Morfogênese antrópica no processo de extração do Amianto Crisotila em Minaçu (GO).

Autores

Souza, J.C. (UEG)

Resumo

O objetivo desse artigo é apresentar uma análise do homem como agente geomorfológico em área de mineração. A análise se aplica ao processo de extração do amianto crisotila na cidade de Minaçu, no norte do estado de Goiás, que há mais de quarenta anos vem elaborando formas antropogênicas, como cavas e bancas de rejeito, com a remoção e deposição de centenas de milhões de toneladas de rocha e solo.

Palavras chaves

Geomorfologia; Antropogeomorfologia; Mineração de amianto

Introdução

Com o desenvolvimento tecnológico e a intensiva ação do homem sobre a superfície, alterando as formas propositalmente ou não, os estudiosos da Geomorfologia passaram o considerar o homem como um agente geomorfológico, pois o mesmo tem alterado significativamente as formas da superfície para o desenvolvimento de suas atividades como agricultura, mineração, implantação de cidades e outras, criando uma especialidade hoje nomeada como Antropogeomorfologia. A Antropogeomorfologia surge como uma especialidade da Geomorfologia que tem como objetivo analisar os impactos nos solos e as alterações no relevo provocadas pela ação humana (GOUDIE, 1993 apud SANTOS FILHO, 2011). Expressões como Geomorfologia Antropogenética (FELDS, 1957), Geomorfologia Antrópica (Marques, 2001), Morfogênese Antrópica (JORGE, 2011), Morfologia Antropogênica (RODRIGUES, 2005), dentre outras, também são utilizadas para fazer referência à ação humana sobre as formas de relevo. Frente a estas abordagens que legitimam o homem como agente geomorfológico é que se propõe, neste trabalho, apresentar os resultados de uma análise que tem por objetivo avaliar a ação do homem na modelação do relevo, no processo de extração do amianto crisotila, no município de Minaçu, no norte do estado de Goiás - Mina de Cana Brava.

Material e métodos

Procedeu-se uma descrição do meio físico da área da mineração, para levantamento dos aspectos morfológicos originais (morfologia original), e a descrição dos aspectos morfométricos atuais (morfologia antropogênica). Estas descrições foram realizadas com base em Moreira et. al. (2008) e dados disponibilizados no sítio do Sistema de Informações Geográficas de Goiás - SIEG . Os dados quantitativos e do processo de produção do amianto crisotila na mina de Cana Brava foram obtidos junto ao Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM e no site da empresa Sama Minerações Associadas . Para a elaboração dos mapas de localização e delimitação da área de estudo foram utilizadas como base imagens do satélite CBERS 2B HRC (High Resolution Camera) de 15 de março de 2009, disponível no site do Instituto de Pesquisas Espaciais – INPE (www.inpe.br). Para a confecção do mapa de relevo sombreado, com curvas de nível, bem como os perfis topográficos, foi utilizado o Modelo Digital de Elevação (MDE), elaborado a partir de dados SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) por TOPODATA (Banco de Dados Geomorfométricos do Brasil), disponibilizado também pelo INPE . Os mapas foram elaborados em ambiente ArcGis 9.3.

Resultado e discussão

A extração do amianto crisotila é um processo realizado a céu aberto feito pela SAMA S.A. Minerações Associadas. O minério é um silicato hidratado de magnésio (Mg3Si2O5(OH)4), fibroso e ocorre em veios incrustados em serpentinitos fraturados ou falhados na porção sul do Complexo Máfico-Ultramáfico Cana Brava (MOREIRA et. al., 2008). A fibra de amianto é utilizada como fibrocimento e produtos de fricção (FERREIRA FILHO e LINHARES, 2009). O processo de extração segue as etapas de planejamento de lavra, decapeamento, perfuração e desmonte, beneficiamento e deposição dos rejeitos. Todo o complexo de extração do amianto é composto pela usina, duas cavas e duas bancas. Nas cavas ocorrem os processos de decepamento, desmonte e retirada das fibras e estéril. As dimensões destas cavas são as seguintes: cava A - 156 metros de profundidade e diâmetros de 1.450 metros no sentido norte-sul e 600m no sentido leste-oeste; cava B - 169 metros de profundidade e diâmetros de 1.110 metros no sentido norte-sul e 850 metros no sentido leste-oeste (SAMA, 2012). Em torno de 16 milhões de toneladas de material rochoso são removidos anualmente, sendo que deste total se extrai aproximadamente 302 mil toneladas de fibra (SAMA, 2012). Todo o rejeito/estéril que sobra desse processo é depositado em duas bancas, e possuem as seguintes dimensões: a banca A - 1.041 m² de área e altura em torno de 80 metros; banca B - 1.839 m² de área e altura em torno de 100 metros. Na Figura 2 podem ser observadas as cavas e bancas delimitadas sobre um modelo digital de terreno. Figura 2: Cavas e bancas em relevo sombreado sobreposta com curvas de nível com equidistância de 10 m. Fonte: SRTM-Topodata-INPE. A disposição do estéril/rejeito retirados da mina é feita de maneira que certifique a firmeza das bancas. Assim, a altura, a inclinação e o espaçamento entre cada talude (berMas) possuem metragens predeterminadas para garantir que o escoamento superficial e a gravidade não comprometam a estabilidade da estrutura. Segundo Pamplona (2003). Este processo ocorre desde 1986 sob orientação técnica do Instituto de Pesquisas Tecnológicas – IPT do estado de São Paulo, que estabeleceram as seguintes medidas: bancos 10m de altura; taludes inclinação inferior a 1:1; bermas, inclinadas para dentro da banca e com largura de 4 a 6m; cobertura de solo, 30 cm no mínimo; e canaletas de drenagem feitas com cascata de concreto, solo-cimento e rocha estéril. Após a deposição de solos (regolito) corrigidos e fertilizados nos taludes, inicia-se o processo de revegetação. A revegetação tem a função de dar estabilidade aos taludes escalonados e evitar a erosão. Para isso, são utilizadas gramíneas e leguminosas e posteriormente são introduzidas árvores e arbustos (PAMPLONA, 2003). No período de 1967 a 2010 houve um expressivo crescimento na produção do minério, que segundo Pamplona (2003) é resultado dos investimentos em tecnologia. Em 1967 a produção foi de 992 t, em 2010 foram extraídas 306.350 toneladas (FERREIRA FILHO e LINHARES, 2009; DEPARTAMENTO NACIONAL DE PRODUÇÃO MINERAL, 2010). De 1969 a 2002 o processo de extração de amianto retirou das duas cavas 247.337.191 de toneladas de minério, estéril e solo (PAMPLONA, 2003) deste total, 82.692.925 compreende a fibra do amianto. Conclui-se então que 164.644.266 de toneladas de estéril e solo passaram a compor as imponentes bancas de rejeito. No período de 2003 a 2007, segundo dados apresentados por Ferreira Filho e Linhares (2009), foram extraídos 1.200.739 toneladas do minério, tendo que para isso remover 18.587.046 toneladas de rocha.

