ALTERAÇÕES NA MORFOLOGIA PRAIAL POR AÇÕES ANTROPOGÊNICAS: ESTUDO DE CASO DO TERMINAL MARÍTIMO DE PASSAGEIROS NA PRAIA MANSA, FORTALEZA/CE
Autores
Barra, O.A.O.L. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ) ; Vasconcelos, F.P. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ)
Resumo
Alterações morfológicas de ambientes praiais se dão por fatores naturais ou antrópicos. O objetivo deste trabalho é retratar as variações no comportamento morfológico, e suas consequências, geradas pela intervenção do Terminal Marítimo de Passageiros na Praia Mansa, localizada na área interna do Porto de Fortaleza. Perfis de praia tem diagnosticado um elevado processo erosivo na área, propiciando diferenças na morfologia, reduções na linha de costa e efeitos de degradação na Praia Mansa.
Palavras chaves
Alterações morfológicas; Processos erosivos; Praia Mansa, CE
Introdução
Os ambientes costeiros, devido sua fragilidade inerente, estão sob constante risco de efeitos ambientais adversos, sobretudo pela pressão antrópica a qual absorvem. Nesse contexto encontram-se os equipamentos portuários, que pela magnitude de suas atividades, tendem a provocar perturbações ambientais nos litorais onde estão inseridos. Exemplo dessa problemática é a atual construção do Terminal Marítimo de Passageiros do Porto de Fortaleza (ou Porto do Mucuripe como é mais conhecido). Este equipamento configura-se como um terminal de uso múltiplo (receptáculo para navios de turismo e demais tipos de embarcações), faz parte do conjunto de obras do evento Copa do Mundo para a cidade de Fortaleza (CE) e encontra-se em fase inaugural. O local escolhido para sua instalação, a Praia Mansa, foi originada a partir de uma intervenção antrópica no mecanismo natural de transporte sedimentar com a instalação do prolongamento rochoso na ponta do Mucuripe durante a construção do porto. Isso lhe confere um alto grau de fragilidade ambiental do ponto de vista ecodinâmico. Diante disso, a instalação do novo terminal trouxe alterações na hidrodinâmica da área por ocasião de dragagens, propiciando elevados processos erosivos responsáveis pela mudança no comportamento morfológico como perca de volume sedimentar e mudanças na declividade, resultando numa considerável redução na linha de costa, bem como efeitos de degradação na Praia Mansa, marcados por supressão na vegetação. A partir dessas constatações, este trabalho tem por objetivo abordar as variações morfológicas e as consequências dessas mudanças sobre a Praia Mansa mediante a instalação do Terminal Marítimo de Passageiros. Esta pesquisa é fruto do monitoramento ambiental realizado pelo Laboratório de Gestão Integrada da Zona Costeira – LAGIZC/Universidade Estadual do Ceará (UECE).
Material e métodos
As propriedades essenciais dos processos morfodinâmicos são um ciclo fechado retroalimentado entre topografia e dinâmica do fluído, que transportam sedimentos produzindo uma mudança morfológica (COWELL e THOM, 1994; MUEHE, 2013). Sendo assim, a morfodinâmica envolve interação mútua de ondas (correntes e marés) com a topografia, no qual as ondas incidentes irão atuar sobre os sedimentos modificando a morfologia da praia, que por sua vez influenciará nas ondas incidentes e assim sucessivamente (HOEFEL, 1998; CALLIARI et. al., 2003). Para obtenção de dados sobre a morfologia da Praia Mansa, foi utilizado o método de levantamento topográfico proposto por Borges (1977), caracterizado por levantamentos perpendiculares à praia, chamados perfis praiais. Em cada ponto pré-determinado, foram medidas as cotas, com auxílio de uma estação total da Marca Ruide, modelo RTS-280 e prisma. O equipamento é instalado em um dado ponto, entre a linha água e o RN pré-determinado e são feitas leituras a ré, em seguida as leituras a vante, sempre em marés de sizígia, em horários de baixa- mar. As variações de altura em função da distância são configuradas através de perfis transversais, onde as representações gráficas são feitas através do programa Auto Cad. A análise documental foi também imprescindível para a obtenção dos resultados, através dos relatórios técnicos do Instituto Nacional de Pesquisas hidroviárias (INPH) sobre a elevação na altura das ondas no local de estudo mediante as dragagens realizadas na bacia portuária do Mucuripe em frente à Praia Mansa.
Resultado e discussão
Em 2010, foi iniciada uma dragagem de aprofundamento no canal de acesso ao Porto
do Mucuripe e em sua bacia de evolução. O estudo realizado (INPH, 2013) apontou
a dragagem como causa principal da alteração da energia das ondas swell que
passaram a se difratar com mais eficiência, chegando à Praia Mansa com até o
dobro de altura que ocorria antes da dragagem (Figura 1).
Esta alteração no regime das ondas intensificou o transporte de sedimentos,
alterando a morfologia e acelerando os processos erosivos, o que resultou em uma
significativa alteração na linha de costa, onde a erosão entre 2009 e 2011,
intervalo no qual se insere o período da dragagem, se mostrou mais expressiva do
que em anos anteriores (Figura 2).
Atestando as observações feitas pelo INPH (2013), o monitoramento realizado
desde 2012 pelo LAGIZC permitiu, através da realização dos perfis, avaliar a
quantidade de material removido ou depositado ao longo da praia em uma série
cronológica. Foram realizados monitoramentos a partir de julho de 2012.
Esse trabalho apresenta resultados de seis perfis realizados no período de julho
de 2012 a julho de 2013, de forma a minimizar os efeitos da sazonalidade sobre a
morfologia praial. A localização e a cota dos perfis topográficos na Praia Mansa
tem como referência o Datum WGS-84, zona 24M (Fortaleza/CE).
