Autores
Belarmino, Y.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ) ; Bastos, F.H. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ) ; Tavares, A.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ)
Resumo
A evolução geomorfológica do maciço de São Pedro, localizado na região do Cariri (Sul do Ceará), apresenta ligação com eventos tectônicos do final do Arqueano e começo do Proterozóico, dos movimentos de tensão intraplaca do Cretáceo Superior e das variações climáticas. O estudo busca fazer um resgaste das concepções de autores sobre a evolução da megageomorfologia da província Borborema e as consequências no relevo do objeto de estudo. Assim, necessitaram-se realizar: levantamentos bibliográficos; levantamentos cartográficos; trabalho de campo; tratamento dos dados, e, por fim, a composição do relatório final para entender o processo de modelagem durante os períodos geológicos. O maciço de São Pedro apresenta no seu platô litologias semelhantes ao encontrado na superfície de aplainamento, mas a manutenção da topografia é ligada ao grau de resistência apresentada pelos gnaisses. Além disso, sua disposição reflete claramente as deformações estruturais associadas ao lineamento de Patos.
Palavras chaves
evolução geomorfológica; serra de São Pedro; lineamento de Patos
Introdução
A grande maioria dos maciços cristalinos do Nordeste brasileiro é associada a granitos de resistência superior às rochas encontradas nas depressões sertanejas, que pelo processo de erosão diferencial foram erodidas com maior facilidade. Tomando a serra de São Pedro, localizada na região do Cariri (Sul do Ceará), como exemplo deste estudo, as litologias apresentadas em seu arcabouço assemelham-se às que aparecem na superfície de aplanamento, logo abaixo, desta forma, esse maciço não apresenta um controle litológico muito claro, pelo menos, no mapeamento geológico oficial da CPRM (2003). As propriedades geomorfológicas dessas litologias e a sua dimensão estrutural podem servir de base para entender o desenvolvimento do relevo encontrado e a sua constituição atual. Os fatores litológicos regionais, as deformações estruturais e as influencias exógenas condicionam o contexto geomorfológico da área de estudo. Os relevos da província Borborema detêm uma gama de aspectos estruturais importantes para a avaliação dos fatores que determinaram a sua evolução. A diversidade geológica encontrada nesta região justifica diferentes influências de eventos morfodinâmicos e de meteorizarão de rochas que contribuíram para a esculturação da topografia atual. Vários estudiosos propuseram modelos conceituais de evolução geomorfológica para o Nordeste brasileiro, pautados em uma análise de ciclos de erosivos, não explicando detalhadamente todas as suas particularidades estruturais.
Material e métodos
Na elaboração deste trabalho fez−se pertinente à delimitação de etapas, dentre as quais estão presentes a organização das atividades segundo os critérios de obtenção dos dados à serem relacionados, conforme observa-se a seguir: levantamentos bibliográficos; levantamentos cartográficos; trabalho de campo; tratamento das informações e, por fim, a composição do relatório final. Para o embasamento teórico da pesquisa foram selecionados textos que se enquadraram na temática abordada, envolvendo diferentes fontes como livros, artigos, periódicos, teses e dissertações em meio analógico e digital. As referências foram lidas, organizadas e classificadas segundo o envolvimento com o objeto de estudo e de sua importância central. A Geomorfologia do Nordeste do Brasil, deve ser analisada a partir de eventos tectônicos remotos e das mudanças climáticas atuais e sub-atuais que culminaram na morfologia atual. Várias foram os estudiosos clássicos que elaboraram modelos conceituais de evolução geomorfologia para esta região. Com base no modelo teórico proposto por King (1956) formulou−se a ideia de recuo paralelo das vertentes associado a diversos ciclos erosivos, impulsionados por soerguimentos, tendo formado um escalonamento da topografia, de acordo com a idade dos relevos. A literatura clássica a respeito da evolução do relevo da região, a partir de mecanismos paleoclimáticos, variações eustáticas e movimentos crustais rápidos já não pode ser amplamente aplicada de forma a generalizar os diferentes ambientes nordestinos. Essas concepções influenciaram várias pesquisas a respeito do modelado do Nordeste, implicando a interpretações de paleosuperfícies escalonadas partindo do nível de base. Exemplos destes trabalhos foram os propostos por Ab’Saber (1969) que identificou a existência de 5 superfícies de aplainamento no Nordeste Oriental, resultado de processos de soerguimento induzido pelo tectonismo e