IDENTIFICAÇÃO DE SUPERFÍCIES GEOMÓRFICAS ENTRE ABELARDO LUZ (SC) E ERECHIM (RS) - BASES PARA COMPREENDER A EVOLUÇÃO DO RELEVO NO VALE DO RIO URUGUAI, SUL DO BRASIL

Autores

Paisani, J.C. (UNIOESTE) ; Pontelli, M.E. (UNIOESTE) ; Manfredini, L. (UNIOESTE) ; Ribeiro, F.J. (UNIOESTE) ; Lima, S. (UNIOESTE)

Resumo

Identificou-se bordas de patamares extensos, patamares dissecados, patamar fortemente dissecado, superfície em elaboração, relevos residuais e remanescente de superfície aplainada. As primeiras correspondem ao prolongamento das superfícies previamente identificadas nas vizinhanças. As demais mostram-se com similaridade topográfica, porém sugerem momentos evolutivos ajustados a incisão do rio Uruguai. Acredita-se que elas evoluíram pelos mesmos mecanismos geradores das superfícies vizinhanças.

Palavras chaves

patamar; relevo residual; superfície aplainada

Introdução

O grupo de pesquisa "Gênese e Evolução de Superfícies Geomórficas e Formações Superficiais”, formado na UNIOESTE e cadastrado no CNPq, a mais de 10 anos vem se interessando em caracterizar o relevo e sua evolução nas áreas mantidas pelos derrames vulcânicos da Bacia do Paraná, entre os estados do Paraná e Santa Catarina. Inicialmente buscamos caracterizar a estrutura geológica em escala de bacia hidrográfica e associá-la a distribuição de patamares (ombreiras), cabeceiras de drenagem e canais de baixa ordem hierárquica (Paisani et al., 2005; 2006; 2008a,b). Num segundo momento procuramos caracterizar as formações superficiais e compreender a evolução de encostas e fundos de vales de baixa ordem hierárquica (Paisani e Geremia, 2010; Paisani et al., 2012). Recentemente, estamos associando as formações superficiais (perfis de intemperismo, sedimentos, solos e paleossolos) com superfícies geomórficas em escala regional. Até o momento foram individualizadas oito superfícies geomórficas organizadas em escadaria com as maiores altitudes a leste (Paisani et al., 2008b). As formações superficiais que mantém essas unidades de relevo são formadas in situ em sua maioria, e se caracterizam por Latossolos renovados ao longo do Quaternário Superior (Paisani et al., 2013a). A exceção são as superfícies mais elevadas (>1.200 m), onde predominam sedimentos e paleossolos do Quaternário Tardio (Paisani et al., 2012; 2013b; 2014; Guerra & Paisani, 2012; 2013). Embora tenham sido gerados importantes informações a respeito da gênese e evolução de superfícies geomórficas, pouco se sabe a respeito de superfícies correlatas entre os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Diante disso, iniciamos a identificação de superfícies geomórficas e a individualização de formações superficiais entre Abelardo Luz (SC) e Erechim (SC), cujos resultados preliminares são apresentados neste trabalho.

Material e métodos

A área de estudo foi definida entre os paralelos 26º e 27º S e os meridianos 52º e 53º W e se estende entre os municípios de Abelardo Luz, extremo noroeste de Santa Catarina, e Erechim, noroeste do Rio Grande do Sul (Fig.1). A identificação de superfícies geomórficas e a individualização de formações superficiais nessa área seguiu os procedimentos adotados por Paisani et al., (2008b), para área vizinhas. Eles consistem no cotejamento entre dados de campo, a respeito da observação da paisagem e das respectivas formações superficiais, e a espacialização de superfícies obtida com a classificação hipsométrica de imagens do sensor Shuttle Radar Topography Mission (SRTM), escala 1:250.000. As formações superficiais foram levantadas em 41 pontos de observação, dispostas em barrancos de cortes de estradas. Em cada ponto fez-se o registro fotográfico, a localização com GPS e as características das formações superficiais, perfis de intemperismo ou depósitos sedimentares. Extraiu-se o quadrante da área de estudo das imagens do sensor SRTM SG-22-Y-A, SG-22-Y-B, SG-22-Y-C, SG-22-Y-D. Essas imagens foram obtidas através do site http://www.relevobr.cnpm.embrapa.br/download/ da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). Os dados foram importados para o ambiente dos aplicativos do ArcGIS, onde plotou-se a distribuição dos pontos de observação e procedeu-se a classificação hipsométrica com equidistância de 100m, similarmente ao realizado por Paisani et al. (2008b). Foram individualizadas as faixas hipsométricas correspondentes a 11 superfícies geomórficas, classificadas conforme o critério morfológico em borda de patamar extenso (<25Km de extensão), patamar dissecado (<10Km de extensão), patamar fortemente dissecado (<4Km de extensão), superfície em elaboração (fundos de vales dos principais tributários do rio Uruguai) e relevos residuais e remanescente de superfície aplainada.

