Autores

Mathias, R.M. (UNICENTRO) ; Lima, E.A. (UNICENTRO) ; Pietrobelli, G. (UNICENTRO)

Resumo

O presente trabalho objetivou caracterizar feições deposicionais e erosivas da caverna Rancho das Três Meninas, localizada na bacia hidrográfica do rio Ivaí no município de Boa Ventura de São Roque, região central do estado do Paraná. Esta caverna encontra-se no limite do Segundo para o Terceiro Planalto paranaense, especificamente nos arenitos da Formação Botucatu. Esta caverna era desconhecida do meio cientifico, pois a região possui difícil acesso. A caracterização das feições foi feita a partir de pesquisas em campo e estudo comparativo com a bibliografia. Ainda em campo foram feitas medições para caracterização morfométrica da caverna e das feições de deposição e erosão. Os trabalhos indicaram que a caverna Rancho das Três Meninas está em fase de acumulação, por praticamente não haver fluxo interno de água.

Palavras chaves

Caverna Rancho das três Meninas; Feição de erosão e sedimentação ; Boa Ventura de Sao Roque

Introdução

No município de Boa Ventura de São Roque-PR ocorrem uma série de cavidades do tipo lapa e caverna desenvolvidas em rochas areníticas pertencentes às formações Botucatu, Pirambóia e Rio do Rasto. As cavidades são extensas e amplas. O conhecimento destas cavidades entre a população é bem restrito uma vez que o acesso a elas é bastante difícil e se dá pela mata nativa e em trilhas sobre terreno dissecado. A caverna Rancho das Três Meninas caverna constitui o objeto de estudo deste trabalho, no qual se buscou efetuar caracterização morfológica da caverna e efetuar o reconhecimento preliminar de suas feições de erosão e sedimentação. A metodologia foi fundamentada em consulta bibliográfica, levantamentos em campo e analogia com feições geradas por diferentes processos de erosão. Essa etapa do trabalho se deu pela análise macroscópica da rocha, das estruturas sedimentares presentes e da dinâmica da água observada dentro da caverna.

Material e métodos

O trabalho se fundamentou no reconhecimento e caracterização de feições e mecanismos de erosão e deposição presentes em caverna de arenito. Em campo foi realizada descrição macroscópica de estruturas sedimentares físicas e químicas, onde foram adotados os procedimentos propostos por Conybeare e Crook (1982) que consideram: 1) a estrutura como uma unidade; 2) as feições internas da estrutura; 3) a estrutura em relação ao material circundante e; 4) a estrutura em sua relação com as estruturas associadas. Acrescenta-se a ela o registro fotográfico e a coleta de materiais para análises posteriores. Quanto à descrição dos materiais em campo, foram consideradas as seguintes propriedades: cor, textura, agregação, presença de material biogênico, forma e disposição das estruturas sedimentares visíveis a olho nu. As feições de erosão foram identificadas e caracterizadas através de medições sistemáticas. Por tanto se adotou a terminologia usada para ambientes de encosta, uma vez que os mecanismos presentes na caverna são correlatos aos daquele ambiente. Efetuou-se também a caracterização da rocha em amostra de mão e afloramento, no presente caso, rochas da Formação Botucatu, dentro e no entorno da caverna

