AVALIAÇÃO DAS MODIFICAÇÕES DO CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO: UMA ABORDAGEM GEOMORFOLÓGICA.

Autores

Almeida, A.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ) ; Paula, E.V. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ)

Resumo

O recém-publicado Código Florestal Brasileiro (Lei n° 12.727/12) alterou significativamente as normas para delimitação das Áreas de Preservação Permanente (APP’s). Oito categorias de APP’s foram delimitadas na bacia do rio Sagrado (Morretes/PR), sendo que no total houve redução de 20,66% nas áreas a serem preservadas com a aplicação da nova legislação. As categorias de APP’s que apresentaram as maiores modificações referiram-se aos topos de morros, montes, montanhas e serras.

Palavras chaves

Código Florestal; APP's; SIG's

Introdução

O Código Florestal Brasileiro é a lei que estabelece as normas de proteção para a vegetação nativa, delimitação das Áreas de Preservação Permanente (APP’s) e da Reserva Legal. O primeiro Código Florestal foi estabelecido, no Brasil, pelo Decreto nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934, que foi revogado pela Lei n° 4.771, de 15 de setembro de 1965. Esta última passou por diversas correções e inclusões, por meio de Medidas Provisórias e Resoluções COMAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente). Diante de muitas polêmicas entre ambientalistas e ruralistas, em 2012 o código de 1965 foi substituído, primeiramente em 25 de maio pela Lei n° 12.651 e posteriormente pela Lei 12.727, de 17 de outubro, sendo esta última lei também denominada de Novo Código Florestal. As APP’s (BRASIL, 2012) são áreas protegidas, cobertas ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas. Sendo assim, ocupações em APP’s podem causar desequilíbrios no meio físico, como a aceleração de processos erosivos e assoreamento das drenagens, problema que ocorre na área de drenagem da baía de Antonina (PAULA, 2010). Nowatzki (2010) ao analisar as bacias que drenam para esta baía, constatou que a do rio Sagrado possui maior extensão das suas APP’s degradadas (17,7%) e Paula (2010) que é a maior contribuinte na produção de sedimentos. Diante disso, a bacia do rio Sagrado, cuja área apresenta 137,7km², foi selecionada para o presente estudo, estando localizada no município de Morretes e, abrangendo as unidades geomorfológicas da Serra do Mar e da Planície Litorânea. O presente trabalho teve como objetivo delimitar as APP’s conforme as leis n° 4.771 de 1965 e n° 12.727 de 2012, seguida da avaliação quantitativa das modificações ocorridas.

Material e métodos

A delimitação das APP's foi realizada em ambiente SIG, por meio do software ArcGIS 9.3. A base cartográfica contemplou arquivos shapefile, em escala 1:25.000, oriundos de cartas topográficas (DSG, 2002), tendo sido editados por Paula e Cunico (2006). As categorias de APP’s consideradas na análise foram: APP1- nascentes; APP2- mata ciliar; APP3- entorno de reservatórios; APP4- topo de morros; APP5- topo de montanhas; APP6- linhas de cumeada; APP7- encostas acima de 45° de declividade; e APP8- manguezais. O processo de delimitação das APP’s conforme a Lei n° 4.771/65 encontra-se descrito em Nowatzki et al. (2010), enquanto que para a nova Lei os principais procedimentos são descritos a seguir: As categorias APP1 e APP2 foram delimitadas por meio dos seguintes buffers: raio de 50 metros em nascentes e de 30, 50 e 100 metros em rios, nas áreas cuja vegetação encontrava-se preservada; raio de 15 metros em nascentes e de 5 metros em rios, nas áreas degradadas situadas em pequenas propriedades rurais (1 módulo fiscal). O uso do solo nas APP’s foi identificado a partir da análise de imagens SPOT-5 referentes ao ano de 2006. A categoria APP3 deixou de existir na bacia do rio Sagrado, à medida que a categoria APP5 foi integrada à APP4, sendo que para sua delimitação efetuou-se: 1) Identificação dos topos isolados; 2) Seleção dos picos com amplitude mínima de 100 metros entre o topo e a base; 3) Seleção dos picos com 25° de declividade; 4) Em tabela Microsoft Excel, calculou-se a altimetria do terço superior das elevações pela equação: ((Pico – Base) / 3) x 2) + Base); 5) Criação de shapefile poligonal no ArcCatalog e; 6) Vetorização dos terços superiores. Na nova legislação a categoria APP6 deixou de existir e os topos passaram a ser delimitados isoladamente. A APP7 foi calculada e extraída de um Modelo Digital do Terreno (MDT) e a APP8 manteve-se inalterada. Para finalizar, foram retiradas as sobreposições entre todas as categorias de APP’s com o auxílio da ferramenta Erase