Resultado e discussão

A superfície geomórfica mais elevada da área de estudo situa-se entre 1100-1200m de altitude e se estende pelos municípios de Abelardo Luz (SC) e Palmas (PR) (Fig.1). Tal superfície corresponde a borda de patamar extenso (Superfície III) identificada por Paisani et al. (2008b), e apresenta perfil de alteração com horizonte C espesso (+8m). Outra superfície dessa categoria esta disposta de forma descontínua entre 1000-1100m n os municípios de Abelardo Luz, Vargeão, Ouro verde, Faxinal dos Guedes, Passos Maia, Ponte Serrada, Ipumirim e Lindóia. Essa superfície refere-se a borda de patamar extenso (Superfície IV) de Paisani et al. (2008b), e tem perfil de alteração que está sendo descritas em detalhe. Foram identificadas 5 superfícies designadas por patamar dissecado. A mais elevada se situa entre 900-1000m e tem maior extensão no município de Abelardo Luz (Fig.1). Nos municípios de Mariópoles, Jupiá, Galvão e São Domingos ela ocorre como relevos residuais. Tal superfície corresponde a superfície interplanáltica (Superfície V) identificada por Paisani et al. (2008b), onde as formações superficiais apresentam-se in situ, sobretudo junto aos divisores de água dos rios Iguaçú/Uruguai e estão sendo caracterizadas em detalhe. Nessa superfície esta inscrito o astroblema Vargeão (Vieira, 2009). Outro patamar dissecado ocorre entre 800-900m, sobretudo no município de Abelardo Luz (Fig.1). Ele se mostra como relevos residuais nos municípios contidos a margem esquerda do Rio Uruguai. Essa superfície tem correlação altimétrica com a superfície interplanáltica (Superfície VI) identificada por Paisani et al. (2008b) entre os estados do Paraná e Santa Catarina. Suas formações superficiais apresentam perfil de alteração in situ com horizontes diagnósticos espessos (+9m) e foram descritos em perfil de referência no município de Mariópolis (Paisani et al., 2013a). O terceiro patamar dissecado foi identificado entre 700-800m e tem correspondência altimétrica com o patamar extenso (Superfície VII - Paisani et al. (2008b). Na área de estudo ele mostra-se dissecado (0,4-9Km de extensão) e tem maior expressão nos municípios de Abelardo Luz, Xanxerê, Ouro Verde, São Domingos e Erechim. Em Abelardo Luz essa superfície é suavemente ondulada com Latossolos húmicos que podem apresentar +2,5m de espessura. Localmente registra-se linha de crostas ferruginosos alóctone, sugerindo que parte desses materiais foram retrabalhados ao longo do tempo. O quarto patamar dissecado foi identificado entre 600-700m e tem correspondência altimétrica com o patamar extenso em Missões – Argentina (Superfície VIII - Paisani et al. (2008b). Ele se apresenta delgado (~4Km de extensão) e se estende, sobretudo, nos municípios de Três Palmeiras, Trindade do Sul, Gramado dos Loureiros, Nonoai, Entre Rios do Sul, Campinas do Sul, todos da margem esquerda do rio Uruguai. Na margem direita deste rio essa superfície mostra-se como remanescente de superfície aplainada, com ocorrência nos municípios de Maravilha, Tigrinhos e Bom Jesus do Oeste e Cunha Porã. Em Chapecó esta superfície apresenta-se suavemente ondulada com perfis de alteração com + 5m de espessura. Enfim, o quinto patamar dissecado foi identificado entre 500-600m (Superfície IX) e não foi identificado por Paisani et al. (2008b). Ele tem maior expressão nos municípios de Guatambu, Cunha Porã, Rio dos Índios, Nonoai e Planalto. Em Pinhalzinho (SC) mostra-se com relevo suavemente ondulado caracterizado por Latossolos com +4m de espessura. O patamar fortemente dissecado se encontra entre 400-500m de altitude e tem extensão <4Km. Sua ocorrência é limitada ao longo do vale do sistema hidrográfico do Rio Uruguai. Por fim, a classe de 300-400m corresponde a superfície em elaboração situada no fundo de vale dos principais tributários do Rio Uruguai. Ela apresenta maior expressão ao longo do vale do Rio Varzea (~6km), abrangendo municípios de Cristal do Sul, Rodeio Bonito, Novo Tiradentes, Serra Grande e Liberato Salzano.

Fig.1 – Localização,hipsometria(SRTM), pontos de obs. e municípios.



Fig.2-Vista de patamar dissecado (900-1000m/Superfície V).



