Geomorfologia, paisagem, previsão de impactos, zoneamento e os riscos: elementos para o planejamento.
Autores
Silva, P.L. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE) ; Costa, R.C. (INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA)
Resumo
Este trabalho aborda procedimentos teóricos e metodológicos envolvendo o tema dos riscos a partir dos geossistemas como interface da geomorfologia aliada aos preceitos de previsão de impactos, assim como a produção de um zoneamento ambiental. O objetivo é identificar o que a temática atual exige de conhecimentos e quais as categorias mais relevantes em diferentes unidades espaciais de análise. Tal trabalho foi feito a partir de levantamento bibliográfico, e operacionalizado para Manaus.
Palavras chaves
Zoneamento ambiental; riscos ambientais; bacia hidrográfica
Introdução
A ocupação inadequada e o desenvolvimento de usos incompatíveis com a capacidade de suporte que o solo apresenta se devem, sobretudo à falta de planejamento urbano, principalmente nas grandes cidades, associada à ausência de efetividade das políticas públicas para gerir e solucionar os problemas decorrentes. Além desses fatores, há o contexto histórico, social e político de ocupação de áreas inapropriadas, incompatíveis do ponto de vista ambiental. A ocupação inicial destas áreas é decorrente de deficiências na provisão de moradias em locais adequados, que levam determinados grupos sociais com baixo poder aquisitivo a se instalar em espaços cuja infraestrutura básica é deficiente ou inexistente, e que, sobretudo, apresentam riscos para sua estadia a partir da iminência de desastres decorrentes de fenômenos naturais. Faz-se necessário não somente identificar as áreas passíveis de ocupação com usos apropriados, mas a partir destes estudos, direcionar as ações do poder público no sentido de identificar áreas para uso (domiciliar, comercial, entre outros), seja ela de baixo ou alto poder aquisitivo, para a ocupação nas áreas apropriadas, por meio de políticas de moradia e instalação de infraestrutura básica. Para áreas inapropriadas já ocupadas, caso majoritário nos principais núcleos urbanos do Brasil, o zoneamento permite mensurar a emergência de remoção dos moradores das áreas de maior risco e de mitigação de problemas identificados de menor risco. Nesse sentido, este trabalho objetiva abordar procedimentos teóricos e metodológicos envolvendo o tema dos riscos a partir da análise geossistêmica culminando com a produção de um zoneamento ambiental com elementos geomorfológicos e processos (climáticos e sociais) correlatos. Tal trabalho foi feito sob uma perspectiva de levantamento bibliográfico, e operacionalizado para a realidade de Manaus.
Material e métodos
O trabalho de zoneamento ambiental a partir da morfodinâmica mostra-se essencial para dar subsídios ao planejamento urbano e à formulação de normas de ocupação territorial, pois a identificação dos sistemas ambientais e os usos adequados possibilitam a diminuição de eventos provenientes de fenômenos naturais, como cheias e deslizamento de encostas e taludes. Os grupos sociais com a aplicação de suas técnicas no território têm como características intrínsecas a modificação do meio natural, e a redefinição dos elementos da paisagem. Diante disto, faz-se essencial a normatização e implementação de instrumentos e políticas de planejamento territorial, que orientem e estabeleçam padrões de ocupação e uso do solo urbano, compatíveis com os anseios das diferentes necessidades dos grupos sociais e da capacidade de suporte do meio físico. Propomos que para elaboração de estratégias de planejamento territorial, o zoneamento ambiental subsidia o melhor diagnóstico das áreas, e a escala de recorte de bacia hidrográfica possibilita que se levem em consideração as diversas variáveis naturais que aí agem de forma sistêmica (OLIVEIRA, 2012). A identificação e setorização a partir de geossistemas permitem a aferição de fenômenos naturais que são mais susceptíveis de ocorrer tanto pela dinâmica natural da área, tanto pelo histórico de eventos ora registrados, tais como inundações e deslizamentos de terra, recorrentes na zona urbana de Manaus. O estudo da Bacia Hidrográfica, a partir de sua base geomorfológica e sua sistematização por meio do zoneamento ambiental se mostram eficazes na elaboração das diretrizes e normas para o planejamento e ordenamento territorial urbano. Assim sendo, auxiliam os órgãos governamentais e institucionais na tomada de decisões, elaboração de legislação adequada e formulação de políticas públicas, no sentido de orientar os usos adequados para cada localidade, bem como salientar a emergência de provisão de infraestrutura adequada (ODUM&BARRET, 2007).
Resultado e discussão
As bacias hidrográficas urbanizadas são elementos que se constituem como
unidades espaciais de análise, inclusive como demarcação administrativa, visto
que os eventos de inundação, deslizamentos de terras e seus impactos, como
doenças ligadas aos riscos, leptospirose, diarreia e outras são impactos
existentes, principalmente de inundação, e a escala de identificação e análise
deve ser considerada conforme a escala de determinado evento.
O sítio urbano de Manaus é um dédalo de drenagem que foi diversamente ocupado e
alterado para diferentes formas e usos. A diferença nas paisagens evidencia a
estrutura desigual de acesso ao espaço urbano com espaços de moradia, de vida e
de infraestrutura distintas. As diferenças de uso refletem a infraestrutura e
produzem impactos múltiplos, desde o aterramento dos riozinhos, até a
transformação dos cursos fluviais em cloaca pública. As áreas de risco se
formaram com vários graus e escalas de risco, desde alagações até
desmoronamentos com impactos pontuais, lineares e areolares. As dinâmicas da
natureza não desapareceram com a urbanidade, os equipamentos urbanos, não raro,
escondem processos naturais, como o fluxo de rios, e processos erosivos. Os
processos da natureza agem em interação geossistêmica, como o gráfico a seguir:
Os riscos são elementos de identificação e análise que tem a potencialidade de
fundamentar problematizações eminentemente geográficas, por exemplo: os
processos erosivos (erodibilidade, erosivisidade) uso e renda do solo urbano, e
a configuração da paisagem; e a dinâmica dos processos de seu funcionamento
utiliza a previsão de impactos conforme seu espaço total.