pelas oscilações climáticas entre climas secos e úmidos. Merece destaque também os trabalhos de Mabessone e Castro (1975) e Bigarella (2003), que correlacionam tais superfícies com os depósitos correlativos. O Projeto RADAMBRASIL propôs a síntese dos dados sobre a evolução do relevo do Nordeste do Brasil. A importância dos estudos em geomorfologia climática, tratada aqui como geomorfologia do Quaternário, não pode ser esquecida, devido as suas contribuições para o conhecimento científico. Contudo, o papel das estruturas no controle da morfologia e os movimentos de arqueamento crustal, têm influenciado trabalhos nesta linha de pensamento e estão começando a nortear várias pesquisas recentes. Peulvast e Claudino Sales (2004), combinando a análise de anomalias de drenagem e interpretação do controle estrutural do relevo, estabelecem uma ligação aos eventos que deram origem a província Borborema e as formas subsequentes aos movimentos rúpteis e dúcteis. Para o caso do presente trabalho, o conhecimento sobre a evolução do campo de tensões se faz de extrema importância para a investigação da configuração atual do relevo, contribuindo aos estudos dos compartimentos do Arqueano e Proterozóico. Vale a pena ressaltar que os maciços interiores do Ceará são ainda pouco estudados pela geomorfologia estrutural e escassos são os trabalhos de referência nessa área. Na cartografia utilizada foram considerados o mapa geológico de 1:500.000 da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais – CPRM (2003); as bases geológicas em formato shapefile disponibilizadas pelo mesmo órgão, as bases cartográficas cedidas pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e o modelo digital de elevação do terreno extraído da imagem SRTM, de 30 m, feito pela NASA. Estas ferramentas cartográficas proporcionaram a visualização do relevo o e seu entorno. Com o intuito de observar a realidade da dinâmica do maciço e as relações geológicas no modelado foi também realizado trabalho de campo, com auxílio de GPS, e, tratamento das informações finais para a formulação do artigo.
Resultado e discussão
A serra de São Pedro localiza‐se na região do Cariri cearense mais
precisamente na porção meridional do Ceará (Figura 01). Estende‐se pelos
municípios de Caririaçu, Crato, Granjeiro e Várzea Alegre. Suas altitudes
médias giram em torno de 600 - 700m e sua disposição possui um forte
controle estrutural em função das deformações associadas ao Lineamento de
Patos. No interior do estado, em grande maioria, observa‐se a ocorrência de
uma superfície de aplainamento, regionalmente conhecidas como depressões
sertanejas, e em sobressalto topográfico os maciços cristalinos (SOUZA,
1988), categoria esta que se enquadra a serra em questão.
A área de estudo compreende um arcabouço litológico datado do Arqueano,
Paleoproterozóico e Neoproterozóico, ou seja, rochas de idade Pré−cambriana.
Ocorrem na trama geológica, granitoides, quartzitos, anfibolitos,
ortognaissesque foram agrupadas no Subdomínio Granjeiro (CPRM, 2003);
fililos, micaxistos, rochas metassedimentares, metavulcânicas e paragnaisses
agrupados na Formação Santana dos Garrotes do Grupo Cachoeirinha (NPcsg)
(CPRM, 2003). O substrato rochoso pelo qual a Serra de São Pedro, no
município de Caririaçu, sustenta−se é formado por ortognaisses e
paraderivados, fortemente dobrados e com resistência considerável em termos
regionais (Ap_gamma) (Figura 02). Esta resistência se processa pela
habilidade que os minerais desta rocha possuem de permanecerem coesos, mesmo
que dobrados, "o metamorfismo faz crescer a coerência das rochas e aumentar
a sua resistência. A erosão diferencial não diz respeito apenas aos
constituintes mineralógicos da rocha, mas também ao grau de metamorfismo."
(PENTEADO, 1983, p. 60). Este é um parâmetro importante para a determinação
das propriedades geomorfológicas das rochas (GUERRA & GUERRA, 2011).
A estrutura dos gnaisses é foliada, ou seja, os minerais tomam um sentido
perpendicular aos planos de tensão. O filamento aparece como xistosidade,
vestígio da antiga estratificação ou injeção de minerais estranhos nas
camadas dos sedimentos. Porém a xistosidade é menos marcada nos gnaisses,
originando relevos semelhantes ao dos granitos (PENTEADO, 1983). Devido à
erosão diferencial e por características próprias das rochas de resistência
aos processos de intemperismo comparado às litologias encaixantes, mesmo que
em pequena parcela, formam relevos elevados sobre a depressão sertaneja, é o
caso da Serra de São Pedro. Outro fator importante e que desenha a
morfologia do maciço é condicionado pelo escoamento superficial difuso.
Segundo Penteado (1983, p. 62) “o escoamento difuso é mais forte [nos
gnaisses] que nos granitos.”.
