Migração do Canal na Planície Fluvial do Rio Claro - Bacia do Rio Araguaia, Goiás, Brasil
Autores
Castro, W.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS) ; De-campos, A.B. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS) ; Zancopé, M.H.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS)
Resumo
Ambientes produzidos pela migração de meandros são altamente biodiversos. Erosão e deposição são processos inerentes em rios meândricos. Este trabalho identifica os processos de migração dos meandros em dois trechos do baixo rio Claro, afluente do rio Araguaia, entre 1988 e 2012, situados entre trechos retilíneos com forte controle estrutural. Verificou-se uma migração intensa, com predomínio do processo de expansão de meandros e ambienteis flúvio-lacustres provenientes do abandono de meandros.
Palavras chaves
Meandros; Erosão Fluvial; Evolução Temporal de Mean
Introdução
Os processos de erosão e sedimentação tem papel importante na morfodinâmica de canais de rios meândricos, demonstrado por Nanson (1980) Hooke (2008) e mais recentemente por Singh (2014). Essa dinâmica meândrica ainda compreende processos envolvendo a hidrologia dos rios e os de cunho ecológicos (SALO et al., 1986; RICHTER e RICHTER, 2000). A compreensão da migração dos canais fluviais inclui preocupações relacionadas com a erosão das margens, com a proteção de comunidades ribeirinhas, a infraestrutura rodoviária, gestão das águas, da zona ripária, dentre outros. Considera-se os processos fluviais importantes para a compreensão das funções do rio, do qual pode vir a apresentar reflexos na qualidade da água e na conectividade do rio com a planície de inundação. Atividades humanas de diferentes ordens afetam os canais dos rios, considerando dentre outras, os efeitos das alterações do uso da terra, decorrentes principalmente do desmatamento para fins agropecuários (GREGORY, 2006). No que se refere às mudanças do sistema fluvial, a erosão e deposição são processos inerentes à dinâmica dos rios meandrantes (SCHUMM, 1985), sendo ambos sensíveis às mudanças externas, cuja intensificação pode ser indicadora da influência antrópica. Ambientes produzidos por processos de migração de meandros são considerados altamente dinâmicos e biodiversos. Cantarelli e Alves (1999) apontam para a sensibilidade dos ambientes fluviais marginais no Rio Araguaia, ressaltando a importância da sua preservação por lei. Bayer (2002) ao classificar unidades da paisagem do rio Araguaia, identifica no baixo curso do rio Claro a deposição ativa, caracterizada por alta instabilidade lateral e presença de bancos de areias. O objetivo deste trabalho é identificar os principais processos de migração dos meandros do baixo curso do rio Claro, afluente do rio Araguaia, buscando classificar os principais processos associados ao canal no intervalo de 1988 a 2012.
Material e métodos
A análise da migração dos meandros baseou-se no deslocamento dos eixos das curvas e das mudanças do raio de curvatura. Este procedimento foi adaptado de Hooke e Harvey (1983), sobre a migração do rio Daner (Inglaterra) entre 1840 e 1980; de Hickin e Nanson, (1975) e Zancopé, Perez Filho e Carpi Jr. (2009), este último sobre os meandros do rio Mogi Guaçu (SP). Neste trabalho, os processos de migração dos meandros foram classificados em: expansão, quando o seu raio de curvatura aumenta; encurtamento, inverso da expansão, quando o meandro reduz o raio de curvatura; translação, quando há deslocamento paralelo do eixo da curva; rotação, deslocamento angular do eixo da curva; desenvolvimento de lóbulo, quando houve alargamento de parte do meandro; e, abandono por corte do pedúnculo (neek cutoff), quando da junção de curvas a montante e a jusante. Delimitou-se dois trechos de aproximadamente 15km no baixo curso do rio Claro, afluente da margem direita do rio Araguaia no estado de Goiás. Ambos trechos apresentam padrão meândrico, intercalados com segmentos retilíneos, com 42m de largura média. Abordou-se a migração dos meandros do rio Claro a partir de análises de imagens de satélite de dois diferentes anos (1988 e 2012), perfazendo um intervalo de tempo de 24 anos. A migração do canal do rio Claro foi analisada a partir da sobreposição dos vetores extraídos das imagens de sensores orbitais. As imagens orbitais usadas foram do sensor TM+ do Landsat 5, órbita 071, com composição RGB/453 obtida em 7/08/1988; e do satélite WorldView de resolução de 15/30cm obtida em maio/2012. Além dos vetores foram avaliadas as feições morfológicas produzidas pela migração do curso do rio, como cordões marginais convexos, terraços fluviais, lagos de meandros, bancos de areais e diques marginais.
Resultado e discussão
A análise da evolução do rio no intervalo de 24 anos, entre 1988 e 2012, permitiu identificar para o trecho 1, quatorze curvas com processos de migração ativos, excluindo os primeiros 800m, devido ao fato destes apresentarem nas imagens apenas parte da curva do meandro. A figura 1 apresenta as diferentes curvas deste trecho, com os respectivos processos de migração.