A intensificação dos índices demográficos e urbanísticos se deu, principalmente,
a partir da década de 1960, com a implantação da Zona Franca de Manaus. A
demanda de profissionais para oferecer mão-de-obra para as indústrias que vinham
se instalando, acarretou o aumento da população da zona urbana, em detrimento do
não provimento de infraestrutura para atender às demandas que vinham a surgir,
tais como moradia, saneamento básico, transporte público, entre outros. Dessa
forma, os grupos com menor poder aquisitivo se viam direcionados a ocupar áreas
inadequadas, tais como as margens dos igarapés, bordas de taludes e encostas
(COSTA, 2012).
Cabe salientar que a ocupação dessas áreas se deve à valoração diferenciada do
solo urbano. Descrito por RIMA/PROSAMIN (2004, p.37), apud Macena & Costa
(2012), o valor urbano do solo de Manaus se diferencia conforme os terrenos
tabulares nos interflúvios dos principais igarapés e demais corpos d’água, que
por serem áreas de maior estabilidade quanto ao substrato pedológico e rochoso,
são de maior valor imobiliário; e por outro lado, as áreas de encosta e de
terrenos mais acidentados, bem com aqueles localizados na planície de inundação
dos corpos d’água, que possuem menor valor imobiliário, consequentemente
ocupados por pessoas de menor poder aquisitivo (MACENA & COSTA, 2012).
No entanto, a geodinâmica e instabilidade de determinados sistemas ambientais,
por apresentarem fenômenos naturais intrínsecos a seu funcionamento, acarretam
em riscos e perigos para moradores e transeuntes. Conforme o estudo do Serviço
Geológico do Brasil (CPRM, 2012) de acordo com a susceptibilidade a riscos
ambientais a partir das variáveis geotécnicas e geológicas é possível
classificar o sítio urbano de Manaus em dois principais domínios: o domínio das
“terras baixas e alagadiças” e o das “terras altas e firmes”. A partir desta
classificação se auferem os principais fenômenos naturais que podem acarretar em
riscos para os moradores que ocupam tais áreas, que estão ligados principalmente
a deslizamentos de terra e inundação a partir das cheias e altos índices
pluviométricos.
Com uso de indicadores, aliado aos dados morfológicos, é possível que por meio
da adoção de um recorte espacial que abranja uma bacia hidrográfica, se produza
um zoneamento ambiental direcionado à identificação de áreas de risco.
Interações do geossistema incluindo os elementos: atmosfera, hidrosfera, energia, litosfera (rochas e modelado), pedosfera, biosfera e sociedade.
Conclusões
Dados da Defesa Civil afirmam que 70% dos eventos de risco estão relacionados a enchentes e alagações. Manaus foi fundada entre duas rias fluviais (São Raimundo e Educandos), e na retroterra um conjunto de bacias hidrográficas de diferentes escalas com as mais variadas formas de urbanidade e usos (habitação, comércio, variados fins, de espaços públicos de lazer a esgoto a céu aberto desprovido de infraestrutura, vias de circulação entre outros). Com o aumento da pobreza e do valor do solo urbano houve uma concentração de pessoas de baixa renda em áreas com custo maior para infraestrutura de moradia, que sendo não existentes passaram a oferecer alternativas não planejadas e inadequadas para o desenvolvimento das atividades humanas. Sob os aspectos da geomorfologia os riscos devem ser considerados como realidade social, portanto elemento da relação sociedade e natureza, assim se valendo para balizar processos de planejamento mais amplos e em diferentes escalas.
Agradecimentos
Referências
COMPANHIA DE PESQUISA DE RECURSOS MINERAIS. Mapeamento das áreas de risco geológico da Zona Urbana de Manaus (AM). Manaus: CPRM & Prefeitura Municipal de Manaus, 2012.
OLIVEIRA, A. V. L. C. de. Zoneamento geoambiental como subsídio ao planejamento territorial municipal: estudo de caso para Currais Novos/RN. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Biociências. Programa Regional de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente/PRODEMA – Natal, RN, 2012.
ODUM, E. P. & BARRET, G. W. Fundamentos da Ecologia. São Paulo: Thomson Learning, 2007.
COSTA, R. C. Áreas de Risco: processos da natureza e produção da sociedade. REVISTA GEONORTE, Edição Especial, V.4, N.4, p.89 – 104, 2012.
ALMEIDA, L. Q. Vulnerabilidades socioambientais de rios urbanos: Bacia Hidrográfica do Rio Maranguapinho, região metropolitana de Fortaleza, Ceará. Tese (doutorado) – Universidade Estadual Paulista, Instituo de Geociências e Ciências Exatas, 2010.
CRUZ, D. R.; CASSIANO, K. R. M.; COSTA, R. C. (coord.). Áreas de risco em Manaus: Inventário Preliminar, 2009.
MACENA, L. S. S. de; COSTA, R. C. A cidade como espaço do risco: estudo em bacias hidrográficas de Manaus, Amazonas – BR. REVISTA GEONORTE, Edição Especial, V.1, N.4, p.318 – 330, 2012.