Autores
Monteiro, D.C.S. (UFPB) ; Souza, J.O.P. (UFPB)
Resumo
Esse trabalho apresenta a correlação de análises em perfis longitudinais e a aplicação do índice de gradiente na bacia hidrográfica do Riacho do Tigre, mais especificamente nos Riachos do Tigre, Cacimbinha e Santa Maria, identificando regiões anômalas em relação a tectônica e diferenças estruturais. Entende-se que a drenagem é um elemento extremamente sensível as alterações estruturais da paisagem se ajustando as deformações produzidas sejam elas por tectônica, diferença litológica ou alterações nos níveis de base. Os resultados encontrados a partir da aplicação do Índice de gradiente revelaram uma intima ligação das anomalias de 1ª ordem com as diferenças litoestratigráficas, enquanto que as anomalias de 2ª ordem estão ligadas aos condicionamentos das falhas e lineamentos nos canais. O Riacho Cacimbinha apresentou o maior índice em porcentagem dos perfis com 68% de trechos anômalos, enquanto que o Santa Maria e do Tigre apresentaram, respectivamente 64% e 18% de trechos anômalos.
Palavras chaves
Índice de Gradiente; Perfil Longitudinal; Bacia Hidrográfica do Riacho do Tigre
Introdução
As analises de perfis longitudinais e a aplicação do índice de gradiente tem ocupado cada vez mais destaque no âmbito da Geomorfologia fluvial, na área de morfometria, principalmente pelo fato da drenagem ser sensível as alterações estruturais da paisagem, sejam elas por tectônica, diferença litológica e alterações nos níveis de base. No Brasil, diversos trabalhos relacionando a aplicação do índice de Relação declividade extensão (RDE) à tectônica recente têm surgido. Como uma série de estudos sobre a bacia do Rio do Peixe, Rio Paraná, Aguapeí e Ivaí aplicando o Índice de Hack (1973), trabalhos como de Etchebehere (2004), Fulfaro (2005), Porto (2013) e Fujita (2011) tem apresentado a metodologia dos parâmetros morfométricos para o cálculo do RDE de forma bem didática e simples, promovendo uma terminologia própria do índice e relacionando com a neotectônica. Porém, há um grande debate sobre a aplicabilidade do índice e sua própria terminologia. Segundo Cremon (2014), os parâmetros têm sido utilizados frequentemente em geomorfologia tectônica, contudo há uma carência de estudos que correlacionem os índices ao longo do perfil longitudinal, bem como, as anomalias indicadas por eles nas morfoestruturas. Lima (2013) propõe uma terminologia de “Índice de Gradiente”, pois entende que o cálculo para os parâmetros morfométricos tem sido evidenciado sem levar em consideração a transformação da formula para a base logarítmica, recorrendo a simplismos, bem como aponta que o termo RDE (Relação declividade extensão) apresenta um equivoco conceitual, pois remete ao significado estrito do termo “relação” apontando ao comportamento combinado entre as variáveis de declividade e extensão. O Perfil longitudinal é uma ferramenta de extrema importância para a investigação do comportamento dos rios, pois ele dá uma visão cartesiana do rio, da sua nascente até a sua foz, servindo para um melhor entendimento das possíveis anomalias instaladas nos canais dos rios. A característica principal de um perfil longitudinal em equilíbrio é apresentar morfologia com decaimento de altimetria sob forma exponencial, com declividades maiores a montante e gradativamente menores à jusante (CHRISTOFOLETTI, 1980).A importância da aplicação do índice de gradiente sobre os perfis longitudinais se encontra nesse esforço de entender as variações condicionantes no perfil, que podem ser detectadas a partir de uma anomalia na valoração dos parâmetros morfométricos. É importante salientar, que esse trabalho proposto se utilizará da terminologia de Índice de Gradiente, pelo fato de se tratar de uma tradução mais coerente ao Índice de Hack, seguindo a proposta de Cremon (2014) e Lima (2013). A área de investigação corresponde a Bacia Hidrográfica do Riacho do Tigre, que se encontra inserida no município de São João do Tigre, pertencente a microrregião do cariri oriental e possui em sua área de 560,8 km². Onde será aplicado índice de gradiente em três rios da bacia e a partir da interação com os perfis longitudinais discutir as possíveis anomalias existentes, integrando com os dados de Litologia e Geologia da área em questão, apresentando assim um produto final de discussão da aplicação do índice de gradiente, relacionando as diversas variáveis que servem como indicativo de anomalias.