Julho de 2012:
Perfil 1: Latitude (S) 9590628,35; Longitude (W) 558364,07; Cota 4,0427 m.
Largura = 81,14 m.
Volume total do perfil (secção de 1 m) = 190,1915 m³
Volume na seção de 1 m² = 2,34 m³/m.
Perfil 2: Latitude (S) 9590734,93; Longitude (W) 558313,55; Cota 4,9790 m.
Largura = 121,00 m.
Volume total do perfil (secção de 1 m) = 418,00 m³.
Volume na seção de 1 m² = 3,45 m³/m.
Perfil 3: Latitude (S) 9590851,65; Longitude (W) 558243,59; Cota 5,2360 m.
Largura = 69,77 m.
Volume total do perfil (secção de 1 m) = 126,0608 m³.
Volume na seção de 1 m² = 1,81 m³/m.
Julho de 2013:
Perfil 1: Latitude (S) 9590628,35; Longitude (W) 558364,07; Cota 4,0427 m.
Largura = 73,89 m.
Volume total do perfil (secção de 1 m) = 114,93 m³.
Volume na seção de 1 m² = 1,55 m³/m.
Perfil 2: Latitude (S) 9590734,93; Longitude (W) 558313,55; Cota 4,9790 m.
Largura = 221,04 m.
Volume total do perfil (secção de 1 m) = 394,11 m³.
Volume na seção de 1 m² = 3,26 m³/m.
Perfil 3: Latitude (S) 9590851,65; Longitude (W) 558243,59; Cota 5,2360 m.
Largura = 69,7 m.
Volume total do perfil (secção de 1 m) = 126,40 m³.
Volume na seção de 1 m² = 1,81 m³/m.
Comparando os perfis durante a série cronológica, temos que em relação a julho
de 2012, o perfil 01 sofreu relevante alteração, com redução de volume na ordem
de 75 m³ na seção de 1 metro de largura. A área de berma também diminuiu,
indicando uma tendência de recuo da linha de costa. O estirâncio também
apresentou a mesma tendência com leve diminuição em seu comprimento, indicando
também um avanço do mar em direção ao continente.
O perfil 2 apresenta redução de volume na ordem de 24 m³ na seção de 1 metro de
largura. O berma aumentou de comprimento e volume. Já o estirâncio possui perfil
muito inclinado em sua porção inicial, indicativo de fortes processos erosivos.
O perfil 3 é o mais curto de todos os três que são analisados. No berma o perfil
continua suave com ligeira inclinação ao mar. No estirâncio também não ocorreu
grande modificação, ele declina moderadamente para o mar. Em comparação com o
período anterior, este perfil permanece praticamente inalterado.
Os perfis 01 apresenta maior processo erosivo, seguido do perfil 02 que também
teve seu volume diminuído. Esses dois perfis são os mais próximos a área de
construção do Terminal de Passageiros do Porto do Mucuripe. O perfil 03 não
sofreu processos erosivos devido sua maior distância da área das obras.
Comparação da altura de ondas swell na Praia Mansa, antes e após a dragagem. Fonte: INPH (2013).
Imagens de Satélite com as alterações na linha de costa na Praia Mansa entre 2009 e 2011. Fonte: INPH (2013).
Conclusões
Os terminais portuários podem gerar alterações importantes na dinâmica litorânea onde se localizam, principalmente em sua fase de instalação. No caso aqui apresentado, a implantação do Terminal de Passageiros provocou efeitos adversos no local onde foi inserido, a Praia Mansa. Tais efeitos se manifestaram inicialmente na elevação na altura significativa de ondas swell (INPH, 2013). Esta elevação promoveu um considerável transporte sedimentar, promovendo modificações no comportamento morfológico redundando em diminuições na linha de costa da Praia Mansa. Através dos monitoramentos dos perfis realizados em julho de 2012 e 2013 foi possível constatar alterações na morfologia local. As maiores reduções ocorrem nos perfis mais próximos às obras com redução de 75 m³ para o 1º perfil e 24m³ para o perfil 02, numa seção de 1m de largura. O perfil 03 apresentou-se estável. Além disso, o cotidiano das obras tem gerado degradação, manifesta pela supressão da vegetação, observada in loco.
Agradecimentos
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES Programa de Pós-Graduação em Geografia (ProPGeo/UECE) Laboratório de Gestão Integrada da Zona Costeira (LAGIZC/UECE)
Referências
BORGES, A.C. Topografia Aplicada à Engenharia Civil. São Paulo: Edgard Blücher, v.1, 1977.
CALLIARI, L.J.; MUEHE, D.; HOEFEL, F.G. & TOLDO Jr., E.. Morfodinâmica praial: uma breve revisão. Revista Brasileira de Oceanografia. 5l (único): 63-78. 2003.
COWELL, P.J.; THOM, B.G. Morphodynamics of Coastal Evolution. In: CARTER, R.W.G.; WOODROFFE, C.D. Coastal Evolution: Late Quaternary Shoreline Morphodynamics. Cambridge: Cambridge, p.33-86, 1994.
HOEFEL, F.G. Morfodinâmica de Praias Arenosas: uma revisão bibliográfica. Itajaí, Editora da Univali, 90p. 1998.
INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS HIDROVIÁRIAS – INPH. Modelagem matemática para avaliação na Praia Mansa e no futuro Terminal de Passageiros, após dragagem no Porto do Mucuripe (Fortaleza – CE). INPH/SEP. Rio de Janeiro, 2013.
MUEHE, Dieter. Erosão costeira, mudança do clima e vulnerabilidade. In: GUERRA, A.J.T & JORGE, M.C.O.(orgs.) Processos erosivos e recuperação de áreas degradadas. São Paulo: Oficina de Textos, 2013.