Foram identificados 14 processos, com predomino respectivamente da expansão do meandro, da translação e encurtamento, e um processo de rotação na curva 1n. Os primeiros foram os que ocorreram com maior frequência, com destaque para os processos de expansão o qual indica o predomínio do processo erosivo marginal. Cabe um especial destaque a curva 1m, onde a continua expansão provoca uma situação de corte de pedúnculo eminente. Neste caso, a curva 1n pode sofrer abandono e formar um lago de canal abandonado. Nesta mesma curva (1n) nota-se deslocamento mínimo, no qual a expansão da curva 1k produziu o desenvolvimento de lóbulo na curva 1n com sentido para montante. O processo de translação foi o segundo mais ativos para o trecho e este pode estar relacionado a uniformidade dos depósitos, como observado no rio Mogi Guaçu por Zancopé, Perez Filho e Carpi Jr. (2009).
No trecho 2, que se situa a 22km a montante do trecho 1, foram identificadas migrações em 16 curvas para o período de 24 anos. Foram identificados 21 processos de migração, com predomínio de mais de um processo por curva. Na figura 2, as curvas estão identificadas de montante para jusante, na qual pode ser visto a maior ocorrência dos processos no terço médio. Por outro lado é possível identificar segmentos do rio onde não houve mobilidade significativa. Entre as curvas 2e e 2f, ficou evidente a desprezível mobilidade e indícios de imposição litoestrutural, assim como no terço final do trecho 2 a jusante da curva 2q. A coincidente sobreposição dos canais demonstra ainda a satisfatória compatibilidade metodológica.
Houve predomínio de curvas com aumento do raio de curvatura (expansão), o qual evidencia o aumento do índice de sinuosidade e posteriores processos de abandono de canal por corte de pedúnculo (neek cutoff). Ressalta-se que a expansão contínua faz os meandros adjacentes unirem-se por meio do estrangulamento do pedúnculo (ZANCOPÉ, 2008). A sequência de eventos de migração demonstra o quanto estão interligados os processos de cada meandro. Exemplo disto é a expansão da curva 2h, resultante do decréscimo do raio de curvatura (encurtamento) da curva adjacente, 2i.
Para o trecho 2 são marcantes os processos de abandono de canais, 2 no total, ambos oriundos de corte do pedúnculo. Os lagos formados por abandono de meandros, observados nas imagens, agregam alto valor em termos de produção de ambientes, que a migração do canal desenvolve, como mencionado por Cantarelli e Alves (1999) para o rio Araguaia (essa sentença esta confusa). Diante do valor ambiental de ambientes meândricos do rio Latrube na Aústralia, Hillemacher, Donohe e Treadwell (2012) ressaltam a importância ecológica da reconstituição de meandros para aumento da atividade da fauna aquática, principalmente para reprodução da ictiofauna, após processos antropogênicos alterarem o regime hidrológico.
Por fim, a alternância entre trechos meândricos e retilíneos sugere o controle litoestrutural sobre os trechos estudados. Nesse sentido, Bayer (2002) classificou o baixo rio Claro como unidade de “planície aluvial de rios menores” onde o “encadeamento de setores retilíneos com trechos sinuosos, outorgando-lhe as planícies destes rios menores uma grande variabilidade nas suas relações geométricas”. O autor indica a geração de uma área de deposição ativa caracterizada por uma elevada instabilidade lateral e presença comum de bancos de areia.
Classificação dos processos de migração de meandros do canal do rio Claro no trecho 1
Classificação dos processos de migração de meandros do canal do rio Claro no trecho 2
Conclusões
O baixo curso do rio Claro apresentou acelerada mobilidade do canal fluvial, identificada por meio da análise temporal das imagens de sensores remotos. Essa mobilidade se desenvolve a partir da combinação variada de processos de migração do canal. A alternância de trechos em planície aluvial com trechos retilíneos sobre controles litoestruturais sugere a ocorrência de sucessão de segmentos com subsidência (graben) e soerguidos (horst). O canal fluvial tem maior tendência a se tornar móvel sobre os trechos com subsidência (graben), enquanto nos trechos retilíneos ocorre a efêmera mobilidade do canal com superimposição sobre bloco soerguido (horst). Apesar da ampla distribuição geográfica das planicies fluviais, estas unidades da paisagem tem características de deposição e erosão comuns associadas a migrações de meandros, quando se compara com a migração de canais fluviais de diferentes regiões hidrográficas.
Agradecimentos
Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG) pelo auxílio financeiro (FAPEG AUX PESQ 005/2012 – FAPEG UNIVERSAL proc. n. 201210267000897), o qual tornou possível o desenvolvimento desta pesquisa. E a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela concessão de bolsa.
Referências
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