Resultado e discussão

Dentre os resultados obtidos, verificou-se que de acordo com Lei de 1965, as APP’s apresentavam 57,12 km² e compreendiam a 41,48% da área total da bacia do rio Sagrado. Com a aplicação do Novo Código Florestal, esse valor diminuiu para 45,32 km², compondo 32,91% da bacia. Sendo assim, a extensão total de APP’s reduziu em 11,80 km² (20.66%) quando se aplicou a nova legislação. De acordo com o quadro síntese (Figura 1), somente a categoria APP8 (manguezais), não sofreu alterações, mantendo sua extensão em 0,56 km². Com a nova Lei apenas os reservatórios artificiais (APP3), com área superior a um hectare, possuem APP no seu entorno. Tal condição acarretou na perda de 100% dessas APP’s na bacia do rio Sagrado. Entre todas as categorias, as APP’s relativas aos topos de morros, montes, montanhas e serras foram as que apresentaram a mais significativa redução em sua extensão. No código anterior os topos (APP4 e APP5) juntamente com as linhas de cumeada (APP6) somavam 21,72 km². Com o novo código a categoria APP5 foi integrada à APP4, todavia devido à extinção da categoria APP6 e ao aumento da amplitude mínima obrigatória de 50 metros para 100 metros entre o topo e a base, as categorias de APPs de topo denotaram decréscimo de 30,43%, já que somaram área de 15,11 km², A categoria APP2, referente ao entorno dos cursos d’água, decresceu 4,54 km² (15,69%), configurando-se na segunda mais importante em termos de redução de área quando se aplicou o novo código. Na Lei de 1965, a largura da mata ciliar era determinada apenas pela largura dos rios, na da bacia do rio Sagrado a mata ciliar era predominantemente de 30 metros. A explicação para a redução das áreas desta categoria se deve ao fato de a nova Lei considerar faixas menores de proteção nas pequenas propriedades rurais, onde o uso agropecuário encontra-se consolidado. Como na bacia em análise nota-se o predomínio de propriedades com até um módulo fiscal, a recomposição das APP’s nessas áreas passou para apenas 5 metros. Na Lei 12.727/12 as áreas rurais consolidadas, independente do tamanho da propriedade rural, também são consideradas em nascentes (APP1). A recomposição em nascentes alteradas ficou em 15 metros e as áreas preservadas continuaram com o raio de 50 metros. Diante disso, a categoria APP1 evidenciou redução de 0,69 km², o que corresponde a um decréscimo de 12,08% em relação à legislação anterior. Apesar da categoria APP7 não ter sofrido alterações nas normas de delimitação, foi a única que apresentou acréscimos em sua extensão, aumentando em 45% (0,09 km²), Isto ocorreu devido à retirada de sobreposições com as categorias anteriormente descritas, Na Figura 2 tem-se a representação das porções de APP que sofreram alterações em suas delimitações. Nota-se predomínio das porções que apresentaram redução de suas áreas, as quais somaram 13,086 km². Os acréscimos, que totalizaram 1,282 km², referiram às porções da categoria APP7 anteriormente descritas, bem como da categoria APP4, que se devem a diferenças entre a interpretação da legislação realizada por Nowatzki et al. (2010) da realizada no presente trabalho. A bacia do rio Sagrado apresenta a maior densidade de ocupação e de estradas rurais, dentre as bacias que drenam para a baía de Antonina, bem como seus topos de morro denotam elevada suscetibilidade geopedológica à produção de sedimentos (PAULA, 2010). As mudanças no Código Florestal Brasileiro implicaram na legitimação do uso agropecuário e dos acessos existentes, principalmente em porções de mata ciliar da área de estudo. As mesmas se constituem em importantes áreas de contribuição ao processo de assoreamento da baía de Antonina, conforme Gibertoni (2008) e Paula (2010). Quanto às porções de topo que ainda se encontram recobertas por Floresta Ombrófila Densa, verifica-se o risco eminente de expansão da ocupação nestes ambientes suscetíveis, o que certamente implicará no aumento da produção de sedimentos e consequentemente do processo de assoreamento da baía de Antonina.

Figura 1: Quadro síntese das APP's da bacia do rio Sagrado



Figura 2: Evolução das APP's entre as Leis ns. 4.771/65 e 12.727/12



Conclusões

As análises desenvolvidas no âmbito do presente estudo demonstraram que as APP’s da bacia do rio Sagrado foram reduzidas em 20,66% (11,80 km²), quando consideradas as mudanças estabelecidas no Código Florestal Brasileiro. Esta expressiva perda de porções de APP, sobretudo de mata ciliar e topo de morros são preocupantes, considerando-se que esta bacia refere-se a que mais contribui ao processo de assoreamento da baía de Antonina. Os resultados aqui descritos poderão subsidiar instrumentos de planejamento e gestão ambiental do território no litoral paranaense, bem como se pretende usá-los na construção de cenários para a estimativa da produção de sedimentos. Deve-se ainda salientar que as técnicas de SIG se mostram eficientes na delimitação das APP’s, apresentando resultados satisfatórios e tornando possível a aplicação desta metodologia em outras áreas.

Agradecimentos

Referências

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SENADO Federal, Glossário do Novo Código Florestal. Disponível em: <http://www12.senado.gov.br/codigoflorestal>. Acesso em 01/08/2013.


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