Material e métodos
Para a aplicação dos índices de gradiente, foram selecionados os três principais rios: Riacho do Tigre, Riacho Cacimbinha e o Riacho Santa Maria. A partir desses três rios, foram executados os cálculos do índice de Gradiente. A aplicação do índice de gradiente seguiu as recomendações de Lima (2013), no qual os cálculos derivaram do perfil semilogarítmico, sendo o calculo transformado para K= dH/lnL2 – lnL1, onde temos: K= Indíce de Gradiente, dH como a diferença entre a distancia inicial e final do canal, desde a sua nascente até a foz, LnL2 e lnL1 são, respectivamente, os logaritmos naturais da distancia da nascente ao ponto final e inicial do trecho considerado, sendo a diferença entre os dois sempre menor que ln2. A partir desses dados plotados em ambiente de software Excel, foram feitos os cálculos para os três rios a partir da divisão de trechos de índice de gradiente para cada 500 metros. Também foram feitos os cálculos para os valores dos trechos totais dos canais e logo em seguida divididos pelos índices dos trechos, assim resultando nos graus de anomalia. Segundo Troiani & Della Seta (2008), os graus de anomalia oscilam de acordo com a inteiração do substrato e sua estrutura, fazendo com que os índices variem, sendo importante para identificar o ajuste da drenagem em movimentos tectônicos. No presente artigo, foram escolhidos os limiares 2 e 10 para o índice de gradiente como limites para as anomalias de 2ª e 1ª ordem respectivamente. O Perfil longitudinal de um rio mostra a sua declividade, ou gradiente, sendo a representação visual da relação entre altimetria e o comprimento de determinado curso de água (CHRISTOFOLETTI, 1980). Os Perfis longitudinais dos riachos do Tigre, Cacimbinha e Santa Maria foram elaborados através de duas imagens de satélite Shuttle Radar Topography Mission (SRTM) disponíveis em Miranda (2016), com resolução espacial de 90 metros e tendo as coordenadas geográficas Datum WGS 1984 e escala de 1:250.000, tais imagens foram recortadas a partir da área da Bacia Hidrográfica do Riacho do Tigre, após essa etapa, foi extraída a drenagem e trabalhada em ambiente SIG (Sistemas de informações Geográficas) dividindo os trechos para a aplicação do Índice de Gradiente em intervalos de 500 m nos canais dos rios. No ArcMap 10.2.2, transformou-se o Datum para Sirgas 2000 UTM fuso 24S e foram produzidos os perfis através da ferramenta Stack profile, permitindo assim, a criação de uma tabela com os dados para serem exportados para o software Excel, sendo elaborados os perfis longitudinais dos Riachos do Tigre, Cacimbinha e Santa Maria, expostos nos resultados do presente artigo. Para a interpolação dos dados, entre Índices, Perfis, Geologia e Litoestratigrafia foram produzidos quatro mapas. Os produtos cartográficos tiveram por base a folha Pesqueira SC.24-X-B-II na escala de 1:100.000 elaborada pela Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM, 2015), disponibilizado no GeoBank da companhia. A carta na escala de 1:100.000 foi inserida na Drenagem automática gerada pelo ArcMap e recortada a partir da função clip de acordo com o preenchimento da drenagem. A partir dai, foram inseridos os layers de Geologia e Litoestratigrafia para a correlação de informações, entre os perfis longitudinais e os dados de informação geológica, por conta da interpolação dos shapes e das diferentes escalas, uma parte ínfima da foz do Riacho do Tigre permaneceu sem cobertura geológica, por se tratar de uma pequena parte da área de estudo, foram utilizadas inferências a partir das leituras para o preenchimento da área em questão.