A formação das litologias remonta ao final do Arqueano e começo do
Proterozóico, eras geológica antigas que passaram por grande ocorrência de
magmatismo e instabilidade da crosta. Esta grade atividade tectônica acabou
repercutindo por toda Província Borborema, em meio a um retalho de terrenos
de diferentes litologias (MABESSONE, 2002). Ao longo das eras geológicas
posteriores ocorreram processos de colisão e fissão de massas continentais,
dentre as quais tiveram expressividade para a análise o registro do
supercontinente Panotia, formado pela aglutinação das massas continentais
Laurásia e Gondwana, entre 880 e 550 Ma no Neoproterozóico. Também
denominada de Orogênese Brasiliana, nomenclatura usada para o evento que
amalgamou vários blocos antigos por meio de uma colisão do tipo himalaiana
originando uma grande cadeia montanhosa, responsáveis pelos sistemas de
dobras e falhas (CLAUDINO−SALES & PEULVAST, 2007). A evolução geológica da
Província Borborema indica o desaparecimento da cadeia de montanhas por
agentes tectônicos de baixa intensidade e oscilações paleoclimáticas,
indicando “período de calma tectônica” (ALMEIDA, 1967 apud CLAUDINO−SALES;
PELVAST, 2007, p. 03).
Após a Orogênese Brasiliana as superfícies afloram através de subsidência
termal correspondente a flexura marginal, moldada pela abertura do oceano
atlântico e consequentemente a fissão do megacontinente Gondwana entre
América do Sul e África durante o Triássico Superior (CLAUDINO−SALES &
PEULVAST, 2007). A intercessão reorganizou o complexo regime de falhas,
reativando−as e proporcionando o surgimento de rifts intracontinentais
(Cariri−Potiguar), uma série de intrusões, e, metamorfismo ao longo das
principais zonas de cisalhamento. Este último episódio comanda a
geomorfologia da Serra de São Pedro e das rochas encontradas fortemente
dobradas entre as Zonas de cisalhamento de Patos, Zona de Cisalhamento de
Cuncas, Zona de Cisalhamento de Granjeiro e Zona de Cisalhamento de Farias
Brito (Visualizar os sentidos das falhas na figura 02). As deformações são
marcas que condicionam hoje os processos de intemperismo e esculturaram o
modelado, concomitantemente as oscilações climáticas do Quaternário.
Considerações Finais
A gênese do relevo da serra de São Pedro encerra questões ainda desconhecidas segundo os seus constituintes morfodinâmicos. A hipótese sobre a resistência apresentada pelos gnaisses existentes no platô da serra em diferença com as rochas encaixantes na depressão sertaneja proporcionam o sobressalto topográfico do maciço. Contudo, as marcas deixadas pelas zonas de cisalhamento e a fissão do Pangea tornam-se importante para entender a dinâmica atual. Este estudo auxilia na identificação dos fatores estruturais na caracterização do relevo dos maciços cristalinos da região do Cariri cearense e em pesquisas voltadas para a história geomorfológica da província Borborema no seu setor central.
Agradecimentos
Agradeço a FUNCAP por fomentar a pesquisa, com o auxílio da bolsa de iniciação científica e a Universidade Estadual do Ceará (UECE) pelo conhecimento adquirido. Agradeço também ao Professor Frederico de Holanda pela revisão do trabalho e na caminhada acadêmica que se inicia. E por fim, agradeço ao meu amigo Adisson Souza Tavares que me acompanha na graduação e na vida, e a minha mãe Lucília Gomes da Silva por todo apoio de sempre nas tardes de estudo.
Referências
AB´SÁBER, A. N. Um conceito de geomorfologia a serviço das pesquisas sobre o Quaternário. Geomorfologia. n. 18, IG-USP, S. Paulo, 1969.
BIGARELLA, J. J. (2003). Estrutura e Origem das Paisagens Tropicais. Vol.3. Florianópolis: Ed. UFSC.
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CLAUDINO–SALES, V.; PEULVAST, J. P.. Evolução morfoestrutural do relevo da margem continental do Estado do Ceará, Nordeste do Brasil. Caminhos de Geografia (UFU), v. 8, p. 2-22, 2007.
GUERRA, A. T.; GUERRA, A. J. T. Novo Dicionário Geológico-Geomorfológico – 3ª edição. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 2011.
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MABESSONE, J. M. História da Província Borborema NE do Brasil. Revista de Geologia, 15, 2002. p. 119-129.
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PEULVAST, J.P.; CLAUDINO SALES, V. Aplainamentos e Geodinâmica: revisitando conceitos clássicos em Geomorfologia. Fortaleza. Rev. Mercator 1:62-92, 2004.
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