ANÁLISE DO EFEITO DE ESCALA DA BASE CARTOGRÁFICA NA OBTENÇÃO DE ATRIBUTOS TOPOGRÁFICOS EM BACIA HIDROGRÁFICA DE 1ª ORDEM

Autores

Siefert, C.A.C. (UFPR) ; Schultz, G.B. (UFPR) ; Marangon, F.H.S. (UFPR) ; Lange, D.R. (UFPR) ; Santos, I. (UFPR)

Resumo

Este trabalho teve como objetivo avaliar a influência da escala da base cartográfica na estimativa de variáveis morfométricas na bacia hidrográfica do rio Sagui - SC (0,25km²). Foram comparadas duas bases cartográficas em escalas distintas: 1:500 e 1:10.000. A distribuição das variáveis obtidas na escala 1:500 mostram-se coerentes com evidências empíricas e compatíveis com estudos de hidrologeomorfologia em pequenas bacias.

Palavras chaves

Modelo Digital do Terreno; Escala; bacia experimental

Introdução

As bacias hidrográficas apresentam uma grande variabilidade espacial de suas propriedades físicas, devido a característica heterogênea das paisagens e a complexidade de respostas hidrológicas mediante a inputs variáveis no espaço e no tempo (McDonnell et al., 2007). Assim, reconhece-se que a topografia é a principal variável utilizada para descrever o comportamento hidrogeomorfológico de bacias, exercendo ainda grande influência no movimento de águas subterrâneas e superficiais (Dunne, 1978), além de ser utilizada como variável explicativa na localização de áreas úmidas (Rohde & Seibert, 1999), padrões de umidade (Western et al., 1999), atributos químicos do solo (Kumar et al., 2012), estabilidade de encostas (Bueno et al., 2012) e processos erosivos. Neste sentido, estudos de natureza quantitativa e comparativa entre mapeamentos e/ou levantamentos topográficos com diferentes resoluções espaciais para a geração de atributos topográficos são recorrentes em médias e grandes bacias (i.e. Sorensen & Seibert, 2007; Aryal & Bates, 2008; Ruhoff et al., 2011). Entretanto, dada a própria complexidade das questões que envolvem o movimento das águas associado a natureza empírica da própria ciência hidrogeomorfológica, onde a descrição e observação dos processos está associada ao monitoramento e modelagem em pequenas bacias experimentais e encostas (Seyfried & Wilcox, 1995; Grayson & Blöschl, 2001) ,poucos estudos são observados considerando o efeito da escala dos levantamentos para obtenção de atributos topográficos e variáveis morfométricas em pequenas bacias (Mota et al., 2013). Desta maneira, este artigo tem como objetivo avaliar a influência da escala da base cartográfica na estimativa de atributos topográficos primários (i.e. MDE, declividade) e variáveis morfométricas (p.ex. amplitude altimétrica, comprimento do canal, perímetro e área de drenagem) em uma bacia hidrográfica experimental de 1ª ordem, localizada no Planalto Norte de Santa Catarina.

Material e métodos

A bacia hidrográfica do rio Sagui localiza-se no estado de Santa Catarina, inserida no município de Rio Negrinho, nas proximidades da divisa com o estado do Paraná. Drenando uma área de aproximadamente 0,25 km², a bacia do rio Sagui é integrante da rede de bacias-escola proposta em Kobyama et al., (2009). Para esta área existem as seguintes bases cartográficas com informações altimétricas: carta topográfica Rio Negrinho (escala 1:50.000, disponibilizado pelo IBGE); ortofotocarta do município de Rio Negrinho (escala 1:10.000, ano 2006); e dados SRTM (Shuttle Radar Topography Mission, resolução espacial de 30m) disponibilizados pelo sítio da EPAGRI/CIRAM. Estas bases foram comparadas com levantamento topográfico realizado na área utilizando estação total. No total foram levantados 1.773 pontos resultando em uma densidade média de 75,8 pontos / hectare, sendo enquadrado na escala 1:500, conforme NBR 13.133 (ABNT, 1994). Os pontos cotados e as curvas de nível foram interpolados utilizando a ferramenta Topo to Raster (Hutchinson, 1989), disponível no software ArcGIS 9.2, visando elaborar um modelo digital de elevação (MDE). A resolução espacial do MDE foi definida conforme Tobler (1987), considerando a relação entre a escala da informação e a área mínima identificável. A partir do MDE foram obtidos o mapa e a distribuição de frequência da declividade e variáveis morfométricas distintas utilizadas para comparação das diferentes escalas. A comparação das duas bases cartográficas foi realizada de forma quantitativa, pela diferença dos valores máximos, mínimos e médios, entre as variáveis acima citadas e pela avaliação visual entre os dois MDE.