Resultado e discussão
A partir da aplicação do índice do gradiente, percebe-se que para os três
rios analisados apenas quatro valores, ultrapassam os valores >10
caracterizando anomalias de 1ª ordem, contudo são canais extremamente
anômalos em relação a anomalias de 2ª ordem, apresentando forte influencia
tectônica nos índices, bem como as diferenças de litologias para as
anomalias de 1ª ordem. O Riacho do Tigre tem como extensão 39,2 Km,
apresenta altitude máxima de 785 m e mínima de 510, tendo como amplitude
média 298 metros. Quando comparado os valores do índice de gradiente, dos 79
trechos analisados em toda a sua extensão, 14 trechos apresentaram
anomalias, sendo 13 de anomalias de 2ª ordem e apenas uma anomalia de 1ª
ordem, dos Riachos analisados este canal é o que menos apresenta anomalias,
com apenas 18% do canal pertencentes com anomalias.
. O Riacho Cacimbinha tem 32 km de extensão, apresentando uma altitude
máxima de 742 metros e mínima de 553 metros, sua amplitude média é
aproximadamente de 189 metros. Esse canal foi dividido em 65 trechos dentre
eles 44 apresentaram 68% de trechos anômalos, sendo três anomalias de 1ª
ordem. A presença de muitas anomalias no perfil indica comportamento
tectônico no condicionamento da drenagem, que será discutido mais adiante.
O Riacho Santa Maria, tem em sua extensão total 21 km de canal com altitude
máxima de 901 metros e altitude mínima de 603 metros, sua amplitude média é
de 298 metros. Para a aplicação do índice de gradiente o canal foi dividido
em 44 trechos, dentre eles, 28 apresentaram índices de anomalia todas de 2ª
ordem, com porcentagem de 64%. A configuração anômala desse canal se
apresenta pelo mesmo estar estritamente configurado no lineamento
Apolinário. (Figura 1).
A figura 2 explicita a relação da Litoestratigrafia e as anomalias do índice
de gradiente evidenciando o perfil longitudinal do Riacho do Tigre. Nela, é
perceptível a importância da diferença de litologia para a formação da
anomalia de 1ª ordem, expressada a partir do contato entre as formações Vila
Moderna e Pão de Açúcar, essa diferença de litologia evidencia no perfil
longitudinal uma diferença altimétrica de 56 metros, o que pode indicar uma
mudança no patamar do relevo local a partir de uma ruptura litológica.
A formação litoestratigráfica Vila Moderna é constituída por rochas
intrusivas compostas por piroxênio-sienitos, quartzo sienitos, anfibólio
sienogranitos a álcali-feldspato granitos. A outra formação que ao se
encontrar causa a anomalia de 1ª ordem é a formação Riacho do Tigre, que é
uma formação Neoproterozóica constituída por anfibolitos, metabasaltos,
metandesitos, anfibólio-gnaisses, gnaisses graníticos finos e metavulcanicos
félsicos (CPRM, 2015).
Apesar da evidência no perfil do rio principal, percebe-se que as diferenças
litológicas também influenciam nas anomalias de 1ª ordem no riacho
Cacimbinha, principalmente no encontro das Formações litoestratigráficas de
Ortognaisses Sítio Severo e Pão de Açúcar. O complexo Pão de Açúcar são
Ortognaisses de composição diorítica, enquanto que os de Sítio Severo tem em
sua composição granodiorítos (CPRM, 2015). Essa diferença de litologia
apresenta uma diferença no perfil longitudinal, pois de todos os rios
estudados, o riacho cacimbinha é o que mais apresenta anomalias de 1ª ordem.
O riacho Santa Maria, não apresenta índices com valores anômalos de 1ª
ordem, esse rio apresenta em sua maior parte a Formação Pão de Açúcar. Em
analise para a escarpa oriental da Borborema, Monteiro (2015) indicou que
quando um rio não apresenta em sua composição grandes rupturas litológicas e
nem mudanças de formações, a presença de valores com anomalias de 1ª ordem
diminuem, é o caso do riacho Santa Maria, que não apresenta modificações na
sua estrutura litológica, apresentando o maior valor do índice de gradiente
em 9,38 e média nos valores de anomalia de 4,61. É importante salientar, que
apesar de não apresentar valores de anomalia de 1ª ordem, o riacho Santa
Maria é um rio que apresenta índices muito grandes de anomalia,
principalmente devido a estrutura que ele perpassa.