Resultado e discussão

A formação geológica na qual está contida a caverna é de origem sedimentar e desta forma possui maior suscetibilidade à ação dos processos de intemperismo e erosão a partir de linha de fraqueza da rocha e da dissolução e carreamento dos minerais. Dentro do compartimento geomorfológico a região encontra-se no limite do Segundo para o Terceiro Planalto paranaense (MAACK, 1968). Dentro de uma nova compartimentação proposta pela Mineropar (2006) o Terceiro Planalto paranaense foi dividido em sub-planaltos, conforme alguns aspectos do relevo e esta região foram caracterizados como de Planaltos Residuais da Formação Serra Geral. A caracterização morfológica é marcada por um alinhamento de encostas e paredões que vão desde o inicio da cachoeira rio Pedrinho até a foz do mesmo com o rio Ivaí e modelada em rochas de arenito com paredões que passam de 50 metros de altura e na maior parte é formado por arenito Botucatu (MINEROPAR, 2006). As declividades locais são elevadas, trata-se de frente de escarpa, cuja morfologia é definida pela resistência a erosão das litológias que ocorrem na região, o basalto do topo é mais resistente à erosão, diferentemente das rochas sedimentares da base, altamente friáveis e diaclasadas (Formação Botucatu, fácies desértica e aquosa) (VIEIRA, 2008). Diáclase é entendida como superfície planar de descontinuidade física das rochas sem apresentar deslocamento vertical. O intemperismo no arenito Botucatu relaciona-se diretamente à presença diáclases (FERNANDES e AMARAL, 1996). O desenvolvimento de feições carstica em arenito se dá nos planos de estratificação ou de contato entre diferentes camadas de rochas com resistências diferentes a erosão, onde a água circula com maior facilidade favorecendo a dissolução e erosão. Nessa litologia, as cavernas podem resultar de vários processos como movimentos de masssa, intemperismo químico e erosão, além da erosão diferencial (ROBAINA e BAZZAN , 2006) Morfologia da caverna Três meninas A caverna apresenta orientação sul-norte, sendo sua entrada localizada na vertente sul. A extensão da caverna, levantada até o momento é de 23m, estima-se que existam outras galerias de menor tamanho cujo acesso não foi possível nas atividades realizadas até o presente momento. Trata-se de caverna que tem sua origem associada às linhas de fraqueza da rocha que têm definido a instalação e evolução da erosão. São elas: diaclases, fraturas e principalmente planos de estratificação. Estas propriedades estruturais da rocha definem a forma da caverna, a qual apresenta grandes extensões retilíneas, indicando o condicionamento de fraturas e diaclases. Contudo são os planos de estratificação da rocha que determinam a conformação da caverna, no presente caso, o corte transversal dos condutos é principalmente de forma oval, com teto plano e piso plano e semi-plano e paredes curvilíneas. Os salões também apresentam esta morfologia. Bigarella (2003) sustenta que a velocidade e profundidade do intemperismo é diretamente proporcional à concentração e frequência do sistema de diáclases na rocha. Um aspecto importante a se considerar avaliando o papel das linhas de fraqueza do arenito é que, quando quantidade de água infiltrada é maior do que a vazão, ocorre à saturação ou a poro-pressão positiva e a perda de coesão interna do material alterado. Com a saturação excessiva, a resistência ao cisalhamento diminui, favorecendo a queda de blocos, descolamento de placas devido ao alívio de tensão e o colapso de material granular da rocha que perdeu elemento cimentante devido ao intemperismo químico. Mecanismos e feições de erosão Os mecanismos de erosão constituem os agentes responsáveis pela remoção de material dentro da caverna. Os mecanismos de erosão predominantes na caverna atualmente são: a) Queda de blocos por perda de sustentação de paredes e teto da caverna Em decorrência da verticalização das encostas do morro, ocorre esse desprendimento de blocos através das linhas de fraqueza, como representado na figura 1. O que explicaria isso seria o alivio de pressão existente em decorrência da desfragmentarão das partes inferiores pelo fato da água escoar pelo canal da linha de fraqueza, fazendo com que a base da estrutura fique suspensa e ocorrendo esse desprendimento de grandes e pequenos blocos. b) Fluxo de água concentrado em canal da caverna O fluxo de água ocorre na extremidade norte do Morro do Cabo Ademir, em decorrência da bacia de reposição estar direcionada no mesmo sentido da rede de drenagem. Na figura 1 onde se é possível ver esse direcionamento do relevo. Na figura 2 pode-se observar o fluxo de água concentrado em salão secundário da caverna da vertente norte. As feições de erosão e de acumulação representam impressões ou marcas visíveis no interior da caverna. Entende-se que a identificação das feições de erosão e de acumulação é de fundamental importância para a compreensão dos mecanismos que ocorrem no interior da caverna e como eles estão contribuindo para evolução ou estabilização do processo erosivo. As características levantadas mostram que no presente a ação da água é muito restrita e localizada na caverna. O predomínio de processo de movimentos de massa, principalmente desprendimento de blocos associado à gravidade deixam sua impressão apenas na superfície fresca da rocha. Feições como caneluras, alvéolos, marmitas e canais não foram identificados nos trabalhos. Mecanismos e Feições de acumulação Em geral, os processos de acumulação existentes no interior das cavernas geram depósitos de origem química, especialmente o concrecionamento (SPOLADORE, 2006). Na caverna Três Meninas os depósitos químicos estão pouco presentes. Eles se desenvolvem por acumulação nas linhas de fraqueza da rocha (fraturas e diaclases) (Figura 3a e 3b). Os depósitos de sedimentos clásticos são predominantes. Estes ocorrem em razão da força da gravidade que desprende fragmentos de rocha das paredes e teto da caverna e da ação mecânica da água transportando materiais de várias granulações. (figura 4 a) A sedimentação de blocos e matacões promovem a obstrução de passagem em condutos mais estreitos. Em estágio final de sedimentação percebe-se o predomínio de sedimentos de granulação mais fina, quando o agente de transporte perde energia para e competência para transporte de sedimentos, nesses ambientes os sedimentos são principalmente grânulos e areia grossa (Figura 4b).

