Ambientes de deposição e geoquímica de depósitos fluviais da bacia do médio/baixo Rio Pardo (SP).
Autores
Celarino, A. (UNICAMP) ; Ladeira, F. (UNICAMP)
Resumo
O Rio Pardo nasce em Ipuiúna-MG e escoa por rochas da Província Tocantins para a Bacia do Paraná apresentando canal retilíneo, sendo que alguns setores assumem caráter meandrante com canais abandonados e uma extensa planície fluvial. Perfis de depósitos aluviais foram analisados em um destes trechos e unidades geomorfológicas foram caracterizadas com base em análises granulométricas e geoquímicas com o objetivo de identificar o ambiente de deposição e processos de alteração pedogenética.
Palavras chaves
Geomorfologia fluvial; Rio Pardo; Depósitos fluviais
Introdução
As planícies fluviais formam um ecossistema caracterizado por grande dinamismo e complexidade de processos bióticos e abióticos. Além de ser um compartimento de transição entre o aquático e o terrestre, uma vez que nestes ambientes há uma intensa renovação de materiais promovida pelo aporte de sedimentos aluviais e coluviais, as planícies fluviais são unidades geomorfológicas capazes de registrar eventos climáticos ao longo do tempo através dos sedimentos e das características pelas quais eles se alteram. Nos sistemas tropicais, períodos de estabilidade onde predominam baixas taxas de sedimentação podem rapidamente favorecer a pedogênese (ZIELHOFER et al., 2009) e, posteriormente, os solos desenvolvidos anteriormente podem ser enterrados por depósitos fluviais preservando as características daquele ambiente pretérito (DANIELS, 2003). Portanto, a combinação entre processos geomorfológicos e pedológicos é característica da planície fluvial (BULLINGER-WEBER & GOBAT, 2006), por se tratar de um importante marco estratigráfico que registra mudanças ocorridas nas mais variadas escalas geológicas de tempo. Neste trabalho o objetivo é interpretar os distintos ambientes de deposição na planície fluvial do Rio Pardo assim como identificar as principais feições pedológicas, lançando mão de análises geoquímicas e granulométricas.
Material e métodos
As características geomorfológicas e geológicas de uma bacia hidrográfica associadas ao clima definem uma série de parâmetros como o padrão de drenagem, a geometria do canal, o tipo de carga sedimentar predominante, a vazão, ou seja, caracterizam como ocorre o processo de formação dos sistemas fluviais e, por consequência, das planícies fluviais. Partindo do pressuposto que as planícies fluviais estão em constante alteração, seja por processos químicos e/ou físicos, adotou-se como estratégia interpretar tais perfis não tão somente como depósitos aluviais, mas utilizar uma perspectiva mais ampla que pudesse abarcar este complexo sistema. Miall (2006), Allen (1964) e Bullinger-Weber e Gobat (2006) foram utilizados para a identificação de processos e ambientes de deposição associados aos perfis analisados, Santos et al. (2005) foi utilizado para a descrição de feições pedológicas. A área de estudo abrange o setor médio/baixo da bacia hidrográfica do Rio Pardo, sendo limitada a oeste pela bacia do Rio Mogi Guaçu, a leste pela bacia do rio Grande e a norte pela bacia do Sapucaí-Mirim/Grande. O Rio Pardo nasce na cidade de Ipuiúna-MG, escoa no sentido SE-NW até atingir a sua foz junto ao rio Grande, após 567km de percurso. Os elementos químicos maiores, menores e traço foram identificados por espectrometria de fluorescência de raios-x (Philips, PW 2404, Holanda) e os valores obtidos foram utilizados segundo a metodologia de Sheldon e Tabor (2009) para a interpretação de determinadas razões molares que são indicativas de discordância entre os materiais do perfil. Foram utilizadas as seguintes razões: Ti/Al (origem dos materiais); ∑Bases/Ti (perda de bases e intemperismo) e Ba/Sr (lixiviação e hidrólise).
Resultado e discussão
Foram analisados treze perfis sendo quatro deles com a geoquímica completa,
representando unidades geomorfológicas distintas, das quais uma será apresentada
neste trabalho (fig. 1).
Terraços
Ocorre em trechos descontínuos ao redor da planície fluvial atual. Geralmente
apresenta-se num nível 10 a 15m superior à planície adjacente, onde predomina a
fração areia bastante alterada.
Planície aluvial
Ocorre entre as cotas de 518 e 522m numa área ampla de baixa declividade,
alcançando, na área mais extensa, aproximadamente 3km de largura a partir do
curso atual do rio. Portanto, uma investigação mais específica das feições
identificadas dentro da unidade geomorfológica é necessária, conforme será
apresentado a seguir.