Conclusões

Foram identificadas as seguintes superfícies geomórficas entre Abelardo Luz (SC) e Erechim (RS): borda de patamar extenso, patamar dissecado, patamar fortemente dissecado, superfície em elaboração, relevos residuais e remanescente de superfície aplainada. As superfícies situadas nas bordas de patamares extensos correspondem ao prolongamento das superfícies previamente identificadas por Paisani et al. (2008b) e são interpretadas conforme a evolução sugerida pelos mesmos. As demais mostram-se com similaridade topográfica, porém com morfologia de patamares dissecados que sugerem momentos evolutivos ajustados a incisão do rio Uruguai. Por outro lado, é possível que elas tenham evoluído pelos mesmos mecanismos geradores das superfícies identificadas por Paisanai et al. (2008b), sobretudo pelo fato de serem mantidas por formações superficiais autóctones de relativa espessura.

Agradecimentos

A Fundação Araucária (Convênio 205/2012), a CAPES/CNPq (Projeto 144/2012-PVEs) pelo apoio financeiro e a CAPES bolsas de mestrado.

Referências

Guerra, S.; Paisani, J.C. 2012. Levantamento estratigráfico das Formações Superficiais Cenozóicas no Planalto de Palmas (PR) e Água Doce (SC): subsídio ao estudo da evolução da paisagem a partir do Estágio Isotópico Marinho 3. Ambiência (UNICENTRO), v.8, p.651 - 665. doi:10.5777/ambiencia.2012.05.03
Guerra, S.; Paisani, J.C. 2013. Abrangência espacial e temporal da morfogênese e pedogênese no Planalto de Palmas (PR) e Água Doce (SC): subsídio ao estudo da evolução da paisagem quaternária. Geociências, v.32, p.501 - 515.
Paisani, J. C.; Geremia, F. 2010. Evolução de encostas no Planalto Basáltico com base na análise de depósitos de colúvio - médio vale do rio Marrecas, SW do Paraná. Geociências, v.29, p.321 - 334.
Paisani, J. C.; Pontelli, M. E. 2012. Propriedades micromorfológicas de colúvios em encosta no médio vale do Rio Marrecas (SW PR) – bases para distinção de formações superficiais alóctones e autóctones em substrato basáltico, Pesquisas em Geociências, UFRGS, v.39 (1), p.53-62.
Paisani, J.C.; Pontelli, M.E., Geremia, F., Etchichury, J.A. 2005. Análise de lineamentos geomorfológicos na Bacia do Rio Quatorze - Sudoeste do Paraná. Varia Scientia (UNIOESTE), v.05, p.65 - 74.
Paisani, J.C.; Pontelli, M.E., Geremeia, F. 2006. Cabeceiras de drenagem da Bacia do Rio Quatorze - Formação Serra Geral (SW do Paraná): distribuição espacial, propriedades morfológicas e controle estrutural. Ra'e ga (UFPR), v.12, p.211 - 219.
Paisani, J.C., Pontelli, M.E., Andres, J. 2008a. Superfícies aplainadas em zona morfoclimática subtropical úmida no planalto basáltico da bacia do Paraná (SW Paraná / NW Santa Catarina): primeira aproximação. Geociências, v.27, p.541 - 553.
Paisani, J.C.; Pontelli, M.E., Andres, J.; Pasa, V., Marinho, F.R. 2008b. Características geológicas da Formação Serra Geral na área drenada pelo rio Marrecas (SW Paraná): fundamentos para a análise geomorfológica. Geografia (Londrina), v.17, p.49 - 65.
Paisani, J.C., Pontelli, M.E., Calegari, M.R., 2012. Evolução de bacias de baixa ordem nos 41.000 anos AP – Brasil Meridional. Revista Mercator, 11, 131–148. doi:10.4215/RM2012.1126.0009
Paisani, J.C., Pontelli, M.E., Corrêa, A.C.B., Rodrigues, R.A.R., 2013a. Pedogeochemistry and micromorphology of oxisols – a basis for understanding etchplanation in the Araucárias Plateau (Southern Brazil) in the Late Quaternary. Journal of South American Earth Sciences, 48, 1-12. doi:10.1016/j.jsames.2013.07.011
Paisani, J.C., Calegari, M.R., Pontelli, M.E., Pessenda, L.C.R., Côrrea, A.C.B., Paisani, S.D.L., Raitz, E., 2013b. O papel das mudanças climáticas do Quaternário Superior na dinâmica evolutiva de paleovale de segunda ordem (Sul do Brasil). Revista Brasileira de Geomorfologia, 14, p.103-116.
Paisani, J.C., Pontelli,M.E.; Osterrieth, M.L.; Paisani, S.D.L.; Fachin, A., Guerra, S.; Oliveira, L. 2014. Paleosols in low-order streams and valley heads in the Araucaria Plateau - record of continental environmental conditions in southern Brazil at the end of MIS 3. Journal of South American Earth Sciences, 54, 57-70. doi:10.1016/j.jsames.2014.04.005
Vieira, C.K. 2009. Caracterização geológica e geofísica da estrutura de impacto Domo de Vargeão, SC. Dissertação (Mestrado em Geociências), UNESP/Rio Claro.


APOIO
CAPES UEA UA UFRR GFA UGB