Figura 1

Queda de blocos por alivio de pressão.

Figura 2

Direcionamento do fluxo de água interno

Figura 3

3(a) Concreção desenvolvida em boco de arenito amplamente fraturado;3(b) Concreção silicosa desenvolvida no teto da caverna a partir de diacláse

Figura 4

4(a) Conduto secundário parcialmente entulhado por deposição de blocos desprendidos do teto e paredes; 4(b)deposição de sedimentos de granulação média

Considerações Finais

Os mecanismos de erosão predominantes na caverna são aqueles relacionados com desprendimento e queda de blocos das paredes e teto das cavernas, percebe-se isto pela presença de blocos e matacões no piso da cavidade. A água tem ação mais localizada na caverna e verifica-se que ela atua na função de limpar o material depositado. As deposições químicas são escassas na caverna. Conclui-se a partir das considerações levantadas que a caverna Rancho das Três Meninas está em fase de acumulação, por não haver importante aporte de água para o interior da caverna. Dessa forma, entende-se que se forem mantidas as condições observadas, a evolução da caverna tende a se estabilizar, não evoluindo para uma cavidade maior.

Agradecimentos

Referências

BIGARELLA, J. J. Estrutura e origem das paisagens tropicais e subtropicais. Florianopolis: Ed. UFSC, 2003.
CONYBEARE, C. E .B.;CROOK, K. A. W. Manual of Sedimentary Structures 2. ed. Bureau of Mineral Resources Geology and Geophysics. Bulletin 102, Canberra Watson Ferguson and Co., 1982. 327p.
FERNANDES, C. E. M.; TEIXEIRA, H. A. DOS S.; CADMAN, J. D.; BARROSO, J. A. Estudos geológicos-geotécnicos para estabilização de taludes de cortes na BR 277 – Serra da Esperança – PR. Instituto de Geociências: Universidade Federal do Rio de Janeiro e Departamento Nacional de Estradas de Rodagem do Ministério dos Transportes, 1974.
MAACK, R. Geografia física do estado do Paraná. Curitiba: Banco de Desenvolvimento do Paraná: UFPR, 1968.
MINEROPAR – Atlas geomorfológico 2006. Disponível em http://www.mineropar.pr.gov.br. Acesso em 14 abril 2012.
ROBAINA, L. E. S.; BAZZAN, T. Cavernas em Arenito: Oeste do Rio Grande do Sul. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOMORFOLOGIA e I.A.G CONFERÊNCIA REGIONAL DE GEOMORFOLOGIA, 6. Anais... 2006, Goiânia, 2006, pp. 1-9.
SPOLADORE, A. A geologia e a geoespeleologia como instrumentos de planejamento para o desenvolvimento do turismo – o caso de São Jerônimo da Serra. Tese. Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2006.
VIEIRA, S. F. Análise e mapeamento das áreas suscetíveis a movimentos de massa no setor central da Serra da Esperança, na divisa entre os municípios de Guarapuava e Prudentópolis – PR. Dissertação de mestrado, Departamento de Geociências, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, 2008.
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