Os relevos cársticos da vertente oriental do maciço de Baturité (CE): uma abordagem geral.

Autores

Cavalcante, D.R. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ - UECE) ; Bastos, F.H. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ - UECE) ; Cordeiro, A.M.N. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ - UECE)

Resumo

A serra de Baturité constitui o mais expressivo maciço úmido do Ceará. Esse maciço é formado predominantemente por rochas metamórficas. Sua gênese está relacionada ao rifting intracontinental que ocorreu no cretáceo inferior e erosão diferencial. Na vertente oriental, constatam-se feições cársticas associadas à dolomitas com predomínio de lapiés. As atividades de beneficiamento dos carbonatos geram preocupação, já que o mesmo constitui um importante registro geológico/geomorfológico do Ceará.

Palavras chaves

Maciço de Baturité; Relevo Cárstico; Dolomita

Introdução

O estado do Ceará está localizado no domínio das depressões interplanálticas e intermontanas semiáridas, esse domínio tem como características principais as drenagens intermitentes sazonais associadas à má distribuição das chuvas e temperaturas médias de 25º a 29ºC (AB’SABER, 2012). A depressão sertaneja é a unidade geomorfológica que ocupa o maior espaço nesse estado, porém dentro desse domínio, algumas unidades se destacam devido principalmente, a sua expressiva altitude e posição geográfica, tendo como exemplo mais expressivo o maciço de Baturité que se localiza próximo, à região metropolitana de Fortaleza (Figura 1). As serras úmidas, como são conhecidas, quebram a homogeneidade dos sertões cearenses tanto nos aspectos climáticos como fitogeográficos e isso acontece devido à sua dinâmica ambiental diferenciada. A ação combinada da altitude e disposição do relevo faz com que alguns setores do maciço de Baturité possuam os mais elevados índices pluviométricos do Ceará, com médias anuais acima de 1.500mm (CEARÁ, 1992). A ocorrência de rochas solúveis no Ceará é significativa em termos territoriais, porém, a primazia territorial da semiaridez climática limita o desenvolvimento de cárstes. Na vertente oriental do maciço de Baturité constatam-se feições cársticas associadas à dolomita da Unidade Independência (BRASIL, 2003), com predominância de lapiés, onde o bom desenvolvimento dessas formas se dá pela presença de um clima úmido e características favoráveis, tais como a litologia, a presença de fraturas e o elevado gradiente. O presente artigo tem como objetivo descrever, de forma preliminar, os relevos cársticos que ocorrem na vertente oriental do maciço de Baturité, servindo como ponto de partida para estudos posteriores. Além disso, destaca a necessidade de se identificar um possível potencial espeleológico, para se promover meios de proteção evitando o uso predatório dos recursos naturais e também um adequado aproveitamento para o turismo e lazer.

Material e métodos

Tendo em vista a necessidade de organizar as etapas de trabalho, o presente artigo foi elaborado em quatro fases. Na primeira etapa foram feitas consultas em livros sobre a região estudada, seguido de pesquisas no site da Sociedade Brasileira de Espeleologia. O levantamento cartográfico foi direcionado, valendo-se, principalmente, de mapas temáticos, sendo que os mais utilizados foram o geológico e geomorfológico, elaborados por Bastos (2012) na escala de 1:250.000, nos quais se pode identificar a localização do relevo cárstico e do maciço de Baturité, além do mapa geológico elaborado pela CPRM (2003) na escala de 1:500.000. Lançando mão das bases cartográficas digitais, foram interpretados, a partir da utilização de técnicas de geoprocassamento, os mapas temáticos de maneira a se justificar a ocorrência de cárste na área em questão, em função das estruturas, formas e parâmetros climáticos. A terceira etapa foi feita através da pesquisa de campo, visitando a referida área estudada, com registros fotográficos das formas cársticas como os lapiés e de outros detalhes que não poderiam ser esquecidos como a vegetação tendo em vista que ela é a resposta da interação dos elementos naturais que ocorrem no ambiente. Finalmente, na quarta etapa foi realizada a integralização dos dados obtidos em campo junto aos levantamentos bibliográficos visando o melhor entendimento da área, onde foi elaborado um mapa com a demarcação do maciço de Baturité e indicação da área de ocorrência de relevos cársticos na vertente oriental do referido maciço através de técnicas de geoprocessamento.