Resultado e discussão

Considerando que o rio Sagui não é representado no levantamento 1:50.000, esta escala foi excluída da análise. Situação similar aos dados SRTM (Shuttle Radar Topography Mission, resolução espacial de 30m). Portanto, essas duas bases cartográficas não apresentam detalhamento suficiente para estudos de bacias de primeira ordem. Na escala 1:10.000 foi possível identificar o rio Sagui e delimitar a sua área de drenagem assim como no levantamento topográfico realizado. A Tabela 1 apresenta as variáveis morfométricas obtidas para as duas escalas consideradas na análise. De maneira geral, todos as variáveis analisadas apresentaram diferenças quando comparadas as duas escalas, sendo as maiores variações apresentadas nas variáveis relacionadas a declividade. Observou-se diminuição na área de drenagem da bacia ao considerar o maior detalhamento das encostas e divisores obtidos no MDE em escala 1:500, culminando numa diferença percentual de 5,91% entre as escalas analisadas. Apesar da diminuição da área de drenagem notou-se um incremento positivo no perímetro, devido a um maior detalhamento do contorno da bacia obtido com o levantamento dos divisores de forma mais fidedigna as características topográficas da bacia. Em relação a altimetria (i.e. cotas máximas, mínimas, médias da bacia e cota da nascente), não foram observadas alterações significativas entre as duas escalas. Entretanto, com relação a morfologia da bacia identificada no MDE, observou-se o detalhamento de um vale não identificado no levantamento 1:10.000 (Figura 1) Em relação a declividade, além da importante diferença entre os valores máximos e mínimos identificados nas duas escalas, observou-se variação entre a distribuição de frequência deste atributo (Figura 1). Na escala 1:10.000, a bacia é representada predominantemente com declividades inferiores a 10%, enquanto na escala 1:500 ocorre maior frequência de declividades entre 10 e 20 %. Desta forma, a escala de maior detalhe representa o relevo com maior variabilidade espacial. Além disso as observações de campo realizadas durante o levantamento topográfico indicam que as generalizações cartográficas intrínsecas a esta escala de 1:10.000 análise não são adequadas para estudos em bacias de 1ª ordem.

Tabela 1

Variáveis morfométricas e comparação entre as duas escalas

Figura 1

Modelos Digitais de Elevação da bacia hidrográfica do rio Sagui

Conclusões

Após a análise inicial das bases cartográficas disponíveis, constatou-se que as escalas 1:50.000 e o levantamento SRTM não apresentam detalhamento suficiente para estudos em bacias de 1ª ordem. Comparativamente ao levantamento topográfico de detalhe, a escala 1:10.000 também não apresentou-se adequada em virtude de uma generalização acentuada nas informações cartográficas, sobretudo nas variáveis relacionadas as declividades. Neste sentido, destaca-se que diferenças significativas podem afetar a obtenção de atributos secundários (p.ex.: índices morfométricos) que serão utilizados como dados de entrada de modelos matemáticos distribuídos e/ou utilizados para estimativa da variabilidade espacial de processos e atributos hidrogeomorfológicos em bacias. Assim, salienta-se que torna-se necessário a realização de um levantamento em escala de detalhe em estudos em pequenas bacias onde a topografia é o fator determinante da ocorrência de processos de origem hidrológica e geomorfológica.

Agradecimentos

Referências

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