Figura 1: Cavas e bancas em relevo sombreado

Figura 1: Cavas e bancas em relevo sombreado sobreposta com curvas de nível com equidistância de 10 m. Fonte: SRTM-Topodata-INPE.

Figura:2 Perfis topográficos da área de mineração

Figura 2: Perfis topográficos da área de mineração, segmentos traçados sobre imagem CBERS 2B HRC.

Conclusões

Do arado aos explosivos, o homem vem a pelo menos 8000 anos modificando as formas da Terra (Brown, 1971) e a mineração figura entre as atividades que mais causam alterações na superfície, especialmente as que se processam a céu aberto, porém, os estudos sob a ótica da geomorfologia, têm explorado as transformações provocadas no meio físico causadas pelo uso e apropriação não planejados da terra, como erosões e movimentos de massa, compreendidos como processos antropogeomorfológicos indiretos. A extração do amianto se enquadra nos processos antropogeomorfológicos diretos, pois as ações são rigorosamente planejadas, mas como essa atividade ocorre há quarenta anos, em Minaçu-GO, o processo de escavação e deposição formou modelados que surpreendem por suas dimensões. Neste sentido é cada vez mais evidente a inserção do homem no patamar dos processos exógenos de modelação relevo e isto representa a legitimação da Antropogeomorfologia enquanto especialidade da Geomorfologia.

Agradecimentos

Os autores agradecem o apoio financeiro disponibilizado pela UEG, por meio do Programa de Auxílio Eventos (Pró-Eventos).

Referências

BROWN, E. H. O homem modela a Terra. In: Boletim Geográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, n. 222, p. 03-18, mai/jun, 1971
DEPARTAMENTO NACIONAL DE PRODUÇÃO MINERAL (Brasil). (2010). Anuário Mineral Brasileiro. Brasília, 804 p.
FELDS, E. Geomorfologia Antropogenética. Boletim Geográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, n. 144, p. 352-357. 1957.
FERREIRA FILHO, O. B. e LINHARES, W. B. (2009). Crisotila. In: BRASIL, Departamento Nacional de Produção Mineral. Economia Mineral do Brasil, Coord. Antônio Ferreira da Silva Rodrigues. Brasília-DF: DNPM, pp. 655-679. 2009.
JORGE, M. do C. O. Geomorfologia Urbana: conceitos, metodologias e teorias. In: GUERRA, A. J. T. Geomorfologia Urbana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011.
MARQUES, J. S. (2011). Ciência Geomorfológica. In: GUERRA, A. J. T.; CUNHA, S. B. da. Geomorfologia: Uma atualização de bases de conceitos. 4ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.
MOREIRA, M. L. O. et al. Geologia do Estado de Goiás e do Distrito Federal. Goiânia: CPRM/SIC – FUNMINERAL, 2008.
PAMPLONA, R. I. O amanto crisotila e a Sama: 40 anos de historia Minaçu-Goiás: da descoberta a tecnologia limpa. Minaçu, GO: SAMA, 2003.
RODRIGUES, C. Morfologia original e morfologia antropogênica na definição de unidades espaciais de planejamento urbano: exemplo na metrópole paulista. In: Revista do Departamento de Geografia (USP), v. 17. P. 101-111. 2005.
SANTOS FILHO, R. D. (2011) Antropogeomorfologia Urbana. In: Guerra, A. J. T. Geomorfologia Urbana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011.
SAMA. Minerações Associadas. Processo de Produção. Disponível em: <www.sama.com.br> acesso em: Agosto de 2012.


APOIO
CAPES UEA UA UFRR GFA UGB