Lagos e meandros abandonados
Em determinados setores os meandros ficam cheios durante o verão, mas não há
qualquer conexão entre eles e o curso atual. Os perfis típicos dessa feição
apresentaram-se preenchidos por matéria orgânica, sendo a fração areia fina
predominante.
Os depósitos ocorreram em ambiente de baixa energia, com feições pedológicas
como estrutura prismática fraca nas porções superiores dos perfis, tornando-se
maciça em profundidade.
Depósitos em barras de pontal
Feições agradacionais foram geradas na área quando o canal do Rio Pardo
meandrava por sua planície fluvial. Neste momento pretérito, o canal depositava
sedimentos em barras de pontal ao longo do rio, erodia suas margens côncavas,
abandonava meandros por corte de pedúnculo e gerava feições que atualmente não
são mais formadas de maneira significativa.
Levees e depósitos de fundo de canal
Levees são geralmente materiais depositados ao longo das margens dos rios,
podendo apresentar granulometria que varia desde o cascalho até areia média,
formando diques marginais.
Já os depósitos de fundo de canal geralmente formam a base dos perfis em uma
planície fluvial, representam os sedimentos carregados como carga de fundo e
podem apresentar alguns metros de espessura (fig. 2).
De 175 a 360cm(+) de profundidade ocorre um depósito residual de fundo de canal,
de granulometria variando predominantemente entre areia muito grossa e grossa
(mais de 90% de areia total).
Após este depósito o material é argilosiltoso e foi interpretado como um
ambiente de deposição em planície aluvial, ou seja, sedimentação de materiais
finos em ambiente de baixa energia. A baixa relação Ba/Sr mostra que o material
foi pouco lixiviado, mas feições de mosqueamento e presença de raízes indicam
que ali ocorrem processos significativos de pedogênese (SHELDON e TABOR, 2009).
Já nos horizontes superficiais ocorre uma camada de sedimentos com praticamente
as mesmas proporções de argila, silte e areia total, interpretado como depósitos
mais recentes formando um levee.
O comportamento da razão Ti/Al, que é usada como indicativo de proveniência dos
materiais (SHELDON e TABOR, 2009), mostrou que a origem dos depósitos também é
distinta. Os valores para o levee, os depósitos argilosiltosos e os depósitos de
canal foram de 0.14, 0.07 e 0.4, respectivamente.
Foz do Rio Araraquara
Esta unidade é composta por materiais finos que compõe o delta do Rio
Araraquara, onde é possível reconhecer algumas paleodrenagens (fig. 1).
Conclusões
Neste trabalho analisou-se um depósito fluvial quanto às suas características químicas e ambientes de deposição em um setor da bacia do Rio Pardo. Foram usadas determinadas razões molares como Ba/Sr, Ti/Al e soma de bases/Ti para inferir o grau de alteração destes sedimentos. A metodologia mostrou-se adequada no sentido de individualizar os diferentes depósitos aluviais dentro das distintas unidades geomorfológicas, confirmando aspectos que foram observados através das descrições de campo.
Agradecimentos
À fapesp pelo apoio através do processo número: 2011/00261-3
Referências
ALLEN, J.R.L. A review of the origin and characteristics of recent alluvial sediments. Sedimentology, v.5, p. 89-191, 1965.
BULLINGER-WEBER, G., & GOBAT, J. M. Identification of facies models in alluvial soil formation: The case of a Swiss alpine floodplain. Geomorphology, 74(1-4), 181-195, 2006.
DANIELS, J.M. Floodplain aggradation and pedogenesis in a
semiarid environment. Geomorphology 56, P. 225–242, 2003.
MIALL, A. D. The geology of fluvial deposits: sedimentary facies, basin analysis, and petroleum geology. 4ª. ed. New York: Springer, 2006, 582p.
SANTOS, R.D.; LEMOS, R.C.; SANTOS, H.G.; KER, J.C.; ANJOS, L.H.C. Manual de descrição e coleta de solo no campo. 5ª Edição. Viçosa: SBCS, 2005. 92p.
SHELDON, N.D. & TABOR, N.J. Quantitative paleoenvironmental and paleoclimatic reconstruction using paleosols. Earth-Science Reviews, n. 95, p. 1-52, 2009.
ZIELHOFER, C., ESPEJO, J.M.R., GRANADOS, M.A.N., FAUST, D. Durations of soil formation and soil development indices in a Holocene Mediterranean floodplain. Quaternary International, V. 209, Issues 1–2,p. 44–65, 2006.