Resultado e discussão

O maciço de Baturité se destaca por ser um ambiente diferente no meio de uma vasta superfície de erosão onde está inserido, tendo uma variedade de rochas e formas, mostrando grande relevância para pesquisas cientificas. Do ponto de vista geomorfológico a citada serra está localizada no Domínio dos Escudos e Maciços Antigos compostos por litotipos do embasamento cristalino datados do Pré-Cambriano (SOUZA, 1988). Do ponto de vista geológico o referido maciço apresenta predomínio de rochas metamórficas com maior ocorrência de gnaisses, micaxistos, migmatitos e quartzitos. De forma pontual, constata-se a ocorrência de granitóides. De acordo com Brasil (2003), predominam duas unidades geológicas: As Unidades Canindé e Independência, ambas constituintes do Complexo Ceará. Segundo Bétard e Peulvast (2011), a gênese do maciço de Baturité está relacionada ao rifting intracontinental que ocorreu no cretáceo, sendo considerado o ombro ocidental do rift Cariri- Potiguar. O rift Cariri-Potiguar foi abortado, logo em seguida formaram-se as bacias do Araripe ao sul e do Apodi ao leste do estado do Ceará. Para Claudino Sales e Peulvast (2007), os maciços de Conceição, Aratanha, Maranguape, Uruburetama e Baturité, se encontram próximos e sem falhas para sugerir uma possível separação tectônica, com isso, se constata que o isolamento desses maciços se deu pelo soerguimento do conjunto e erosão diferencial. Segundo Bastos (2012) os níveis altimétricos alcançam em média, cotas entre 600 – 800m, podendo, em algumas cristas, alcançar níveis acima de 900m, onde o ponto mais alto é o Pico Alto (Guaramiranga), com 1.114 m estando associado ao quartzito da Unidade Independência, um dos litotipos mais resistentes da região. Na vertente oriental, onde fica o setor mais úmido do maciço devido à exposição do relevo às massas de ar úmidas vindas dos oceanos gerando chuvas orográficas, a topografia se encontra fortemente dissecada com vales em “V” e essa dissecação se deve à elevada capacidade de entalhe da rede de drenagem associada a aspectos estruturais, tais como a significativa presença de diaclases (BASTOS, 2012). No contato entre a vertente oriental e o piemont se encontram os relevos cársticos do maciço de Baturité, compostos principalmente por rochas metamórficas do tipo dolomita, onde as formas mais comuns são os lapiés. Tendo em vista a dificuldade de acesso, é desconhecida a existência de outras feições cársticas na área, tais como formas endocársticas. Para Bastos (2012), a Unidade Independência é composta, em sua maioria, por rochas metamórficas bem resistentes como é o exemplo dos quartzitos, mas existe também a presença de metacalcários que justificam a ocorrência desses relevos cársticos na vertente oriental do maciço. Os relevos cárstico da área em questão se localizam nas encostas de um esporão do maciço de Baturité, que recebe o topônimo de serra do Cantagalo. Essa pequena serra localiza-se entre os municípios de Acarape, Barreiras e Aracoiaba. Os lapiés que ocorrem nessa área apresentam-se verticalizados com altitudes que chegam a mais 50m em alguns trechos (Figura 2). As condições litológicas propiciam um bom desenvolvimento dos cárstes tendo em vista que a dolomita se apresenta fortemente fraturada e o declive constitui um significativo gradiente para o escoamento da água. Essas áreas possuem também um grande potencial educacional, podendo entrar em roteiros de estudos de campo em várias outras disciplinas, devido a sua gênese que se dá de uma forma holística, abrangendo áreas do conhecimento como geomorfologia, geologia, paleontologia, turismo e outras. Tendo em vista o valor econômico da dolomita, essas áreas vêm sendo muito degradadas, por causa da exploração mineral para construção civil e fabricação de tintas e com isso pode-se comprometer um grande potencial científico e turístico nessa área de ocorrência desses relevos. Uma das grandes preocupações reside no fato de que não se conhece em detalhe o potencial espeleológico da área.

Figura 1:

Localização dos relevos cársticos do maciço de Baturité/CE.

Figura 2:

Identificação dos lapiés no fundo da imagem e exploração de dolomita no detalhe, no município de Barreiras /CE.

Conclusões

O estudo dos relevos cársticos é de grande importância geomorfológica, tendo em vista que essas feições apresentam grande potencial turístico e de pesquisas cientificas, existindo assim, a necessidade de se conhecer e proteger esses ambientes. Porém, o que se constata é o uso predatório desses recursos naturais para fins industriais. No Ceará o clima semiárido limita a ocorrência de relevos cársticos, mesmo assim, segundo a Sociedade Brasileira de Espeleologia (2011), existem 44 cavernas registradas no estado. Considerando que no Ceará o clima é um fator limitante para a evolução dos cárstes, a preocupação com esses ambientes já identificados deve ser redobrada. No caso da área específica da serra do Catagalo preocupa muito a inexistência de informações detalhadas sobre os cárstes da área. Nessa perspectiva, pode haver formas endocársticas desconhecidas e suas potencialidades científicas e turísticas encontram-se subutilizadas e, até mesmo, ameaçadas.

Agradecimentos

Referências

AB’SÁBER, A.N. Os Domínios de Natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. 7ª edição. São Paulo: Ateliê Editorial, 2012.
BASTOS, F.H. Movimentos de massa no maciço de Baturité (CE) e contribuições para estratégias de planejamento ambiental. 2012. 257 p. Tese (Doutorado) – Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza. 2012.
BRASIL. Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais – CPRM. Atlas Digital de Geologia e Recursos Minerais do Ceará. Mapa na escala 1:500.000. Serviço Geológico do Brasil. Ministério das Minas e Energia. Fortaleza, 2003.
CEARÁ. Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE) - Zoneamento Ambiental da APA da Serra de Baturité. diagnósticos e diretrizes. Fortaleza:, 1992. 136p.
CLAUDINO SALES, V., PEULVAST, J-P. Evolução morfoestrutural do relevo da margem continental do Estado do Ceará, Nordeste do Brasil. Caminhos de Geografia, Vol 7, Nº 2. Uberlândia, 2007.
CHRISTOFOLETTI, A. Geomorfologia. 2ª edição. São Paulo: Editora Blucher, 1980.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE ESPELEOLOGIA. Cadastro Nacional de Cavernas do Brasil. Disponível em: <http://www.sbe.com.br>. Acesso em 22 de julho de 2014.
SOUZA, M. J. N. Contribuição ao estudo das unidades Morfo-Estruturais do Estado do Ceará. Revista de Geologia, (1): 73-91, junho/1988.


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