A partir da analise da imagem do Google Earth e o perfil longitudinal do
Riacho Cacimbinha, compreende-se que as anomalias de 1ª ordem são
configuradas a partir das diferenças litológicas, como também por mudanças
bruscas no relevo da área. No aumento da figura 3, percebe-se a presença de
soleiras rochosas na configuração do relevo do trecho, essa feição do relevo
fez com que os índices de gradiente tivessem aumentado no seu ponto de
perfil próximo a confluência com o Riacho do Tigre (Figura 3).
O mapa de feições geológicas dá área de estudo (Figura 4), apresenta uma
correlação das falhas e lineamentos com as anomalias do índice do gradiente,
contendo o Riacho Santa Maria como destaque para o perfil longitudinal. De
acordo com a imagem, a drenagem está intimamente ligada as falhas e
lineamentos estruturais que perpassam a bacia hidrográfica, se tornando
perceptível a influência tectônica na configuração da drenagem.
Os rios têm formatos retilíneos, como boa parte do trecho do riacho Santa
Maria, podendo apresentar inflexões, como por exemplo, trechos do riacho
Cacimbinha e riacho do Tigre. A presença das falhas transcorrentes dextrais
e do Lineamento Apolinário com direção NW-SW condicionando trechos dos
Riachos Cacimbinha e Santa Maria, corroboram o grande número de anomalias de
2ª ordem nesses trechos.
As anomalias de 1ª ordem estão intimamente ligadas às diferenças de
litoestratigrafia e diferenças em resistência das rochas no relevo, essas
anomalias são encontradas nos canais dos Riachos do Tigre e Cacimbinha. No
Riacho do Tigre a diferença litológica evidencia no perfil longitudinal um
desnível de 56 metros, no Riacho Cacimbinha as anomalias estão ligadas a
diferença das Formações Litoestratigráficas, além da presença de soleiras
rochosas. As anomalias de 2ª ordem estão ligadas a presença de falhas
condicionando a estrutura da drenagem, caso do Riacho Santa Maria que além
de percorrer uma zona com apenas uma Formação litoestratigráfica, também é
condicionado por um lineamento no seu percurso atribuindo a esse riacho uma
forma retilínea.
Localização da Área de Estudo e Anomalias do Índice do Gradiente
Litoestratigrafia e Anomalias do Riacho do Tigre
Perfil Longitudinal e Anomalias do Rio Cacimbinha
Estruturas Geológicas e Anomalias do Riacho Santa Maria
Considerações Finais
As técnicas de analises morfométricas dos índices de gradiente para a caracterização da drenagem se configuram de forma simples, práticas e eficientes para as analises de cunho regional, permitindo entender como o índice se relaciona com os setores anômalos, bem como, com a compartimentação geológica e litoestratigráfica da bacia hidrográfica pertencente à área de estudo. Os resultados da pesquisa foram obtidos a partir da analise do índice de gradiente em relação ao perfil longitudinal correlacionando com os produtos cartográficos, dentre eles: os mapas de Litoestratigrafia e de Estruturas geológicas da área. Diante desses resultados apresentados, as analises dos índices de Gradiente e perfis longitudinais apresentaram nos três Riachos zonas anômalas, apresentando quatro valores para anomalias de 1ª ordem. Os Riachos Cacimbinha e Santa Maria apresentaram uma grande quantidade de trechos com anomalias de 2ª ordem, a partir das configurações estruturais que os condicionam. Por fim, entende-se que o primeiro passo para a aplicação do índice de gradiente na Bacia Hidrográfica do Riacho do Tigre foi dado. A partir da analise das imagens de satélite (Google earth e SRTM) e interpolação de dados Litoestratigráficos e Geológicos dentro da Carta Pesqueira 1:100.000. Contudo, no prosseguimento do trabalho se faz necessária a ida a campo, pois assim poderemos corroborar ou confrontar as informações produzidas em laboratório com o que se apresenta no real.
Agradecimentos
Referências
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