.

Considerações Finais

A análise preliminar das perdas de solo na bacia hidrográfica do Ribeirão São José demonstra que a quantidade de toneladas/ano/hectare não são altas na maior parte da bacia, principalmente nas áreas de Latossolos Vermelho-Amarelos (fator K), aliadas às áreas de florestas ou de culturas permanentes (fator C) e à prática conservacionista de vegetação permanente e plantio em contorno ao relevo (fator P). Por meio de análise das imagens do Google Earth Pro é possível identificar a forma com que as culturas são desenvolvidas, variando entre plantio em contorno (respeitando as curvas de nível) e alternância de campinas com plantio em contorno. Nas áreas de floresta identificadas, como as de Cerrado, indicados à conservação pelo Programa BIOTA/FAPESP, o índice de perda de solo pelo fator P é cinco vezes menor (P= 0,2) do que nas áreas de plantio morro abaixo (P = 1,0). Quanto à erosividade medida pela intensidade das chuvas (fator R), a área possui um valor inferior à maioria das outras regiões paulistas. Estes padrões de utilização da terra e do solo para as culturas, somadas aos solos mais resistentes à erodibilidade e baixo valor de erosividade, além da conservação das áreas de floresta remanescentes, refletem os números baixos ou médios para a quantidade estimada de perda de solo na bacia hidrográfica do Ribeirão São José. Contudo, para finalizar a obtenção dos valores que compõem a equação são necessários os dados numéricos referentes aos fatores L e S, ainda em elaboração.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela oportunidade e bolsa de iniciação científica concedida (PIBIC).

Referências

BERTONI, J.; LOMBARDI NETO, F. Conservação do Solo. Ícone. São Paulo, 1990.
CUNHA, C. M. L. Quantificação e mapeamento das perdas do solo por erosão com base na malha fundiária. Dissertação (Mestrado em Geografia), IGCE, UNESP, Rio Claro, 1997.
DAEE - DEPARTAMENTO DE ÁGUAS E ENERGIA ELÉTRICA. Banco de Dados Hidrológicos. São Paulo: DAEE, 2016. Disponível em: http://www.hidrologia.daee.sp.gov.br/Default.aspx?dadosorigem=Pluviom%C3%A9tricos&ugrhi=UGRHI&cidadeugrhi=M%C3%89DIO%20PARANAPANEMA&prefixoposto=D6-094. Acesso em: 03 fev. 2016.
FIORI, A. M.; FIORAVANTI, C. Os caminhos para salvar o cerrado paulista. Revista Pesquisa FAPESP Nº63, 2001. p. 38-40. Disponível em: revistapesquisa.fapesp.br/wp-content/uploads/2001/04/38_biota.pdf?051c7c. Acesso em: 03 fev. 2016.
IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Folhas Topográficas de Campos Novos Paulista e Echaporã, 1975. Escala 1:50.000.
KERTZMAN, F. F. et al. Mapa de erosão do estado de São Paulo. Rev. Inst. Geol., São Paulo, v. 16, n. esp, dez. 1995. Disponível em <http://ppegeo.igc.usp.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-929X1995000200004&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 7 jan. 2016.
OLIVEIRA, J. B. et al. Mapa pedológico do Estado de São Paulo: legenda expandida. IAC/Embrapa, Campinas, 1999.
SOKOLONSKI, H. H. Manual técnico de uso da terra. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, 1999.
SOUZA, V. Estimativa de perdas de solo por erosão laminar na bacia do córrego Pinhalzinho Segundo com suporte de Geoprocessamento. Revista Brasileira de Geomorfologia, v. 13, n. 3, 2012.
TALAMONI, C. D. et al. Unidades hidrográficas de gerenciamento de recursos hídricos do estado de São Paulo- UGRHI. DAEE/IGC, 2003.
WISCHMEIER, W. H.; D. D. SMITH. Predicting rainfall erosion losses - a guide to conservation planning. U.S. Department of Agriculture, Handbook No. 537, Washington, 1978.